Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | FALCÃO DE MAGALHÃES | ||
Descritores: | TÍTULO EXECUTIVO LETRA PRESCRIÇÃO OBRIGAÇÃO CARTULAR | ||
Data do Acordão: | 04/05/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | VARA DE COMPETÊNCIA MISTA DE COIMBRA | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE REVOGADA | ||
Legislação Nacional: | ARTº 46º, Nº 1, AL. C) DO CPC | ||
Sumário: | I – Numa relação cambiária o portador do título – endossado – vê a si transmitidos os direitos que o endossante tem sobre o aceitante. II – Só que o endosso, se prescrita a obrigação cambiária, deixa de poder ser invocado, designadamente como meio de transmissão de direitos, porquanto só os de natureza cambiária se transmitem e estes, após a sua prescrição, não subsistem. III – O portador de uma letra de câmbio que a haja adquirido por endosso não pode usá-la como título executivo após a sua prescrição e contra quem não é seu devedor na relação subjacente. IV – Tais documentos não podem, pois, valer como títulos executivos, de acordo com o disposto na al. c) do nº 1 do artº 46º do CPC. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
I - Relatório: A) – 1) - A..., intentou, em 23/06/2005, na Vara de Competência Mista de Coimbra, contra B..., execução comum para pagamento de quantia certa, fundada em quatro letras de câmbio, emitidas em 2002/01/01, pelo montante de € 2.500,00, cada uma, com vencimentos, respectivamente, em 2002/06/30, 2002/07/31, 2002/08/31 e 2002/09/30, bem assim, como em outras duas letras de câmbio, embora que, porque prescritas, apenas enquanto documentos particulares, nos termos do art.° 46° al. c), do CPC, letras estas emitidas em 2002/01/01, com o valor de € 2.500,00 cada uma, com vencimentos, respectivamente, em 2002/04/30 e 2002/05/31. Sustentou, em síntese, que: - As referidas letras, todas elas aceites pelo executado, destinavam-se ao pagamento de débitos que, em resultado de transacções comerciais, este tinha para com C..., a quem as entregou como reconhecimento de dívida e promessa de pagamento, tendo este C..., por sua vez, endossado a ele, Exequente, tais títulos; - As letras não foram pagas pelo executado nas datas do respectivo vencimento, nem posteriormente, não obstante as inúmeras diligências encetadas pelo Exequente nesse sentido. 2) - Por apenso a tais autos, veio o referido B..., deduzir oposição à execução, sustentando, em síntese, que: - A situação que justificara a emissão e aceite das seis letras havia sido regularizada com C..., nunca tendo sido, por este, ou pelo Exequente, interpelado para as pagar; - Os créditos titulados pelas letras, inclusive, por aquelas que o Exequente invoca serem escritos particulares (documentos n°s 5 e 6), encontravam-se prescritos à data da instauração da execução; - É alheio à relação comercial tida pelo Exequente com C... e à dívida que este teria para com aquele por força dos documentos n°s 5 e 6, enquanto escritos particulares nos termos do artigo 46°, c), do CPC; - Os juros peticionados no requerimento executivo são excessivos, traduzindo-se em inaceitável duplicação de juros moratórios. Concluiu pela procedência da oposição, com a improcedência total da execução e a sua “absolvição”. 3) - O Exequente contestou, defendendo que não ocorrera a invocada prescrição, nem, tão pouco, quer o excepcionado cumprimento, quer abusiva contabilização de juros moratórios. Concluiu pela improcedência da oposição, com condenação do Opoente, como litigante de má fé, em multa, bem como em indemnização a fixar segundo o prudente arbítrio do Tribunal, mas em montante nunca inferior € 1000. 4) - No despacho saneador julgou-se improcedente a arguida excepção da prescrição. Procedeu-se à selecção dos factos que se consideravam já assentes e elaborou-se a base instrutória. 5) - Prosseguindo os autos os seus ulteriores termos, veio a ter lugar a audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova, após o que foi proferida sentença (em 30/04/2009) que, na medida em que considerou só serem devidos juros moratórios à taxa de 4% ao ano, julgou a oposição parcialmente procedente, consignando-se no respectivo dispositivo o seguinte: «a) – julga-se apenas parcialmente procedente, por só em parte provada, a presente oposição, ante a parcial procedência do excepcionado quanto a juros moratórios peticionados, com a consequente extinção da execução no que concerne, tão-só, aos juros de mora excedentes ao correspondente à taxa supletiva legal de 4% ao ano, desde a data de vencimento de cada um dos seis títulos dados à execução e com referência ao montante por cada um deles titulado – como consta, supra, em II-, als. B) e C); b) – no mais, julga-se a oposição improcedente, por não provada, com a subsistência nessa parte da acção executiva; c) – julga-se, por sua vez, parcialmente procedente, por em parte provado, o deduzido incidente de condenação por litigância de má fé, termos em que se condena, nesta sede, o opoente, B..., como litigante de má fé: 1 – em multa no montante de 04 (quatro) UCs.; 2 – em indemnização ao exequente/oposto no montante de 300,00 (trezentos) euros; d) já do mais nesta sede peticionado indo absolvido, na improcedência, nessa parte, deste incidente deduzido.». 6) - Desta sentença recorreu o Opoente, tendo o recurso sido admitido como Apelação, a subir imediatamente e com efeito meramente devolutivo.
B) - É esse recurso de Apelação que ora cumpre decidir e em cujas respectivas alegações, o Recorrente oferece as seguintes conclusões: […]
Termina, requerendo a procedência do recurso.
Contra-alegando, o Apelado defende que seja negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.
C) - Em face do disposto nos art.ºs 684º, nº 3 e 4, 690º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil (CPC)[1], o objecto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 660º, n.º 2, “ex vi” do art.º 713, nº 2, do mesmo diploma legal. Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, com as “questões” a resolver se não confundem os argumentos que as partes esgrimam nas respectivas alegações e que, podendo, para benefício da decisão a tomar, ser abordados pelo Tribunal, não constituem verdadeiras questões que a este cumpra solucionar (Cfr., entre outros, Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B3586 [2]). O Executado, não obstante haja recorrido da sentença sem qualquer limitação, nas conclusões da sua apelação, embora sem o dizer expressamente, circunscreveu o recurso ao capital das letras “prescritas” dadas à execução e respectivos juros de mora, bem como à sua condenação como litigante de má (cfr., v.g., conclusões nºs 9º, 10º, 11º, 26º e 27º), restringindo, assim, o objecto inicial do recurso (artigo 684º, nº 3, do CPC).
II - Fundamentação: A) Os factos. 1) - Na sentença da 1.ª Instância considerou-se estar provado o seguinte:
2) - Tendo-se procedido à gravação dos depoimentos prestados na audiência, a decisão do Tribunal de 1.ª Instância sobre matéria de facto é susceptível de ser alterada pela Relação se for impugnada, nos termos do art.º 690.º-A, a decisão com base neles proferida - (alínea a) do n.º 1 do art.º 712.º do CPC). Em tal hipótese, o objecto dessa impugnação tem obrigatoriamente de ser especificado, com indicação, quer dos concretos pontos de facto que se entendem incorrectamente julgados, quer dos concretos meios probatórios, constantes do processo do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, sob pena de rejeição (alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 690.º-A do CPC). Ao recorrente caberá, tendo havido gravação dos meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta (n.º 2 do art.º 690.º-A do CPC). A certeza a que conduz a prova suficiente é, assim, uma certeza jurídica e não uma certeza material, absoluta. […] Concluindo, dir-se-á, pois, que da análise da prova produzida resulta a necessidade de alterar, nos termos sobreditos, as respostas aos quesitos 3º e 4º, pelo que, nessa medida, será de alterar a correspondente matéria de facto constante da sentença recorrida. Assim, efectuadas as alterações acima decididas e eliminadas as expressões que, na sentença recorrida, dão por reproduzidos os títulos, a matéria de facto que se tem por assente é a seguinte: A) O exequente instaurou a presente execução apresentando como títulos executivos seis letras de aceites pelo executado e por este entregues a C...; B) Quatro das letras foram emitidas em 01/01/2002, pelo montante de 2.500,00 euros cada, tendo o seu vencimento ocorrido, respectivamente, em 30/06/2002, 31/07/2002, 31/08/2002 e 30/09/2002 (documentos de fls. 16 a 19 dos autos principais); C) Duas outras letras apresentadas pelo exequente foram emitidas a 01/01/2002, pelo montante de 2.500,00 euros cada, tendo o seu vencimento ocorrido, respectivamente, em 30/04/2002 e 31/05/2002 (documentos de fls. 20 e 21 dos autos principais); D) As seis letras destinavam-se ao pagamento de débito do ora executado para com C..., decorrente de transacção comercial deste, enquanto comerciante, com o executado. F) O executado/opoente é comerciante, tendo essa qualidade aquando da entrega das letras a C... – resposta ao quesito 5.º.». III - Decisão: Em face de tudo o exposto, decidem os Juízes deste Tribunal da Relação em, julgando a Apelação procedente, revogar a sentença recorrida, na parte impugnada, e, consequentemente: - Absolver o Opoente/Executado do pedido de condenação como litigante de má fé; - Julgando procedente a Oposição, no que concerne ao capital inscrito nos documentos dados como títulos à execução, enquanto documentos particulares previstos na al. c), do n.º 1, do art°. 46º, do CPC (Doc. nºs 5 e 6, juntos com o requerimento executivo), bem como quanto aos respectivos juros, julgar, nessa parte, extinta a execução.
Custas pelo Apelado.
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