Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4806/11.7TBLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: RESPONSABILIDADE BANCÁRIA
DEPÓSITO
TRANSFERÊNCIA
PROCURAÇÃO
DEVER DE CUIDADO
Data do Acordão: 06/12/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - LEIRIA - JC CÍVEL - JUIZ 5
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 220, 796, 1142, 1144, 1187 CC, DL Nº298/92/31/12, DL Nº 76-A/2006 DE 29/3
Sumário:
I - Apurado, em função de prova pericial, que a assinatura aposta numa procuração não o foi pelo punho do mandante, não pode dar-se como provado, não obstante tal constar em termo de autenticação da mesma, elaborado por advogada, que aquele compareceu pessoalmente no escritório desta e assinou na sua presença tal instrumento.
II - O banco que admite o levantamento da quantia de 75 mil euros e, três dias depois, a transferência de mais 285 mil euros, por terceiro, falso procurador, sem cuidar de averiguar da regularidade/validade da procuração, vg. confrontando a assinatura do mandante nela constante com a existente na ficha de assinaturas, tentando contactar com este – assim vindo a saber que já tinha falecido -, e não se apercebendo que o termo de autenticação dela efectuado por uma advogada não tinha sido registado informáticamente, como exigido pelo artº 38º nº3 do DL 76-A/2006 de 29.03, assume uma postura omissiva culposa e, assim, responsabilizante.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA


1.
C (…), e J (…) instauraram contra C (…) SA acção declarativa, de condenação, sob a forma de processo ordinário.

Pediram:
a) A condenação da ré no reconhecimento de que em 06.05.2011 a importância de € 75.000,00 existente na conta à ordem nº 0035 2044 051506330 e em 09.05.2011 a importância de € 285.000,00 existente na conta a prazo nº 0035 2044 051506920, pertencem ambas exclusivamente aos autores;
b) Seja declarado que a procuração exibida por Jorge Pereira à ré é nula;
c) A condenação da ré a entregar aos autores a importância total de € 360.000,00 acrescida de juros de mora contados à taxa legal desde o dia em que J (…) delas se apropriou, até integral reembolso.

Para tanto alegaram, em síntese:
São os únicos e universais herdeiros de O (…), falecido no estado de solteiro no dia 06.04.2011.
Este era titular de duas contas bancárias na agência de Leiria da ré C (…), sita no Largo Goa, Damião e Diu, sendo uma conta de depósitos à ordem com o nº (…) e outra uma conta de depósitos a prazo com o nº (…).
No dia 06.05.2011, J (…) levantou a quantia de € 75.000,00 da referida conta de depósitos à ordem e no dia 09.05.2011 levantou a quantia de € 285.000,00 da conta de depósitos a prazo, tendo transferido este último montante para a conta da CGD nº (…) de que nem o falecido nem os autores eram ou foram titulares, mas sim o próprio J (…), facto de que apenas tiveram conhecimento aquando da efectivação do arrolamento constante dos autos apensos.
Os movimentos bancários descritos foram feitos por J (…) munido de uma procuração outorgada pelo falecido que lhe dava poderes para o efeito, sem que a ré tenha tido o cuidado de verificar que, aquando dos levantamento a mesma já caducara, atento o falecimento do outorgante e sem conferir a assinatura constante da procuração com a aposta na ficha bancária.
A ré não teve também o cuidado de verificar a validade da procuração, a qual padece de um vício de forma, uma vez que o termo de autenticação efectuado por advogado não contém o nº de identificação do registo informático, nos termos exigidos pela Portaria 657-B/2006, assim como não teve o cuidado de solicitar a apresentação do original da procuração, bastando-se que com uma pública forma.

Contestou a ré.
Alegou que J (…) é cliente da agência da C (…) da Marinha grande, não tendo causado qualquer estranheza no balcão dessa cidade que tivesse procedido ao levantamento da quantia de € 75.000,00, atenta a actividade de mediação imobiliária e seguradora a que se dedica, e que, dada esta, movimenta regularmente quantias elevadas.
A procuração apresentada por J (…) encontrava-se autenticada e com assinatura reconhecida por advogado, encontrando-se ainda a cópia notarialmente certificada, pelo que agiu com grau de diligência idóneo, confiando na sua autenticidade.
Para a movimentação do depósito a prazo, J (…) apresentou ainda o conhecimento de depósito respectivo.


2.
Prosseguiu o processo os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido:
«julgo a acção procedente e consequentemente condeno a ré a pagar aos autores a quantia de € 360.000,00 (trezentos e sessenta mil euros), acrescida de juros de mora, desde a data da citação, à taxa legal de 4%, até efectivo e integral pagamento.»

3.
Inconformada recorreu a ré.
Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:
(…)

Contra alegaram os autores pugnando pela manutenção do decidido com os seguintes argumentos finais:
(…)

4.
Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção -, o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes:

1ª - Alteração da decisão sobre a matéria de facto.
2ª - Improcedência da ação.

5.
Apreciando.
5.1.
Primeira questão.
5.1.1.
No nosso ordenamento vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, e fixa a matéria de facto em sintonia com a sua prudente convicção firmada acerca de cada facto controvertido -artº607 nº5 do CPC.
Perante o estatuído neste artigo, exige-se ao juiz que julgue conforme a convicção que a prova determinou e cujo carácter racional se deve exprimir na correspondente motivação cfr. J. Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, 3º, 3ªed. 2001, p.175.
O princípio da prova livre significa a prova apreciada em inteira liberdade pelo julgador, sem obediência a uma tabela ditada externamente; mas apreciada em conformidade racional com tal prova e com as regras da lógica e as máximas da experiência – cfr. Alberto dos Reis, Anotado, 3ª ed. III, p.245.
Acresce que há que ter em conta que as decisões judiciais não pretendem constituir verdades ou certezas absolutas.
Pois que às mesmas não subjazem dogmas e, por via de regra, provas de todo irrefutáveis, não se regendo a produção e análise da prova por critérios e meras operações lógico-matemáticas.
Assim: «a verdade judicial é uma verdade relativa, não só porque resultante de um juízo em si mesmo passível de erro, mas também porque assenta em prova, como a testemunhal, cuja falibilidade constitui um conhecido dado psico-sociológico» - Cfr. Ac. do STJ de 11.12.2003, p.03B3893 dgsi.pt.
Acresce que a convicção do juiz é uma convicção pessoal, sendo construída, dialeticamente, para além dos dados objetivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, nela desempenhando uma função de relevo não só a atividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis e mesmo puramente emocionais AC. do STJ de 20.09.2004 dgsi.pt.
Nesta conformidade - e como em qualquer atividade humana - existirá sempre na atuação jurisdicional uma margem de incerteza, aleatoriedade e erro.
Mas tal é inelutável. O que importa é que se minimize o mais possível tal margem de erro.
O que passa, como se viu, pela integração da decisão de facto dentro de parâmetros admissíveis em face da prova produzida, objetiva e sindicável, e pela interpretação e apreciação desta prova de acordo com as regras da lógica e da experiência comum.
E tendo-se presente que a imediação e a oralidade dão um crédito de fiabilidade acrescido, já que por virtude delas entram, na formação da convicção do julgador, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova, e fatores que não são racionalmente demonstráveis.
Sendo que estes princípios permitem ainda uma apreciação ética dos depoimentos - saber se quem depõe tem a consciência de que está a dizer a verdade– a qual não está ao alcance do tribunal ad quem - Acs. do STJ de 19.05.2005 e de 23-04-2009 dgsi.pt., p.09P0114.
Nesta conformidade constitui jurisprudência sedimentada, que:
«Quando o pedido de reapreciação da prova se baseie em elementos de características subjectivas, a respectiva sindicação tem de ser exercida com o máximo cuidado e só deve o tribunal de 2.ª instância alterar os factos incorporados em registos fonográficos quando efectivamente se convença, com base em elementos lógicos ou objectivos e com uma margem de segurança muito elevada, que houve errada decisão na 1.ª instância, por ser ilógica a resposta dada em face dos depoimentos prestados ou por ser formal ou materialmente impossível, por não ter qualquer suporte para ela. – Ac. do STJ de.20.05.2010, dgsi.pt p. 73/2002.S1.
5.1.2.
Ademais, urge atentar que a impugnação da decisão sobre a matéria de facto não se destina a que o tribunal da Relação reaprecie global e genericamente a prova valorada em primeira instância, ainda que apenas se pretenda discutir parte da decisão - Cfr. entre outros, os Acs. do STJ de 9.07.2015, p.405/09.1TMCBR.C1.S1 e de 01.10.2015, p. 6626/09.0TVLSB.L1.S1 in dgsi.pt.
Efetivamente, e como dimana do preâmbulo do Decreto-Lei nº 39/95 (…), «a garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência – visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso.
Não poderá, deste modo, em nenhuma circunstância, admitir-se como sendo lícito ao recorrente que este se limitasse a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo, pura e simplesmente, a reapreciação de toda a prova produzida em 1ª instância, manifestando genérica discordância com o decidido.».
Como corolário deste princípio:
«impôs-se ao recorrente um “especial ónus de alegação”, no que respeita “à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação”, em decorrência “dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa fé processuais, assegurando, em última análise, a seriedade do próprio recurso intentado e obviando a que o alargamento dos poderes cognitivos das relações (resultante da nova redacção do artigo 712º [actual 662º]) – e a consequente ampliação das possibilidades de impugnação das decisões proferidas em 1ª instância – possa ser utilizado para fins puramente dilatórios, visando apenas o protelamento do trânsito e julgado de uma decisão inquestionavelmente correcta.»
Na verdade:
«A reforma do Código de Processo Civil de 2013 não pretendeu alterar o sistema dos recursos cíveis…mas teve a preocupação de “conferir maior eficácia à segunda instância para o exame da matéria de facto”, como se pode ler na Exposição de Motivos da Proposta de Lei nº 113/XII apresentada à Assembleia da República…Essa maior eficácia traduziu-se no reforço e ampliação dos poderes da Relação, no que toca ao julgamento do recurso da decisão de facto; mas não trouxe consigo a eliminação ou, sequer, a atenuação do ónus de delimitação e fundamentação do recurso, introduzidos em 1995. Com efeito, o nº 1 do artigo 640º vigente, aplicável ao recurso de apelação que agora nos interessa:
– manteve a indicação obrigatória “dos concretos pontos de facto” que o recorrente “considera incorrectamente julgados” (al. a),
– manteve o ónus da especificação dos “concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos de facto impugnados diversa da recorrida” (al. b), – exigiu ao recorrente que especificasse “a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas” (al. c), sob pena de rejeição do recurso de facto. E à mesma rejeição imediata conduz a falta de indicação exacta “das passagens da gravação em que se funda” o recurso, se for o caso, sem prejuízo de poder optar pela apresentação da “transcrição dos excertos” relevantes.» - Ac. do STJ de 01.10.2015, sup. cit.
Assim, estatui o artº 640º do CPC:
“1 — Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. »
Por outro lado, como dimana do já supra referido, e como constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, o recorrente não pode limitar-se a invocar mais ou menos abstrata e genericamente, a prova que aduz em abono da alteração dos factos.
A lei exige que os meios probatórios invocados imponham decisão (não basta que sugiram) diversa da recorrida.
Ora tal imposição não pode advir, em termos mais ou menos apriorísticos, da sua, subjetiva, convicção sobre a prova.
Porque, afinal, quem tem o poder/dever de apreciar/julgar é o juiz.
Por conseguinte, para obter ganho de causa neste particular, deve ele efetivar uma análise concreta, discriminada, objetiva, crítica, logica e racional, de todo o acervo probatório produzido, de sorte a convencer o tribunal ad quem da bondade da sua pretensão.
A qual, como é outrossim comummente aceite, apenas pode proceder se se concluir que o julgador apreciou o acervo probatório com extrapolação manifesta dos cânones e das regras hermenêuticas, e para além da margem de álea em direito probatório permitida e que lhe é concedida.
E só quando se concluir que a natureza e a força da prova produzida é de tal ordem e magnitude que inequivocamente contraria ou infirma tal convicção, se podem censurar as respostas dadas.– cfr. neste sentido, os Acs. da RC de 29-02-2012, p. nº1324/09.7TBMGR.C1, de 10-02-2015, p. 2466/11.4TBFIG.C1, de 03-03-2015, p. 1381/12.9TBGRD.C1 e de 17.05.2016, p. 339/13.1TBSRT.C1; e do STJ de 15.09.2011, p. 1079/07.0TVPRT.P1.S1., todos in dgsi.pt;
5.1.3.
No caso vertente pretende a ré que sejam dados como provados os seguintes pontos de facto:
(…)

5.1.4.
Decorrentemente, e no parcial deferimento da presente pretensão, os factos a considerar são os seguintes, indo a negrito o aditado:
1- O (…) faleceu no dia 6 de Abril de 2011, no estado de solteiro.
2- Por escritura de habilitação datada de 13 de Maio de 2011, os autores, na qualidade de primos de O (…), foram declarados seus únicos e universais herdeiros.
3- O (…), à data referida em 1 era, entre o mais, o único titular das seguintes contas bancárias da C (…), agência de Leiria: a) Conta de Depósitos à Ordem com o nº (…), à data, com o saldo no valor de € 73.926,24; b) Conta de Depósitos a Prazo com o nº (…), à data, com o saldo no valor de € 285.000,00.
4- Em 06.05.2011, por força da creditação do valor da pensão do falecido, bem como dos juros vendidos relativos ao depósito a prazo, a conta mencionada na alínea a) do facto anterior apresentava o saldo de € 78.084,96.
5- No dia 06.05.2011J (…) na agência da Marinha Grande da C (…), sita na (…) procedeu ao levantamento, em numerário, no montante de e 75.000,00 da conta mencionada na alínea a) do facto 3.
6- No dia 09.05.2011, no mesmo local, J (…) procedeu à transferência do saldo da conta a prazo mencionada na alínea b) do facto 3, para a conta bancária da C (…) com o nº (…), da qual J (…) é titular.
7- Aquando dos movimentos bancários referidos em 5 e 6, J (…) apresentou ao balcão da referida agência da C (…) uma fotocópia reconhecida notarialmente em 06.05.2011, de uma procuração e termo de autenticação efectuado por uma advogada, com data de 18.04.2007, pela qual O (…) lhe conferia, entre o mais, poderes para abrir, movimentar e cancelar quaisquer contas bancárias, como se o próprio fosse, sacar e endossar cheques bancários e vales de correio, para depósito em qualquer banco, assinar e passar recibos de precatórios cheques, bem como receber essas mesmas quantias e valores; requisitar todo o tipo de cheques, em moeda portuguesa ou estrangeira; assinar ordens de pagamento aos bancos a favor de fornecedores, sacar, endossar e assinar cheques, aceites bancários, letras e livranças (…).
8- Nas datas referidas em 5 e 6, J (…) era titular de uma conta bancária na agência da Marinha Grande, sita na Avenida José Gregório e exercia a actividade de agente de mediação imobiliária.
9- Aquando da exibição da cópia da procuração referida em 7, os funcionários da ré, perante o reconhecimento da assinatura presencial, autenticada por advogado, anexo à mesma e perante a certificação notarial da cópia apresentada, confiaram na sua autenticidade.
10- Previamente às operações bancárias referidas em 5 e 6, os funcionários da ré não contactaram o titular da conta, não conferiram a assinatura constante da procuração com a assinatura aposta na ficha bancária e não conferiram o registo no sistema informático do termo de autenticação elaborado pela advogada que o subscreveu.
11- O termo de autenticação da procuração referido no facto 7 não contém o número de identificação correspondente ao seu registo informático.
12- A assinatura que consta da procuração referida em 7 não foi aposta por O (…).
13 - Na data referida em 6, J (…) apresentou documento de conhecimento de depósito respectivo.

5.2.
Segunda questão.
5.2.1.
A Srª Juíza decidiu, de jure, alicerçada no seguinte, nuclear, discurso argumentativo:
«… quando é efectuado um depósito bancário, este dá origem à abertura de uma conta, constituindo esta a expressão contabilística do depósito efectuado, porquanto é na conta que se vão registando todas as entregas feitas pelo cliente ao abrigo do contrato de depósito inicialmente celebrado, bem como todos os levantamentos das quantias nele depositadas…
Independentemente de se considerar que o depósito bancário reveste a natureza de um depósito irregular ou de um mútuo, a verdade é que mesmo que se considere um depósito irregular, como decorre do artº 1206º do Código Civil ao mesmo sempre serão aplicáveis as regras do contrato de mútuo na medida do possível
Se assim é, como decorre do disposto nos artºs 1142º e 1187º al. c) do Código Civil …o banco é responsável pela guarda dos valores que lhe são confiados pelo cliente, estando obrigado à restituição com os seus frutos.
Dispõe, por sua vez, o artº 1144º que as coisas mutuadas tornam-se propriedade do mutuário pelo facto da entrega.
Acresce que o artº 796º nº 1 estabelece que nos contratos que importem a transferência do domínio sobre certa coisa ou que constituam ou transfiram um direito real sobre ela, o perecimento ou deterioração da coisa por causa não imputável ao alienante corre por conta do adquirente.
Resulta assim, destas normas legais que é sobre o banco que corre o risco relativo à subtracção dos montantes que lhe foram entregues pelo depositante, salvo se houver culpa deste.
Como supra se disse, aquando das operações bancárias efectuadas por J (…), este apresentou uma fotocópia reconhecida notarialmente de uma procuração e termo de autenticação efectuados por uma advogada com certificação do reconhecimento presencial da assinatura constante daquela procuração.
Tal documentação, como resulta do facto 9, foi suficiente para que os funcionários da agência da ré confiassem na autenticidade da procuração que conferia poderes a J (…) para efectuar as ditas operações, procuração que, como se extrai do facto 12, era falsa.
Alega a ré em seu abono, por um lado que J (…) tinha também uma conta bancária na C (…) e que dada a sua profissão de agente imobiliário movimentava regularmente quantias elevadas, motivo pelo qual as operações bancárias descritas, apesar do seu montante, não causou qualquer estranheza ao funcionário que as realizou. Por outro lado, o mesmo funcionário, perante a certificação notarial e perante o reconhecimento presencial da assinatura constante da procuração autenticada por advogada, confiou na sua autenticidade.
Como vimos não ficou demonstrador que J (…) movimentasse regularmente quantias elevadas como representante de clientes. Também não ficou demonstrado…que se os funcionários da ré tivessem efectuado o confronto das assinaturas constantes da procuração e da ficha bancária poderiam facilmente verificar que as minhas não tinham qualquer semelhança.
Isto é, apesar de ter ficado provado que não conferiram a assinatura constante da procuração com a que constava da ficha bancária (cf. facto 10), não se provou que se o tivessem feito, facilmente teriam verificado que não eram idênticas.
A questão que se coloca é, pois, saber, se os funcionários da ré, cumpriram todos os deveres ao alcance de um funcionário bancário médio, designadamente ao nível dos deveres de zelo e diligência.
E, desde já, avançamos que entendemos que tais deveres não foram cumpridos.
Sublinhe-se que aqui o critério não pode ser o do homem médio, mas sim o do funcionário bancário médio, como se disse, porque a diligência exigível se apura, em abstracto, em conformidade com o género de actividade desenvolvida e, sendo esta uma actividade profissional em referência ao nível técnico e à perícia de um bom profissional na actividade em causa.
Ora, a este propósito refere-nos o AC. STJ 18.12.2008 que os Bancos são entidades legalmente habilitadas a praticar profissionalmente actos bancários. E a referência ao carácter profissional da sua actividade significa …(que) as instituições bancárias (devem) adoptar uma orgânica própria e muito especializada, que possa responder, com eficácia, ao complexo de deveres a que estão vinculadas, e que têm a ver, no sector bancário, não só com preocupações de política económica, de salvaguarda do sistema, mas também com a tutela dos direitos e interesses dos clientes.
O Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGIC) contém mesmo um complexo de normas relativas às regras de conduta do banqueiro, aí sendo destacadas, no que tange a deveres gerais, regras respeitantes à competência técnica, às relações com os clientes, ao dever de informação e ao critério de diligência (arts. 73º a 76º).
A competência técnica (art. 73º) tem subjacente deveres de qualidade e de eficiência: o banqueiro deve assegurar ao cliente, em todas as actividades que exerça, “elevados níveis de competência técnica”, devendo, para a consecução de tal objectivo, dotar a sua organização empresarial “com os meios materiais e humanos necessários para realizar condições apropriadas de qualidade e eficiência”.
No tocante às relações com os clientes (art. 74.º) vem referenciado o dever de adopção, por parte do banqueiro, enquanto instituição, de procedimentos de diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhe estão confiados.
E quanto ao critério de diligência (art. 76.º), também referenciando o banqueiro enquanto instituição, aponta ele para o modelo do banqueiro criterioso e ordenado, no que pode ver-se a recuperação, com fins bancários, da figura do bonus paterfamilias, prudente, ordenado e dedicado.
Nos presentes autos encontra-se provado (cf. facto 10) que os funcionários da ré…para além de não terem conferido a assinatura que constava da procuração com a que constava da ficha bancária…não contactaram, ou pelo menos não tentaram contactar, com este e não conferiram o registo no sistema informático do termo de autenticação elaborado pela advogada que o subscreveu, sendo certo que o mesmo nem sequer continha tal número (cf. facto 11).
No que se refere a este termo de autenticação prescreve o artº 38º …do Dec.Lei 76-A/2006, na redacção que lhe foi dada pelo Dec.Lei 8/2007, sob a epígrafe “Competência para os reconhecimentos de assinaturas, autenticação e tradução de documentos e conferência de cópias”…
…de acordo com o nº 3 os actos referidos no nº 1 apenas podem ser validamente praticados pelas câmaras de comércio e indústria, advogados e solicitadores mediante registo em sistema informático, cujo funcionamento, respectivos termos e custos associados são definidos por portaria do Ministro da Justiça (sublinhado nosso).
Este sistema informático veio a ser implementado pela Portaria 657-B/2006 de 29 de Junho, com entrada em vigor no dia 30 de Junho de 2006, que no seu artº 1º estipula que a validade dos reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, das autenticações de documentos particulares e da certificação, ou realização e certificação, de traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial, efectuados por câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei 244/92 de 29 de Outubro, advogados e solicitadores, depende de registo em sistema informático (sublinhado nosso).
O artº 4º da mesma Portaria estabelece ainda que:
1- O registo informático é efectuado no momento da prática do acto, devendo o sistema informático gerar um número de identificação que é aposto no documento que formaliza o acto.
2- Se, em virtude de dificuldades de carácter técnico, não for possível aceder ao sistema no momento da realização do acto, esse facto deve ser expressamente referido no documento que o formaliza, devendo o registo informático ser realizado nas quarenta e oito horas seguintes.
Das disposições legais descritas resulta, com toda a clareza e evidência, que a validade do documento particular em questão, neste caso, a procuração exibida por J (…) que lhe permitia efectuar as operações bancárias realizadas, tendo sido autenticada por advogado, estava dependente do registo informático do acto de autenticação, que, como vimos não foi feito.
Estando em crise a validade da autenticação por omissão desta formalidade essencial, a procuração exibida por J (…) aos funcionários da ré carecia também ela de validade.
Como vimos, este regime legal entrou em vigor no ano de 2006, sendo que as operações bancárias efectuadas, mediante exibição de procuração foram feitas no ano de 2011. Entendemos, por isso, que um funcionário bancário medianamente diligente no cumprimento das suas obrigações, não poderia ter deixado de analisar os requisitos externos dos documentos que lhe foram exibidos, mormente o termo de autenticação da procuração que lhe foi apresentada, podendo facilmente concluir que a mesma não obedecia aos requisitos legais e, por aí, não ter permitido, sem mais, a realização das operações bancárias que foram feitas e que lesaram os herdeiros de O (…).
Por último, cabe dizer que não existe da parte destes herdeiros qualquer conduta que tenha contribuído para tal prejuízo, já que as operações bancárias foram efectuadas cerca de um mês após o falecimento de O (…) apesar de herdeiros não eram sequer familiares próximos, não havendo por isso motivo para que soubessem da existência das contas bancárias de O (…) e que comunicassem às respectivas instituições bancárias o seu óbito.
Perante o que fica dito, só podemos concluir pela omissão dos deveres de diligência por parte da ré, devendo em consequência a mesma ser responsabilizada pelo indevido levantamento e indevida transferência de fundos não ordenados pelos herdeiros de O (…).»

Este discurso apresenta-se, na sua essencialidade relevante, em tese, curial, e, para este nosso caso concreto, adequado, atentos os seus apurados contornos fáctico circunstanciais.
Perscrutemos e dilucidemos os argumentos da recorrente no sentido de convencer que ela não violou os deveres de diligência e zelo que se lhe impunham.
5.2.2.
No atinente à falta de conferência da assinatura alega que ela «não resulta de qualquer normativo legal» que « já se mostrava feita por advogado» e que «é a própria sentença a reconhecer a sua inutilidade»
Relativamente ao primeiro argumento cumpre dizer que tais deveres dimanam dos diplomas e normativos citados na sentença, devidamente interpretados.
E, ainda que assim não fosse, sempre resultariam de um dever geral de cuidado outrossim neles ínsito.
Na verdade, e como é apodíctico, em função da delicadeza da actividade desenvolvida pelos bancos, decorrente, por um lado, da necessidade de incutir confiança, sempre necessária e importante, à actividade económica em geral - e, ademais, da qual eles não podem dissociar-se, antes para cujo desenvolvimento e proficuidade devem contribuir -, e, por banda outra, da necessidade de protecção dos concretos interesses dos seus clientes:
«Os bancos estão adstritos ao dever de proceder com diligência, tanto nas relações com os clientes como nas relações com outras instituições, e de assegurar, em todas as suas actividades, «elevados níveis de competência, garantindo que a sua organização empresarial funcione com os meios humanos e materiais adequados a assegurar condições apropriadas de qualidade e eficiência», por imposição dos comandos dos arts. 73.º e 74.º do DL n.º 298/92 de 31-12 (que aprovou o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras).» -Ac. do STJ de 11.07.2017, p. 996/13.2TVLSB.L1.S1 in dgsi.pt.
Quanto ao segundo ele falece, desde logo e determinantemente, por decorrência do agora acabado de dizer.
Aquele dever de cuidado e zelo, como bem se alude na decisão, é acrescida e acutilantemente, exigível aos bancos, por comparação com outras actividades de menor relevância e impacto particular /pessoal e geral/social, dada a importância da sua actividade.
Assim, o simples facto de a assinatura estar reconhecida por advogada não a desonerava de desenvolver a atuação necessária no sentido de confirmar a sua autenticidade.
É que os ilustres advogados, não obstante a presumida fidedignidade atribuída à sua atuação, rectius na certificação de documentos, também podem falhar ou cometer lapsos, como, aliás, no caso vertente parece que aconteceu.
Assim, o Banco não pode, confortável e comodamente, apenas confiar cegamente em actividade de terceiro sempre potencialmente contingente e falível, mas, ele próprio, certificar-se, na medida do possível, da autenticidade do documento que lhe é apresentado.
Ademais, tal possibilidade vislumbrava-se de fácil e rápida efectivação, pois que apenas passaria pela confrontação das assinaturas do mandante que constavam no instrumento apresentado com a(s) existente(s) na respectiva ficha de assinaturas.
Esta atuação era exigível, acrescida e impressivamente, atentas as elevadas quantias movimentadas, não pelo titular das mesmas, mas por um terceiro, ainda que alegado procurador.
Sendo ainda de notar e relevar o facto que os movimentos se terem dado em dias diferentes, mas entre eles apenas terem medeado três dias.
Assim, se quanto ao primeiro movimento, e porque se tratou de uma quantia inferior, ainda que elevada - 75.000,00 euros – se pudesse admitir, num esforço complacente, uma menor censura da posição omissiva da recorrente, já no atinente ao segundo, porque relativo a uma verba de grande calibre – 285.000 euros – e dado o curto lapso de tempo entre os dois movimentos, é, de todo, intolerável que não fosse efectivada uma averiguação sobre a regularidade da procuração.
Então não seria, ao menos, de estranhar, o levantamento e o movimento, de centenas de milhares de euros, em período tão limitado, por um terceiro, mero procurador, respaldado numa procuração alegadamente outorgada há mais de quatro anos?
E nem se diga, como a Recorrente, que ela é responsabilizada por não praticar um ato que a sentença considera inútil.
Em lado algum da sentença a confrontação das assinaturas é taxada de inútil.
O que nela se diz é que não se provou que Os funcionários da ré, se tivessem efectuado o confronto das assinaturas facilmente verificariam que as mesmas não tinham qualquer semelhança.
Ora tal não equivale à consideração da inutilidade da confrontação, como dimana da própria decisão que é, vg., alicerçada nessa omissão.
Mas a não prova de tal facto não acarreta as consequências que a insurgente lhe atribui.
Desde logo por razões formais, pois que, como é consabido, a não prova de um facto não significa a prova do facto seu contrário.
Apenas retira tal facto da apreciação jurisdicional, apresentando-se ele como inútil ou inócuo.
E devendo a actividade hermenêutica e a consequente decisão incidir e derivar unicamente dos factos apurados.
Depois e substancialmente, e mesmo que pudesse ser dada alguma relevância à não prova de tal facto, sempre se poderia argumentar que, mesmo que não fosse «fácil» descortinar a falsidade da assinatura, tal poderia acontecer através de uma atuação mais diligente e sagaz.
Como, até certo ponto, é exigível aos funcionários da ré, os quais, em função, repete-se, da importância das suas atribuições, devem para elas e em função delas e para bom desempenho das mesmas – como a presente – estar apetrechados, e, até, pelos bancos, formados.
Efetivamente e para além do decidido no citado Ac. do STJ de 11.07.2017, também outros arestos apontam neste sentido, a saber:
« Os bancos dedicam-se à prática de atos bancários, com carácter profissional e habitual, com vista à obtenção do lucro, em regime de tendencial exclusividade, para o que constroem uma estrutura e orgânica com vista à realização de tal escopo e também à salvaguarda dos direitos e interesses de quem procura os seus serviços (clientes), que neles depositam confiança nos serviços e informações que pelo banco lhes são prestadas, no âmbito da realização ou preparação de atos e contratos bancários.» - Ac. da RC de de 16.01.2018, p. 2918/16.0T8LRA.C1.
(sublinhado nosso)
Cfr., ainda, no sentido da responsabilização dos bancos e da actividade bancária, numa perspetiva mais lata, vg. por virtude do dever de informação, cfr. os Acs. do STJ de 10.01.2013, p. 89/10.4TVPRT.P1.S1 e de 17.03.2016, p. 70/13.1TBSEI.C1.S1 e os Acs. da RC de 16.01.2018 e de 23.01.2018, ps. 3906/16.1T8VIS.C1 e 4327/16.1T8VIS.C1.
5.2.3.
No concernente à falta de contacto com o cliente, e no que se refere à não prova de que
«É prática habitual nas diversas instituições bancárias contactar o titular da conta quando ocorrem operações bancárias como as descritas em 5 e 6”» e quanto à inexistência de preceito legal que tal imponha, valem aqui, mutatis mutandis, as considerações supra referidas.
Ademais, tal contacto, ou a tentativa do mesmo, pelas razões supra aludidas – ser um terceiro a movimentar quantias muito elevadas - impunha-se, ou, ao menos, era aconselhável.
E o facto de o alegado mandante já ter falecido não retirava utilidade a tal diligência, antes pelo contrário.
Na verdade, se a ré disso tivesse conhecimento, maior cuidado deveria assumir na concessão da movimentação das verbas depositadas através de mero procurador que nem sequer era herdeiro.
Antes devendo, em princípio, rejeitar a movimentação, e inteirar-se de todas as possíveis decorrências do decesso do falecido, designadamente no que tange à validade e eficácia do instrumento que lhe foi apresentado.
5.2.4.
Finalmente no atinente à falta do registo informático da autenticação da procuração.
Não está em causa que a omissão deste requisito acarreta a invalidade do instrumento.
É evidente que este vício, como requisito ad substantiam do título, acarreta a sua invalidade/nulidade – artº 220º do CC.
E apresenta-se também óbvio que um documento inválido é ineficaz e não produz quaisquer efeitos.
Decorrentemente, ipso facto, a presente procuração nunca poderia fundamentar o direito do procurador, ademais abusivo e falso, a qualquer movimento de verbas das contas em causa, ou à prática de qualquer ato nela plasmado.
Falece, pois, a interpretação da recorrente no sentido de que tal vício não teria influência no desfecho prático do caso; teria, se fosse detetado, como deveria ter sido.
E, por este último motivo, mais uma vez falha o raciocínio da insurgente.
É que na sentença não se lhe imputou a responsabilidade por via direta da invalidade da procuração.
Antes ela lhe foi assacada por ela não ter vislumbrado tal invalidade; ou seja, a decisão move-se, ainda e apenas, no âmbito da violação pelo banco dos seus deveres de zelo e cuidado na perscrutação da regularidade e veracidade, formal e substancial, do instrumento em causa.
O que claramente ressuma do seguinte trecho decisório: «Entendemos, por isso, que um funcionário bancário medianamente diligente no cumprimento das suas obrigações, não poderia ter deixado de analisar os requisitos externos dos documentos que lhe foram exibidos, mormente o termo de autenticação da procuração que lhe foi apresentada, podendo facilmente concluir que a mesma não obedecia aos requisitos legais e, por aí, não ter permitido, sem mais, a realização das operações bancárias que foram feitas…»
É claro que a invalidade não obviava ao recebimento da procuração pela C (…).
Mas o problema coloca-se a jusante: recebida esta – e, nunca é demais repetir, ex vi das avultadas quantias pretendidas movimentar – deveria ela diligenciar pela pratica dos aludidos atos omitidos, um, ou mais, dos quais, levaria(m), em termos de normalidade, à conclusão de que alguma coisa estava errada com a procuração.
Sendo que, a partir daí, seria possível trilhar um caminho/desenvolver um processo de averiguações o qual certamente desembocaria na conclusão sobre a sua inveracidade, e, consequentemente, no impedimento da pratica do facto ilícito efetivado.
Diga-se ainda que o facto ora provado por este tribunal ad quem não assume força e dignidade bastante para alterar os dados da equação e acarretar a conclusão final sobre a incúria da recorrente.
Levasse ou não levasse o conhecimento de depósito, o procurador não deixava de ser um terceiro, pelo que a idoneidade da procuração, instrumento único ou fulcral que lhe permitia a movimentação das contas, sempre teria de ser confirmada nos termos sobreditos.
5.2.5.
Finalmente, a imputação da culpa, pela recorrente, aos lesados.
Diz ela que estes «…não diligenciaram pela comunicação rápida ao Banco do falecimento do seu familiar e não procederam ao arresto das contas do J (…) para garantir o ressarcimento das quantias que entendiam ter sido por este indevidamente levantadas…»
Mas dos factos provados não pode concluir-se pela emergência de qualquer juízo de censura aos autores por atuação tardia nas aludidas vertentes.
Entre a morte do O (…) e a movimentação das verbas medeou apenas um mês.
Este lapso de tempo, só por si e desacompanhado de quaisquer outras circunstancias, não é o bastante para se concluir por qualquer laxismo censurável por banda dos demandantes.
Sendo certo que, inclusive, eles nem sequer eram parentes diretos do falecido mas antes colaterais no quarto grau, facto este que até poderá ter dificultado a perceção de todo o circunstancialismo respeitante ao de cujus e, assim, retardado uma atuação tendente à escalpelização/apuramento de tudo o que girou em torno da sua vida e situação económico financeira.

Improcede o recurso.

6.
Sumariando- artº 663º nº7 do CPC
I - Apurado, em função de prova pericial, que a assinatura aposta numa procuração não o foi pelo punho do mandante, não pode dar-se como provado, não obstante tal constar em termo de autenticação da mesma, elaborado por advogada, que aquele compareceu pessoalmente no escritório desta e assinou na sua presença tal instrumento.
II - O banco que admite o levantamento da quantia de 75 mil euros e, três dias depois, a transferência de mais 285 mil euros, por terceiro, falso procurador, sem cuidar de averiguar da regularidade/validade da procuração, vg. confrontando a assinatura do mandante nela constante com a existente na ficha de assinaturas, tentando contactar com este – assim vindo a saber que já tinha falecido -, e não se apercebendo que o termo de autenticação dela efectuado por uma advogada não tinha sido registado informáticamente, como exigido pelo artº 38º nº3 do DL 76-A/2006 de 29.03, assume uma postura omissiva culposa e, assim, responsabilizante.

7.
Deliberação.
Termos em que se acorda negar provimento ao recurso e, consequentemente, confirmar a sentença.

Custas pela recorrente.

Coimbra, 2018.06.12.


Carlos Moreira ( Relator )
Moreira do Carmo
Maria João Areias