Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1168/07.0PBVIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: LUIS RAMOS
Descritores: RECURSO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
DEPOIMENTO INDIRECTO
DEPOIMENTO DE AGENTE POLICIAL
ESCOLHA E MEDIDA DA PENA
Data do Acordão: 12/09/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE VISEU
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: 129º, 356º, 374º,º2, 410º 412º E 428º DO CPP E 40º,70º E 71º DO CP
Sumário: 1.A lei – artigo 412º, nº3 e 4 do CPP - impõe ao recorrente que nas conclusões da motivação especifique os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, as concretas provas que impõem decisão diversa (e as concretas provas a renovar) e que, tendo como referência o consignado na acta — quanto ao registo áudio ou vídeo das prova prestadas em audiência —indique concretamente as passagens em que se funda a impugnação.
2.Não tendo o recorrente, seja na motivação stricto sensu, seja nas conclusões, especificado, nos termos pormenorizados pelos n.ºs 3, alínea b), e 4, do art.º412ºdo CPP, as concretas provas que, no seu entendimento, impõem decisão diversa da recorrida, não há que proceder a convite para que o mesmo faça tal especificação nas conclusões.

3. A violação do princípio in dubio pro reo verifica-se quando, em sede de prova, perante uma dúvida objectiva e intransponível, o tribunal decidiu desfavoravelmente ao arguido; e não, quando, perante provas contraditórias, o tribunal decide pela tese mais desfavorável ao arguido por dar crédito (motivando) à prova contra ele produzida e não dar (motivando) à prova que lhe era favorável.

4.Limitando -se o recorrente a invocar a violação do princípio in dúbio pro reo sempre que a sua tese difere da do tribunal e não porque tenha detectado qualquer dúvida no espírito do julgador, não se mostra violado o princípio in dubio pro reo.

5.O que a lei proíbe (artigos 129º e 356º, nº7 do CPP) são os testemunhos que visam ultrapassar o silêncio do arguido, não os depoimentos de agentes de autoridade que relatam o conteúdo de diligências de investigação, nomeadamente a prática das providências cautelares a que se refere o art. 249º do CPP

6.A pena de multa não se mostra adequada e suficiente à realização das finalidades da punição, finalidades exclusivamente preventivas, no caso em que o agente é condenado por crime de detenção de arma proibida, sendo verdade que 10 meses antes havia sido condenado por infracção idêntica.

Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra

Por sentença proferida nos autos supra identificados, decidiu o tribunal condenar o arguido J, como autor de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artº 86.º, n.º 1, al. c), 3.º, n.º 3, da lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro na pena de um ano de prisão, suspensa na sua execução por igual período.

Inconformado com o decidido, o arguido interpôs recurso no qual apresentou as seguintes conclusões (transcrição):


B1: De uma leitura atenta da sentença recorrida, extrai-se que o M.mo Juiz a quo entendeu, grosso modo, dar como provada a matéria de facto dada como provada, com base no depoimento da testemunha M e dos agentes policiais A e D
B2: Ora, no que tange ao depoimento da testemunha MJ cabe referir que a mesma é hostil ao recorrente porquanto crê que foi alvo de uma suposta agressão, cujo autor/instigador teria sido o recorrente, e cuja causa será o presente processo - agressão esta objecto de pretenso, porquanto não há prova documental que corrobore tal afirmação, processo a correr no Tribunal Judicial da Comarca de Viseu.
B3: Sucede que vigora no nosso ordenamento jurídico o Princípio da Presunção de Inocência, consagrado no artigo 32º da C.R.P., pelo que até ao trânsito em julgado de uma decisão que confirme o que a testemunha referiu em sede de Audiência de
 Julgamento não poderia o M.mo Juiz a quo fazer menção dos mesmos, nomeadamente referir que as testemunhas, supostamente, foram alvo de pressões e destarte descredibilizar os seus depoimentos, credibilizando a testemunha M, única, no seu entender, que teve coragem de assumir a verdade.
B4: Mais a mais os depoimentos desta testemunha não são corroborados por qualquer outro meio de prova válido.
B5: Mais, as declarações dos agentes policiais A e D não podem ser valoradas porque se tratam de uma meio de prova proibido e, destarte, violadoras do disposto nos artigos 125.°, 126.° 356.º, n. ° 7, todos do C.P.P. e artigo 32. ° da C.R.P.
B6: Com efeito, as mesmas vieram, em sede de Julgamento referir que as testemunhas L e AJ lhes tinham dito, quando chegaram ao local, nomeadamente que o recorrente havia discutido e ameaçado com uma arma de fogo o primeiro e,
B7: O artigo 356.°, n. ° 7 veda a possibilidade de os órgãos de policia criminal virem, em sede de Audiência de Julgamento reproduzir o que quaisquer "pessoas" lhes tenham dito antes ou depois da abertura formal do inquérito, dentro ou fora do processo e independentemente do motivo de ausência da pessoa na Audiência.
B8: Padece, pois, a douta sentença recorrida de nulidade, porquanto valorou meios de prova proibidos, em clara violação dos artigos 125.°, 126.° 356.°, nº 7, todos do C.P.P. e artigo 32.° da C.R.P.
B9: Por conseguinte, deverá a decisoao recorrida ser revogada e substituida por outra que considere, nesta parte, nulos os depoimentos das testemunha A e D
B10: Mais a mais, o Douto Julgador, interpretou erradamente o artigo 356.°, n. ° 7 do C.P.P. ao valorar os depoimentos dos agentes policiais A (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com início às 15:47:10, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353) e D (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com inicio às 15:56:32, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353) na parte em que os mesmos reproduzem o que lhes foi dito pelas testemunhas L e AJ.
B11: Na verdade, entende o recorrente que tais depoimentos, na parte em que reproduzem o que as testemunhas lhes referiram quando chegaram ao local, não deveriam ter sido considerados e por isso estão feridos de nulidade, não podendo ser considerados para decidir da matéria de facto dada como provada.
B12: Estão, assim, violados os artigos 129.° e 356.°, nº 7, todos do C.P.P. E artigo 32.° da C.R.P., pelo que é nula a sentença nos termos do disposto no artigo 379.°, n. ° 1, alínea c) do C.P.P.
B13: Na vã tentativa de tornear a questão do artigo 356.°, nº 7 o M.mo Juiz a quo enveredou pela figura do depoimento indirecto para valorar as declarações dos agentes policiais.
B14: Apesar de não concordar com esta solução, porquanto o legislador, para as declarações prestadas pelos órgãos de polícia criminal, em sede de Julgamento, criou um artigo específico, sempre se dirá que, ainda assim, as declarações por aqueles prestadas são nulas.
815: Com efeito, se é certo que o M.mo Juiz a quo chamou a depor as testemunhas Ildirectas", L e AJ - como legalmente se lhe impunha, também o é que não valorou os seu depoimento.
B16: Ora, nesta sede, havendo contradição de depoimentos deve ser valorado aquele referente à testemunha “directa" - depoimento de uma testemunha que percepcionou directamente os factos - porquanto essa é que é a ratio da prova testemunhal. Cfr a este respeito Manzini in Il Trattato di Procedura Penal".
B17: Conclui-se, pois, que o depoimento indirecto tem caracter excepcional e visa sobretudo trazer a depor a juizo a testemunha que viu/ ouviu os factos pois o que interessa para a verdade material são os factos concretos e não o que se ouviu dizer.
B18: Ao considerar, em caso de contradição, os depoimentos das testemunhas Ilindirectas", in casu, aqueles prestados pelas testemunhas para dar como provada a matéria dada como provada, incorreu a sentença recorrida, em nulidade.
B19: Nesta confluência, foram violados os artigos 125.° e 129.°, ambos do C.P.P. e 32. ° da C.R.P.
B20: O recorrente pretende demonstrar o seu dissidio no que tange à matéria de facto dada como provada nos autos - por manifesta ausência de prova, contradição na prova testemunhal, erro na apreciação da prova ou não apreciação da prova - que, por não se encontrar individualizada lhe cumpre transcrever: "No dia 14 de Outubro de 2007, pelas 4h50m, no interior do estabelecimento denominado "Bar Clássico", sito na Rua João Mendes, em Viseu, o arguido dirigiu-se a L, porteiro desse estabelecimento, encetou com ele discussão de conteúdo não concretamente apurado e no decurso da qual lhe fez o anuncio do uso de uma arma de fogo contra a sua pessoa.
Tendo sido chamada ao local a PSP, o arguido, ao aperceber-se a sua presença, fugiu apressadamente em direcção às casas de banho, onde escondeu, na antecâmara daquelas e no interior de um cesto, a arma de fogo que trazia consigo.
Tal arma foi sujeita a exame pericial, tendo-se verificado tratar-se de de uma pistola, da classe B), da marca Sic Sauer, nº U479944, calibre 9 mm, com um carregador com a capacidade para 15 munições do mesmo calibre, no valor de 250,00. No seu interior, a pistola continha o carregador municiado com 13 munições de calibre 9 mm e, na câmara, mais uma munição do mesmo calibre.
O arguido não é titular de licença de uso e porte de arma e sabia que a pistola que tinha consigo era capaz de disparar munições com o projéctil de calibre 9 mm, que era capaz de provocar a morte de pessoas contra quem fosse usada e que não lhe era permitido detê-la.
O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. ".
B21: Contudo, por considerar que os meios probatórios submetidos à apreciação do Tribunal impunham assunção fáctica inelutavelmente diversa, o recorrente, em cumprimento do disposto no artigo 412º, n. o 3, al. c) do C.P.P., passa a transcrever a matéria de facto dada como provada que, no seu entender, reputa incorrectamente julgada: “(..) o arguido dirigiu-se a L, porteiro desse estabelecimento, encetou com ele discussão de conteúdo não concretamente apurado e no decurso da qual lhe fez o anuncio do uso de uma arma de fogo contra a sua pessoa.
Tendo sido chamada ao local a PSP, o arguido, ao aperceber-se a sua presença, fugiu apressadamente em direcção às casas de banho, onde escondeu, na antecâmara daquelas e no interior de um cesto, a arma de fogo que trazia consigo.
Tal arma foi sujeita a exame pericial, tendo-se verificado tratar-se de de uma pistola, da classe B), da marca Sic Sauer, n. o U479944, calibre 9 mm, com um carregador com a capacidade para 15 munições do mesmo calibre, no valor de 250,00. No seu interior, a pistola continha o carregador municiado com 13 munições de calibre 9 mm e, na câmara, mais uma munição do mesmo calibre.
(..) sabia que a pistola que tinha consigo era capaz de disparar munições com o projéctil de calibre 9 mm, que era capaz de provocar a morte de pessoas contra quem fosse usada e que não lhe era permitido detê-la.
O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. ".
B22: Relativamente a este concreto trecho – (…) o arguido dirigiu-se a L, porteiro desse estabelecimento, encetou com ele discussão de conteúdo não concretamente apurado e no decurso do qual lhe fez o anúncio de uma arma de fogo contra a sua pessoa” o Tribunal a quo entendeu dá-lo como provado com base nas declarações dos agentes policiais A (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com inicio às 15:47:10, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353) e D (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com inicio às 15:56:32, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353) que acorreram ao local após a suposta discussão e de fogo perpetrada pelo recorrente.
B23: Contudo, como já adrede expendido estas declarações dos agentes, porquanto se limitaram a reproduzir o que as testemunhas lhes disseram, são um meio de prova proibida nos termos do disposto nos artigos 125.°, 126. ° e 356.°, n. ° 7 do C.P.P. e artigo 32. ° da C.R.P., se tivermos em conta que se tratam de declarações proibidas,
B24: Ou, caso se rume pela figura do depoimento indirecto, nulas por violadoras do disposto nos artigos 125.° e 129.°, ambos do C.P.P. na medida em que havendo contradição de depoimentos, foram valorados os “lindirectos" em detrimento daqueles prestados pelas testemunhas “directas”
B25: E do depoimento da testemunha directa L - o qual deveria ter sido considerado atenta a disciplina do artigo 129º do C.P.P., - prestado na sessão de Julgamento do dia 29¬04-2010, às 16:18:37, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta de Julgamento, ficheiro 20100429161835_183816_65353 -,resulta que o mesmo nunca teve qualquer discussão com o recorrente nem por ele foi ameaçado de qualquer forma, inclusive com arma de fogo.
B26: Reinquirido (depoimento prestado em 12-05-2010, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta, com inicio às 16:11:10, ficheio n.º 20100512161108_183816_65353) veio confirmar que nunca foi ameçado com arma e muito menos discutiu com o recorrente.
B27: Logo deveria o tribunal a quo ter dado como não provado que “( ... ) o arguido dirigiu-se a L porteiro desse estabelecimento, encetou com ele discussão de conteúdo não concretamente apurado e no decurso da qual lhe fez o anuncio do uso de uma arma de fogo contra a sua pessoa"
B28: No mais, nenhuma das testemunhas, à excepção de M, referiu ter presenciado qualquer discussão e ameaça com arma de fogo ao porteiro - a testemunha L.
B29: Não obstante, nem das suas declarações se pode retirar a ilação de que o recorrente discutiu com o porteiro e o ameaçou com arma de fogo - depoimento prestado pela testemunha M, prestado em 12-05-2010, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta, com inicio às 15:21:23, ficheiro n.º 20100512152121_183816_65353.
B30: Afere-se, portanto, que, salvo o devido respeito, mal andou o Douto Julgador ao dar como provada a seguinte materialidade:"(. .. ) o arguido dirigiu-se a L, porteiro desse estabelecimento, encetou com ele discussão de conteúdo não concretamente apurado e no decurso da qual lhe fez o anuncio do uso de uma arma de fogo contra a sua pessoa", porquanto não há prova suficiente que permita desta forma concluir.
B31: Idêntica crítica merece o seguinte segmento da matéria de facto dada como provada: "Tendo sido chamada ao local a PSP, o arguido, ao aperceber-se a sua presença, fugiu apressadamente em direcção às casas de banho, onde escondeu, na antecâmara daquelas e no interior de um cesto, a arma de fogo que trazia consigo.
Tal arma foi sujeita a exame pericial, tendo-se verificado tratar-se de de uma pistola, da classe B), da marca Sic Sauer, nº U479944, calibre 9 mm, com um carregador com a capacidade para 15 munições do mesmo calibre, no valor de 250,00. No seu interior, a pistola continha o carregador municiado com 13 munições de calibre 9 mm e, na câmara, mais uma munição do mesmo calibre.
(..) sabia que a pistola que tinha consigo era capaz de disparar munições com o projéctil de calibre 9 mm, que era capaz de provocar a morte de pessoas contra quem fosse usada e que não lhe era permitido detê-la.
O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. ".
B32: Desta factualidade de pode extrair-se duas conclusões: O arguido, ao avistar a P.S.P. no local, fugiu, apressadamente, para a casa de banho, onde escondeu a arma que trazia consigo, arma esta com as características enunciadas nos autos ~ Porque o arguido trazia consigo uma arma - e consequentemente agia livre, voluntaria e conscientemente sabendo que legalmente essa conduta não lhe era permitida - carregada com 13 munições e uma na câmara, tinha conhecimento que esta era apta a provocar a morte de pessoas contra quem fosse usada”
B33: Ainda, nesta sede, não há material probatório suficiente que permita dar como provado tal factualidade.
B34: A este respeito veja-se o depoimento da testemunha L, prestado na sessão de Julgamento do dia 29-04¬2010, às 16:18:37, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta de Julgamento, ficheiro 20100429161835_183816_65353, donde resulta que só se terá apercebido da existência de uma arma de fogo aquando da sua apreensão.
B35: Igualmente se atente o depoimento da testemunha A, prestado na sessão de Julgamento do dia 29-04-2010, às 16:37:08 gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta de Julgamento, ficheiro 20100429163706_183816_65353, que refere apenas ter tido conhecimento da apreensão de uma arma de fogo no estabelecimento desconhecendo a quem pertencia.
B36: Nem do depoimento da testemunha M, depoimento prestado no dia 12-05-2010, gravado no sistema em uso no Tribunal, conforme resulta da respectiva acta, com começo às 15h21m23s, ficheiro nº 20100512152121_183816_65353, se pode concluir, sem dúvidas, que o recorrente detinha uma arma porquanto o local onde a testemunha estava era pouco iluminado.
B37: Mais uma vez se conclui que não há acervo probatório suficiente que permita concluir que o recorrente detinha uma arma de fogo e, por consequência que fugiu da P.S.P. para a sala de banho a fim de esconder a arma
B38: Contudo, caso assim não se entenda, sempre se dirá que não foi produzida prova suficiente que permita dar como provado que "o arguido, ao aperceber-se a sua presença [PSPj, fugiu apressadamente em direcção às casas de banho, onde escondeu, na antecâmara daquelas e no interior de um cesto, a arma de jogo que trazia consigo.
B39: Com efeito, a testemunha L, depoimento prestado na sessão de Julgamento do dia 29-04-2010, às 16:18:37, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta de Julgamento, ficheiro 20100429161835_183816_65353, é peremptoria ao afirmar que quando a P.S.P. Chegou ao local o recorrente não se poderia ter apercebido.
B40: Na verdade, entre a porta de entrada do estabelecimento e a sala do estabelecimento existe um hall com uma porta que se encontra sempre fechada e, estando o arguido dentro da sala ele não se poderia ter apercebido da chegada dos agentes policiais.
B41: A testemunha AJ, depoimento prestado na sessão de Julgamento do dia 29-04-2010, às 16:37:08 gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta de Julgamento, ficheiro 20100429163706_183816_65353, assevera que quando a P.SP. entrou no estabelecimento, o recorrente já se encontrava há "um bocado" na casa de banho.
B42: Ressumbra claro que tal factualidade - "o arguido, ao aperceber-se a sua presença [PSP], fugiu apressadamente em direcção às casas de banho, onde escondeu, na antecâmara daquelas e no interior de um cesto, a arma de fogo que trazia consigo. " - não se ancora em qualquer elemento probatório produzido em julgamento, sustentando-se, apenas, em ilações não corroboradas e extraidas das regras da experiência comum
B43: Pelo que, incorreu o Tribunal a quo em excesso de pronúncia, devendo a mesma ser dada como não provada.
B44: Não se ignora que vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio da livre apreciação da prova cuja disciplina se encerra no artigo 127º do C.P.P.
B45: Não obstante, tal "livre apreciação" não se pode consubstanciar numa apreciação discricionária e arbitrária destituída de qualquer fundamentação racional e plausível antes deve ter como pressupostos as regras da experiência comum e da lógica do homem médio.
B46: Mais a mais, à convicção e livre apreciação da prova associa-se inelutavelmente a obrigatoriedade da sua fundamentação com elementos objectivos que a tornem crível e livre de qualquer dúvida em obediência ao disposto no artigo 374º, nº 2 do C.P.P. e artigo 205º da C.R.P., o que não sucede na sentença recorrida.
B47: Ora, não se ignora que as regras da experiência poderão acrescentar algo às provas materiais contudo não pode o Julgador condenar ou absolver apenas com base nelas sob pena de não fazer sentido os inúmeros comandos de direito constitucional e legislado que obrigam à fundamentação dos actos.
B48: Realce-se, uma vez mais, o Tribunal a quo decidiu pela condenação do arguido ancorando-se, unícamente, na versão da testemunha hostil ao recorrente M, descurando o depoimento credível, coerente e lógico das testemunhas L, J e A, pelo que resultaram violados os artigos 127.° e 374.°, nº 2 do C.P.P. e valorando prova proibida, conforme já se aflorou supra.
B49: Deveria o Tribunal a quo, face à materialidade efectivamente provada, ter decidido pela absolvição do arguido.
B50: Não se discute, outrossim, a aplicação, no nosso ordenamento jurídico, do princípio do in dubio pro reo, corolário do principio da presunção de inocência do arguido consagrado no artigo 32.°, n. ° 2 da Lei Fundamental.
B51: É ainda pacificamente aceite que se verifica o mesmo "quando a conclusão retirada pelo tribunal em matéria de prova se materialize numa decisão contra o arguido que não seja suportada de forma suficiente, de modo a não deixar dúvidas irremovíveis quanto ao seu sentido, pela prova em que assenta a convicção." - vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Processo n. ° 11/04.7GCABT.C1.S1, in www.dgsi.pt.
B52: Ora, atendendo à insuficiência de prova produzida nos autos que permita concluir pela condenação do recorrente, o sentido da decisão recorrida deveria ter sido o da sua absolvição e, ao assim não suceder, violou a sentença recorrida o artigo 32.°, nº 2 da C.R.P..
Sem prescindir,
B53: Por fim, considera o recorrente que ao ter-lhe sido aplicada uma pena de prisão, ainda que suspensa na sua execução, violou a sentença recorrida o disposto nos artigos 40.° e 70.° do C.P., 1.° e 18.° da Constituição da República Portuguesa porquanto violadora dos princípios da adequação, proporcionalidade e necessidade.
B54: Com efeito, atendendo por um lado aos corolários da prevenção geral e especial, e, por outro lado aos princípios ora enunciados a pena de multa é a pena que mais se adequa ao caso dos autos.
B55: Resulta violado, outrossim, o artigo 40º do C.P. na medida em que a pena de prisão de um ano aplicada ao arguido ultrapassa a medida da sua culpa pelo que, ainda aqui pugna o recorrente pela aplicação de uma pena de multa, ou, sem prescindir a moldura deve centrar-se perto do seu mínimo legal.
Termos em que na procedência do presente Recurso deve a presente decisão ser revogada e substituida por outra que conheça das nulidades invocadas e o arguido absolvido do crime por que vem condenado, ou, sem prescindir, proceder-se à modificação da matéria de facto nos termos do disposto no art. 431º do C.P.P, considerando não provados os factos supra identificados com as demais consequências que se extraiem das conclusões supra expendidas ou, caso assim não se entenda o que apenas por mera cautela de raciocínio se concede, ser aplicada uma pena de multa ao recorrente, ou, sem prescindir, ser-lhe aplicada uma pena de prisão cujo limite se encontre mais perto do mínimo legal.

 

Respondeu defendendo a manutenção da decisão recorrida.

O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo.

Nesta instância o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se manifesta pela improcedência do recurso.

No âmbito do art.º 417.º, n.º 2 do Código Penal o nada disse.

Os autos tiveram os legais vistos após o que se realizou a conferência.

Cumpre conhecer do recurso

Constitui entendimento pacífico que é pelas conclusões das alegações dos recursos que se afere e delimita o objecto e o âmbito dos mesmos, excepto quanto àqueles casos que sejam de conhecimento oficioso.

É dentro de tal âmbito que o tribunal deve resolver as questões que lhe sejam submetidas a apreciação (excepto aquelas cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras).

Cumpre ainda referir que é também entendimento pacífico que o termo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.

Questões a decidir:

- Erro de julgamento

- Nulidades da sentença

- Violação do princípio “in dubio pro reo”

- Espécie e medida da pena

Na 1.ª instância foi dada como provada a seguinte factualidade (transcrição):
“No dia 14 de Outubro de 2007, pelas 4h50m, no interior do estabelecimento denominado “Bar Clássico”, sito na Rua João Mendes, em Viseu, o arguido dirigiu-se a L, porteiro desse estabelecimento, encetou com ele discussão de conteúdo não concretamente apurado e no decurso da qual lhe fez o anuncio do uso de uma arma de fogo contra a sua pessoa.
Tendo sido chamada ao local a PSP, o arguido, ao aperceber-se a sua presença, fugiu apressadamente em direcção às casas de banho, onde escondeu, na antecâmara daquelas e no interior de um cesto, a arma de fogo que trazia consigo.
Tal arma foi sujeita a exame pericial, tendo-se verificado tratar-se de de uma pistola, da classe B), da marca Sic Sauer, n.º U479944, calibre 9mm, com um carregador com a capacidade para 15 munições do mesmo calibre, no valor de 250,00€. No seu interior, a pistola continha o carregador municiado com 13 munições de calibre 9mm e, na câmara, mais uma munição do mesmo calibre.
O arguido não é titular de licença de uso e porte de arma e sabia que a pistola que tinha consigo era capaz de disparar munições com o projéctil de calibre 9 mm, que era capaz de provocar a morte de pessoas contra quem fosse usada e que não lhe era permitido detê-la.
O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.
Quanto ao passado criminal do arguido, provou-se que já foi condenado em 11-12-2006, pela prática, em 23-12-2002, de um crime de detenção ou tráfico de armas proibidas p.p. pelo art. 275.º, n.º 3, do Código Penal.”

Quanto à factualidade não provada, consignou-se (transcrição):
“Não se provam os demais factos constantes da acusação e não elencados na matéria de facto provada.”

O tribunal recorrido fundamentou a formação da sua convicção nos seguintes termos (transcrição):
“Assentou o julgador a sua convicção na análise crítica, conjugada e ponderada da prova, produzida (testemunhal) e examinada (documental) em julgamento, naquilo que de coerente e credível se revelou, ponderadas as regras legais da valoração dessa prova, as regras da lógica, da experiência e senso comum.
A prova testemunhal mereceu particular atenção em julgamento e merece agora reparo no que se refere às testemunhas de acusação L, AJ e JF, estas que se apresentaram a depor nitidamente comprometidas, comprometimento este que foi manifesto quer pela postura expressa em gestos e expressões insusceptíveis de tradução linguística, quer pelo discurso propriamente dito, este parco em palavras naquilo que não podia ser contornado, por objectivo ou demonstrável por outra via - v.g a ida ao local da PSP e a apreensão da arma - e encoberto por alegado esquecimento.
E o comprometimento foi tal que o MP, conhecedor do que haviam estas testemunhas declarado em inquérito, veio a requer a extracção de certidão para instauração de procedimento criminal. E, a final, veio a testemunha AJ quando reinquirido, a admitir ter sido abordado para não contar o que sabia em tribunal acerca do sucedido, como também o admitiu a testemunha M, este mais claro e peremptório do que aquele, dizendo-se sabedor de que todas as testemunhas de acusação, como ele próprio, haviam sido abordadas no mesmo sentido. E, nisto que disse, neste particular, mereceu credibilidade, quer porque não foi o único a admitir ter sido abordado, quer porque disse ter sido agredido recentemente por terceiros, facto que ligava ao julgamento nestes autos, agressão esta que a referida testemunha A declarou ter ouvido comentar, dando assim um fundo de verdade às motivações desta testemunha A para declarar o que declarou quanto às alegadas pressões.
E, já que estamos no âmbito da credibilidade, não se vê como apontar qualquer falta dela à testemunha A, ao contrário do que pugnou a defesa do arguido em alegações finais, posição que se entende somente pela necessidade de defesa da escolha - legítima - do arguido em nada dizer - nem para explicar o que esta testemunha pudesse ter contra si e que não se vislumbrou - e não o resultado da conjugação com a demais prova produzida, quando analisada - e no momento das alegações essa análise era possível - com objectividade e isenção, designadamente com os depoimentos dos elementos da PSP - a quem nada se pode apontar - e mesmo com os depoimentos das referidas testemunhas L e AJ, estes que apesar do comprometimento, sempre foram adiantando pequenos pormenores do que foi por si vivido que são em tudo coerentes e plenos de sentido com o afirmado pela testemunha A
Cumpre dizer também que o CPP não proíbe a valoração dos depoimentos indirectos nem tão pouco proíbe que as testemunhas relatem aquilo que lhes foi contado, sobretudo se perguntado se e como chegaram a determinada conclusão. Aliás, não haveria hipótese de sindicar a razão de ciência das testemunhas se não lhe fosse perguntado como chegaram ao conhecimento dos factos: seja por os presenciarem, seja por ouvirem dizer. E, isto nada contende com o direito do arguido ao silêncio e, tão pouco ao direito de não se auto-incriminar, pois que a fonte do que as testemunhas trouxeram a julgamento não foi algo que o arguido tivesse dito.
Por outro lado, naquilo em que se verificou ter o conhecimento resultado do depoimento de ouvir dizer, teve o julgador o cuidado de, novamente, chamar as pessoas a depor. Está-se a fazer referência, pois, aos depoimentos das testemunhas A e D, elementos da PSP. Efectivamente, o que estes relataram diz respeito ao que ouviram dizer no exercício das suas funções e porque chamados ao local da ocorrência dos factos, aliás, na sequência do que elaboraram o auto de notícia e concretizaram a própria detenção. Inclusivamente, não fossem essas diligências, que se impõem em todos os casos, e não poderiam proceder à aquisição da notícia do crime.
Portanto, o depoimento que estas testemunhas prestaram versou quer sobre factos de que tinham conhecimento directo, quer sobre as diligências que fizeram e informações que, ao abrigo do disposto no art. 249, n.º 2, al. d), do CPP, obtiveram: conhecimento indirecto.
Não se trata, como se defendeu no decurso da produção de prova - ao ponto de se questionar a instância que o Ministério Público fazia a estas testemunhas – e nas alegações finais, de ultrapassar as limitações decorrentes do art. 356.º n.º 7, do CPP, por via indirecta. Uma ligeireza desta espécie na interpretação da norma que resulta deste artigo, meramente formalista, equivale a arrasar por completo a utilidade e necessidade que, para a descoberta da verdade, têm os conhecimentos obtidos pelas forças de segurança ao abrigo do dever de obter informações das pessoas (as testemunhas que foram inquiridas) que facilitem a descoberta dos agentes do crime e a sua reconstituição. Aliás, o art. 356.º é claro em restringir a proibição às declarações que forem recebidas como tal, o que não é o caso nos autos relativamente a estes elementos da PSP. Não se pode esquecer é que a razão da proibição da nos termos assinalados no art. 356.º n.º 7, do CPP emerge da necessidade de assegurar o princípio da imediação e não de qualquer proibição de prova, o que significa que o que se pretende assegurar é a possibilidade de, em julgamento, a prova ser exposta e contraditada – o que não sucede com a tomada de declarações em inquérito - exposição e contraditório que se asseguram pelo mecanismo do art. 129.º, citado, relativamente ao testemunho de ouvir dizer, permitindo a instância e o contra-interrogatório da testemunha que ouviu dizer e da própria testemunha que foi a fonte da informação. Estando isto assegurado, como se assegurou em julgamento, está cumprida a finalidade da norma.
Isto pressuposto, o auto de notícia, a que se reportaram os elementos da PSP inquiridos, permitiu a concreta individualização do dia e lugar da apreensão da arma, o que confrontado com o depoimento das demais testemunhas, e porque todas foram unânimes nesse ponto, permitiu também a afirmação do lugar onde os factos ocorreram.
Depois, apesar do já referido comprometimento, do depoimento da testemunha L aproveitou-se o facto, declarado, de que efectivamente trabalhava como porteiro e que o arguido, na noite dos factos esteve no local. Nada mais do que disse mereceu credibilidade, nomeadamente de que não tinha sido ameaçado nos termos provados. Isto porque, efectivamente, não só o declarou aos elementos da PSP, e estes afirmaram-no, como a testemunha M precisou com conhecimento directo que, à entrada do bar houve, efectivamente, uma discussão entre o arguido, outro indivíduo de etnia cigana e o porteiro, L, discussão essa cujo conteúdo concreto, por não ouvir exactamente as palavras ditas, não pôde precisar. É claro que, isto sendo coerente entre si, e constatado que foi o comprometimento desta testemunha, a resposta que deu, negando ter sido ameaçado não mereceu qualquer credibilidade. Daí que se valorassem os depoimentos de ouvir dizer e não as suas declarações. Aliás, L foi capaz de, sem credibilidade, pormenorizar que o arguido entrou com outra pessoa no bar e logo se sentou, quando, manifestamente, pelo depoimento da testemunha M resulta claro que assim não foi, antes tendo ocorrido a referida discussão.
Do depoimento da testemunha A, considerando o já referido comprometimento e apesar de ter acabado por admitir, quando novamente inquirido, ter sido abordado para não contar o que sabia em tribunal acerca do sucedido, aproveitou-se somente a declaração que fez de que sabia que a arma tinha sido encontrada na antecâmara na casa de banho, dentro de um recipiente, este que não soube precisar em concreto, mas que acabou por resultar identificado da conjugação dos depoimentos das testemunhas M, que precisou o sítio onde a arma foi escondida ao elemento da PSP D, este que o identificou, tal qual se provou.
Já do depoimento da testemunha M resultou a dinâmica da acção provada, em conjugação com o depoimento dos elementos da PSP, isto porquanto esta testemunha precisou, com conhecimento presencial dos factos, como ocorreu uma discussão à entrada do bar, entre o arguido e o porteiro, como se deixou já dito, como depois daquela viu o arguido a correr, com uma arma na mão, que viu esconder no sítio que acabou por indicar à PSP, esta que apareceu logo após esse acto do arguido - correr a esconder a arma -  tendo depois aí sido efectivamente encontrada a pistola que foi apreendida. Naquilo que disse não mostrou a menor duvida e, mereceu inteira credibilidade.
E, por ser assim, lógica e evidentemente que o comportamento do arguido só se compreende por se ter apercebido da chegada da GNR e porque sabia que tinha na sua posse uma arma que não podia ter. Se nenhuma discussão tivesse havido, se nada tivesse sucedido, para quê esta atitude!?
Claramente, desta conjugação dinâmica, relatada, resulta evidente a conclusão de que, tendo sido encontrada uma arma, a única, num sítio onde o arguido a colocou, naturalmente que só pode ser aquela que este tinha na sua posse e que, como se veio a apurar do depoimento dos elementos da PSP, foi aquela com que, no decurso da discussão veio a fazer o anuncio do seu uso através contra a pessoa do porteiro.
E, efectivamente, A, elemento da PSP, precisou como aquela foi chamada ao local em virtude de desacatos entre o arguido e o porteiro, a testemunha L, e, como aí chegados, o referido porteiro lhe transmitiu que havia sido ameaçado com uma arma de fogo pelo arguido nos termos provados.
O mesmo disse e explicou a testemunha D, também ele agente da PSP, que além de reiterar o que o seu colega e companheiro desse dia afirmou, acrescentou que para além do porteiro, também o responsável pelo bar, a testemunha A, identificaram o arguido como sendo o autor da ameaça e detentor da arma.
As concretas características da arma e o que a mesma continha, resultou do auto de apreensão de fls. 4 e 10.
A falta de licença resulta dos documentos de fls. 66 e 71.
Isto considerado, a dinâmica da acção quando conjugada com as regras da lógica e senso comum, deixa claro o comportamento livre e voluntarioso e a intenção provada do arguido ao agir como agiu, intenção essa que não poderia ser outra senão aquela provada, sendo certo que, atenta a natureza da arma, não ignorava quer as suas características quer o o seu carácter letal.
O conhecimento ilicitude penal, essa é do comum conhecimento das pessoas, atenta a carga valorativa que o bem jurídico transporta, e do próprio arguido que, com o seu comportamento o revela, caso contrário não teria tentado esconder a arma.
Os antecedentes criminais do arguido resultaram do CRC de fls. 133 e 134.
Tendo sido esta a prova produzida, que permitiu a afirmação da factualidade nos termos provados, nenhuma outra se pôde produzir que permitisse a afirmação dos factos não provados. Daí que tenha sido considerados enquanto tal.”


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Conforme resulta das conclusões, a recorrente considera que da audiência de julgamento resultou uma factualidade diversa da que foi dada como provada e que essa factualidade levaria a que tivesse sido absolvido..

Acontece porém, que tal discordância tem que ser manifestada segundo determinados parâmetros e estes não foram seguidos.

Vejamos:

A impugnação da matéria de facto impõe o cumprimento do formalismo consignado no Código de Processo Penal e este formalismo mostra-se ausente, não só nas conclusões, mas também nas motivações”stricto sensu”.

Com efeito, atento o disposto nos art.ºs 410.º, n.º 2, 428.º e 431.º, a reapreciação da matéria de facto pelo Tribunal da Relação apenas pode ser abordada por duas formas:

1) Através da aferição de vícios que decorram do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência[[1]] (sem apoio de quaisquer outros elementos externos, ainda que constantes do processo), e

2) Através da reavaliação da prova produzida[[2]].

Assim:

Embora o art.º 428.º nos diga que ”as relações conhecem de facto e de direito”, exceptuando os casos abrangidos pelo n.º 2 do art.º 410.º, a modificabilidade da decisão de facto da l.ª instância só pode ter lugar quando se verifiquem os requisitos estabelecidos no art.º 431.º do mesmo diploma e que são:

a) se do processo constarem todos os elementos de prova que lhe serviram de base,

b) se a prova tiver sido impugnada, nos termos do art.º 412.º n.º 3 ou

c) se tiver havido renovação da prova.

Por sua vez, o referido n.º 3 do art.º 412.º impõe ao recorrente que impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o dever de especificar:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;

c) As provas que devem ser renovadas

Dispõe, ainda o n.º 4 que ”quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 364º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação”.

Temos assim que a decisão do tribunal recorrido sobre a matéria de facto é susceptível de modificação se tiver sido impugnada nos termos do art.º 412.º nº 3 e 4[[3]].

Ora, os passos a seguir quanto à prova gravada estão claramente descritos na norma e são de fácil apreensão.

Contudo, não raramente, os recorrentes atropelam tais comandos e vêem defraudadas as suas expectativas.

Com efeito, como é jurisprudência uniforme[[4]], a apreciação do recurso da matéria de facto não constituiu um novo julgamento do objecto do processo mas, apenas e tão só, um remédio jurídico que visa despistar e corrigir os erros in judicando ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente[[5]].

Por isso, as alterações introduzidas no Código de Processo Penal pela Lei 48/2007, de 29 de Agosto vieram clarificar determinados pontos da lei anterior que foram alvo de interpretações discrepantes.
É agora a lei muito mais clara ao impor ao recorrente que nas conclusões especifique os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (e as concretas provas a renovar) e que, tendo como referência o consignado na acta — quanto ao registo áudio ou vídeo das prova prestadas em audiência —, indique concretamente as passagens[[6]][[7]] em que se funda a impugnação pois são essas que devem ser ouvidas ou visualizadas pelo tribunal, sem prejuízo de outras relevantes (nºs 4 e 6 do art.º 412º[[8]][[9]].

Ora, como diz Paulo Pinto de Albuquerque em”Comentário do Código de Processo Penal”, pág. 1135, a «especificação dos”concretos pontos de facto" só se satisfaz com a indicação do facto individualizado que consta da sentença recorrida e que se considera incorrectamente julgado» e a «especificação das”concretas provas" só se satisfaz com a indicação do conteúdo específico do meio de prova ou de obtenção de prova que impõe decisão diversa da recorrida».

Aliás, como já se entendera no AcSTJ de 9 de Março de 2006[[10]], onde se pode ler que”se o recorrente se dirige à Relação limitando-se a indicar alguma prova, com referência a suportes técnicos, mas na totalidade desses depoimentos e não qualquer segmento dos mesmos, não indica as provas que impõem uma decisão diversa quanto à questão de facto, pois o recurso de facto para a Relação não é um novo julgamento em que a 2.ª Instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1.ª Instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes é um remédio jurídico destinados a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros.

Acresce que ao determinar o n.º 6, do art.º 412º que”no caso previsto no n.º 4, o tribunal procede à audição ou visualização das passagens indicadas (…)”, se terá que concluir que as concretas provas terão de corresponder a segmentos das declarações ou do depoimento e não a toda a extensão dos mesmos e ainda que são esses segmentos que terão que ser ouvidos ou visualizados pelo tribunal “ad quem” (sem prejuízo de o tribunal, por sua iniciativa, ouvir ou visualizar outras passagens que considere relevantes).

Aliás, é esta a interpretação que a nosso ver corresponde à mens legislatoris, tal como resulta da proposta de Lei nº 109/X, onde consta que «no âmbito da motivação, para pôr cobro a uma das principais causas da morosidade na tramitação do recurso, elimina-se a exigência de transcrição da audiência de julgamento. O recorrente pode referir as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida indicando as passagens das gravações; não é obrigado a proceder à respectiva transcrição (artigo 412.º). O tribunal ad quem procede à audição ou visualização das passagens indicadas e de outras que, porventura, considere relevantes».

No caso”sub judice”, como resulta evidente das conclusões, o recorrente não impugnou a decisão nos termos acima referidos, ou seja, não especificou, nos termos dos n.ºs 3, alínea b. e 4, as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida.

Com efeito, indica assim as “provas concretas”(sequência nas conclusões):
“(…) depoimentos dos agentes policiais A (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com início às 15:47:10, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353) e D (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com inicio às 15:56:32, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353)”
“(…) declarações dos agentes policiais A (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com inicio às 15:47:10, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353) e D (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com inicio às 15:56:32, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353)”
“(…) depoimento da testemunha directa L - o qual deveria ter sido considerado atenta a disciplina do artigo 129º do C.P.P., - prestado na sessão de Julgamento do dia 29¬04-2010, às 16:18:37, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta de Julgamento, ficheiro 20100429161835_183816_65353” … “Reinquirido (depoimento prestado em 12-05-2010, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta, com inicio às 16:11:10, ficheio n.º 20100512161108_183816_65353)”
“(…) depoimento prestado pela testemunha, prestado em 12-05-2010, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta, com inicio às 15:21:23, ficheiro n.º 20100512152121_183816_65353
“(…) depoimento da testemunha L, prestado na sessão de Julgamento do dia 29-04¬2010, às 16:18:37, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta de Julgamento, ficheiro 20100429161835_183816_65353
“(…) testemunha A, prestado na sessão de Julgamento do dia 29-04-2010, às 16:37:08 gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta de Julgamento, ficheiro 20100429163706_183816_65353
“(…) testemunha M depoimento prestado no dia 12-05-2010, gravado no sistema em uso no Tribunal, conforme resulta da respectiva acta, com começo às 15h21m23s, ficheiro nº 20100512152121_183816_65353
L, depoimento prestado na sessão de Julgamento do dia 29-04-2010, às 16:18:37, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta de Julgamento, ficheiro 20100429161835_183816_65353
“(…) testemunha A, depoimento prestado na sessão de Julgamento do dia 29-04-2010, às 16:37:08 gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da respectiva Acta de Julgamento, ficheiro 20100429163706_183816_65353

Em relação às testemunhas D e J nem sequer faz esta indicação.

Ora, basta a simples confrontação entre o consignado nas conclusões e o CD onde estão gravados os depoimentos das testemunhas para concluir que o recorrente não nos remete para os segmentos que correspondem às concretas provas, mas sim para o depoimento integral de cada uma, o que equivale a dizer que, atento o recurso na sua globalidade, o recorrente remete para a totalidade da prova produzida em audiência de julgamento..

Por isso, é evidente o incumprimento dos n.ºs 3, alínea b. e 4, do art.º 412º.

Contudo, até por força do disposto no n.º 4, do art.º 417º[[11]], não é caso para convidar a recorrente a reformular as conclusões uma vez que, constituindo o texto da motivação (stricto sensu) limite absoluto que não pode ser extravasado nas conclusões[[12]]e sendo estas, logicamente, um resumo dos fundamentos porque se pede o provimento do recurso[[13]], há que concluir que o que não constar das motivações stricto sensu, não pode constar das conclusões.

Aliás, como bem historia e explica o AcSTJ de 5 de Junho de 2008[[14]].

Ora, examinando a motivação stricto sensu verifica-se que na mesma também não consta a exigência legal acima referida, ou seja, a recorrente não especifica nos termos pormenorizados pelo n.ºs 3, alínea b. e 4, do art.º 412º, as concretas provas que, no seu entendimento, impõem decisão diversa da recorrida.

Temos assim que, embora pretenda recorrer da matéria de facto, a recorrente não fez constar das conclusões os requisitos determinados por lei e que tais requisitos também não constam das motivações”stricto sensu”, o que equivale a dizer nunca poderiam aquelas cumprir tais exigências legais porque, como se disse, constituindo o texto da motivação (stricto sensu) limite absoluto que não pode ser extravasado nas conclusões, visto serem estas o resumo dos fundamentos porque se pede o provimento do recurso, o que não constar das primeiras, não pode constar das segundas.

Assim sendo, não haveria que dar cumprimento ao disposto ao n.º 3 do art.º 417º do Código de Processo Penal.

Atento o que ficou exposto, conclui-se que esta Relação não pode apreciar a matéria de facto com base no teor dos depoimentos prestados em audiência.  

No entanto, ainda que o recorrente tivesse cumprido escrupulosamente a lei, a sua pretensão sempre estaria destinada ao malogro.

Explicando:

Da leitura da sentença e das motivações de recurso ressalta que o recorrente faz o seu próprio julgamento e olvida que a entidade competente para o mesmo é o tribunal, ou seja, em vez de indicar os erros do tribunal e apontar a respectiva solução, o recorrente contorna a questão saltando por cima de trechos da sentença que abalam toda a sua construção.

Com efeito, diz-se nesta em sede de fundamentação:
“A prova testemunhal mereceu particular atenção em julgamento e merece agora reparo no que se refere às testemunhas de acusação L, A e JF, estas que se apresentaram a depor nitidamente comprometidas, comprometimento este que foi manifesto quer pela postura expressa em gestos e expressões insusceptíveis de tradução linguística, quer pelo discurso propriamente dito, este parco em palavras naquilo que não podia ser contornado, por objectivo ou demonstrável por outra via - v.g a ida ao local da PSP e a apreensão da arma - e encoberto por alegado esquecimento.
(…)
E, a final, veio a testemunha A, quando reinquirido, a admitir ter sido abordado para não contar o que sabia em tribunal acerca do sucedido, como também o admitiu a testemunha M, este mais claro e peremptório do que aquele, dizendo-se sabedor de que todas as testemunhas de acusação, como ele próprio, haviam sido abordadas no mesmo sentido. E, nisto que disse, neste particular, mereceu credibilidade, quer porque não foi o único a admitir ter sido abordado, quer porque disse ter sido agredido recentemente por terceiros, facto que ligava ao julgamento nestes autos, agressão esta que a referida testemunha A declarou ter ouvido comentar, dando assim um fundo de verdade às motivações desta testemunha A para declarar o que declarou quanto às alegadas pressões.
E, já que estamos no âmbito da credibilidade, não se vê como apontar qualquer falta dela à testemunha A, ao contrário do que pugnou a defesa do arguido em alegações finais, posição que se entende somente pela necessidade de defesa da escolha - legítima - do arguido em nada dizer - nem para explicar o que esta testemunha pudesse ter contra si e que não se vislumbrou - e não o resultado da conjugação com a demais prova produzida, quando analisada - e no momento das alegações essa análise era possível - com objectividade e isenção, designadamente com os depoimentos dos elementos da PSP - a quem nada se pode apontar - e mesmo com os depoimentos das referidas testemunhas L e A, estes que apesar do comprometimento, sempre foram adiantando pequenos pormenores do que foi por si vivido que são em tudo coerentes e plenos de sentido com o afirmado pela testemunha A”

Como se vê, o tribunal explica de forma coerente as razões por que atribuiu ou não credibilidade ao depoimento das testemunhas M, L, A e J: as três últimos apresentaram-se “a depor nitidamente comprometidas, comprometimento este que foi manifesto quer pela postura expressa em gestos e expressões insusceptíveis de tradução linguística, quer pelo discurso propriamente dito, este parco em palavras naquilo que não podia ser contornado, por objectivo ou demonstrável por outra via - v.g a ida ao local da PSP e a apreensão da arma - e encoberto por alegado esquecimento”, tendo até o segundo, quando posteriormente reinquirido, admitido “ter sido abordado para não contar o que sabia em tribunal acerca do sucedido”, enquanto que a primeira se disse sabedora “de que todas as testemunhas de acusação, como ele próprio, haviam sido abordadas no mesmo sentido”, ou seja, que não contassem em tribunal o que sabia.

No entanto, o recorrente omite qualquer crítica a esta fundamentação e limita-se a afirmar que M é uma testemunha “hostil” e que por isso o seu depoimento não devia ter sido valorado.

Ora, como se pode verificar, o tribunal, ao contrário do que resulta das motivações de recurso, valorou o depoimento em conjugação com outros elementos, tais como a “retractação” da testemunha A o “comprometimento” manifestado pelas testemunhas L e JF durante a inquirição e ainda “pequenos pormenores” que os mesmos sempre foram adiantando, para além de que se mostraram parcos em palavras no que “não podia ser contornado, por objectivo ou demonstrável por outra via - v.g a ida ao local da PSP e a apreensão da arma - e encoberto por alegado esquecimento.”

Como se vê, o recorrente, argumenta como se o julgamento não fosse constituído por um todo, contorna a fundamentação e lança-se num apreciação muito pessoal que não encontra âncora na sentença.

Por isso, não faz qualquer sentido a afirmação de que “(…) os depoimentos desta testemunha [M] não são corroborados por qualquer outro meio de prova válido

Pode-se dizer, em suma, que o recorrente se limita a apresentar a testemunha M como “hostil” e a partir daí, esquecendo-se que ainda que assim fosse, não seria caso para, à partida, o desvalorizar totalmente o seu depoimento (apenas seria necessária uma maior exigência na sua apreciação), faz o seu próprio julgamento, atribuindo exclusiva credibilidade aos depoimentos que, de maneira fundada e compreensível, o tribunal considerou incredíveis.

Entende também o recorrente que “as declarações dos agentes policiais A e D não podem ser valoradas porque se tratam de uma meio de prova proibido e, destarte, violadoras do disposto nos artigos 125.°, 126.° 356.º, n. ° 7, todos do C.P.P. e artigo 32. ° da C.R.P.”.

Mais uma vez não lhe assiste qualquer razão uma vez que o afirmado não tem fundamento legal.

Com efeito, diz que “as declarações dos agentes policiais A e D não podem ser valoradas porque se tratam de uma meio de prova proibido e, destarte, violadoras do disposto nos artigos 125.°, 126.° 356.º, n. ° 7, todos do C.P.P. e artigo 32. ° da C.R.P.”, uma vez que “as mesmas vieram, em sede de Julgamento referir que as testemunhas L e A lhes tinham dito, quando chegaram ao local, nomeadamente que o recorrente havia discutido e ameaçado com uma arma de fogo o primeiro”, pois que “o artigo 356.°, n. ° 7 veda a possibilidade de os órgãos de policia criminal virem, em sede de Audiência de Julgamento reproduzir o que quaisquer "pessoas" lhes tenham dito antes ou depois da abertura formal do inquérito, dentro ou fora do processo e independentemente do motivo de ausência da pessoa na Audiência.”

Note-se que o recorrente faz estas afirmações olvidando que as referidas testemunhas relataram o que viram e ouviram quando foram chamados a intervir, ou seja, numa fase em que estava apenas em causa a avaliação de uma situação que a autoridade policial acabara de ter notícia e por isso, numa fase prévia à instauração do inquérito em que se impunha a aquisição de informação sobre as razões que levaram a que fosse solicitada a intervenção das autoridades policiais.

Ora, como é explicado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Fevereiro de 2007[[15]], uma vez que, como no caso “sub judice”, «se está no plano da recolha de indícios de uma infracção de que a autoridade policial acaba de ter notícia, compete então às autoridades, nos termos do art. 249º do CPP, praticar “os actos necessários e urgentes para assegurar os meios de prova”, entre os quais, “colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime”. Estas “providências cautelares” são fundamentais para investigar a infracção, para que essa investigação tenha sucesso. E daí que a autoridade policial devam praticá-las mesmo antes de receberem ordem da autoridade judiciária para investigar (art. 249º, nº 1).

Nessa fase não há ainda inquérito instaurado, não há ainda arguidos constituídos. É uma fase de pura recolha informal de indícios, que não é dirigida contra ninguém em concreto. As informações que então forem recolhidas pelas autoridades policiais são necessariamente informais, dada a inexistência de inquérito. Ainda que provenham de eventual suspeito, essas informações não são declarações em sentido processual, precisamente porque não há ainda processo (pode até não vir a haver, como por exemplo se o crime for semi-público e não for apresentada queixa).

Completamente diferente é o que se passa com as ditas “conversas informais” ocorridas já durante o inquérito, quando há arguido constituído, e se pretende “suprir” o seu silêncio, mantido em auto de declarações, por depoimentos de agentes policiais testemunhando a “confissão” informal ou qualquer outro tipo de declaração prestada pelo arguido à margem dos formalismos impostos pela lei processual para os actos a realizar no inquérito.

O que o art. 129º do CPP proíbe são estes testemunhos que visam suprir o silêncio do arguido, não os depoimentos de agentes de autoridade que relatam o conteúdo de diligências de investigação, nomeadamente a prática das providências cautelares a que se refere o art. 249º do CPP.»[[16]]

De qualquer maneira, ainda que assim não fosse entendido, sempre se dirá que foi dado cumprimento ao artº 129º do Código de Processo Penal e que o tribunal, fazendo uso do princípio da livre apreciação da prova, decidiu em conformidade.

Aliás, não tem qualquer fundamento jurídico a alegação de em sede de cumprimento do artº 129º do Código de Processo Penal, “havendo contradição de depoimentos deve ser valorado aquele referente à testemunha directa”.

Nenhuma norma o impõe e por isso aplica-se o princípio consignado no artº 127º.

Resumindo:

Dado o incumprimento do disposto nos nºs 3, alínea b. e 4, do artº 412º, não podia esta Relação apreciar a matéria de facto com base no teor dos depoimentos prestados em audiência mas, para além disso, o recurso sempre soçobraria neste ponto uma vez o recorrente não põe em causa a correcção do raciocínio do tribunal perante a prova produzida e tida em consideração — omite até qualquer referência ao mesmo — e limita-se a invocar nulidades que não existem para que determinados depoimentos não fizessem parte do acervo probatório e assim só fossem válidos os que apoiam a sua tese.

Assim sendo e uma vez que não vislumbramos qualquer dos vícios previstos no artº 410º, considera-se definitivamente fixada a matéria de facto.

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Uma breve referência ao princípio “in dubio pro reo”, abundantemente invocado pelo recorrente.

Como se diz no Acórdão da Relação de Lisboa de 22 de Setembro nde 2009[[17]], “nos nossos tribunais são frequentes as ambiguidades e as contradições entre depoimentos prestados em audiência mas a sua verificação não determina, sem mais, o funcionamento do princípio. Este só deve ser actuado quando, produzidas as provas — congruentes ou não — o julgador — e apenas este — no esforço desenvolvido para alcançar a verdade material de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, fica na dúvida, objectiva e intransponível, sobre a verificação, ou não, de determinado facto ou complexo factual.

Se a dúvida não existe no espírito do julgador, não há que apelar ao princípio.”

Ora, da leitura da sentença não decorre que tenha ficado instalada no espírito do Meritíssimo Juiz a mais pequena incerteza quanto a qualquer dos factos que deu como provados.

O próprio recorrente não a aponta e invoca a violação do princípio sempre que apresenta uma tese, que necessariamente lhe é favorável.

Ora, a violação do princípio “in dubio pro reo” acontece, quando, em sede de prova, perante uma dúvida objectiva e intransponível, o tribunal decidiu desfavoravelmente ao arguido e não, quando, perante provas contraditórias, o tribunal opta pela tese mais desfavorável ao arguido por considerar que a mesma corresponde à verdade material.

Uma vez que, como se disse, o recorrente se limita a invocar a violação do referido princípio sempre que a sua tese difere da do tribunal e não porque tenha detectado qualquer dúvida no espírito do julgador, teremos que concluir que não se mostra violado o princípio in dubio pro reo.

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Na sequência da pretendida alteração da matéria de facto, pedia o arguido a sua absolvição.

Ora, não tendo havido qualquer alteração da mesma e não tendo sido posta em causa a integração jurídica efectuada pelo tribunal perante o acervo factual apurado, está prejudicada a apreciação do recurso neste ponto (que, aliás, não nos merece qualquer reparo).

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Quanto à pena e sua medida, insurge-se também o recorrente.

Mais uma vez sem razão.

Refira-se desde já que o recorrente não nos dá a sua visão quanto ao erro do tribunal ao não ter optado pela pretendida pena de multa, limitando-se a invocar a violação dos artºs 40º e 70º do Código Penal porque a pena de multa, “de per si, já realiza as finalidades preventivas das penas”.

Ficamos assim sem saber qual o fundamento da discordância.

No entanto, sempre diremos o seguinte:

Diz-nos o art.º 70.º do Código Penal que “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição” e que são, segundo o n.º 1 do art.º 40.º do mesmo diploma “a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”.

Temos assim que a escolha da pena depende de critérios de prevenção geral e especial (v.g. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 17 de Janeiro de 1996, CJ, ano XXI, tomo 1, pág. 38) pelo que o julgador, perante um caso concreto, tem que os valorar para depois optar por aplicar uma pena detentiva ou não detentiva.

Como bem explica o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Janeiro de 2001 (processo n.º 3404/00-5ª) “subjaz à norma constante no art.º 70.º, do CP, toda a filosofia informadora do sistema punitivo vertido no Código Penal vigente, ou seja, a de que embora se aceitando a existência da prisão (ou pena corporal) como pena principal para os casos em que a gravidade dos ilícitos, ou de certas formas de vida, a impõem ou justificam, a recorrência deverá ter lugar quando, face ao circunstancialismo que se perfile, se não apresentem adequadas, suficientes ou convenientes, as sanções não detentivas, às quais não é de recusar elevada capacidade (ou potencialidade) ressocializadora. Tudo isto se insere no desiderato de se evitarem as curtas penas de prisão (ou a eventualidade da efectivação dessas penas) donde que, por regra, a alternativa por pena de multa se autorize nos casos em que aos ilícitos caiba pena prisional não demasiado elevada”.

Elucida ainda a este respeito o Professor Jorge de Figueiredo Dias in Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, §§ 497 e 498 que “o tribunal deve preferir à pena privativa de liberdade uma pena alternativa ou de substituição sempre que, verificados os respectivos pressupostos de aplicação, a pena alternativa ou a de substituição se revelem adequadas e suficientes à realização das finalidades da punição, o que vale logo por dizer que são finalidades exclusivamente preventivas, de prevenção especial e de prevenção geral, não finalidades de compensação da culpa, que justificam (e impõem) a preferência por uma pena alternativa ou por uma pena de substituição e a sua efectiva aplicação. Bem se compreende que assim seja: sendo a função exercida pela culpa, em todo o processo de determinação da pena, a de limite inultrapassável do quantum daquela, ela nada tem a ver com a questão da escolha da espécie de pena. Por outras palavras: a função da culpa exerce-se no momento da determinação quer da medida da pena de prisão (necessária como pressuposto da substituição), quer da medida da pena alternativa ou de substituição; ela é eminentemente estranha, porém, às razões históricas e político-criminais que justificam as penas alternativas e de substituição, não tendo sido em nome de considerações de culpa, ou por força delas, que tais penas se constituíram e existem no ordenamento jurídico.”

Explica ainda aquele Ilustre Professor que “o tribunal só deve negar a aplicação de uma pena alternativa ou de uma pena de substituição quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente do que aquelas penas” (§ 500) e que leve surgir aqui unicamente sob a forma do conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico, como limite à actuação das exigências de prevenção especial de socialização. Quer dizer: desde que impostas ou aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias”.

Vejamos o caso concreto

Diz-se na sentença sob recurso:
“Regressando aos autos, o crime em causa têm elevadíssimas necessidades de prevenção geral, ao ponto de o legislador ter visto necessidade de agravar a punição, sendo ademais conhecidas e noticiadas, desde há uns anos a esta parte, e já à data da prática dos factos, as vezes em que crimes violentos são praticados com armas de fogo.
As expectativas comunitárias de reafirmação do bem jurídico tutelado e violado – a convivência pacífica e o perigo decorrente da utilização da arma – são proporcionalmente elevadíssimas.
Por sua vez o arguido, tem antecedentes criminais por factos da mesma natureza, tendo sido os presentes praticados muito pouco tempo depois da sentença pela qual havia sido condenado: a sentença data de 11-12-2006 e logo em 14-10-2007 o arguido tem na sua posse uma arma de fogo sem licença para tanto, praticando o crime agora em julgamento.
A singeleza desta realidade, sem nada que a favor do arguido possa ser considerado apontando em sentido contrário, demonstra elevadas necessidades de prevenção especial que, de todo, se assegurariam com a pena de multa.
A condenação do arguido será, por isso, em pena de prisão”

Temos que concordar com o tribunal a quo: as necessidades de prevenção geral são, em casos como presente, elevadíssimas — as recentes alterações legislativas são esclarecedoras quanto às prementes necessidades de protecção da sociedade — e as necessidades de prevenção especial são também elevadas e incompatíveis com a aplicação de pena não detentiva, como resulta claro do facto de o arguido ter voltado a cometer o mesmo tipo de crime menos de um ano depois da anterior condenação.

Ora, esta obstinação em manter idêntica conduta criminosa é reveladora que a pena de multa em que fora anteriormente aplicada não se mostrou eficaz no que tange às finalidades da pena.

Por tudo isto, bem andou o tribunal ao optar pela pena de prisão.

Considera também o recorrente que a medida concreta da pena — 1 (um) ano de prisão — peca por excesso porque ultrapassa a medida da culpa.

É vulgar a utilização deste “fundamento” quando se pretende reduzir a pena concreta.

No entanto, não estamos perante um verdadeiro fundamento, mas sim perante a mera reprodução do nº 2, do artº 40º do Código Penal.

É certo que o recorrente também diz que “só uma concepção ultrapassada de uma prevenção geral univocamente intimidatória e eivada de uma ideia de “publicidade negativa”, associada a uma prevenção especial que privilegie o isolamento do infractor, podem erigir-se como putativos elementos legitimadores de uma medida da pena com a dos autos. Alias, a tal condicionalismo houve ainda que acrescer um notável desligamento da culpa do agente.

No entanto, como facilmente se constata, também esta alegação nada adianta em termos concretos.

Acresce que a alegação de que “aplicar-lhe uma pena de prisão de um ano, ainda que suspensa na sua execução, será colocar  em sério risco a sua estabilidade emocional e familiar”, mais não é do que uma afirmação não fundamentada e consequentemente, inócua em termos de medida da pena.

Aliás, é suposto que uma pena criminal tenha consequências sobre a “estabilidade emocional e familiar” do condenado.

Temos assim que o recorrente não só não aponta o erro do tribunal na fixação da medida da pena, como também não apresenta argumentos minimamente consistentes que permitam a este tribunal vislumbrá-lo na sentença.

De qualquer modo sempre diremos o seguinte:

A pena a aplicar ao arguido será a resultante da concretização dos critérios do artº 71º do Código Penal, ou seja, num primeiro momento apura-se a moldura abstracta da pena e num segundo momento a medida concreta da mesma.

Assim, no caso "sub judice" e dentro da moldura penal abstracta de 1 (um) mês até cinco anos de prisão[[18]], há que atender à culpa do agente e às exigências de prevenção, bem como a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo depuserem a favor ou contra o arguido.

Nesta conformidade, há que ter em consideração que a culpa (enquanto censura dirigida ao agente em virtude da sua atitude desvaliosa e avaliada na dupla vertente de culpa pelo facto criminoso e de culpa pela personalidade) para além de constituir o suporte axiológico-normativo da pena, estabelece o limite máximo da pena concreta dado que sem ela não há pena e que esta não pode ultrapassar a sua medida (retribuição justa).

Por outro lado e ainda numa primeira linha, relevam as necessidades de prevenção (com um fim preventivo geral, ligado à contenção da criminalidade e defesa da sociedade — e cuja justificação assenta na ideia de sociedade considerada como o sujeito activo que sente e padece o conflito e que viu violado o seu sentimento de segurança com a violação da norma, tendo, portanto, direito a participar e ser levada em conta na solução do conflito — e com um fim preventivo especial, ligado à reinserção social do agente).

Assim e em termos de prevenção geral, a medida da pena é dada pela necessidade de tutela dos bens jurídicos concretos pelo que o limite inferior da mesma resultará de considerações ligadas à prevenção geral positiva ou reintegração, contraposta à prevenção geral negativa, de intimidação do delinquente.

Para além de constituir um elemento dissuasor da prática de novos crimes por parte de terceiros, a pena deve neutralizar o efeito negativo do crime na comunidade e fortalecer o seu sentimento de justiça e de confiança na validade das normas violadas.

No que toca à prevenção especial há a ponderar a vertente necessidade de ressocialização do agente e a vertente necessidade de advertência individual para que não volte a delinquir (devendo ser especialmente considerado um factor que também toca a culpa: a susceptibilidade de o agente ser influenciado pela pena).

Como bem explica o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Janeiro de 2000 (processo n.º 1193/99), “se, por um lado, a prevenção geral positiva é a finalidade primordial da pena e se, por outro, esta nunca pode ultrapassar a medida da culpa, então parece evidente que — dentro, claro está, da moldura legal —, a moldura da pena aplicável ao caso concreto (“moldura de prevenção”) há-de definir-se entre o mínimo imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias e o máximo que a culpa do agente consente: entre tais limites, encontra-se o espaço possível de resposta às necessidades da sua reintegração social” e também o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Outubro de 2000 (processo n.º 2803/00-5ª), “pelo que nos art.ºs 71. °, n.ºs 1 e 2 e 40.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, se plasma, logo se vê que o modelo de determinação da medida a pena é aquele que comete à culpa a função (única, mas nem por isso menos decisiva) de estabelecer o limite máximo e inultrapassável da pena; à prevenção geral (de integração) a função de fornecer uma “moldura de prevenção”, cujo limite máximo é dado pela medida óptima de tutela dos bens jurídicos —  dentro do que é consentido pela culpa — e cujo limite mínimo é fornecido pelas exigências irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico; e à prevenção especial a função de encontrar o quantum exacto da pena, dentro da referida “moldura de prevenção”, que melhor sirva as exigências de socialização (ou, em casos particulares, de advertência ou de segurança) do delinquente.”

Ora, o tribunal a quo explicou assim a aplicação da pena de 1 (um) ano de prisão:
“(…) as necessidades de prevenção geral são muitíssimo elevadas e, por isso, colocam o liminar mínimo irrenunciável de tutela do bem jurídico num patamar substancialmente superior ao limite mínimo da pena concreta.
Para atingir a tutela óptima, partindo daquele liminar irrenunciável há que ter em conta, no que ao grau da ilicitude diz respeito, que o arguido detinha apenas uma arma, mas, por outro lado, era de um calibre considerável – 9mm – e, logo, potencialmente mais perigosa. Além disso, estava municiada e, efectivamente, o seu uso foi anunciado numa situação de conflito, tudo o que exponencia a ilicitude. 
No que à culpa diz respeito, há que considerar que o arguido agiu com dolo directo. Ao mesmo passo inexistem motivos compreensíveis para a actuação do arguido, nos termos em que o fez. Por outro lado, o comportamento lícito alternativo é particularmente exigível, quer porque o dever de abstenção (que podemos dizer ser proporcional às elevadas necessidades de prevenção) é elevado quer porque, em concreto, inexistem motivos compreensíveis, provados, para que o arguido tivesse agido como agiu.
A culpa é, assim, muito elevada e faz crescer, proporcionalmente, a medida da pena. 
Tudo ponderado, julga-se adequada a pena de um ano de prisão.”

Como se vê, o tribunal a quo teve em consideração que “as necessidades de prevenção geral são muitíssimo elevadas”, que a detenção de uma arma de calibre 9 mm “exponencia a ilicitude” e que a culpa é elevada.

Ora, concordamos com a fundamentação o tribunal a quo e se alguma crítica se lhe pode dirigir, não será certamente a de que a pena resultante de tal ponderação — 1 (um) ano de prisão — peca por excesso (note-se que nada se diz nesta parte da sentença acerca das elevadas necessidades de prevenção geral). 

Em face do exposto, o recurso improcede também nesta parte.

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Nesta conformidade, acorda-se em julgar improcedente o recuso.

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Custas pelo recorrente, fixando-se em 6 UC a taxa de justiça.

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Coimbra,

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[1] (“… vícios intrínsecos quanto ao conteúdo da decisão tomada sobre a matéria de facto — insuficiência ou contradição dos factos e razões que suportam a própria decisão —, ou de erros ostensivos ou patentes na valoração da prova, que pela sua natureza e gravidade constituem verdadeira nulidade da sentença” Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 399/03)
[2] (sempre ressalvando qualquer intromissão no princípio da livre apreciação da prova consignado no art.º 127º)
[3]  [O facto de a alínea b. do art.º 431.º remeter para o n.º 3 do art.º 412.º não exclui o n.º 4 uma vez que este se limita a regular o modo de em sede de recurso apresentar as provas especificadas em b. e c. do n.º 3 que hajam sido gravadas, ou seja, o n.º 4 nada mais é do que uma extensão do n.º 3.]
[4] [Entre outros, v. Acs STJ de 20 de Novembro de 2008, de 29 de Outubro de 2008, de 15 de Outubro de 2008 e de 14 de Maio de 2008 (todos em www.dgsi.pt]
[5] «(…) O julgamento em 2.ª instância não é o da causa, mas sim do recurso e tão-só quanto às questões concretamente suscitadas e não quanto a todo o objecto da causa, em que estão presentes, face ao Código actual, alguns apontamentos de imediação (somente na renovação da prova, quando pedida e admitida) e da oralidade (através de alegações orais, se não forem pedidas e admitidas alegações escritas.» (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 59/06, de 18/01/2006 – ACS. Do Tribunal Constitucional, 64.º Vol., p. 399)
[6] [São estas e não a integralidade das declarações ou dos depoimentos que constituem as provas que impõem decisão diversa da recorrida]
[7] Como se diz no Acórdão da Relação do Porto de 14 de Fevereiro de 2000, Relator Dr. Baião Papão: “A referência aos suportes técnicos aludida no n.4 do artigo 412 do Código de Processo Penal é a indicação das metragens da fita gravada que contenha as declarações, depoimentos ou acareações que o recorrente decide invocar, com referência ao número e ao lado da cassete em que se inscrevam.
É insuficiente para servir de base à transcrição a simples remissão para os números das cassetes.
A transcrição deve ser efectuada pelo próprio tribunal subsequentemente à apresentação da motivação do recurso.”
[8] [Só esta maior exigência, ou seja, só o reconhecimento de que o recurso da matéria de facto, tal como está actualmente delineado, reivindica mais tempo para ser elaborado, poderá justificar o alargamento do prazo de recurso de 20 para 30 dias]
[9] No mesmo sentido, v.g., AcTRC de 25 de Junho de 2008, in http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/8e2795d32c907bca802574830038a611?OpenDocument
[10]http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/7078095c7759c2328025712c00572ccd?OpenDocument
[11] [“O aperfeiçoamento previsto no número anterior não permite modificar o âmbito do recurso que tiver sido fixado na motivação”]
[12] (Neste sentido e entre muitos outros, v.g., Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Dezembro de 2005, de 11 de Janeiro de 2001, processo n.º 3408/00-5, de 8 de Novembro de 2001 e processo n.º 2453/01-5, de 4-12-03 (www.pgdlisboa.ptpgdljurelstj)
[13] (Neste sentido, v.g., Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Maio de 1998, processo n.º 328/98 (cfr. Código de Processo Penal Anotado de Simas Santos e Leal-Henriques, II Volume, 2ª edição, pág. 824))
[14] [http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/a64f4961e6c64dd880257460002d2ac5?OpenDocument]
[15] Acessível em www.dgsi.pt
[16] No mesmo sentido, ainda que com argumentação não absolutamente coincidente, v.g., Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Junho de 2006,
[17] In www.dgsi.pt
[18] Torna-se desnecessário ponderar a moldura actual uma vez que o limite mínimo corresponde precisamente a um ano de prisão e vigora entre nós a proibição de reformatio in pejus