Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
128/14.0TTLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE MANUEL LOUREIRO
Descritores: AUTO DE NOTÍCIA
CULPA
SUBSÍDIO DE NATAL
CONTRA-ORDENAÇÃO MUITO GRAVE
Data do Acordão: 12/04/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DO TRABALHO DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 13º, Nº 1, E 15º DA LEI Nº 107/09, DE 14/09 (REGIME PROCESSUAL DAS CONTRA-ORDENAÇÕES LABORAIS); 263º/1 E 3 DO C. TRABALHO DE 2009.
Sumário: I – A afirmação de um juízo censório de culpa, nas modalidades de dolo ou de mera negligência de que pode revestir-se e necessário à integração do tipo subjectivo de um determinado ilícito, não pode ser levado a efeito em termos factuais directos, pois que o que aí está em causa é verdadeiramente uma questão de direito, não uma questão de facto.

II – A afirmação desse juízo de censura há-de extrair-se da globalidade dos factos descritos como sendo integradores da prática do ilícito, designadamente na sua dimensão objectiva.

III – O Código do Trabalho de 2009 disciplina a matéria respeitante ao subsídio de natal no artº 263º/1, nos termos do qual: “o trabalhador tem direito a subsídio de natal de valor igual a um mês de retribuição, que deve ser pago até 15/12 de cada ano”.

IV – Nos termos do artº 263º/3 do CT de 2009, constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

I - Relatório

A autoridade recorrida condenou a recorrente (fls. 91 e 92), em cúmulo jurídico, na coima única de € 13.000, sendo solidariamente responsáveis pelo pagamento da coima os administradores da recorrente, A..., B..., C...e D..., como autora:
a) de uma contra-ordenação leve negligente prevista e punida pelos arts. 521º/2 e 554º/2/b do CT/09, conjugado com a cláusula 54ª/3, do Contrato Colectivo de Trabalho (CCT) celebrado entre a Associação Portuguesa de Facility Services e a FETESE – Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços e Outros, publicado no BTE 8/2010, de 28/2, e com o n.º 2, da cláusula 34ª do CCT celebrado entre a Associação Portuguesa de Serviços de Limpeza e Actividades Similares e o SLEDA – Sindicato Livre dos Trabalhadores dos Serviços de Limpeza, Portaria, Vigilância, Manutenção, Beneficência, Doméstico e Afins e Outros, publicado no BTE 5/2001, de 8/2, a que se fez corresponder a coima parcelar de € 900 (processo 161300065, com proposta de decisão a fls. 85 a 89);
b) como autora de duas contra-ordenações muito graves negligentes previstas e punidas pelos arts. 263º/1/3 e 554º/4/e do CT/09, a que se fizeram corresponder as coimas parcelares de 9.200 euros por cada uma (processo 161300069, com proposta de decisão a fls. 286 a 291; processo 161300067, com proposta de decisão a fls. 213 a 217).
A recorrente foi também condenada no pagamento de:
a) € 875,50 à trabalhadora E... e de € 304,23 à Segurança Social, pelo não pagamento das diuturnidades devidas na remuneração mensal;
b) € 210,12 e de € 83,96 à Segurança Social relativamente ao não pagamento de diuturnidades no subsídio de Natal  de 2011, às trabalhadoras F... e G...;
c) € 210,12 e de € 105,87 à Segurança Social relativamente ao não pagamento de diuturnidades no subsídio de Natal de 2011, às trabalhadoras E..., H...e I....
*
Inconformada, deduziu a recorrente impugnação judicial, na sequência da qual foi proferida sentença de cujo dispositivo consta, designadamente, o seguinte:
Pelos fundamentos expostos, julgo parcialmente procedente o presente­ recurso e, em consequência:
a) Revogo a decisão administrativa recorrida da Diretora do Centro Local do Lis da Autoridade para as Condições de Trabalho na parte em que aplicou à Arguida “J..., S.A.” uma coima parcelar de € 900 (novecentos euros) pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelos Arts. 521º, n.º 2 e 554º, n.º 2, al. b) do Código do Trabalho, conjugado com a Cláusula n.º 54.ª, n.º 3 do Contrato Coletivo de Trabalho (CCT) celebrado entre a Associação Portuguesa de Facility Services e a FETESE – Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços e Outros, publicado no B.T.E. n.º 8/2010, de 28/2, e com o n.º 2, da Cláusula 34.ª do CCT celebrado entre a Associação Portuguesa de Serviços de Limpeza e Atividades Similares e o SLEDA – Sindicato Livre dos Trabalhadores dos Serviços de Limpeza, Portaria, Vigilância, Manutenção, Beneficiência, Doméstico e Afins e Outros, publicado no B.T.E. n.º 5/2001, de 8/2, absolvendo-a da prática dessa contraordenação, bem como do pagamento da quantia no valor de € 875,50 (oitocentos e setenta e cinco euros e cinquenta cêntimos) à trabalhadora E... e do valor de € 304,23 (trezentos e quatro euros e vinte e três cêntimos) à Segurança Social;
b) Condeno a Arguida “ J..., S.A.”, pela prática de duas contraordenações previstas e punidas pelos Arts. 263º, n.os 1 e 3, e 554º, n.º 4, al. e) do Código do Trabalho, em duas coimas parcelares de € 9.200 (nove mil e duzentos euros);
c) Efetuando o cúmulo jurídico das duas coimas parcelares referidas em b), condeno a Arguida “ J..., S.A.” numa coima única de € 12.000 (doze mil euros), bem como no pagamento da quantia no valor de € 210,12 (duzentos e dez euros e doze cêntimos) às trabalhadoras F... e G... e o valor de € 83,96 (oitenta e três euros e noventa e seis cêntimos) à Segurança Social e no pagamento da quantia no valor de € 210,12 (duzentos e dez euros e doze cêntimos) às trabalhadoras E..., H...e I... e o valor de € 105,87 (cento e cinco euros e oitenta e sete cêntimos) à Segurança Social, a efetuar no mesmo prazo de pagamento da coima aplicada à Arguida, sendo A..., B..., C...e D..., na qualidade de administradores da Arguida, responsáveis solidários pelo pagamento da coima.”.
*
Mais uma vez inconformada, a recorrente interpôs recurso para esta Relação, pugnando pela sua absolvição das contra-ordenações por cuja condenação continuou a decidir-se na sentença impugnada.
Apresentou para tanto as conclusões a seguir transcritas:
[…]
*
Neste tribunal da Relação, tal como no tribunal recorrido, o Ministério Público entende que o recurso deve improceder.
*
II) Questões a decidir
São as seguintes as questões a decidir no âmbito deste recurso:
1ª) se são nulos os autos de notícia que originaram estes autos de processo de contra-ordenação, com a subsequente nulidade de todos os ulteriores trâmites processuais;
2ª) se a recorrente cometeu as contra-ordenações pelas quais foi condenada;
3ª) se a recorrente deveria ter sido condenada por uma única coima correspondente a uma só contra-ordenação a que deveriam subsumir-se os factos provados.
*
III) Fundamentação

A) De facto.

Transcrevem-se de seguida os factos dados como provados no tribunal recorrido:
[…]
*
B) De direito

Primeira questão: se são nulos os autos de notícia que originaram estes autos de processo de contra-ordenação, com a subsequente nulidade de todos os ulteriores trâmites processuais.

A recorrente começa por arguir a nulidade dos autos de notícia que deram origem aos processos contra-ordenacionais no âmbito dos quais foram aplicadas as coimas parcelares cuja subsistência foi determinada na decisão judicial recorrida (processos 1613000167 e 161300069), por considerar que dos mesmos não constava a descrição do elemento subjectivo dos tipos de contra-ordenação cuja comissão lhe foi imputada nesses autos, com a consequente violação do direito de defesa que assiste à recorrente e consequente nulidade de todo o processado subsequente.
Não assiste razão, manifestamente, à recorrente.
            Nos termos do art. 13º/1 da Lei 107/09, de 14/9 (Regime Processual das Contra-ordenações Laborais e de Segurança Social), “O auto de notícia e a participação são elaborados pelos inspectores do trabalho ou da segurança social, consoante a natureza das contra-ordenações em causa.”.
No termos do art. 15º do mesmo diploma legal:
1 - O auto de notícia, a participação e o auto de infracção referidos nos artigos anteriores mencionam especificadamente os factos que constituem a contra-ordenação, o dia, a hora, o local e as circunstâncias em que foram cometidos e o que puder ser averiguado acerca da identificação e residência do arguido, o nome e categoria do autuante ou participante e, ainda, relativamente à participação, a identificação e a residência das testemunhas.
2 - Quando o responsável pela contra-ordenação seja uma pessoa colectiva ou equiparada, indica-se, sempre que possível, a sede da pessoa colectiva e a identificação e a residência dos respectivos gerentes, administradores ou directores.
3 - No caso de subcontrato, indica-se, sempre que possível, a identificação e a residência do subcontratante e do contratante principal.”.
Comece por referir-se que a afirmação de um juízo censório de culpa, nas modalidades de dolo ou de mera negligência de que pode revestir-se e necessário à integração do tipo subjectivo de um determinado ilícito, não pode ser levado a efeito em termos factuais directos, pois que o que aí está em causa é verdadeiramente uma questão de direito, não uma questão de facto.
A afirmação daquele juízo de censura há-de extrair-se da globalidade dos factos descritos como sendo integradores da prática daquele ilícito, designadamente na sua dimensão objectiva.
Por outras palavras, a culpa não pode ser objecto de prova judicial, a qual deve incidir exclusivamente sobre os factos com base nos quais se deve sustentar o juízo de censura em que aquela assenta – Isabel Ribeiro Parreira, Concretização do conceito de justa causa do despedimento no sector bancário: análise da jurisprudência publicada, in RDES, ano XLVII, nº´s 1 e 2, p. 90.
Na verdade, como vem sendo entendido,  os elementos subjectivos dos tipos de ilícito pertencem ao foro interno do agente, sendo insusceptíveis de apreensão directa, e por isso, na ausência de confissão, têm de ser inferidos dos factos materiais que, provados, apreciados segundo a livre convicção do julgador e em conjugação com as regras da experiência comum, apontam para a sua existência.
Os actos interiores ou factos internos, que respeitam à vida psíquica, raramente se provam directamente. Na ausência de confissão, a prova dos elementos subjectivos dos tipos de ilícito terá de fazer-se indirectamente[1] por ilações, a partir de outros factos provados, através de uma leitura do comportamento exterior e visível do agente – sobre esta temática, no sentido acabado de apontar, podem consultar-se o acórdão da Relação do Porto de 23/02/83, BMJ 324°, p. 620, acórdão da Relação do Porto de 3/4/2013, proferido no âmbito do processo 140/08.8TAOAZ.P1, acórdão da Relação do Porto de 24/9/2014, proferido no âmbito do processo 510/12.7JAPRT.P3, acórdão da Relação de Coimbra de 30/1/2013, proferido no âmbito do processo 196/10.3PTLRA.C1, acórdão da Relação de Coimbra de 16/11/2005, proferido no âmbito do processo n° 3380/05, acórdão da Relação de Guimarães de 30/5/2005, proferido no âmbito do processo 538/05-2, acórdão da Relação de Évora de 19/12/2013, proferido no âmbito do processo 119/12.5GBRMZ.E1, acórdão do STJ de 25/09/97, proferido no âmbito do processo 479/97, acórdão do STJ de 1/4/93, BMJ 426, p. 154 .
Ora, lidos os autos de notícia em questão deles se extrai, à evidência e na parte com relevo para o tema ora em questão, uma descrição dos factos que constituem as contra-ordenações aqui em causa e que se traduzem numa recusa intencional da recorrente, claramente descrita em cada um dos autos em questão, em de pagar diuturnidades nos subsídios de Natal de algumas das suas trabalhadoras.
Por outro lado, lidos os autos de notícia em questão, verifica-se que deles consta textualmente o seguinte:
Após a verificação da irregularidade supra referida foi, a entidade empregadora, para regularizar a mesma, dando a possibilidade de voluntariamente apurar e pagar os valores em dívida às duas trabalhadoras e à Segurança Social …” – ponto 7 de fls. 153; cfr. ponto 5 de fls. 222;
Apesar de a entidade empregadora ter obtido desta autoridade, a possibilidade de, voluntariamente, regularizar a sua dívida para com as suas trabalhadoras e para com a Segurança Social, decidiu não proceder ao pagamento dos valores em dívida;” – ponto 9 de fls. 153; cfr. ponto 7 de fls. 22.
Dos excertos acabados de transcrever resulta à evidência que a autoridade administrativa imputou à recorrente uma conduta intencional de não pagar determinadas quantias às suas trabalhadoras, pagamentos esses que a mesma autoridade considerava serem devidos de acordo com os normativos indicados nos autos de notícia e com a jurisprudência também aí invocada.
A par disso, e ficando-se até um pouco aquém do que seria expectável face à intencionalidade comportamental da recorrente que, como visto, lhe é imputada nos autos de notícia e que apontaria para uma dimensão dolosa da correspondente actuação, escreveu-se nesses autos que “A infractora ao não assegurar o cumprimento dos normativos legais exigidos para o pagamento do Subsídio de Natal, actuou de forma negligente, não agindo no estrito cumprimento do dever de cuidado, que lhe era exigido e de que era capaz;” - ponto 19 de fls. 155; cfr. ponto 17 de fls. 224.
Acresce que em cada um dos autos de notícia vem indicada a moldura abstracta da coima correspondente às contra-ordenações imputadas à recorrente, seja na forma dolosa, seja na negligente.
Tanto basta para concluir, claramente, que a autoridade administrativa identificou explicitamente o elemento subjectivo dos tipos de contra-ordenações que imputava à recorrente, que considerava preenchidos nas suas formas negligentes.
Como assim, não se verifica a nulidade dos autos de notícia arguida pela recorrente.
De resto, mesmo que se registasse tal nulidade, a mesma não poderia agora ser declarada.
Com efeito, como consta da fundamentação invocada no assento nº 1/2003 [Diário da República, nº 21, Série I - A, de 25 de Janeiro de 2003], que fixou jurisprudência relevante sobre a temática em apreço[2]:
(…) Se a impugnação se limitar a arguir a nulidade, o tribunal invalidará a instrução administrativa, a partir da notificação incompleta, e também, por dela depender e a afectar, a subsequente decisão administrativa [artigos 121º, nºs 2, alínea d), e 3, alínea c), e 122, nº 1, do Código de Processo Penal e 41º, nº 1, do regime geral das contra-ordenações]. Todavia, se o impugnante se prevalecer na impugnação judicial do direito preterido (abarcando, na sua defesa, os aspectos de facto ou de direito omissos na notificação mas presentes na decisão/acusação), a nulidade considerar-se-á sanada [artigos 121º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Penal e 41º, nº 1, do regime geral das contra-ordenações]. (…)”.
Tal é o caso da impugnação judicial deduzida pela recorrente, em que esta não se limitou a arguir a nulidade alegadamente cometida na fase administrativa, tendo aproveitado a oportunidade para discutir a relevância da sua conduta, concluindo pela sua atipicidade e, por isso, pela sua absolvição das contra-ordenações pelas quais foi administrativamente condenada e que considera não ter cometido (cfr. conclusões 29ª a 47ª); no limite, sustenta que é apenas uma a contra-ordenação pela qual devia ser punida (cfr. conclusões 48ª a 50ª).
Como assim, ao apresentar a defesa que apresentou em sede de impugnação judicial, a recorrente extravasou manifestamente a mera arguição da nulidade pela qual continua ainda a pugnar no presente recurso, tendo aproveitado a ocasião para exercer amplamente o seu direito de defesa, dele se prevalecendo, enjeitando a prática das contra-ordenações pelas quais tinha sido condenada, em qualquer das suas formas subjectivas, desde logo pela atipicidade objectiva das condutas censuradas; mais sustentou, no limite, a unificação sancionatória que deveria ser operada em relação às condutas ilícitas que lhe eram imputadas.
Nesse enquadramento, a recorrente sanou os eventuais vícios por cuja declaração continua a pugnar neste recurso.
Ou seja, mesmo que se registasse a nulidade invocada pela recorrente, a mesma não poderia ser declarada, porque sanada.
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Segunda questão: se a recorrente cometeu as contra-ordenações pelas quais foi condenada.

Importa determinar, antes de mais, se a recorrente estava obrigada a pagar, no subsídio de Natal, as diuturnidades que vinha pagando a algumas das suas trabalhadoras identificadas nos autos de notícia que deram origem aos processos 161300067 e 161300069.
O Código do Trabalho de 2009 disciplina a matéria respeitante ao subsídio de Natal no art. 263º/1 (cfr. artigo 254º/1 do CT/03), nos termos do qual “O trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano.”.
Conjugadamente com o normativo acabado de citar, importa ter em conta o estatuído  no art. 262º/1 do CT/09, nos termos do qual “Quando disposição legal, convencional ou contratual não disponha em contrário, a base de cálculo de prestação complementar ou acessória é constituída pela retribuição base e diuturnidades.” (cfr. art. 250º/1 do CT/03).
Ora, o subsídio de Natal é inequivocamente uma prestação complementar de entre as referidas no citado art. 262º/1 CT/09, pois não tem correspectividade directa com certa quantidade de trabalho, sendo certa, por corresponder a prestação fixa que se vence periodicamente, razão pela qual o mês de retribuição a que se refere o artigo 263º/1 corresponde ao somatório da retribuição base e diuturnidades – neste sentido, Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 13.ª edição, p. 470, Pedro Romano Martinez e outros, in Código do Trabalho Anotado, 4ª edição, pp. 458 e 459, Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, 3ª edição, p. 582, Sónia Kietzmann Lopes, A retribuição e outras atribuições patrimoniais, in Colecção Formação Inicial – Retribuição e Outras Atribuições Patrimoniais, (http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/trabalho/Caderno_Retribuicao.pdf?id=9&username=guest), acórdãos do STJ de 11/5/2011, proferido no âmbito do processo 273/06.5TTABT.S1, e de 3/7/2014, proferido no âmbito do processo 532/12.8TTVNG.P1.S1.
Do exposto se conclui, pois, que a recorrente estava obrigada a pagar às suas trabalhadoras F..., G..., E..., H...e I..., no subsídio de Natal, as diuturnidades a que estas tinham direito e que estão referidas nos factos dados como provados.
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Nos termos do art. 263º/3 do CT/09, “Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.”.
Resulta da simples descrição típica acabada de transcrever que do ponto de vista objectivo o tipo de contra-ordenação fica preenchido por qualquer comportamento que envolva qualquer violação da obrigação imposta às entidades empregadoras pelos números 1 e 2 do referido art. 263º, sendo que do ponto de vista dessa tipicidade objectiva a lei não estabelece qualquer distinção entre violações integrais ou meramente parciais da obrigação de pagamento do subsídio de Natal, razão pela qual estas últimas também são suficientes para se concluir no sentido do preenchimento dessa factualidade.
Não assiste ao intérprete, assim, qualquer margem de ponderação sobre o nível relativo de incumprimento a partir do qual ou aquém do qual se deve ter ou não por preenchida aquela tipicidade objectiva.
Resulta desse número 1 que as entidades empregadoras devem pagar aos seus trabalhadores, até 15 de Dezembro de cada ano, um subsídio de Natal que, no caso em apreço e por referência às trabalhadoras em questão, incluiu a retribuição base e as diuturnidades.
Flui dos factos provados que a recorrente não pagou a algumas das suas trabalhadoras, no subsídio de Natal de 2011, as diuturnidades a que as mesmas tinham direito, tendo-lhes pago, apenas, os montantes correspondentes à retribuição base.
Como assim, a recorrente violou, em relação a essas trabalhadoras, o disposto no mencionado nº 1, pois não lhes pagou, nos termos legalmente determinados, o subsídio de Natal quantificado nos termos em que o deveria ter sido.
Tanto basta, conforme resulta do acima referido e independentemente da percentagem do subsídio de Natal em relação à qual se verifica o incumprimento da recorrente, para se ter por preenchida a factualidade típica da contra-ordenação em apreço.
Nem se diga, como sustenta a recorrente, que por esta via se lesa o princípio da proporcionalidade, o que, consequencialmente, redundaria numa inconstitucionalidade do citado art. 263º/3 do CT/09.
Esse princípio está consagrado no art. 18º/ 2, da CRP, o qual se analisa em três subprincípios: necessidade (ou exigibilidade), adequação e racionalidade (ou proporcionalidade em sentido restrito).
Como vem sendo entendido, a necessidade supõe a existência de um bem juridicamente protegido e de uma circunstância que imponha intervenção ou decisão – no caso o bem jurídico protegido está associado ao direito dos trabalhadores receberem em tempo e integralmente as prestações retributivas a que têm direito, por forma a que lhes esteja garantida, designadamente, a subsistência condigna tutelada constitucionalmente (cfr. art. 59º/1/a da CRP); a intervenção legislativa justifica-se pela necessidade de prevenir e, se necessário, reprimir as condutas das entidades empregadoras que violem tal direito e daí retirem vantagens patrimoniais.
A adequação significa que a providência se mostra adequada ao objectivo almejado, se destina ao fim da norma e não a outro – no caso a adequação em causa verifica-se, já que a norma incriminadora visa, justamente, prevenir e, se necessário, punir comportamentos das entidades empregadoras que lesem aquele direito dos trabalhadores na parte em que o mesmo se concretiza através do pagamento do subsídio de Natal.
A racionalidade implica justa medida; que o órgão competente proceda a uma correcta avaliação da providência em termos quantitativos (e não só qualitativos), que a providência não fique aquém ou além do que importa para se obter o resultado devido.
A falta de necessidade ou de adequação traduz-se em arbítrio. A falta de racionalidade traduz-se em excesso – cfr. Jorge Miranda/Rui Medeiros, CRP Anotada, Tomo I, Coimbra Editora, 2005, p. 148-163, Gomes Canotilho/Vital Moreira, CRP Anotada, 3.ª edição revista, Coimbra Editora, 1993, p. 144-154, Santiago Mir Puig, O princípio da proporcionalidade enquanto fundamento constitucional de limites materiais do Direito Penal, publicado na RPCC, Ano 19, nº 1, Janeiro-Março 2009, Coimbra Editora, p. 7-38.
O Tribunal Constitucional tem entendido que, gozando o legislador ordinário de uma ampla liberdade na definição de crimes e na fixação de penas, apenas sendo de considerar violado o princípio de proporcionalidade, consagrado no artigo 18º/2 da Constituição, em casos de inquestionável e evidente excesso, essa liberdade ainda será mais ampla, quando não se está perante matéria criminal, mas apenas de mera ordenação social.
No seu acórdão nº 132/2011, disponível em www.tribunalconstitucional.pt., o Tribunal Constitucional referiu o seguinte:
[…] Como tem este Tribunal entendido, a fixação da dosimetria sancionatória, maxime, em sede contra-ordenacional, encontra-se no âmbito de um amplo espaço de conformação do legislador, só devendo ser censuradas “as soluções legislativas que cominem sanções que sejam desnecessárias, inadequadas ou manifesta e claramente excessivas, pois tal proíbe o artigo 18.º, n.º 2, da Constituição” (cfr. Acórdão n.º 574/95, disponível no mesmo sítio da internet).
Tal asserção é sobretudo significativa no domínio do ilícito de mera ordenação social, porquanto – pode ler-se no mesmo aresto – “as sanções não têm a mesma carga de desvalor ético que as penas criminais – para além de que, para a punição, assumem particular relevo razões de pura utilidade e estratégia social”.
Como se refere no acórdão n.º 67/2011:
“(…) o legislador ordinário goza de ampla liberdade de fixação dos montantes das coimas aplicáveis, desde que respeitados os limites fixados pelo regime geral do ilícito contra-ordenacional e que as sanções aplicadas sejam “efectivas”, “proporcionadas” e “dissuasoras”, de modo a garantir o efeito preventivo daquelas, sob pena de os destinatários das normas não se sentirem compelidos a cumpri-las (com efeito, a fixação de coimas com montantes irrisórios face ao benefício colhido da prática do ilícito contra-ordenacional tende a enfraquecer o próprio cumprimento da lei; assim, ver Paulo Otero / Fernanda Palma, Revisão do Regime Legal do Ilícito de Mera Ordenação Social, in «RFDUL» (Separata), 1996, n.º 2, pp. 562 e 563).

Neste sentido, o Tribunal Constitucional tem reconhecido ao legislador ordinário uma livre margem de decisão quanto à fixação legal dos montantes das coimas a aplicar (ver Acórdãos n.º 304/94, n.º 574/95 e n.º 547/00, todos disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos), ainda que ressalvando que tal liberdade de definição de limites cessa em casos de manifesta e flagrante desproporcionalidade ou de excessiva amplitude entre os limites mínimo e máximo.
(…)
Na linha da jurisprudência consolidada neste Tribunal, a propósito da fixação dos montantes das coimas a aplicar (a título de exemplo, ver Acórdãos n.º 304/94, n.º 574/95 e n.º 547/2000, todos disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/), o Tribunal Constitucional deve coibir-se de interferir directamente nesse espaço de livre conformação legislativa, apenas lhe cabendo – sempre que necessário – acautelar que tais opções legislativas não ferem, de modo flagrante e manifesto, o princípio da proporcionalidade. A este propósito, deve sempre ter-se presente que “Só um método interpretativo rigoroso e controlado limita a invasão pelos tribunais constitucionais da esfera legislativa e impede a actividade judicativa de se tornar um «contra-poder legislativo»” (Fernanda Palma, O legislador negativo e o intérprete da Constituição, in «O Direito», 140º (2008), III, 523).
”.
Ora, no caso em apreço, estão em causa contra-ordenações que o próprio legislador configurou de muito graves.
Por outro lado, está em causa um relevante interesse jurídico dos trabalhadores que pretende proteger-se com a incriminação, qual seja o do recebimento tempestivo e integral de uma dada prestação retributiva devida por causa do regime jurídico do trabalho subordinado.
Neste enquadramento, não vislumbramos que a coima abstractamente estabelecida para as contra-ordenações imputadas à recorrente revele a flagrante desproporcionalidade ou a excessiva amplitude entre os limites mínimo e máximo que justifiquem um juízo de inconstitucional de desproporcionalidade.
Como assim, seja com a incriminação da conduta proibida nos exactos termos em que a mesma se encontra prevista, seja na moldura sancionatória abstracta cominada no preceito incriminador, não se vislumbra que exista qualquer violação da exigência constitucional de proporcionalidade sob apreciação.
*
Terceira questão: se a recorrente deveria ter sido condenada por uma única coima correspondente a uma só contra-ordenação a que deveriam subsumir-se os factos provados.

Sustenta a recorrente, para o caso de improcedência da restante argumentação expendida no sentido da revogação da decisão recorrida, que devia ser punida por uma única contra-ordenação p. e p. no art. 263º/3 do CT/09, pois apesar de terem estado em causa dois processos contra-ordenacionais, o certo é que a matéria que neles estava em causa era exactamente a mesma e única, prendendo-se, apenas, com a violação do art. 263º/1 do CT/09.
Somos, assim, remetidos para o tema da unidade e pluralidade de infracções, ou seja, para o problema de saber quando é que o agente cometeu uma só ou mais do que uma infracção pelas quais deva ser punido.
Essa temática não é objecto de tratamento específico na Lei 107/09, de 14/9, e no DL 433/82, de 27/10, na sua actual redacção, que não definem os critérios determinativos da unidade ou pluralidade referidas, limitando-se o art. 19º deste último diploma a estabelecer o regime punitivo a aplicar nas situações de concurso de contra-ordenações, sem estabelecer quando se registam situações desse tipo.
Importa atender, por isso, ao art. 30º do CP e aos ensinamentos que a respeito dele têm sido expendidos – arts. 60º da Lei 107/09, de 14/9, e 32º do DL 433/82, de 27/10.
Decorre da primeira parte do art. 30º/1, que o número de ilícitos se determina pelo número de tipos de ilícito efectivamente cometidos (... pela conduta do agente) – estamos aqui perante o que se denomina de «concurso efectivo heterogéneo», decorrente de  violação de diversas normas incriminadoras, que pode ser ideal, quando está em causa apenas uma acção ou omissão, ou real, quando à pluralidade de infracções corresponde uma pluralidade de acções ou omissões[3].
Da segunda parte desse mesmo normativo resulta que o número de ilícitos se determina, igualmente, pelo número de vezes que o mesmo tipo de ilícito for preenchido pela conduta do agente – está em causa o denominado «concurso efectivo homogéneo» emergente de violações plúrimas da mesma norma incriminadora, que igualmente pode ser ideal ou real.
Assim, estaremos perante uma situação de concurso de ilícitos sempre que pelo mesmo (concurso ideal) ou diversificados (concurso real) comportamentos o agente preencha vários tipos de ilícito (concurso heterogéneo) ou preencha mais do que uma vez o mesmo tipo de ilícito (concurso homogéneo), tanto do ponto de vista objectivo, como do subjectivo.
Do exposto flui, assim, a regra segundo a qual existe uma pluralidade de ilícitos sempre que se preencham os elementos típicos enunciados em vários preceitos incriminadores, ou sempre que se preencham por diversas vezes os elementos típicos enunciados pelo mesmo preceito.
No caso em apreço, a recorrente preencheu, por mais do que uma vez, através de vários comportamentos assumidos por referência a distintos trabalhadores seus, o mesmo tipo de infracção, pelo que estaremos aqui perante uma situação de concurso efectivo real homogéneo de contra-ordenações, ou seja, no domínio da regra da pluralidade de infracções acima enunciada[4].
Existem situações, é certo, em que apesar da pluralidade de normas incriminadoras violadas ou da plúrima violação da mesma norma incriminadora, aquela regra da pluralidade de infracções deve ceder, tudo devendo passar-se como se uma só infracção houvesse ocorrido.
Reportamo-nos às situações de concurso aparente ou de unificação de condutas (v.g. infracção única, infracção continuada, infracção de trato sucessivo).
No caso em apreço é manifesto que não estamos perante uma situação de concurso aparente de infracções[5], que exige, ao contrário do que aqui ocorre, a aplicabilidade à mesma situação de facto de diferentes normas representativas de diversos tipos de infracção, encontrando-se a reacção punitiva devida pela violação concreta do bem jurídico tutelado por um deles suficientemente assegurada pela emergente da violação do tutelado por outro, caso em que não se justifica a aplicação da norma que protege o bem jurídico de “menor dimensão”.
Evidente é, também, que não estamos perante uma situação de infracções de trato sucessivo integradas por uma prática reiterada[6] de actos lesivos do mesmo ou semelhante bem jurídico, dificilmente contabilizáveis mas essencialmente homogéneos, ao longo de períodos mais ou menos longos durante os quais se mantém uma certa unidade resolutiva[7], devendo a vítima ser a mesma no caso de estarem em causa infracções contra as pessoas (v.g. tráfico de estupefacientes, infracções fiscais ou contra a segurança social, lenocínio, infracção às regas de segurança, maus tratos) – sobre a caracterização deste tipo de crimes de trato sucessivo pode consultar-se Lobo Moutinho, Da unidade à pluralidade dos crimes no direito penal português, p. 620, nota 1854; Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2ª edição, p.314.
Resta determinar, assim, se estaremos perante uma situação de delito único ou de delito continuado a que se alude no art. 30º/2 do CP, o qual dispõe que “Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.".
A verificação de uma situação continuidade delituosa[8] exige, assim e de modo resumido, a verificação dos seguintes requisitos: pluralidade de resoluções criminosas conexionadas, no sentido de que apesar de aparentemente autónoma, cada resolução depende essencialmente da anterior, de tal modo que apenas a inicial se pode dizer normal; pluralidade homogénea ou heterogénea de infracções que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico; verificação de uma situação exógena ao agente, presente no momento das diferentes resoluções e subsequentes condutas, que diminui consideravelmente a culpa daquele, tudo convergindo num juízo de exigibilidade diminuída; identidade da vítima no caso estarem em causa bens de carácter emi­nentemente pessoal.
Reportando-nos ao caso em apreço, logo se verifica que não resulta dos factos provados a ocorrência de uma qualquer situação exógena à recorrente que permita sustentar uma diminui considerável da sua culpa subjacente à reiteração dos comportamentos delituosos que lhe são imputados e que se materializam no não pagamento parcial do subsídio de Natal a uma pluralidade de trabalhadoras suas.
Finalmente, a possibilidade de afirmação de que a recorrente teria incorrido numa única contra-ordenação pressupõe que possa afirmar-se, em face dos factos provados, que subjacente à pluralidade de infracções por si perpetradas esteve uma só resolução criminosa inicial, pois só nesse caso fica inviabilizada a possibilidade de às diferentes condutas ilícitas da recorrente poderem ser dirigidos plurais juízos de censura associados a plurais resoluções autónomas que, por regra, determinam situações de concurso efectivo.
Na verdade, conforme vem sendo reiteradamente decidido pelo STJ, a realização plúrima do mesmo tipo de crime só pode reconduzir-se à figura do crime único se ao longo de toda a realização tiver persistido o dolo ou resolução inicial; ou seja, para que se verifique um crime único, mesmo que traduzido em diversas condutas semelhantes, é necessário que estas últimas resultem de uma só e única resolução criminosa – acórdãos de 12/9/2012, proferido no âmbito do processo 2745/09.0TDLSB-L1.S1, e de 22/6/2011, proferido no âmbito do processo 3776/05.5TALRA.S1; no mesmo sentido, acórdão da Relação de Lisboa de 24/9/2014, proferido no âmbito do processo 163/12.2TACDR.P1; na doutrina pode consultar-se Eduardo Correia, A Teoria do Concurso em Direito Criminal, Colecção Teses, Almedina, Coimbra, Capítulo III, § 2.º, pp. 189 e ss) .
No caso em apreço, temos que em Dezembro de 2001, a recorrente não pagou integralmente o subsídio de Natal – por nele não ter incluído diuturnidades  –  a duas trabalhadoras suas em exercício no Instituto Vasco da Gama, em  Santiago da Guarda ( F... e G...) – pontos 14º a 16º e 19º a 21º dos factos provados
Nesse mesmo mês, a recorrente também não pagou integralmente o subsídio de Natal – por nele não ter incluído diuturnidades  –  a três trabalhadoras suas em exercício no Colégio Dr. Luís Pereira da Costa, em Monte Redondo ( E..., H...e I...) – pontos 26º, 27º, 30º a 33º dos factos provados.
Trata-se, assim, de uma omissão parcial de pagamento do subsídio de Natal referente a distintas trabalhadoras da recorrente, a exercer funções em dois estabelecimentos igualmente distintos.
Fica sem se perceber, face aos factos provados, se os pagamentos com omissão parcial do devido foram efectuados todos no mesmo momento ou em momentos diferentes, não estando excluído que esta última alternativa se tivesse verificado, designadamente em relação a trabalhadoras a operar em distintos estabelecimentos.
Por outro lado e mais relevante do que isso, fica sem se perceber se a omissão parcial do pagamento em relação a trabalhadoras diferentes a operar em distintos estabelecimentos foi fruto de uma única resolução que abarcou todas essas omissões ou, ao invés, de uma reiteração de decisões no sentido das diferentes omissões, pelo menos em relação às trabalhadoras que operaram em estabelecimentos distintos.
Não demonstram os factos provados, assim, a unicidade resolutória a que supra se fez referência para que realização plúrima do mesmo tipo de ilícito possa reconduzir-se a um único ilícito.
De tudo se conclui, assim, que no caso dos autos os factos provados não permitem concluir no sentido de que se regista uma situação de concurso aparente ou de unificação de condutas a que supra se aludiu, razão pela qual tem cabimento a aplicação da regra de que existe uma pluralidade de ilícitos quando se preencham por diversas vezes os elementos típicos enunciados pelo mesmo preceito.
Não havia razão, assim, para unificar em termos delituosos e sancionatórios as condutas omissivas que a recorrente assumiu em relação a distintas trabalhadoras suas a operar em dois estabelecimento diferentes.
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Por tudo o atrás exposto, o recurso deve improceder.
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IV) Decisão

Termos em que decidem os juízes que compõem esta secção social do Tribunal da Relação de Coimbra no sentido de julgar improcedente o recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.

(Jorge Manuel Loureiro - Relator)
 (Ramalho Pinto)


[1] Sobre a distinção entre prova directa e indirecta, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, 3ª ed., II, p. 99: a primeira incide directamente sobre o facto probando, enquanto a segunda incide sobre factos diversos do tema de prova, mas que permitem, com o auxílio de regras da experiência, uma ilação da qual se infere o facto a provar.
[2]Quando, em cumprimento do disposto no art. 50º do Regime Geral das contra-ordenações, o órgão instrutor optar, no termo da instrução contra-ordenacional, pela audiência escrita do arguido, mas, na correspondente notificação, não lhe fornecer todos os elementos necessários para que este fique a conhecer a totalidade dos aspectos relevantes para a decisão, nas matérias de facto e de direito, o processo ficará doravante afectado de nulidade, dependente de arguição, pelo interessado/notificado, no prazo de 10 dias após a notificação, perante a própria administração, ou, judicialmente, no acto de impugnação da subsequente decisão/acusação administrativa.”.


[3] Como é sabido, o art. 30º/1 do CP opera uma total equiparação entre as situações de concurso ideal e as de concurso real – acórdão para fixação de jurisprudência de 19/2/1992, DR, I, de 9/4/1992; Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2ª edição, pp. 989 e ss.; no sentido de que essa equiparação também deve operar no âmbito das contra-ordenações, Maria João Antunes, anotação ao acórdão da Relação de Coimbra de 30/1/1991, RPCC, ano 3, Julho/Setembro, pp. 463 a 474.
[4] Não está aqui em causa, pois, em face da multiplicidade dos comportamentos ilícitos do empregador, uma situação de concurso efectivo ideal homogéneo do tipo das previstas no art. 558º do CT/09 – Soares Ribeiro, Contra-ordenações no Código do Trabalho, Questões Laborais, ano XI, nº 23, pp. 27 e ss.
[5] Por relação de especialidade, subsidiariedade ou consumpção – Cavaleiro de Ferreira, Direito Penal Português, I, 1982, pp. 159 e ss; por facto posterior não punível – Figueiredo Dias, Direito Penal, Sumários, 1976, p. 107 e Teresa Beleza, Direito Penal, I, 1985, pp. 543 e ss; ou por facto anterior não punível – Hans Wessels, Direito Penal, Parte Geral, 1976, p. 181.
[6] Revelando a reiteração uma culpa agravada correspondente a uma resolução determinada e persistente do agente.
[7] O dolo do agente abarca desde o início uma pluralidade de actos sucessivos que ele se dispõe desde logo a praticar.
[8] No sentido de que a figura do crime continuado também se aplica no âmbito das contra-ordenações, Maria João Antunes, RPCC, 3, Julho/Setembro, p. 469, em anotação a um acórdão da Relação de Coimbra, acórdão da Relação de Évora de 11/7/2013, proferido no âmbito do processo 82/12.2YQSTR.E1; contra, Faria Costa, Afirmação do princípio do numerus clausus na repartição das infracções penais e diferenciação qualitativa entre as duas figuras dogmáticas, Questões Laborais, ano VIII, nº 17, pp. 9 a 11.