Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
421/10.0TBVIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FRANCISCO CAETANO
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
BENFEITORIA
INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 12/11/2012
Votação: DECISÃO SINGULAR
Tribunal Recurso: VISEU 3º J C
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: 23º Nº 1 E 29º Nº 2 DO CE
Sumário: I – Constitui benfeitoria, como tal indemnizável, a existência de um muro de vedação e suporte em parcela expropriada por utilidade pública;

II – Não obstante a parcela se inserir em “espaço agrícola” e consequentemente o solo da parcela expropriada ter a natureza de para outros fins, nada impede que a perda da capacidade edificativa da parte sobrante, para habitação do respectivo agricultor e instalações de apoio agrícola, integre o cômputo da indemnização global da expropriação.

Decisão Texto Integral: Decisão singular no Tribunal da Relação de Coimbra:

            1. Relatório

“EP - Estradas de Portugal, SA”, entidade que sucedeu a “EP - Estradas de Portugal, EPE”, instaurou processo especial de expropriação contra os herdeiros (e respectivos cônjuges) de A..., ou seja, B..., C...e marido D..., E... e marido F..., G..., H...e marido I..., J...e marido L..., K e ex-esposa M...(à data da sucessão ainda não eram divorciados), N... e marido O..., P...e marido Q..., R...e esposa S..., T..., U...e esposa V..., X... e mulher Z..., com vista à expropriação de uma parcela de terreno identificada com o n.º 32, necessária à realização da obra da A 25-IP 5 – Lanço nó do IC 2-Viseu, Sublanço Faíl-Viseu, mais tarde designada por A24, com a área de 6827 m2, a destacar do prédio rústico sito na freguesia de S. Cipriano, concelho de Viseu, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 990 dessa freguesia e omisso na Conservatória do Registo Predial de Viseu, que confronta a norte com Guilhermina de Jesus e a sul, nascente e poente com Caminho.

 Na decisão arbitral foi fixado, como indemnização, o valor de € 37.928,78, sendo € 16.726,15 para o terreno, para as benfeitorias a importância de € 18.232,00 e para a desvalorização das partes sobrantes a quantia de € 2.970,63, valor esse que foi depositado.

Discordando desse valor, recorreram os expropriados, contrapondo a quantia global de € 187.612,50.

A entidade expropriante não apresentou resposta.

            Nomeados os peritos, vieram estes apresentar o respectivo laudo, concluindo, os peritos indicados pelo tribunal e pelos expropriados pela indemnização global de € 118.304,38, considerando o solo apto para construção, por ser maior que aqueloutro que fixaram a partir da consideração de solo para outros fins (uso agrícola), no valor de € 70.587,65.

            O perito indicado pela entidade expropriante, partindo da classificação do solo como para outros fins, concluiu pela indemnização global de € 62.880,65, concordando com o valor fixado no relatório pericial quanto ao solo, com o das benfeitorias à excepção do fixado pelo muro de suporte em pedra, e com o das partes sobrantes à excepção do fixado relativamente a perda da capacidade edificativa.

            Ambas as partes alegaram nos termos do art.º 64.º do Cód. Expropriações (CE), os expropriados a pugnar pela fixação daquela indemnização de € 118.304,38 ou subsidiariamente de € 94.000,00 e a entidade expropriante pela sua improcedência e atendimento ao lado minoritário (€ 62.880,65).

            Proferida decisão, foi acolhido o critério valorativo e os valores indicados no relatório pericial na vertente da caracterização do solo como “para outros fins”, fosse quanto ao valor deste, fosse quanto às benfeitorias e desvalorização das partes sobrantes, fosse quanto à perda da capacidade edificativa da parcela, conforme permitido pelo PDM de Viseu.

Inconformada com a decisão, recorreu de apelação a entidade expropriante, em cujas alegações formulou as seguintes úteis conclusões:

a) – O muro de suporte em pedra [avaliado em € 3.500,00] foi construído não para murar ou vedar a propriedade, mas para permitir a exploração agrícola existente no local da parcela, sendo sua parte integrante, permitindo a obtenção do rendimento considerado no cálculo do valor do solo, já que, se não existisse, o terreno, de tão acentuado, não dispunha de aptidão para culturas arvenses de regadio;

b) – Logo, o valor das benfeitorias deverá ser de € 18.805,00 e não de € 22.305,00;

c) – À dada da DUP a parcela não poderia ser classificada como solo para construção face à potencialidade edificativa nula que possuía pelo que não poderia haver perda dessa potencialidade na parte sobrante;

d) – O PDM de Viseu classifica a parcela como área agrícola I e reserva agrícola nacional (RAN), não lhe conferindo qualquer capacidade edificativa, pelo que a área sobrante não pode estar sujeita a uma servidão non aedificandi porque essa possibilidade não existia, ali.

Os expropriados não responderam.

Face à natureza das questões, cuja simplicidade é patente e porque quanto à “perda da capacidade edificativa” já a mesma foi objecto de apreciação em caso similar em recurso intentado pela mesma entidade expropriante[1], ao abrigo do disposto no n.º 1, alín. c) do art.º 700.º e art.º 705.º, do CPC procede-se a decisão sumária.


*

            2. Fundamentos

            2.1. De facto

            Foi a seguinte a factualidade elencada como provada pela 1.ª instância e que não foi objecto de impugnação pela recorrente:

a) A parcela expropriada, com o nº 32, corresponde a parte do prédio inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 990 da freguesia de S. Cipriano, concelho de Viseu e omisso na Conservatória do Registo Predial de Viseu;

b) A parcela nº 32 tem a área total de 6827 m2;

c) Corresponde-lhe a declaração de utilidade pública, com carácter de urgência, publicada no DR nº 291, II Série, de 14-12-2004, com vista à execução da obra da SCUT Beiras Litoral e Alta – A 25/IP5 – lanço nó do IC 2 – Viseu, sublanço Faíl-Viseu;

d) Foi publicada no DR nº 120, II Série, de 23-06-2006 a rectificação e renovação da declaração de utilidade pública referida em c), com os seguintes fundamentos: “Verificou-se agora a necessidade de rectificar os dados identificativos de algumas parcelas abrangidas pela declaração de utilidade pública atrás referida. Por outro lado, dadas as dificuldades verificadas, não foi possível dar por concluídos os processos de expropriação antes de ocorrer a caducidade da referida declaração de utilidade pública”;

e) De acordo com o PDM de Viseu vigente às datas referidas em c) e d), o prédio referido em a) encontra-se situada em zona definida como “Espaço Agrícola I”;

f) À data da vistoria, a parcela expropriada é constituída por terreno agrícola de regadio de classe B, de natureza CAR 1ª, declive plano com socalcos, orografia plana, pedregosidade nula, exposição solar a nascente;

g) À data da vistoria, o terreno encontrava-se cultivado com hortícolas, revelando um índice de fertilidade elevada e medianamente profundo;

h) A parcela expropriada confronta do norte com Guilhermina de Jesus, do sul com caminho e próprio, do nascente com caminho, do poente com caminho e próprio;

i) A expropriação atinge parcialmente o prédio, resultando três áreas sobrantes, uma a norte e duas a poente com cerca de 2731 m2;

j) A parte sobrante a norte tem 561 m2, com as mesmas características da parte expropriada;

k) Na parte sobrante a norte, existiam à data da vistoria 9 carvalhos DAP 40, 2 pinheiros DAP 20, 2 oliveiras médias, 1 oliveira pequena, 11 marmeleiros pequenos;

l) A arte sobrante a poente (mais a norte) tem 955 m2 de área e possui as mesmas características da parte expropriada;

m) No terreno referido em l), existiam à data da vistoria 6 oliveiras médias, 1 oliveira grande, 1 nogueira média, 12 m de bardo de videiras de primeira e um poço com 7 metros de profundidade e 2,5 m de largura;

n) Na parte sobrante a poente (mais a sul), com a área de 1215 m2, existia à data da vistoria terreno florestal de 1ª, com pinheiros de cerca de 15 anos em muito bom estado de crescimento;

o) O terreno referido em n) tem profundidade média e fertilidade elevada, ali existindo 2 castanheiros grandes, 10 carvalhos DAP 30, 2 carvalhos DAP 40 e 8 carvalhos DAP 25;

p) Na parcela expropriada, existia, à data da vistoria, uma construção agrícola em pedra de granito com argamassa, chão em cimento e telhado em telha Marselha, de 4,60 x 4,40 m, em bom estado de conservação;

q) Na parcela expropriada, existia, à data da vistoria, uma eira em pedra de granito, de 11 x 8 m, em bom estado de conservação;

r) Na parcela expropriada, existia, à data da vistoria, uma estufa de 5 x 3 m, em bom estado de conservação;

s) Na parcela expropriada, existia, à data da vistoria, uma poça em pedra de 3 x 3 x 1 m, em bom estado de conservação;

t) Na parcela expropriada, existiam, à data da vistoria, duas minas;

u) Na parcela expropriada, existia, à data da vistoria, um poço revestido a pedra de 2,2 x 7 m, em bom estado de conservação;

v) Na parcela expropriada, existia, à data da vistoria, outro poço revestido a pedra de 2,5 m x 5 m, em bom estado de conservação;

w) Na parcela expropriada, existiam, à data da vistoria, 1 carvalho com DAP 10, 5 carvalhos com DAP 30, 3 carvalhos com DAP 15, 4 carvalhos com DAP 20, 1 castanheiro de fruto pequeno, 5 castanheiros de fruto médios, 2 pinheiros com DAP 20;

x) Na parcela expropriada, existiam, à data da vistoria, 4 pessegueiros pequenos, 12 oliveiras grandes, 125 videiras grandes, 30 marmeleiros médios, 11 ameixeiras médias, 5 ameixeiras pequenas, 2 oliveiras pequenas, 1 pessegueiro grande, 1 pereira grande, 1 cerejeira grande, 1 cerejeira pequena, 1 ameixeira grande, 1 macieira média, 1 nogueira média, 2 aveleiras médias, 11 marmeleiros grandes, 8 macieiras grandes, 1 laranjeira pequena, 2 oliveiras médias;

y) Na parcela expropriada, existia, à data da vistoria, um muro de suporte e vedação em pedra, de 50 x 2 x 0,40 m, em bom estado de conservação;

z) Na parcela expropriada, existiam, à data da vistoria, 3 árvores ornamentais grandes, 2 bardos de videiras de videiras de 1ª de 25 m, 2 árvores ornamentais médias, um muro de pedra aparelhadas de 11 x 0,70 m, em regular estado de conservação;

aa) A parcela expropriada encontra-se muito próxima da localidade de Chãos, distando desta cerca de 90 m;

bb) A parcela confina em 180 metros com estrada pavimentada, dispõe de saneamento público, de energia eléctrica, de água da rede, de rede telefónica;

cc) O acesso à parcela expropriada é feito por estrada pavimentada;

dd) O acesso à propriedade é afectado pela expropriação;

ee) Antes da expropriação, o prédio referido em a) era bem dimensionado, com uma área cerca de 3 vezes superior à média da região e bem localizado;

ff) Antes da expropriação, o prédio referido em a) confrontava a norte com Guilherme de Jesus, a sul, nascente e poente com caminho;

gg) A parcela expropriada tem configuração poligonal irregular;

hh) Não existem nas proximidades do local focos de poluição;

ii)  A parcela expropriada localiza-se junto da povoação de Chãos e a relativa distância do mercado de produtos hortícolas da cidade de Viseu, permitindo uma sucessão cultural batata e couve repolho;

jj) O terreno onde se insere a parcela expropriada permite, por hectare, uma produção de 15.000 kg de batata grande, pelo preço (ao produtor) de 0,17€/kg e de 2500 kg de batata miúda ao preço de 0,05€/kg, com encargos fundiários correspondentes a 70% do rendimento bruto, assim permitindo um rendimento fundiário de 802,5€;

kk) O terreno onde se insere a parcela expropriada permite, por hectare, uma produção de 15.000 kg de couve, pelo preço (ao produtor) de 0,18€/kg, com encargos fundiários correspondentes a 70% do rendimento bruto, assim permitindo um rendimento fundiário de 810€;

ll) As construções existentes na parcela expropriada valiam:

- casa de arrumos : € 5.060,00 ;

- eira: € 2.640;

- estufa: € 225,00;

- muro de vedação e de suporte: € 3.500,00;

- muro de pedra aparelhada: € 385,00;

- mm) Os recursos hídricos existentes na parcela expropriada valiam:

- poça de 9 m3: € 900,00;

- poço de 7 m3: € 3.150,00;

- poço de 5m3: € 2.250,00.

nn) As árvores fruteiras existentes na parcela expropriada valiam:

- pessegueiros: 1 x 25€ + 4 x 5€ = 45€;

- oliveiras: 12 x 90€ + 2 x 60€ + 2 x 7,50€ = 1215€;

- videiras: 125 x 7,50m = 937,50€;

- marmeleiros: 11 x 20€ + 30 x 15€ = 670€;

- ameixeiras: 1 x 25€ + 11 x 15€ + 5 x 5€ = 215€;

- pereira: 1 x 30€ = 30€;

- cerejeira: 1 x 60€ + 1 x 7,5€ = 67,50€;

- macieira: 8 x 30€ + 1 x 20€ = 260€;

- nogueira: 1 x 50€ = 50€;

- aveleiras: 2 x 20€ = 40€;

- laranjeira: 1 x 10€ = 10€;

 - bardo de videiras: 25 m x 7,50€/m = 187,50€;

 - castanheiros: 5 x 50€ + 1 x 7,50€ = 257€.

mm) As restantes espécies florestais existentes na parcela expropriada valiam:

- carvalhos: 1 x 2,50€ +  3 x 5€ + 4 x 7,50€ + 5 x 12,50€ = 110€;

- pinheiros: 2 x 7,50€ = 15€;

- árvores ornamentais: 3 x 20€ e 2 x 12,50€ = 85€.

nn) Com a expropriação, o prédio ficou fragmentado em 3 partes sobrantes que passaram a ter um valor inferior, na proporção de 50%, ao que tinham antes da expropriação;

oo) Por força da expropriação e da diminuição de área dela decorrente, as partes sobrantes ficaram sem a capacidade edificativa definida no art. 36º do PDM e pontos ii) da al. a) do nº I e vii) da alínea b) do Anexo I – Condições para a viabilização dos usos e acções referidos nos nº 2 e 3 do art. 20º do DL 166/2008 de 22-08;

pp) Os pontos ii) da al. a) do nº I e vii) da alínea b) do Anexo I – Condições para a viabilização dos usos e acções referidos nos nº 2 e 3 do art. 20º do DL 166/2008 de 22-08 permitiam, antes da expropriação, a construção de apoios agrícolas com uma área máxima de implantação de 100 m2 e da habitação para residência própria e habitual dos agricultores com uma área máxima de implantação de 250 m2;

qq) O lanço entre o ex-IP25 e a A25 é da jurisdição da EP, Estradas de Portugal SA, tendo sido construído no âmbito da concessão BLA, pela actual Ascendi no decorrer da empreitada da A25/IP5 – lanço Nó do IC 2 – Viseu Sublanço Faíl – Viseu, passando em momento posterior a ser designada por A24;

rr) Por ofício datado de 25-11-2008, a entidade expropriante solicitou ao Sr Juiz Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra a constituição da arbitragem (doc. de fls. 50);

ss) Por ofícios datados de 26-12-2008, os expropriados foram notificados da nomeação dos árbitros efectuada na sequência do referido em rr) (doc. de fls. 52-62);

tt) O presente processo de expropriação deu entrada em juízo em 09-02-2010 (fls. 2);

uu) À data em que foi interposto o recurso da decisão arbitral, já se encontrava implantada na parcela expropriada a obra que motivou a expropriação.

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O mesmo tribunal não deu como provados outros factos relevantes para a decisão da causa e/ou em contradição com os anteriores e, nomeadamente:
- que a parcela expropriada proporcionasse uma produção de milho no valor de 750 euros anuais.
- que sem os socalcos, o terreno apresentaria um declive acentuado sem qualquer aptidão para produção de culturas arvenses de regadio.

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2. 2. De direito

            A única questão a apreciar traduz-se em saber qual a justa indemnização a atribuir à parcela expropriada, para isso importando decidir as sub-questões colocadas no recurso, ou seja, saber se o “muro de suporte em pedra” constitui benfeitoria e se, no caso, indiscutível, de “solo para outros fins” (uso agrícola – hortícola) pode haver lugar a indemnização por perda de capacidade edificativa da parte sobrante (aliás, repartida em três).

            De acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 23.º do CE “a justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública (DUP), tendo em consideração as circunstâncias e condições existentes naquela data”.

            Por seu lado o n.º 3 do art.º 27.º do CE estipula que o valor do solo para outros fins, que não os aptos para a construção, e à falta de elementos para seguir-se avaliação com base nas aquisições unitárias ou nas avaliações fiscais, será calculado tendo em atenção os seus rendimentos efectivo ou possível no estado existente à data da DUP, a natureza do solo e do subsolo, a configuração do terreno e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstâncias objectivas susceptíveis de influir no respectivo cálculo.

            A propósito do cálculo do valor nas expropriações parciais dispõe ainda o n.º 2 do art.º 29.º que “quando a parte não expropriada ficar depreciada pela divisão do prédio ou desta resultarem outros prejuízos ou encargos, incluindo diminuição da área total edificável ou a construção de vedações idênticas às demolidas ou às subsistentes, especificam-se (…) os montantes da depreciação e dos prejuízos ou encargos, que acrescem ao valor da parte expropriada”.

            Relativamente a “espaços agrícolas I” em que pacificamente foi inserida a parcela expropriada, dispõe o art.º 36.º do Regulamento do PDM de Viseu[2] no seu n.º 1 que “os usos permitidos serão predominantemente o agrícola, sendo permitida a construção dos seguintes tipos de edificação, sem prejuízo do disposto no art.º 20.º e demais condicionalismos aplicáveis como sejam a REN (…):

            a) – Edificação do agricultor ou proprietário da parcela (…);

            b) – Instalações de apoio exclusivamente agrícola”.

            O n.º 2 faz depender o tipo de construção da alín. a) da área mínima da parcela igual ou superior a 7500 m2, não podendo o índice construtivo bruto exceder 450 m2 e o n.º 3, quanto às instalações de apoio agrícola, limita esse índice ao máximo de 500 m2.

            Por seu turno, a Portaria n.º 1356/2008, de 28.11, para os casos inseridos em REN limita esses índices a 250 m2 e 100 m2, respectivamente (Anexo I- I, alíns. a) ii) e b) vii).

            Embora a matéria de facto da sentença seja omissa quanto à inserção do “espaço agrícola I” da parcela também em REN (para aí apontando o extracto da planta junta a fls. 43, mas ainda assim insuficiente para oficiosamente se modificar a factualidade provada), porque os valores considerados na sentença recorrida como se de REN se tratasse são inferiores àqueloutros resultantes do cit. art.º 36.º do Regulamento do PDM, a eles nos ateremos.

            Ora bem.

            Quanto à 1.ª (sub-)questão, da consideração do “muro de suporte em pedra”, a pretexto de haver sido construído para permitir a exploração agrícola, uma vez que, conforme assim sustentado pelo laudo minoritário “sem, os socalcos o terreno apresentaria um declive acentuado, sem qualquer aptidão para produção de culturas arvenses de regadio”, carece a recorrente de razão, por duas ordens de razões.

            Em 1.º lugar, porque a sentença recorrida além do mais considerou não provado “que sem os socalcos o terreno apresentaria um declive acentuado sem qualquer aptidão para produção de culturas arvenses de regadio”.

            Prova que, como facto modificativo do direito dos expropriados, à recorrente incumbia (art.º 342.º, n.º 2, do CC).

            Depois, a benfeitoria em causa, avaliada em € 3.500,00 pelo laudo maioritário acolhido na sentença, refere-se a um “muro de vedação e de suporte com 100 m2”, o que é coisa diversa de se tratar de mero muro para socalco!

            Assumindo ambas as funções é como vedação que logra ser indemnizado.

            Quanto à 2.ª (sub-)questão, da desvalorização pela perda da capacidade edificativa da parcela” a sentença foi clara ao considerar que, não obstante o solo se encontrar servido por vias de aceso, rede de abastecimento de água, energia eléctrica, telefone, etc., não podia ser avaliado como apto para construção em virtude da sua inserção em espaço agrícola.

            Daí não fazer sentido a parte das alegações que reedita a questão da caracterização do solo e traz à colação o disposto no n.º 2 do art.º 25.º do CE.

            Claro é também (como igualmente sobressai da mesma sentença) que em função da área anterior do prédio dos expropriados era possível construir estruturas de apoio à agricultura, o que deixou de ser possível face à sua área sobrante.

            Trata-se, como vimos, de uma possibilidade que o próprio PDM prevê, o que nada tem que ver com a natureza não construtiva do solo, antes com ela se articulando.

            Como vinha do laudo pericial maioritário, a existência de infra-estruturas agrícolas são um factor de valorização do solo para lá da simples capacidade produtiva. “No mercado corrente de transacções não é comparável o preço de dois solos com iguais capacidades produtivas, estando um deles servido com várias infra-estruturas e o outro não”.

            E isso é indiscutível.

            Ora, não posta em causa nem a área, nem o valor do preço do m2, da perda da capacidade edificativa acolhida do relatório pericial maioritário pela sentença, há que manter o valor correspondente fixado em € 4.207,00.

            Com o que soçobram as conclusões recursivas.


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            3. Resumindo e concluindo

            I – Constitui benfeitoria, como tal indemnizável, a existência de um muro de vedação e suporte em parcela expropriada por utilidade pública;

            II – Não obstante a parcela se inserir em “espaço agrícola” e consequentemente o solo da parcela expropriada ter a natureza de para outros fins, nada impede que a perda da capacidade edificativa da parte sobrante, para habitação do respectivo agricultor e instalações de apoio agrícola, integre o cômputo da indemnização global da expropriação.


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            4. Decisão

            Face a todo o exposto, decide-se julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida.

            Custas da apelação pela recorrente.


(Francisco Caetano)



[1] Acórdão por nós relatado nesta Relação em 17.4.12 na Apelação n.º 92/07.1TBPNL.C2.
[2] Ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 173/95, in DR n.º 291, I-B, de 19.12.95.