Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
376/11.4PBVIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ORLANDO GONÇALVES
Descritores: PROVA TESTEMUNHAL
PROVA POR RECONHECIMENTO
Data do Acordão: 11/06/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 1º JUÍZO CRIMINAL DO TRIBUNAL JUDICIAL DE VISEU
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGO 147º CPP
Sumário: O auto de reconhecimento pode ser valorado na sua integralidade, em audiência de julgamento, mesmo que o arguido, objeto do reconhecimento, se tenha remetido ao silêncio.
Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra.

       Relatório

            Pelo 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Viseu, sob acusação do Ministério Público, foram submetidos a julgamento em processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, os arguidos

A... , solteiro, pugilista, nascido a 04/03/1993, na freguesia de (...), em Viseu, filho de (...) e residente na (...), em Viseu,

 B... , nascido a 05/04/1984, na freguesia de (...), Viseu, filho de (...) e de (...) e residente na (...), Viseu,

 C..., Solteira, nascida a 12/07/1988, na freguesia de (...), em Viseu, filha de (...) e de (...) e residente na (...), Viseu,

D... , solteira, desempregada, nascida a 01/08/1973, na freguesia da (...), em Coimbra, filha de (...) e de (...) e residente na (...), em Viseu,

imputando-se-lhes, nos autos de inquérito nº 376/11.4PBVIS , a prática de factos pelos quais teriam cometido:

- o arguido A..., em concurso real, três crimes de roubo, p. e p. pelo art.º 210, n.º 1 do C.P., sendo dois como autor material e um em co-autoria e um crime de coacção grave, na forma tentada, p. e p. pelo art.º 154, n.º 1, 155, n.º 1, al. a) e 22.º, todos do C.P.;

- o arguidos B..., C... e D... , em co-autoria, um crime de roubo, p. e p. pelo art.º 210, n.º 1 do C.P.

           

Ao arguido A..., ainda, no âmbito do inquérito nº 762/11.0TAVIS (apensado aos presentes autos), a prática de factos pelos quais teria cometido um crime de detenção de arma proibida, p. e p. no art.86.º, n.º 1, c) da Lei nº5/2006 de 23 de Fevereiro, revista pela Lei 17/2009 de 6 de Maio, por referência ao art.3º, n.º2, l) e u) da referida Lei; e

no âmbito do inquérito nº 751/11.4GCVIS, (apensado aos presentes autos), a prática de factos pelos quais teria cometido, em concurso real, dois crimes de violação de domicílio, p. e p. pelo art.190.º, n.ºs 1 e 3 do  Código Penal.

            Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Colectivo, por acórdão de 10 de Abril de 2013, decidiu julgar as acusações do Ministério Público, umas parcialmente procedentes por provada e outras não provadas e, consequentemente:                       

 Condenar o arguido A...:

- Como autor material da prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1 do CP, na pena de um (1) ano e dez (10) meses de prisão (roubo respeitante aos factos dados como assentes em I);

- Como autor material da prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º1 do CP, na pena de dois (2) anos e dois (2) meses de prisão (roubo respeitante aos factos dados como assentes em III);

- Em cúmulo jurídico condenar o arguido na pena única de dois (2) anos e dez (10) meses de prisão;

- Nos termos do artigo 50.º do Código Penal suspender-lhe a execução da pena de prisão aplicada por igual período de tempo;

- Determinar, nos termos dos arts. 52.º, n.º1, al.a) e 3, 53.º, n.º3 e 54.º, todos do C.Penal, que a suspensão da execução da pena do arguido, seja acompanhada de regime de prova, assente num plano individual de readaptação social, executado com vigilância e apoio, durante o tempo de duração da suspensão, dos serviços de reinserção social;

Absolver o mesmo arguido da prática como co-autor de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º1 do  Código Penal;

Absolver o arguido A... da prática de um crime de coacção grave, na forma tentada, p. e p. pelo art.154.º, n.º 1, 155.º, n.º 1, al. a) e 22.º, todos do C.P.;

Absolver o arguido A... da prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. no art.86.º, n.º1, c) da Lei n.º5/2006 de 23 de Fevereiro, revista pela Lei 17/2009 de 6 de Maio, por referência ao art. 3.º, n.º2, l) e u) da referida Lei.

Absolver o arguido A... da prática de dois crimes de violação de domicílio, p. e p. 190.º, n.ºs 1 e 3 do CP,

            Condenar a arguida C..., como co-autora da prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º1, na pena de dois anos (2) de prisão;

- Nos termos do artigo 50.º do Código Penal suspender-lhe a execução de tal pena de prisão aplicada à arguida, por igual período.

   Condenar a arguida D..., como co-autora da prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º1, na pena de um (1) ano e dez (10) meses de prisão;

- Nos termos do artigo 50.º do Código Penal suspender-lhe a execução de tal pena de prisão aplicada à arguida, por igual período.

 Condenar o arguido B..., como co-autor material da prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º1 do CP, na pena de dois (2) anos e oito (8) meses de prisão.

Julgar o pedido de indemnização civil, parcialmente procedente e, consequentemente, condenar os arguidos C..., D... e B..., solidariamente, a pagarem a G..., a quantia de 550€ (quinhentos e cinquenta euros); e

            Absolver o arguido A... do pedido de indemnização civil contra ele formulado.

 

           Inconformado com a douta sentença dela interpôs recurso o arguido B..., concluindo a sua motivação do modo seguinte:

1 - Hoje, ao contrário do que sucedia na vigência do C.P.P. de 1929 é obrigatório uma motivação que não pode limitar-se a uma mera remissão genérica para os meios de prova.

2 - Actualmente, com os princípios que presidem ao Estado de Direito democrático é obrigatório indicar os motivos de facto (que não são os factos, nem os meios de prova) sob pena de, não se entendendo nem procedendo assim, se estar a violar o disposto no art. 374.º, n.ºs 2 e 210.º, n.º1 do C.R.P.

3 - O acto de julgar tem a sua essência na operação intelectual da formação da convicção, a qual não é pura e simplesmente logico-dedutiva, nos termos da lei, a partir de dados objectivos para uma formulação logico-intuitiva. Ora,

4 - Não foi produzida prova no sentido de que, por qualquer forma o arguido/recorrente roubou o que quer que fosse ao ofendido, agrediu o ofendido ou injuriou o ofendido.

5 - A factualidade vertida nos n.ºs 9 a 17 no que se refere ao ora recorrente devia ter sido pura e simplesmente julgada não provada.

6 - As concretas provas que impõem, decisão diversa são as declarações do ofendido que se encontram gravadas e transcritas nos autos.

7 - Tais declarações foram prestadas em sede de audiência, sob juramento e sujeitas a contraditório.

8 - Das mesmas resulta inequivocamente - conforme repetidamente declarou o ofendido - que o recorrente não teve qualquer intervenção, tendo entrado e saído logo, não havendo sequer rigorosamente nada que permita concluir que estivesse a actuar em conjugação de esforços com outros.

9 - A isto acresce que o processo penal exige que toda a prova deve ser produzida em audiência de julgamento com observância do princípio do contraditório.

10 - Não foi produzida qualquer prova no sentido de que o recorrente cometeu o crime de que vem acusado.

11 - O recorrente não prestou declarações, aconteceu o mesmo com as arguidas D... e C... e o arguido A... negou os factos (nesta parte).

12 -  Por sua vez, sobre os mesmos apenas prestou declarações o ofendido G... que, no que se refere ao recorrente disse que não teve qualquer intervenção.

13 - Sempre e em qualquer caso se afigura ao recorrente que mesmo que não tivesse sido assim o depoimento do ofendido seria insuficiente, no caso concreto, para sustentar e poder dar-se como provada a matéria da acusação.

14 - Não obstante saber-se que o Tribunal pode formar a sua convicção com base num único depoimento, mesmo do ofendido, o certo é que o Tribunal não explicitou as razões do seu convencimento.

15 - O Tribunal socorreu-se exclusivamente de declarações do ofendido que nem sequer foram prestadas na sua presença e sem contraditório e desvalorizou as outras do mesmo ofendido prestadas para memória futura perante um juiz e com contraditório.

16 - Assim, os concretos meios de prova que impõem decisão diversa sobre a matéria de facto, são a total falta de prova, ou prova do contrário como resulta das declarações do ofendido.

17 - Deve o douto Acórdão ser revogado e, em consequência, decretar-se a absolvição do recorrente, quanto ao ilícito que lhe é imputado, bem como do pedido de indemnização civil.

18 - a) Foi violado, por erro de aplicação e interpretação, o disposto nos arts.13.º, 15.º 127.º e 137.º do C. Penal, nomeadamente porque, não obstante o princípio da livre apreciação da prova, a mesma deve ser apreciada de acordo com as regras da experiência, sendo que no caso concreto, há elementos que impõem que a decisão seja no sentido da absolvição como se defende.

       b) Foram também violados os preceitos contidos no art. 410.º, n.º 2 do CPP que impõe que a motivação da matéria de facto deve ser tal que, intraprocessualmente, permita aos sujeitos processuais e ao tribunal superior o exame do processo lógico ou racional que lhe subjaz, pela via do recurso, bem ainda o art. 210.º, n.º 1 da C.R.P. que dispõe no mesmo sentido.

            Também a arguida C..., inconformada com o douto acórdão dele interpôs recurso, concluindo a sua motivação do modo seguinte:

1.ª - A sentença recorrida “fundamentou” a decisão proferida sobre a matéria de facto exclusivamente nas declarações do ofendido.

2.ª - Porém, o Tribunal a quo apenas a deveria condenar se para além das declarações da assistente houvesse outros meios de prova que sustentassem a Acusação.

3.ª - A recorrente tem presente o princípio da livre apreciação da prova, mas é jurisprudência assente que a livre ou íntima convicção do juiz não poderá nunca ser puramente subjectiva ou emotiva e, por isso, há-de ser fundamentada, racionalmente objectivada e logicamente motivada, de forma a susceptibilizar controlo.

4.ª - Com o respeito devido, a valoração do depoimento do ofendido, nos termos em que foi feito pelo Tribunal a quo, é manifestamente insuficiente para ter levado à condenação da recorrente, dado que só por si, sem quaisquer outros meios de prova, não pode ser havida como racionalmente objectivada nem logicamente motivada.

5.ª - O Tribunal a quo, ao ter decidido exclusivamente com base nas declarações da assistente/ofendida, violou o princípio da presunção de inocência da arguida, consagrado no art. 32°, n° 2, da C. R. P..

6.ª - Tal princípio significa, no plano processual probatório, que toda a decisão condenatória deve ser precedida de uma mínima mas suficiente actividade probatória, impedindo a condenação sem provas.

7.ª - Tal princípio é também um princípio de prova, segundo o qual um non liquet na questão de prova, deve ser sempre valorado a favor do arguido.

8.ª -Tendo em conta as declarações divergentes do ofendido e na ausência de outros meios de prova, dever-se-ia ter resolvido a favor da recorrente.

9.ª - Perante a insuficiência de prova supra referida, a decisão recorrida violou o disposto nos art°s. 374°, n° 2, do C. P. P., o que acarreta a nulidade da sentença, nos termos do art°. 379°, n° 1, al. a), do C. P. P., que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos.

10.ª - Deverá, por isso, ser proferido acórdão que absolva a recorrente do crime pelo qual foi condenada e do pedido cível contra ela formulado.

11.ª -Ao decidir como decidiu, a douta decisão violou, entre outros, o disposto nos art°s. 32°, n° 2, da C. R. P.; art°s. 143°, n° 1, 181°, n°4, do C. P.; art°s. 127°, 374°, n° 2, e 379°, n° 1, al. a), do C. P. P.; e art°. 483° e 562° e ss. do C. C..

Nestes termos, deverá o presente recurso ser recebido, julgado procedente e, por via disso, ser proferido douto acórdão que revogue a douta decisão nos termos supra referidos.

O Ministério Público na Comarca de Viseu respondeu ao recurso interposto pelos arguidos, pugnando pelo não provimento dos recursos e confirmação da decisão recorrida.

            O Ex.mo Procurador-geral adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido de que o recurso deverá improceder, mantendo-se integralmente a decisão recorrida.

            Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º 2 do C.P.P., tendo os arguidos respondido ao douto parecer, concluindo nos termos consignados nos respectivos recursos.

            Colhidos os vistos, cumpre decidir.

     Fundamentação

            A matéria de facto apurada e respectiva motivação constantes do acórdão recorrido é  a seguinte:

Factos Provados:

                        I
1) No dia 6 de Março de 2011, no Café (...) junto à Rotunda Cibernética, nesta cidade de Viseu, entre as 7H30 e as 8H00, ao ver H...e a pagar uma cerveja e um Ice Tea, o arguido A... apercebeu-se que o mesmo tinha na sua carteira várias notas de € 20,00.
2) Com intenção de se apropriar de tal dinheiro, o arguido A... aproximou-se de H...convidando-o a ter sexo com uma suposta brasileira, o que este aceitou.
3) Dirigiram-se, então até ao n.º (...) da Rua (...), tendo o ofendido constatado a presença no 2.º andar de C....
4) À entrada do prédio o arguido A... disse em tom intimidativo a H...e para lhe dar o dinheiro que tinha na carteira porque “tinha uma pistola escondida na parte de trás do corpo e que lhe dava um tiro num minuto”, causando grande receio no ofendido, tendo o arguido logo de seguida retirado do interior da carteira que o arguido trazia na mão a quantia de € 400,00 que levou consigo, fazendo seu o referido dinheiro, pondo-se de imediato em fuga.
5) O ofendido solicitou a presença da PSP que de imediato se dirigiu ao local.
6) Na altura o arguido disse a H...e que se chamava I..., tendo-lhe entregue o papel junto aos autos a fls. 22.

7) Ao actuar conforme descrito o arguido agiu com a intenção de fazer seu o dinheiro, como efectivamente fez, bem sabendo que agia contra a vontade do proprietário do mesmo e que ao intimidá-lo com a expressão mencionada em 4) o obrigava a entregar o dinheiro, usando para o efeito de violência, bem sabendo que a sua conduta, da forma como actuou, impossibilitava a vítima de resistir e de o impedir de se apoderar de tais montantes.
8) Agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
         II)
9) No dia 22 de Março de 2011, cerca das 10H20, quando o ofendido G..., se encontrava no café (...), situado na Rua (...), nesta cidade, a arguida D..., aproximou-se do mesmo e perguntou-lhe se “queria dar uma queca” com a sua sobrinha, arguida C... que se encontrava à janela de um andar.
10) Então, e perante a resposta afirmativa do ofendido, a arguida C... desceu à rua, tendo a mesma recebido de G... como pagamento antecipado a quantia € 20,00.
11) De seguida, deslocaram-se os dois ao 3.º andar do n.º (...) da R. (...), onde a arguida C... disse a G... que colocasse o preservativo, o que aquele fez.
12) Subitamente, o arguido B... e um outro indivíduo de identidade não apurada entraram no quarto e de imediato começaram a agredir o ofendido G... com murros na face, tendo um desses murros atingindo-o no olho esquerdo, provocando-lhe as lesões descritas no exame médico de fls. 133 e 134 dos autos, nomeadamente equimose violácea circular com cerca de 3x4 cm com envolvimento palpebral superior e inferior do olho esquerdo, as quais foram causa directa e necessária de 12 dias de doença, com 4 dias de afectação da capacidade de trabalho geral e sem afectação da capacidade de trabalho profissional, ao mesmo tempo que o indivíduo de identidade não apurada ainda o apelidava de “filho da puta” e “cabrão”.
13) Posteriormente, o arguido B... saiu para o exterior, enquanto o outro indivíduo permaneceu no interior do quarto, e após ter dito em tom agressivo: “Dá cá tudo o que tens”, retirou do pulso do braço direito do ofendido uma pulseira em ouro, no valor de € 450,00, obrigando-o, ainda, a entregar-lhe € 40,00 que trazia na carteira.
14) Após, este indivíduo disse-lhe, ainda, em tom intimidativo: “se dizes alguma coisa e fores à polícia eu “limpo-te o sebo”.

15) Os arguidos B..., D..., C... e o indivíduo de identidade não apurada ao actuarem como descrito, actuarem de comum acordo, segundo um plano pré estabelecido, e em conjugação de esforços, bem sabendo que agiam contra a vontade do ofendido, e que ao agredi-lo, usando para o efeito da força física e da violência, o obrigavam a entregar os bens em causa.

16) Agiram com intenção de se apropriarem dos seus bens, o que concretizaram, bem sabendo que as suas condutas, da forma como actuaram, impossibilitavam a vítima de resistir e de os impedir de se apoderaram de tais bens.

17) Actuaram de forma livre, voluntaria e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e puídas por lei.
                        III
18) No dia 2 de Agosto de 2011, cerca da 1H30, o arguido A... pediu a E... para lhe dar boleia até à rua das (...), nesta cidade de Viseu e depois até ao bar denominado (...), na zona do Instituto Politécnico de Viseu.
19) Na deslocação até ao referido bar, tiveram um acidente no veículo de que resultaram danos na roda direita dianteira, motivo porque o veículo ficou imobilizado.
20) E... pretendia telefonar à sua filha e ao seu genro para o virem ajudar, tendo o arguido A... lhe dito que não havia necessidade uma vez que tinha um amigo ali perto que rapidamente o ajudaria.
21) Deslocaram-se, então, para uma rua sem saída uns metros à frente do referido Bar, local onde o arguido A... começou a agredir o ofendido a murro, tendo-lhe retirado com um puxão o fio em ouro que este trazia ao pescoço, num valor não concretamente apurado, mas superior a 150€, levando-o consigo, fazendo-o seu, pondo-se de seguida em fuga.
22) Com a sua conduta o arguido A... provocou no ofendido E... as lesões descritas e examinadas a fls. 101 e 102 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, nomeadamente, traumatismo da hemiface esquerda e da região dorsal, as quais foram causa directa e necessária de 10 dias de doença, sem afectação da capacidade para o trabalho geral e profissional.

23) O arguido ao actuar da forma acima descrita, agiu com intenção de fazer seu o mencionado fio, como efectivamente fez, bem sabendo que agia contra a vontade do proprietário do mesmo e que ao agredi-lo o obrigava a entregar o mesmo, usando para o efeito da força e da violência, bem sabendo que a sua conduta, da forma como actuara, impossibilitava a vítima de resistir e de o impedir de se apoderar de tal bem.
24) Agiu de forma livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram punidas e proibidas por Lei Penal.

                        IV

25) No dia 11 de Maio de 2011, cerca das 04h30, no parque de estacionamento da Esquadra da PSP de Viseu, no interior do veículo Opel Vectra, de matricula (...), que o arguido tinha acabado de conduzir, entre a abertura do tejadilho e a plataforma de acesso ao mesmo pelo interior do veículo encontrava-se uma arma de alarme, de marca Tanfoglio, modelo GT 27, com calibre 6,35mm, com um cano de 6,3 cm liso, com capacidade para seis tiros e carregamento semi-automático, modificada e em mau estado de conservação.

26) No mesmo local encontrava-se, ainda, um carregador com duas munições de 6,35mm, em bom estado de conservação.

27) O arguido à data dos factos não era titular de qualquer licença de uso e porte de arma.

                        V

28) - O arguido A... foi condenado:

- no PS nº 732/11.8PBVIS, do 2º Juízo criminal de Viseu, por sentença transitada em julgado em 17.6.2011, na pena de 80 dias de multa, à taxa de 5€, por factos de 11.5.2011, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p.p.p artigo 3º do DL 2/98 de 3 de Janeiro; 

- no PS nº 184/11.2GTVIS, do 1º Juízo criminal de Viseu, por sentença transitada em julgado em 10.9.2011, na pena de 120 dias de multa, à taxa de 7€, por factos de 3.7.2011, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p.p.p artigo 3º do DL 2/98 de 3 de Janeiro; 

29) O arguido A... na altura dos factos não exercia qualquer actividade, auferindo cerca de 180€ de RMI;

30) Tem 9 irmãos, com os quais não tem qualquer relacionamento;

31) A mãe está presa;

32) Tem o 9º ano de escolaridade.

33) O arguido B... foi condenado:

- No PS nº 7/02.3PTVIS, do 1º Juízo criminal de Viseu, por sentença transitada em julgado em 25.2.2002, na pena de 130 dias de multa, à taxa de 4€, por factos de 9.2.2012, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p.p.p artigo 3º do DL 2/98 de 3 de Janeiro;

- No PCC nº 184/01.0GCVIS do 1º Juízo Criminal de Viseu, por acórdão transitado em 1.7.2003, na pena de 2 anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, por factos de 21.3.2001, pela prática de um crime de furto qualificado, p.p.p artigo 204 do CP, tendo a suspensão da pena sido revogada;

- No PCC nº 6/05.3PEVIS do 2º Juízo Criminal de Viseu, por acórdão transitado em 17.7.2006, na pena de quatro anos e oito meses de prisão, por factos de 6.1.2006, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p.p.p artigo 21º , nº1 do DL 15/93, de 22 de Janeiro, tendo-lhe sido concedida a liberdade condicional em 4/3/2011, terminando a mesma em 10.6.2013;

- No PS nº 164/06.0GTVIS, do 1º Juízo criminal de Viseu, por sentença transitada em julgado em 11.9.2006, na pena de 200 dias de multa, à taxa de 4€, por factos de 21.7.2006, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p.p.p artigo 3º do DL 2/98 de 3 de Janeiro; 

- PCS nº 996/06.9 PBVIS, do 2º Juízo criminal de Viseu, por sentença transitada em 28/11/2007, na pena de 190 dias de multa, à taxa de 5€, por factos de 2.8.2006, pela prática, em concurso real de um crime de ameaça, p.p.p artigo 153, nº1 e 2 do CP e um crime de injúrias, p.p.p artigo 181, nº1 e 184 do CP;

 - No PS nº 201/06.8GTVIS, do 1º Juízo criminal de Viseu, por sentença transitada em julgado em 3.3.2008, na pena de dois meses de prisão, por factos de 8.8.2006, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p.p.p artigo 3º do DL 2/98 de 3 de Janeiro.

34) O arguido B... à data dos factos estava desempregado e recebia o RMI.

35) Tem o12º ano e um curso de electricidade e informática.

 36) Antes de detido residia com a arguida C... de quem tem uma filha de dois meses.

37) Pagavam 230 euros de renda por mês.

38) A arguida C... foi condenada no PCS nº 390710.7 PBVIS, do 2º Juízo Criminal de Viseu, por sentença transitada em julgado em 18.5.2012, por factos de 22/3/2010, na pena de 100 dias de multa, à taxa de 5€, pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p.p.p artigo 143º do CP.

39) Recebe um subsídio de cerca de 400 a título de RMI.

40) Tem a 3ª classe.

41) Não exerce qualquer actividade.

42) Do CRC da arguida D... não constam quaisquer antecedentes.

43) É doméstica.

44) Recebe 200 euros a título de RMI.

45) Vive com o companheiro que é desempregado.

46) Vive em casa arrendada, pagando 200 euros por mês de renda.

47) Tem a 4ª classe.

            Factos não provados

Para além dos factos mencionados outros não se provaram, nomeadamente:

            - Que o outro individuo mencionado nos factos relatados em II seja o arguido A....
- Que relativamente a este episódio a arguida C... se tenha deslocado ao estabelecimento denominado “ X...Penhores, Ld.ª” onde recebeu pela penhora da pulseira que haviam subtraído ao ofendido G..., por outra pulseira, um anel e um fio, tudo em ouro, a quantia de € 477,50.
- Que no dia 4 de Setembro, o arguido A... tenha telefonado a E... dizendo-lhe em tom intimidativo que retirasse a queixa que apresentou, tendo de seguida afirmado que quando o apanhasse o matava, causando receio no ofendido.
- Que o arguido A... ao telefonar para o ofendido E... da forma acima descrita, pretendia dessa forma intimidá-lo, criando-lhe receio de que atentasse contra a sua vida caso não desistisse da queixa que apresentou, bem sabendo que a sua conduta era adequada a causar receio no ofendido, como efectivamente causou, de que ele viesse a concretizar o mal anunciado.

            - Que o arguido conhecesse as características da arma que foi apreendida na viatura Opel Vectra, nomeadamente que era modificada;

            - Que tal arma fosse sua ou que tenha sido por si ali colocada;

            - Que o arguido soubesse que a mesma se encontrava naquele local;

            - Que soubesse que a mesma não podia ser nem manifestada nem licenciada;

            - Que o arguido quisesse mantê-la em seu poder e transportá-la consigo no automóvel Opel Vectra que conduzia.

- Que neste contexto tenha agido voluntária, livre e conscientemente, sabendo que a sua conduta era prevista e punida por lei penal.

            - Que o arguido A... nos dias 12 e 15 de Agosto de 2011 se tenha, introduzido na habitação sita na Rua (...), Viseu, tendo para tal, nomeadamente partido uma porta de alumínio, causando danos no valor de €500,00 e que ali tenha pernoitado.

            - Que tenha agido com intenção de se introduzir na residência do ofendido, nomeadamente por meio de arrombamento das portas de alumínio, contra a vontade deste, o que era do seu conhecimento.

            - Que tenha actuado de forma livre, voluntária e consciente bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei. 

            Convicção do Tribunal

            A convicção do Tribunal estribou-se na totalidade da prova produzida, a qual depois de conjugada entre si e analisada de acordo com as regras da experiência permitiu ao Tribunal responder à mesma.

            Desde logo, no que tange aos factos dados como provados em I) (1 a 8) o Tribunal teve em conta a confissão do arguido A..., que confessou em audiência de julgamento a factualidade em causa, apenas mencionado que não se recordava do montante retirado.

            Contudo, em audiência de julgamento foi inquirida a testemunha H..., ofendido que confirmou em causa, bem como o montante subtraído, 400€.

            O Tribunal valorou, ainda o escrito junto a fls. 22.

            Por fim valorou ainda o depoimento da testemunha F..., agente da PSP em Viseu e que confirmou a deslocação ao local, bem como a localização da residência da arguida C....


*

            No que tange aos factos dados como provados em II (9 a 17) o Tribunal teve em conta a totalidade da prova produzida, a qual depois de conjugada entre si, tendo sempre em conta as regras da experiência permitiu ao Tribunal concluir conforme a factualidade dada como assente, e isto, não obstante os arguidos B..., C... e D... se terem remetido ao silêncio.
Desde logo, para a fixação da matéria de facto em causa o Tribunal teve em conta os autos de reconhecimento de fls. 186 e 187 dos autos, em que o ofendido G..., logo após os factos, reconheceu, para além de toda a dúvida, quer fotograficamente, quer pessoalmente, o ora arguido B... como sendo um dos indivíduos que entrou no quarto onde se encontrava, desferindo-lhe um murro na face, colocando-se de seguida em fuga.
Cumpre mencionar que o reconhecimento fotográfico é válido na medida em que foi seguido de reconhecimento pessoal, motivo pelo qual pode ser valorado.
Por seu turno, o reconhecimento pessoal obedeceu aos pressupostos do artigo 147 do CPP, pelo que, igualmente, pode ser valorado.
Assim, desses autos extrai-se, desde logo, a intervenção do arguido B... nos factos.
Desse auto, como mencionado, extrai-se que o arguido B... entrou no quarto onde se encontrava o ofendido com a C... (companheira do B...) e desferiu-lhe um murro na face, retirando-se de seguida, sendo que quando inquirido em declarações para memoria o futura o ofendido voltou a confirmar que o arguido B... entrou no quarto com outro individuo, quando se encontrava no interior do mesmo com a arguida C....
De facto, nessa declarações, o ofendido confirmou que entraram dois rapazes no quarto quando se encontrava no interior do mesmo, identificando um deles como sendo o arguido B... (presente nas declarações para memória futura ao contrário do arguido A...), apesar de referir que este, na altura, não disse, nem fez nada, tendo ficado na entrada na porta, retirando-se do quarto quando o outro indivíduo lhe batia e retirava os objectos.
Acontece que logo após os factos (cerca de 7 dias depois), como mencionado, foi elaborado um auto de reconhecimento, em que o ofendido reconheceu o arguido B... como sendo um dos indivíduos que o agrediu, dando-lhe, segundo o mesmo, um murro na face, ausentando-se de seguida.

            É certo que quando inquirido em declarações para memória futura (onde se encontrava presente o arguido B..., mas já não o arguido A...), o ofendido mencionou que o arguido B... apesar de ter aparecido no quarto com outro indivíduo não lhe bateu, saindo do mesmo, tendo sido o outro que lhe bateu e retirou os objectos.

            Perante tal depoimento, e depois de confrontado pelo Senhor Juiz se se lembrava do reconhecimento, disse que sim, não tendo dado qualquer justificação para a circunstância de ter reconhecido o B... como sendo um dos indivíduos que o agrediu, sendo que quando inquirido pelo Ministério Publico, nas mesmas declarações, voltou a mencionar que reconheceu o arguido B..., quer fotograficamente, quer pessoalmente (cfr. fls. 33 das declarações para memória futura).
            Acresce ainda que o ofendido deixou bem claro nas declarações para memória futura que o arguido B... também entrou no quarto apesar de não confirmar que o mesmo não o agrediu.
Acontece que não há nada nos autos que nos permita concluir, ou sequer desconfiar, que o ofendido estivesse influenciado por o que quer que fosse aquando do reconhecimento.
Como mencionado do auto de reconhecimento resulta, não só que o arguido B... entrou no quarto com o outro indivíduo, mas, ainda, que agrediu o ofendido, não obstante de seguida se ter retirado. A isto acresce a circunstância do reconhecimento ter sido feito logo após os factos, altura em que o declarante, certamente, teria a sua memória muito mais fresca, sabendo o ofendido que, apesar de estar a ver as pessoas, nomeadamente o arguido, estas não o viam.

            Ora, perante isto, não obstante as declarações prestadas em memória futura, o Tribunal valorou os autos de reconhecimento, os quais apreciou nos termos mencionados, concluindo dos mesmos que o arguido B... entrou no quarto e agrediu o ofendido com uma bofetada, retirando-se de seguida.

            Aliás, as declarações para memória futura do ofendido, tendo em conta o contexto em que foram realizadas, na presença do arguido B..., mas já não na presença do outro indivíduo que alegadamente teria actuado em conjunto com o arguido B..., não nos parecem, analisando as mesmas detalhadamente, completamente livres, sendo, perfeitamente plausível a existência de algum receio em face da presença do arguido, e daí o facto de ter tentado culpar apenas o ausente, não obstante ter continuado a referir que o B... entrou no quarto com o outro individuo.

            Contudo, tal não invalida que o Tribunal valore o auto de reconhecimento nos termos mencionados, o qual atento o exposto nos parece que traduz a realidade e se encontra corroborado por outros elementos de prova, nomeadamente pelo próprio depoimento da testemunha que sempre foi dizendo que reconheceu o arguido B... e que este entrou no quarto.

            No que tange à intervenção das arguidas D... e C... nos factos a mesma resulta bem clara das declarações prestadas pelo ofendido G..., nomeadamente a fls. 19 e seguintes.

            Nessa declarações o ofendido mencionou que no café (...) na Rua (...) onde conversou com a arguida D... (a qual identifica e cuja morada consta dos autos), que se ofereceu para ter relações sexuais com ele, oferecendo, ainda a sua sobrinha para tal, tendo-lhe perguntado, a certa altura, se queria dar uma queca com a sobrinha que estava à janela. Também mencionou que a sobrinha (que identificou como sendo a arguida C...) estava à janela do prédio situado ao lado do café e que desceu à Rua, tendo acordado ter relações sexuais com ela pelo preço de 20€, preço esse já previamente combinado com a arguida D..., que entregou à C....

            Mencionou, ainda, que subiu para o quarto com a C... e que esta o mandou colocar o preservativo, o que fez, sendo que a C... nunca chegou a tirar a roupa, continuando vestida. Que quando estava com o preservativo colocado apareceram no quarto duas pessoas o arguido B... e outro indivíduo, sendo que posteriormente apareceu, ainda, a arguida D.... Confirmou, ainda, que indivíduo que não estava presente nas declarações, e que acompanhava o arguido B..., lhe bateu, nomeadamente com murros e lambadas, ao mesmo tempo que dizia a “minha mulher, a minha mulher”. Nesse contexto, perguntou-lhe ainda o que “tens aí, retirando-lhe a pulseira de ouro, que valia 450 € e 40 € em dinheiro (cfr. fls. 12 e seguintes). Com interesse, também referiu que o outro indivíduo o chamou “filho da puta” e “cabrão”, referindo, ainda, que lhe limpava o “sebo” , caso fosse à polícia.

            Também esclareceu que tinha levantado 60€ e que, como já tinha entregue 20 € à arguida C..., o valor que posteriormente foi retirado foram os 40€.  

            Toda esta prova, depois de conjugada entre si e valorada de acordo com as regras da experiência, permitiu ao Tribunal concluir conforme factualidade assente, nomeadamente que os arguidos actuaram em conjugação de esforços, apesar do arguido B... se ter ausentado para o exterior, enquanto o individuo não apurado retirava os objectos ao ofendido.

            De facto, juntando todas as peças a única conclusão lógica que se impõe é a que consta da factualidade dada como assente, sendo que, igualmente resultou da prova produzida que a arguida C... é companheira do arguido B..., sendo o 3º andar do nº (...), precisamente a residência da arguida D..., o que nos foi confirmado em audiência de julgamento pelo arguido A....

            Aliás, não é por acaso que a arguida D... oferece a arguida “ C...” para se relacionar sexualmente, na medida em que esta não só é mais nova como mais “graciosa”, e que esta, por seu turno, está, precisamente, à janela da residência da D..., para onde sobe com o ofendido a quem manda colocar um preservativo, apesar da mesma continuar vestida. Ora, é precisamente, neste contexto, com o ofendido de calças em baixo, com o preservativo colocado e com a arguida vestida, que aparecem, precisamente, o arguido B..., companheiro da C..., e o outro individuo, seguidos da arguida D..., agredindo os dois primeiros o ofendido, retirando-se o B... para o exterior, quando o arguido A... retira os objectos, o que é perfeitamente plausível nomeadamente para efeitos de vigilância do local, se tivermos em conta que os factos ocorreram num prédio.

            Perante tudo isto, igualmente nos parece perfeitamente lógico concluir que o estratagema utilizado era atrair as vítimas com o argumento do relacionamento sexual com uma das arguidas, neste caso a arguida C..., aparecendo os outros indivíduos, nomeadamente o arguido B..., companheiro da arguida C..., quando a vítima se encontrava com a arguida, para desta forma lhe retiraram os objectos de valor que a mesma possuísse.

            Assim, outra conclusão não se impõe do que aquela que os arguidos e o tal individuo actuaram em conjugação de esforços, não obstante a repartição de tarefas (uns atraem a vitima e outros agridem e retiram os objectos).

            Não há dúvida que o princípio de livre apreciação da prova pressupõe que a convicção a que o Tribunal chegou resultou de um procedimento lógico e coerente de valoração, não podendo, nunca, resultar de qualquer arbítrio na apreciação da prova.

            O tribunal, como mencionado valorando os elementos de prova mencionados e seguindo um raciocínio lógico de acordo com as regras da vida, concluiu como mencionado, com a certeza jurídica exigida em sede de julgamento.

            O Tribunal valorou, ainda, o relatório pericial de fls. 132 no que tange aos danos sofridos pelo ofendido.


*

            Relativamente aos factos dados como provados em III (13 a 24), o Tribunal teve em conta a confissão do arguido A..., que confessou em audiência de julgamento a factualidade em causa, mencionando, no entanto não saber o valor do cordão em ouro.

            Além disso, em audiência de julgamento foi inquirida a testemunha, E..., ofendido, que confirmou a factualidade em causa, mencionando, no entanto, que não sabia qual era o valor do cordão, mas apenas que o mesmo tinha de peso trinta e um gramas.

            Perante tal, o Tribunal concluiu que apesar de não se saber o valor concreto, o mesmo seria sempre superior a 150€, tendo em conta os gramas de ouro em causa.

            O tribunal teve ainda em conta a perícia de fls. 101 dos autos, no que tange aos danos sofridos pelo ofendido.


*

            No que tange aos factos dados como provados em IV o Tribunal teve em conta o auto de apreensão de fls. 12 do inquérito nº 762 /11.0TAVIS, bem como os depoimentos prestados pelas testemunhas J...e L..., agentes da PSP, que estiveram na apreensão em causa e que a confirmaram.

            Dos mencionados autos resulta, ainda que o arguido não era titular de licença de uso e porte de arma, o que, aliás, é confirmado pelo mesmo.

            O tribunal teve, ainda, em conta o auto de exame e avaliação de fls. 15 dos autos nº 762/11.0TAVIS.

            Relativamente aos antecedentes criminais dos arguidos o Tribunal teve em conta os CRC juntos aos autos.

            No que tange às condições pessoais dos arguidos o Tribunal teve em conta as declarações dos mesmos.


**

            O Tribunal deu como não provados os factos mencionados uma vez que a prova produzida sobre os mesmos foi insuficiente ou mesmo inexistente, para permitir outra resposta.

            O Tribunal não deu como provado que o arguido A..., no que tange aos factos dados como provados em II, fosse o outro indivíduo.

            De facto, sobre este episódio o arguido A..., em audiência de julgamento negou peremptoriamente a sua intervenção.

            Os restantes arguidos não prestaram declarações.

            Por seu turno, o ofendido nas declarações para memória futura não identificou o arguido A... como o outro indivíduo na medida em que o mesmo não esteve presente.

            Assim, resta o reconhecimento fotográfico de fls. 185 dos autos, o qual não pode ser valorado, nos termos do artigo 147.º do CPP, uma vez que não foi seguido de reconhecimento pessoal (nº 5 e 7 do citado artigo).

            Perante tal, em relação a este arguido, o Tribunal teve que dar como não provada a sua intervenção.
Igualmente não se provou que a arguida C... se tenha deslocado ao estabelecimento denominado “ X...Penhores, Ld.ª” onde recebeu pela penhora da pulseira que haviam subtraído ao ofendido G..., por outra pulseira, um anel e um fio, tudo em ouro, a quantia de € 477,50, uma vez que a pulseira cujo fotografia se encontra junta a fls. 182 não corresponde à pulseira subtraída ao ofendido G....

            É certo que documento junto a fls. 243 resulta que a arguida C... no dia 23 de Março, um dia após os factos, deu de penhor duas pulseiras em ouro. Contudo, o Tribunal, sem outros elementos, nomeadamente auto de apreensão, não pode concluir que uma dessas pulseiras é a pulseira subtraída ao ofendido. Há indícios de tal, no entanto não existe certeza, podendo, eventualmente ser outro, ainda mais que no mesmo dia é dado de penhor duas pulseiras, um fio e um anel. 
O Tribunal deu como não provado que no dia 4 de Setembro, o arguido A... tenha telefonado a E... dizendo-lhe em tom intimidativo que retirasse a queixa que apresentou, tendo de seguida afirmado que quando o apanhasse o matava, causando receio no ofendido, uma vez que o arguido A... nega tal factualidade e o ofendido E... não a confirma.

            No que tange ao episódio da arma apreendida no Opel Vectra o Tribunal não deu como provado que o arguido soubesse que a mesma se encontrava nessa viatura, nomeadamente que tal arma fosse sua e tivesse por si sido aí colocada.

            De facto, em relação a este episódio o arguido A... afirmou desconhecer que a arma aí se encontrava, negando que tal arma fosse sua.

            Acontece que sobre esta questão foram inquiridas as seguintes testemunhas:

- M..., que se encontra de relações cortadas com o arguido e que referiu ter sido ele a chamar a PSP, pelo facto do arguido A... se encontrar a conduzir a viatura Opel, apesar de não ter carta.

            - L..., agente da PSP, que mencionou que foram chamados ao local pela testemunha M... que referia que o A... andava armado e a conduzir sem carta. Que perante isto, e no local, fizeram uma revista à viatura, onde não encontraram qualquer arma, sendo que o carro estava estacionado.

            Mencionou, ainda, a testemunha, que passado pouco tempo viram o arguido A... a conduzir o Opel e como sabiam que o mesmo não tinha carta levaram-no para a esquadra, tendo a viatura ficado estacionada em frente ao mesmo e que quando se encontravam a fazer o expediente receberam um telefonema a denunciar a circunstância do A... ter uma arma no carro, que se encontrava no tecto de abrir, no tejadilho.

Com interesse a testemunha afirmou, ainda, que anteriormente tinham feito a revista à viatura e não viram qualquer arma, sendo que se a mesma estivesse no local onde a encontraram, quando conduziram a viatura para a esquadra, com o movimento tinham de se aperceber da arma, pois a mesma teria de andar de um lado para o outro, no tecto de abrir. Mencionou, também, que depois do telefonema voltaram à viatura e encontraram a arma no local mencionado na denúncia, ou seja no tecto de abrir que estava entreaberto.

A testemunha conclui que para ele a arma foi aí colocada por alguém, e isto quando a viatura já estava estacionada em frente à PSP, sendo possível, uma vez que o tecto estava entreaberto, colocá-la naquele local por fora da viatura.           

            - J..., agente principal da PSP, que igualmente se deslocou ao local e que prestou um depoimento idêntico ao da testemunha anterior, acrescentando que na altura em que receberam o telefonema e se deslocaram ao exterior depararam-se com a presença da testemunha M..., que andava ali de um lado para o outro. Também esta testemunha levantou a hipótese da arma lá ter sido colocada, já depois da viatura se encontrar na esquadra, e isto com a intenção de incriminar o arguido A....

            Perante estes depoimentos dúvidas ficaram sobre a forma como a arma foi parar à viatura, e sobre a intervenção do arguido, motivo pelo qual se deu como não provada a factualidade menciona, sob pena de violação do princípio “in dúbio pró reo”.

            Finalmente o Tribunal não deu como provado que o arguido A... nos dias 12 e 15 de Agosto de 2011 se tenha, introduzido na habitação sita na Rua (...), Viseu, tendo para tal, nomeadamente partido uma porta de alumínio, causando danos no valor de €500,00 e que ali tenha pernoitado e que tenha agido com intenção de se introduzir na residência do ofendido, nomeadamente por meio de arrombamento das portas de alumínio, contra a vontade deste, o que era do seu conhecimento.

            De facto, o arguido a este respeito, apesar de reconhecer ter estado naquela residência, sem precisar, no entanto, os dias mencionou que a irmã tinha um contrato de arrendamento com o Sr N... e que, quando se mudou para a Alemanha, como a renda estava paga até finas de Agosto, entregou-lhe as chaves, tendo sido neste contexto que chegou a ocupar a mencionada residência, negando que tenha arrombado as portas.

            Por seu turno, a testemunha N..., proprietário da casa, confirmou ter arrendado a mesma à irmã do arguido A..., sendo que ao lado deste apartamento situa-se um outro de um seu irmão, onde residiram os arguidos B... e C....

            Confirmou, ainda, que a irmã do A... deixou a casa, apesar de lhe ficar a dever uns meses, sendo que o arguido B..., posteriormente lhe entregou as chaves da casa, mencionando que a irmã do arguido lhas entregou a ele. A testemunha mencionou ainda que no dia em que o B... lhe entregou as chaves apercebeu-se que a porta da varanda estava arrombada, tendo-lhe sido dito pelo B... e pela C... que quem tinha arrombado a porta tinha sido o arguido A..., o qual tinha lá entrado várias vezes.

            Ora, esta prova deixou dúvidas ao Tribunal, desconhecendo, nomeadamente o Tribunal até quando vigorou o contrato de arrendamento que a testemunha teve com a irmã do arguido, nomeadamente se estava em vigor quando o arguido A... entrou na residência, sendo certo que este reconhece ter aí entrado, pela porta e com a autorização da irmã, embora não confirme que foi nas datas mencionadas na acusação.

            Além disso, aquilo que a testemunha sabia sobre a actuação do A... foi-lhe transmitido pelos arguidos B... e C..., o que nos deixa algumas dúvidas, nomeadamente porque resultou da prova produzida em audiência, nomeadamente das declarações do arguido A... que, apesar de inicialmente serem todos amigos, tendo nomeadamente residido todos juntos, em determinada altura zangaram-se, tendo o arguido A... apresentado queixa contra o arguido B....

            Perante, isto, e tendo em conta que sobre a residência em causa existiu um contrato de arrendamento com a irmã do arguido A..., o Tribunal ficou com dúvidas sobre o contexto em que o arguido se introduziu na residência em causa e quando, motivo pelo qual deu como não provada a factualidade em causa, sob pena, mais uma vez, de violação do principio “ in dúbio pró reo”, ao que acresce a circunstância de, não obstante o arguido A... admitir ter entrado naquela residência, não admitiu ter sido nos dias constantes da acusação.


 *

                                                                              *
                                                  
O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação. ( Cfr. entre outros , os acórdãos do STJ de 19-6-96 [1] e de 24-3-1999 [2] e Conselheiros Simas Santos e Leal Henriques , in Recursos em Processo Penal , 6.ª edição, 2007, pág. 103).
São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar [3], sem prejuízo das de conhecimento oficioso .

No caso dos autos, face às conclusões da motivação do arguido B... as questões a decidir são as seguintes :

- se o acórdão recorrido padece da falta de fundamentação da matéria de facto dada como provada nos pontos n.ºs 9 a 17; e

- se, no que se refere ao ora recorrente, foi incorrectamente julgada a factualidade dada como provada nos pontos n.ºs 9 a 17 do acórdão recorrido, pois devia ter sido dada como não provada, pelo que o arguido/recorrente deve ser absolvido do crime e do pedido cível pelos quais foi condenado.

As questões objecto de recurso por parte da arguida C..., que resultam das conclusões da motivação do seu recurso, são, por sua vez, as seguintes:

- se o Tribunal a quo ao dar como provada a factualidade constante dos pontos n.ºs 9 a 17 do acórdão recorrido violou o princípio da presunção de inocência da arguida;

- se o acórdão é ainda nulo, nos termos dos artigos 374.º, n.º2, 379.º, n.º1 , alínea a) do C.P.P., pelo que se impõe a sua absolvição do crime e do pedido cível contra si formulado.


-

            Recurso do arguido B...

            Passemos ao conhecimento da primeira questão.

O recorrente B... defende que o acórdão recorrido padece de falta de fundamentação e de exame crítico da prova relativamente à matéria de facto constante dos  pontos n.ºs 9 a 17, porquanto e em síntese, não obstante saber-se que o Tribunal pode formar a sua convicção com base num único depoimento, mesmo do ofendido, o certo é que o Tribunal a quo não explicitou as razões do seu convencimento de que o ora recorrente roubou o que quer que fosse ao ofendido e que o agrediu ou o injuriou.

Foram assim violados pelo Tribunal a quo, em face das conclusões da motivação, os artigos 374.º, n.º2  e 210.º, n.º1 do C.R.P..

Já da motivação do recurso do arguido resulta que da falta de fundamentação e do exame crítico da prova resulta que terão sido violados os artigos 374.º, n.º2 do CP e 210.º, n.º1 do C.P.P.

Antes de entrar directamente na apreciação da questão importa clarificar a manifesta confusão que o arguido faz, quer nas conclusões da motivação, quer na motivação do recurso, sobre os diplomas a que pertencem os preceitos pretensamente violados.

É evidente que, em face da questão suscitada pelo recorrente, o art.374.º, n.º2 só pode dizer respeito ao C.P.P. , ou seja, ao Código de Processo Penal e não ao “C.R.P.” – que normalmente é associado ao Código do Registo Predial – , nem ao C.P. – que é associado ao Código Penal.    

Pelos mesmos motivos, também é evidente que o art.210.º, n.º1 do “C.R.P.”, o art. 210.º, n.º1 do “C.P.P.” ou o art.210.º, n.º1 da “C.R.P.”, que o recorrente invoca, só pode respeitar ao art.210.º, n.º1 do Código Penal, ou seja, ao crime de roubo pelo qual foi condenado, pois o Código do Registo Predial não tem duzentos e dez artigos, o art.210.º do C.P.P. respeita ao “inêxito de diligências para aplicação da prisão preventiva” e o art.210.º da Constituição da República Portuguesa respeita à organização do Supremo Tribunal de Justiça e instâncias.
Posto isto, diremos que a necessidade de fundamentação das decisões dos tribunais, que não sejam de mero expediente, tem consagração no art.205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, e insere-se nas garantias de defesa de processo criminal a que alude o art.32.º, n.º 1 do mesmo diploma fundamental.

A fundamentação da sentença e a sua falta tem tratamento específico na lei processual penal, estatuindo o art.379.º, alínea a), do Código de Processo Penal, que é nula a sentença que não contiver as menções referidas no art.374.º, n.º 2 do mesmo Código.

O art.374.º, n.º 2 do Código de Processo Penal estabelece que , na elaboração da sentença , ao relatório segue-se a fundamentação, «…que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição, tanto quanto possível completa , ainda que concisa , dos motivos de facto e de direito , que fundamentam a decisão , com indicação e exame critico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.». 
A exigência do exame crítico das provas é um aditamento levado a cabo pela Lei n.º 59/98 de 25 de Agosto, na sequência de jurisprudência que se vinha formando sobre essa necessidade, nomeadamente pelo STJ, que interpretou aquele dever de fundamentação no sentido de que a sentença - para além de dever conter a indicação dos factos provados e não provados e a indicação dos meios de prova - há-de conter também os elementos que , em razão das regras de experiência ou de critérios lógicos , constituíram o substrato racional  que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse no sentido de considerar provados e não provados os factos da acusação , ou seja , um exame critico sobre as provas que concorrem para a formação da convicção do Tribunal num determinado sentido.[4]
Neste sentido, se pronunciava ainda o Tribunal Constitucional, declarando inconstitucional a norma do n.º 2 do art.374.º do C.P.P. na interpretação segundo a qual a fundamentação das decisões da matéria de facto se bastava com a simples enumeração dos meios de prova utilizados na 1ª instância, não exigindo a explicitação do processo de formação da convicção do tribunal, por entender ser violado o dever de fundamentação das decisões dos tribunais previsto no n.º1 do art.205.º da Constituição da República Portuguesa, bem como quando conjugada com a norma das alíneas b) e c) do n.º2 do art.410.º do mesmo Código , por violação do direito ao recurso consagrado no n.º1 do art.32.º da Constituição da República Portuguesa.[5]

Para o Prof. Germano Marques da Silva o objectivo de tal dever de fundamentação é imposto pelos sistemas democráticos, permitindo “ a sindicância da legalidade do acto , por uma parte , e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correcção e justiça, por outra parte , mas é ainda um importante meio para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, actuando  por isso  como meio de autodisciplina .” - Cfr. Curso de Processo Penal” , Vol. III, 2ª ed. , pág. 294.

O art.374.º, n.º 2 do Código de Processo Penal não exige, porém, que seja sempre feita menção específica na sentença ao conteúdo das declarações do arguido e de todas as testemunhas. O que deve constar dela é a parte relevante das declarações e depoimentos tidos como relevantes para a formação da convicção do Tribunal.

Como diz o Tribunal Constitucional, «Com o dever de fundamentação das decisões judiciais, a Constituição não impõe, na verdade, um modelo único de fundamentação, com descrição ou, ainda mais, transcrição, de todos os depoimentos apresentados no julgamento, ou a menção do conteúdo de cada um deles. Estes depoimentos, mesmo quando são depoimentos da arguida e das testemunhas de defesa, podem, com efeito, não ter sido decisivos para a formação da convicção do tribunal, podendo então bastar que o tribunal indique aqueles que o foram.».[6]

No caso em apreciação, o Tribunal a quo consignou na motivação da matéria de facto do acórdão  recorrido que teve em consideração, para dar como provada a factualidade constante dos pontos n.ºs 9 a 17, no que respeita ao arguido B..., os autos de reconhecimento de folhas 186 e 187, parte das declarações para memória futura prestadas pelo ofendido G..., parte das declarações do arguido A... e o relatório pericial de folhas 132, tudo conjugado com as regras da experiência comum.
Para além de indicar os meios de prova que serviram para formar a sua convicção, o Tribunal a quo procedeu ainda ao exame crítico dessas provas, deixando claro o papel fulcral que nessa tarefa tiveram os autos de reconhecimento de folhas 186 e 187, porquanto os mesmos foram validamente realizados e neles o ofendido G..., logo após os factos, reconheceu, para além de toda a dúvida, quer fotograficamente, quer pessoalmente, o ora arguido B... como sendo um dos indivíduos que entrou no quarto onde se encontrava, desferindo-lhe um murro na face, colocando-se de seguida em fuga.
No âmbito do exame crítico das provas o Tribunal a quo considerou ainda, em síntese, que das declarações para memória futura resulta que o ofendido G... confirmou que entraram dois rapazes no quarto quando se encontrava no interior do mesmo, identificando um deles como sendo o arguido B... (presente nas declarações para memória futura ao contrário do arguido A...). O mesmo ofendido declarou que se encontrava de calças em baixo, com o preservativo colocado e a arguida vestida, quando apareceu o arguido B... e outro individuo, seguidos da arguida D..., mas que o arguido B... se retirou do quarto, tendo sido o outro individuo que lhe bateu e retirou os objectos. Mais referiu que o dito individuo, enquanto lhe batia, mencionou, designadamente, “ minha mulher, a minha mulher” e que lhe limpava o “sebo” caso fosse à polícia.”.
Foi confirmado, em audiência de julgamento, pelo arguido A..., que a arguida C... é companheira do arguido B....

O ofendido confrontado pelo Senhor Juiz , aquando das declarações para memória futura, se se lembrava do reconhecimento, disse que sim, não tendo dado qualquer justificação para a circunstância de ter reconhecido o B... como sendo um dos indivíduos que o agrediu, sendo que quando inquirido pelo Ministério Publico, nas mesmas declarações, voltou a mencionar que reconheceu o arguido B..., quer fotograficamente, quer pessoalmente.

Perante isto, não obstante as declarações prestadas em memória futura, o Tribunal a quo valorou os autos de reconhecimento, concluindo dos mesmos que o arguido B... entrou no quarto e agrediu o ofendido com uma bofetada, retirando-se de seguida.
Conjugando os autos de reconhecimento, com as circunstâncias em que o ofendido G... foi convidado pela arguida D... a ter relações sexuais com a arguida C... na residência daquela, o comportamento da C... ao não se despir, a súbita entrada do arguido B... e do outro individuo no quarto da residência da arguida D..., e as lesões do ofendido físicas descritas no relatório pericial de folhas 132, conclui o Tribunal a quo, resultar das regras da experiência comum que os arguidos actuaram em conjugação de esforços, apesar do arguido B... se ter ausentado para o exterior, certamente para vigilância, enquanto o outro individuo retirava os objectos ao ofendido.      

Deste modo, tendo a decisão recorrida indicado os meios de prova que serviram para formar a convicção do tribunal e examinado criticamente os mesmos, possibilitando ao Tribunal de recurso, bem como aos restantes sujeitos processuais, entender em termos lógicos e racionais, a razão pela qual o Tribunal a quo formou a sua convicção no sentido de dar como provados os factos que constam do acórdão nos pontos n.ºs 9 a 17, consideramos que foi realizada a necessária indicação e exame crítico das provas que serviram para firmar a convicção do Tribunal e, assim, que o acórdão recorrido não padece, quanto à decisão da matéria de facto, da nulidade a que alude o art. 379.º, n.º 1, alínea a) do C.P.P.
Assim, improcede esta primeira questão.

            Segunda questão: se, no que se refere ao ora recorrente, foi incorrectamente julgada a factualidade dada como provada nos pontos n.ºs 9 a 17 do acórdão recorrido, pois devia ter sido dada como não provada e o arguido/recorrente absolvido do crime e do pedido cível pelos quais foi condenado.

O arguido B... defende que aquela matéria de facto não resultou provada, alegando para este efeito e em síntese o seguinte: o ora recorrente não prestou declarações, aconteceu o mesmo com as arguidas D... e C... e o arguido A... negou os factos (nesta parte).

Sobre os mesmos factos apenas prestou declarações o ofendido G... que, no que se refere ao recorrente disse que não teve qualquer intervenção.

O Tribunal socorreu-se exclusivamente de declarações do ofendido constantes dos autos de reconhecimento, que não foram prestadas na sua presença e desvalorizou as outras do mesmo ofendido prestadas para memória futura perante um juiz e com contraditório, e que estando gravadas ora se transcrevem.

Foi violado, por erro de aplicação e interpretação, o disposto nos arts.13.º, 15.º 127.º e 137.º do C. Penal, nomeadamente porque, não obstante o princípio da livre apreciação da prova, a mesma deve ser apreciada de acordo com as regras da experiência, e no caso concreto, há elementos que impõem que a decisão seja no sentido da absolvição. Foram também violados os preceitos contidos no art. 410.º, n.º 2 do CPP que impõe que a motivação da matéria de facto deve ser tal que, intraprocessualmente, permita aos sujeitos processuais e ao tribunal superior o exame do processo lógico ou racional que lhe subjaz, pela via do recurso, e bem ainda o art. 210.º, n.º 1 da “C.R.P.” – terá querido dizer do Código Penal - que dispõe no mesmo sentido.

Mais uma vez começamos por mencionar que a referência aos artigos 13.º, 15.º 127.º e 137.º do  Código Penal, têm pouco sentido, tanto mais que os artigos 15.º e 137.º respeitam aos crimes negligentes.

Eventualmente, art.127.º mencionado pelo recorrente respeitará ao  Código de Processo Penal.    

Retomando o fundo da questão, diremos que o arguido B... ao impugnar a matéria de facto dada como provada nos pontos n.ºs 9 a 17 da decisão recorrida, sustenta, por um lado, que o acórdão padece dos vícios do art.410.º, n.º2 do Código de Processo Penal e, por outro, que existe erro de julgamento, requerendo a reapreciação das declarações do ofendido que se encontram gravadas e que transcreveu no recurso.

Uma vez que a impugnação da matéria de facto pode realizar-se através de dois meios, ou seja , pelos vícios a que alude o art.410.º, n.º 2 do Código de Processo Penal ou através do disposto nas várias alíneas do art.431.º do mesmo Código, invocando o arguido B... simultaneamente os dois meios de impugnação da matéria de facto, iremos ter ambos em consideração.
O art.410.º n.º 2 do Código de Processo Penal estatui que mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito , o recurso pode ter por fundamento , desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida , por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
     a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada ;
     b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão ; ou 
     c) O erro notório na apreciação da prova .

Uma vez que os vícios do art.410.º, n.º 2, do C.P.P. têm de resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugados com as regras da experiência comum, sem que seja possível a consulta de outros elementos constantes do processo na decisão sobre a sua verificação, é evidente que é a partir da fundamentação da sentença, designadamente da motivação da matéria de facto, que se podem detectar os vícios a que alude o preceito.

 Com este sentido subscrevemos a afirmação do recorrente de que o art. 410.º, n.º 2 do C.P.P.  impõe que a motivação da matéria de facto deve ser tal que, intraprocessualmente, permita aos sujeitos processuais e ao tribunal superior o exame do processo lógico ou racional que lhe subjaz, pela via do recurso.

No caso em análise o arguido/recorrente não específica de qual dos aludidos vícios padece a decisão recorrida.
O vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, previsto na al. a) do n.º2 do art. 410.º do C.P.P., existe quando da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem dados e elementos para a decisão de direito, considerando as várias soluções plausíveis, como sejam a condenação (e a medida desta) ou a absolvição (existência de causas de exclusão da ilicitude ou da culpa), admitindo-se, num juízo de prognose, que os factos que ficaram por apurar, se viessem a ser averiguados pelo tribunal a quo através dos meios de prova disponíveis, poderiam ser dados como provados, determinando uma alteração de direito.

A insuficiência para a decisão da matéria de facto existe se houver omissão de pronúncia pelo tribunal sobre factos relevantes e os factos provados não permitem a aplicação do direito ao caso submetido a julgamento, com a segurança necessária a proferir-se uma decisão justa.[7]
No caso em apreciação os factos dados como provados nos pontos n.ºs 9 a 17 do acórdão  recorrido permitem a aplicação segura do direito ao caso submetido a julgamento, com o preenchimento pelo arguido dos elementos constitutivo do crime de roubo de que vem acusado pelo Ministério Público, e do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, não se vislumbram factos que ficaram por apurar.
O vício da contradição existirá quando se afirmar e negar ao mesmo tempo uma coisa. Duas proposições contraditórias não podem ser , ao mesmo tempo , verdadeiras e falsas.
“Só existe, pois, contradição insanável da fundamentação quando, de acordo com um raciocínio lógico, seja de concluir que essa fundamentação justifica uma decisão precisamente oposta ou quando, segundo o mesmo tipo de raciocínio, se possa concluir que a decisão não fica esclarecida de forma suficiente, dada a colisão entre os fundamentos invocados”.[8]

O vício da contradição insanável entre a fundamentação e a decisão, elencado na alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do C.P.P., não se verifica quando o resultado a que o juiz chegou na sentença advém, não de qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão, mas da subsunção legal que entendeu melhor corresponder aos factos provados. 
No caso em análise não existe qualquer contradição, e menos ainda insanável, entre a factualidade dada como provada nos pontos n.ºs 9 a 17 e a fundamentação, designadamente da matéria de facto ou entre aquela fundamentação e a decisão condenatória, pelo que não se reconhece a existência do vício a que alude a al.b), n.º2 do art.410.º do C.P.P..
Por fim, o erro notório na apreciação da prova, a que alude a al.c), n.º2 do art.410.º do C.P.P., consiste num vício de apuramento da matéria de facto, que prescinde da análise da prova produzida para se ater somente ao texto da decisão recorrida, por si ou conjugado com as regras da experiência comum.
No dizer dos Juízes Conselheiros Leal-Henriques e Simas Santos, o erro notório na apreciação da prova existe “...quando se retira de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável, quando se dá como provado algo que notoriamente está errado, que não podia ter acontecido, ou quando, usando um processo racional e lógico, se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória, ou notoriamente violadora das regras da experiência comum, ou ainda quando determinado facto provado é incompatível ou irremediavelmente contraditório com outro dado facto (positivo ou negativo) contido no texto da decisão recorrida”. [9]
No caso em apreciação, o arguido impugna, nas conclusões da motivação e na motivação do recurso, matéria de facto dada como provada, mas não o faz apenas a partir do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, pois tem em consideração também prova produzida oralmente nas declarações para memória futura cuja reapreciação requer  ao Tribunal de recurso.
A impugnação da matéria de facto efectuada nestes termos não se confunde com o vício em questão, uma vez que aquela não se limita ao texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum.
Por outro lado, analisando o texto da decisão recorrida, nomeadamente a fundamentação da matéria de facto, e as referências que na mesma são feitas às declarações do ofendido para memória futura, conjugadas com as restantes provas indicadas a este propósito, não vemos que o Tribunal recorrido, ao dar como provada a matéria de facto impugnada pelo recorrente, tenha seguido um raciocínio ilógico, arbitrário ou contraditório, por si só ou conjugado com as regras da experiência comum, de onde se possa concluir pela existência de um erro notório na apreciação da prova.
Não se tem, pois, também, por verificado este vício, nem qualquer dos outros a que alude o n.º2 do art.410.º, do Código de Processo Penal.

Importa agora apreciar se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de facto dada como provada nos pontos n.ºs 9 a 17 da sentença recorrida.

Nos termos do art.431.º do Código de Processo Penal, sem prejuízo do disposto no art.410.º,  o tribunal de recurso poderá modificar a matéria de facto fixada em 1.ª instância, se se verificarem as seguintes condições:
  « a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que lhe serviram de base;
     b) Se a prova tiver sido impugnada nos termos do n.º 3 do art.412.º; ou
     c) Se tiver havido renovação de prova.”.
A situação prevista na alínea a), do art.431.º, do C.P.P. está excluída quando a decisão recorrida se fundamenta, não só em prova documental, pericial ou outra que consta do processo, mas ainda em prova produzida oralmente em audiência de julgamento. 
Também a possibilidade de modificação da decisão da 1.ª instância ao abrigo da al.c) do art.431.º, do C.P.P., está afastada quando não se realizou audiência para renovação da prova neste Tribunal da Relação, tendo em vista o suprimento dos vícios do art.410.º, n.º 2 do C.P.P..
A situação mais comum de impugnação da matéria de facto é a que respeita à alínea b) do art.431.º do C.P.P. e foi a utilizada pelo recorrente para impugnar a matéria de facto.
Esta alínea b) do art.431.º do C.P.P., conjugada com o art.412.º, n.º3 do mesmo Código, impõe ao recorrente, quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o dever de especificar:

  « a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados ;

     b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;
     c) As provas que devam ser renovadas

O n.º 4 deste art.412.º, acrescenta que «Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do art.364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que funda a impugnação

O recorrente deverá indicar a sessão de julgamento em que as declarações ou depoimentos constam e localizar a passagem em causa na gravação, entre os minutos em que produziu prova oralmente, de modo a deixar claro qual a parte da declaração ou depoimento que se quer que o Tribunal de recurso ouça ou aprecie.

O STJ, pelo acórdão de fixação de jurisprudência n.º 3/2012, decidiu, sobre esta matéria, que « Visando o recurso a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, basta, para efeitos do disposto no artigo 412.º, n.º 3, alínea b), do CPP, a referência às concretas passagens/enxertos das declarações que, no entendimento do recorrente, imponham decisão diversa da assumida, desde que transcritas, na ausência de consignação na acta do início e termo das declarações.».
Nos termos do n.º 6 do art.412.º do C.P.P., o tribunal procede à audição ou visualização das passagens indicadas e, ainda, de outras que considere relevantes para a descoberta da verdade e a boa decisão da causa.

No presente caso, o arguido B... especifica, nas conclusões da motivação, os pontos de facto que consideram incorrectamente julgados e as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, mas já não indica as concretas passagens em que funda a impugnação e a localização da passagem na gravação.
O recorrente indica, porém, na motivação do recurso, a localização, na acta das declarações para memória futura das passagens das declarações do ofendido, transcreve os respectivos segmentos, pelo que o Tribunal da Relação considera que o mesmo deu cumprimento mínimo ao estabelecido no art.412.º, n.ºs 3, al. b) e 4 do C.P.P.. e, por uma questão de economia processual, mesmo sem convite ao aperfeiçoamento das conclusões da motivação, julga-se apto a modificar a matéria de facto fixada pelo Tribunal a quo, se concluir pela existência de erro de julgamento.
Antes de passar ao conhecimento directo da questão, importa realçar que a documentação da prova em 1ª instância tem por fim primeiro garantir o duplo grau de jurisdição da matéria de facto, mas o recurso de facto para o Tribunal da Relação não é um novo julgamento em que a 2ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada como se o julgamento ali realizado não existisse. É antes, um remédio jurídico destinado a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros.
A garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto exige uma articulação entre o Tribunal de 1ª Instância e o Tribunal de recurso relativamente ao principio da livre apreciação da prova, previsto no art. 127.º do Código de Processo Penal, que estabelece que “Salvo quando a lei dispuser de modo diferente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.”.

As normas da experiência, a que se deve atender na apreciação da prova, são «...definições ou juízos hipotéticos de conteúdo genérico, independentes do caso concreto “sub judice”, assentes na experiência comum, e por isso independentes dos casos individuais em cuja observação se alicerçam, mas para além dos quais têm validade.»[10].

Quanto à livre convicção do juiz, nessa apreciação da prova, ela não pode esta deixar de ser “... uma convicção pessoal -  até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v.g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais  -  , mas em todo o caso , também ela ( deve ser) uma convicção objectivável e motivável , portanto capaz de impor-se aos outros.”[11].

Na livre apreciação da prova o juízo sobre a valoração da prova tem diferentes níveis. Observa, a este respeito, o Prof. Germano Marques da Silva, que « Num primeiro aspecto trata-se da credibilidade que merecem ao tribunal os meios de prova e depende substancialmente da imediação e aqui intervêm elementos não racionalmente ( v.g., a credibilidade que se concede a um certo meio de prova). Num segundo nível referente à valoração da prova intervêm as deduções e induções que o julgador realiza  a partir dos factos probatórios e agora já as inferências não dependem essencialmente da imediação, mas hão-de basear-se na correcção do raciocínio, que há-de fundar-se nas regras da lógica, princípios da experiência e conhecimentos científicos, tudo se podendo englobar na expressão regras da experiência.».[12]     

O princípio da livre apreciação da prova assume especial relevância na audiência de julgamento, encontrando afloramento, nomeadamente, no art.355.º do Código de Processo Penal. È ai, na audiência de julgamento, que existe a desejável oralidade e imediação na produção de prova, na recepção directa de prova e se assegura o princípio do contraditório, garantido constitucionalmente no art.32.º, n.º5.

Reportando-se aos princípios da oralidade e imediação diz o Prof. Figueiredo Dias, que « Por toda a parte se considera hoje a aceitação dos princípios da oralidade e da imediação como um dos progressos mais efectivos  e estáveis na história do direito processual penal. Já de há muito, na realidade, que em definitivo se reconheciam os defeitos de processo penal submetido predominantemente ao principio da escrita, desde a sua falta de flexibilidade até à vasta possibilidade de erros que nele se continha, e que derivava sobretudo de com ele se tornar absolutamente impossível avaliar da credibilidade de um depoimento. (...) . Só estes princípios, com efeito, permitem o indispensável contacto vivo e imediato com o arguido, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade. Só eles permitem, por outro lado, avaliar o mais correctamente possível a credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais.”.[13]

Na verdade, a convicção do Tribunal a quo é formada da conjugação dialéctica de dados objectivos fornecidos por documentos e outras provas constituídas, com as declarações e depoimentos prestados em audiência de julgamento, em função das razões de ciência, das certezas, das lacunas, contradições, inflexões de voz, serenidade e outra linguagem do comportamento, que ali transparecem.

Assim, se o recorrente impugna somente a credibilidade das declarações ou do depoimento deve indicar elementos objectivos que imponham um diverso juízo sobre a credibilidade das declarações ou depoimentos, pois aquela, quando estribada em elementos subjectivos é um sector especialmente dependente da imediação do tribunal recorrido. 

Uma vez, porém, que o princípio da livre apreciação da prova tanto vincula o tribunal de 1.ª instância como o tribunal de recurso, e que a reforma do Código de Processo Penal de 1998 deixou inequívoco que se quis assegurar um recurso efectivo da matéria de facto, o Tribunal da Relação, na reapreciação da matéria de facto a que se procede nos termos do art.412.º, n.ºs 3 e 4 do C.P.P., deve proceder a uma reapreciação autónoma sobre a razoabilidade da decisão tomada pelo Tribunal a quo quanto aos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados, avaliando se as provas indicadas por este impõem decisão diversa da recorrida.

Se o Tribunal a quo, que beneficiou plenamente da imediação e da oralidade da prova, explicou racionalmente a opção tomada, e o Tribunal da Relação entender que da reapreciação da prova resulta o acerto dessa opção sobre a matéria de facto impugnada, nos termos do art.127.º do C.P.P., deve manter a decisão recorrida.
Vejamos.

É pacífico os arguidos B..., D... e C... não prestaram declarações, remetendo-se ao silêncio, e que o arguido A... negou os factos (nesta parte).

O arguido que exerce o seu direito ao silêncio (como diz o Prof. Costa Andrade, citando Kühl), « …renuncia (faculdade que lhe é reconhecida) a oferecer o seu ponto de vista sobre a matéria em discussão, nessa medida vinculando o Tribunal à valoração exclusiva dos demais meios de prova disponíveis no processo».[14]

Resulta das declarações para memória futura e das respectiva transcrição constantes dos autos, em apenso, que a testemunha G... declarou, nomeadamente, que um dos dois rapazes que entraram no quarto era o arguido B..., mas que este não lhe fez nada, retirando-se para o exterior quando o outro rapaz lhe bateu, o injuriou e lhe tirou uma pulseira em ouro e dinheiro. 

Tal como refere o recorrente, as respostas da testemunha G... , nas declarações para memória futura, “ não são constantes”, mas, ainda assim, cremos que a testemunha ao mencionar que o arguido não lhe fez nada, não foi coerente com outras declarações que prestou na mesma altura e que conjugadas com as regras da experiência comum apontam em sentido diverso.

Note-se que a testemunha G... declarou, designadamente,  que o arguido B... e um outro rapaz entraram a correr no quarto da residência da arguida D..., numa altura em que o ofendido punha um preservativo a pedido da arguida C... o individuo que lhe bateu disse-lhe « É pá, não sei quê, estás aqui a fazer o quê? …a  minha mulher” e eu, “ mas se ela …” e eu “ então mas o que se passa aqui?”. E, depois, de dizer a minha mulher, a minha mulher “ começou-me a bater”. 

Ora, tendo sido apurado em audiência de julgamento que o companheiro da arguida C..., com quem a testemunha G... estava sozinho no quarto, é o arguido B... é razoável concluir que foi este quem, após fingir ser um homem traído, agrediu o ofendido G... conjuntamente com o outro rapaz, antes sair para o exterior do quarto - deixando lá o outro rapaz a apelidar o mesmo de “filho da puta” e “cabrão”, ao mesmo tempo que o desapossava de uma pulseira em ouro.

Perguntado à  testemunha G... sobre a conclusão que tira do que se passou, declarou esta que “ eu acho que ali havia qualquer combinação, jogo ali no meio” ; se o terão chamado para o local para o roubarem, disse “claro” e se a C... e a D... não queriam ter relações sexuais consigo, respondeu “não”.

Resulta destas declarações do ofendido, conjugadas com as regras da experiência comum e com o exame pericial, que o arguido B... agiu em comunhão de esforços com os arguidos D..., C... e o outro rapaz não identificado, para desapossar o ofendido de bens que possuía.

Não tem assim razão o recorrente que o Tribunal a quo ignorou ostensivamente as declarações do ofendido.

O Tribunal a quo não ignorou seguramente o que o ofendido G... disse; simplesmente, na parte em que este disse que o ora recorrente B... não lhe bateu, logo se retirando do quarto da D..., teve ainda em consideração uma outra prova que não pode ser esquecida: a prova por reconhecimento.

Diz o arguido/recorrente que o reconhecimento só serve para reconhecer, pelo que do auto de reconhecimento nada se pode retirar sobre a actuação do recorrente. Por outras palavras, as declarações do ofendido aquando do reconhecimento do ora recorrente não têm que ver com o reconhecimento e não têm valor. As declarações que têm valor são as prestadas pelo mesmo para memória futura, que forma sujeitas ao contraditório.

Cremos que este entendimento do arguido/recorrente B... não pode ser subscrito integralmente.

O reconhecimento é um meio de prova que « consiste na confirmação de uma percepção sensorial anterior, ou seja, consiste em estabelecer a identidade entre uma percepção anterior e outra actual da pessoa que procede ao acto.».[15]

O reconhecimento de pessoas encontra-se previsto no art.147.º do Código de Processo Penal, onde se estabelecem regras de procedimento a observar, sob pena de « …não ter valor meio de prova, seja qual for a fase do processo em que ocorrer.» ( n.º7).

O reconhecimento de pessoa não deve confundir-se com a prova testemunhal, embora nos parece medianamente claro que o reconhecimento de pessoa implica sempre uma imputação fáctica.

Clarificando esta afirmação diremos que o reconhecimento de pessoa feito em inquérito, como é aqui o caso, tem sempre subjacente um determinado comportamento que a pessoa que faz o reconhecimento imputa a alguém que não conhece.

O reconhecimento tem como pressuposto específico, que o autonomiza como meio de prova, a necessidade de individualizar uma pessoa que praticou um determinado facto dada a situação de a incerteza subjectiva.

A prova testemunhal, embora direccionada para um determinado sujeito, não visa em primeira linha o esclarecimento de uma qualquer situação de incerteza subjectiva, quanto à autoria dos factos e à identificação do agente.

Quando consta do auto de reconhecimento que o ofendido reconheceu o ora recorrente como tendo sido um dos indivíduos que entrou « no quarto onde o denunciante se encontrava, desferindo-lhe um murro na face deste e de imediato se pôs em fuga» cremos que estamos ainda no âmbito da prova por reconhecimento, e não da prova testemunhal, não podendo dissociar-se racionalmente a pessoa reconhecida da imputação fáctica.

Consequentemente, o auto de reconhecimento pode ser valorado na sua integralidade, em audiência de julgamento, mesmo que o arguido, objecto do reconhecimento, se tenha remetido ao silêncio.

Os autos de reconhecimento em causa estão integrados no processo e foram objecto de apreciação na audiência de julgamento, onde o ora recorrente teve possibilidades de os contraditar, colocando em causa o que deles consta.

Assim, entendemos que não foi violado o princípio do contraditório, consagrado constitucionalmente no art.32.º, n.º5, que no seu conteúdo essencial nos diz que nenhuma prova deve ser aceite na audiência, nem nenhuma decisão deve ser tomada pelo Juiz, sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra a qual é dirigida de a discutir, de a contestar e de a valorar.

Em suma, a versão considerada provada nos pontos n.ºs 9 a 17 do acórdão recorrido tem pleno suporte nos meios de prova produzidos, e a sua valoração, nos termos em que foi feita pelo Tribunal a quo, pese embora tenha implicado a desvalorização de uma parte das declarações para memória futura do ofendido, não revela a violação de qualquer regra da experiência comum.

O Tribunal a quo, que beneficiou da imediação da prova, expôs e explicou racionalmente, a opção tomada, e o Tribunal da Relação entende que da reapreciação da prova resulta o acerto da decisão recorrida, por em nada violar o disposto no art. 127º do C. Processo Penal, nem qualquer das outras normas indicadas pelo recorrente nas conclusões da motivação.
Improcede assim esta questão e, mantendo-se a decisão condenatória, improcede também o recurso.  

            Recurso da arguida C...

            A primeira questão a conhecer, de acordo com a ordem lógica, é a que respeita à alegada nulidade da sentença, nos termos dos artigos 374.º, n.º2, 379.º, n.º1 , alínea a) do C.P.P..

A este propósito limita-se a recorrente a alegar, quer nas conclusões da motivação, quer mais especificamente na motivação do recurso, que a sentença penal deve ser fundamentada, designadamente no que respeita à matéria de facto e que, no caso, a nulidade da sentença recorrida resulta da insuficiência da prova.

Vejamos.

A garantia do efectivo direito de defesa do arguido, incluindo o recurso, consagrada no art.32.º, n.º1, da Constituição da República Portuguesa, e a necessidade de fundamentação das decisões dos tribunais, que não sejam de mero expediente, estabelecida no art.205.º, n.º 1 da mesma Lei impõe que na sentença sejam indicados os elementos que em razão das regras da experiência comum ou de critérios lógicos constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados na audiência.

Só cumprindo o disposto no art.374.º, n.º2 do Código de Processo Penal, que dá execução na lei ordinária àqueles princípios, é que se possibilita o controlo da legalidade dos meios de prova produzidos em audiência e a adequada fiscalização do julgamento da matéria de facto feito pela 1.ª instância, onde vigora o princípio da livre apreciação da prova.

Questão diferente da fundamentação da sentença, embora com ela relacionado, é a do erro na apreciação da prova que se pode detectar dessa fundamentação, por a prova examinada criticamente ser insuficiente para dar determinados os factos como provados ou não provados.

Nesta segunda situação, em que determinada matéria de facto é dada como provada apesar da insuficiência da prova, poderá existir eventualmente o vício a que alude a al.c), n.º2 do art.410.º do C. P. , se o erro na apreciação da prova for notório e resultar da fundamentação da matéria de facto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum. O problema não está então na falta de fundamentação.

No caso em apreciação, o Tribunal a quo consignou na motivação da matéria de facto da sentença recorrida que teve em consideração, para dar como provada a factualidade constante dos pontos n.ºs 9 a 17, no que respeita a todos os arguidos, os autos de reconhecimento de folhas 186 e 187, parte das declarações para memória futura prestadas pelo ofendido G..., parte das declarações do arguido A... e o relatório pericial de folhas 132, tudo conjugado com as regras da experiência comum.

Por outro lado, resulta da apreciação crítica da mesma prova, que a arguida C..., em concertação de esforços com os arguidos D..., B... e outro individuo, atraiu o ofendido a um quarto da residência da arguida D... com o falso pretexto de que aceitava ter relações sexuais com este, quando o que pretendiam todos eles era desapossa-lo, através de violência e de ameaça, dos bens que possuísse, o que conseguiram.   

Uma vez a fundamentação da matéria de facto da sentença recorrida possibilita ao Tribunal de recurso, bem como aos restantes sujeitos processuais, entender em termos lógicos e racionais, a razão pela qual o Tribunal a quo formou a sua convicção, no sentido de dar como provados os factos que constam da sentença nos pontos n.ºs 9 a 17, consideramos que a sentença não padece, quanto à decisão da matéria de facto, da nulidade a que alude o art. 379.º, n.º 1, alínea a) do C.P.P..

Assim, improcede esta questão.

A questão seguinte é se o Tribunal a quo, ao dar como provada a factualidade constante dos pontos n.ºs 9 a 17 do acórdão recorrido, violou o princípio da presunção de inocência da arguida.

A recorrente C... defende que foi violado este princípio e ainda o disposto nos artigos  32°, n° 2, da C. R. P., os artigos 143.°, n.° 1, 181.°, n.°4, do C. P, o art.127°, do C.P.P. e o art. 483.° e 562.° e seguintes do C. C., porquanto o Tribunal  a quo condenou o recorrente exclusivamente com base nas declarações do ofendido, interessado na causa, o que constitui manifesta insuficiência de prova. O Tribunal a quo, sem pôr em causa o princípio da livre apreciação da prova, não podia ter ignorado o princípio da presunção de inocência da arguida ( princípio in dubio pro reo) e devia ter valorado o non liquet a favor da arguida.

Vejamos se assim é.

 O princípio in dubio pro reo, é um princípio relativo à prova que estabelece que na decisão de factos incertos a dúvida favorece o arguido. Ou seja, o julgador deve valorar sempre em favor do arguido um non liquet.

O mesmo decorre do princípio da presunção da inocência, consagrado no art.32.º, n.º2 da Constituição da República Portuguesa, que estatui que “ todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação”.

O Tribunal de recurso apenas pode censurar o uso feito desse principio se da decisão recorrida resultar que o tribunal a quo - e não os sujeitos processuais ou algum deles - chegou a um estado de dúvida insanável e que, face a ele , escolheu a tese desfavorável ao arguido.[16]

Se na fundamentação da sentença/acórdão oferecida pelo Tribunal, este não invoca qualquer dúvida insanável, ou, ao invés, se a motivação da matéria de facto denuncia uma tomada de posição clara e inequívoca relativamente aos factos constantes da acusação, com indicação clara e coerente das razões que fundaram a convicção do tribunal, inexiste lugar à aplicação do princípio in dubio pro reo.

Como assertivamente refere o Prof. Roxin, “o princípio não se mostra atingido quando, segundo a opinião do condenado, o juiz deveria ter tido dúvidas, mas sim quando condenou apesar da existência real de uma dúvida”.[17]
A detecção de violação do in dubio pro reo, em sede de recurso, passa pela sua notoriedade face aos termos da decisão, isto é, tal violação tem que resultar do texto da decisão e dela deve extrair-se que o juiz, tendo ficado na dúvida sobre a verificação de determinado facto desfavorável ao agente, o deu como provado.

Não é nesta perspectiva, porém, que a recorrente C... coloca a questão mas antes, na da insuficiência da prova produzida face à decisão de facto proferida, que é coisa bem diferente e para a qual a lei do processo prevê formas de reacção, como a impugnação ampla da matéria de facto, prevista no art. 412º do C. Processo Penal e o vício do erro notório na apreciação da prova, a que alude o art.410.º, n.º2, alínea c), do C.P.P..

No caso em apreciação, a factualidade dada como provada no que respeita à conduta da ora recorrente C..., como já dissemos, não resultou apenas das declarações do ofendido, nem se detecta do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, qualquer erro notório na apreciação da prova – que é de conhecimento oficioso – pelo facto das declarações do ofendido serem o principal meio de prova que suporta aquela decisão.

Por outro lado, percorrido o acórdão recorrido, não se detecta nele qualquer dúvida que tenha existido no espírito do Tribunal colectivo quanto a qualquer dos factos que consideraram provados. O que resulta da fundamentação da matéria de facto é um estado de certeza do Tribunal recorrido relativamente à prática pela arguida/recorrente dos factos dados como provados, pelo que está deste modo afastada a violação pelo Tribunal recorrido – e bem face à prova produzida – do princípio da inocência, associado ao princípio in dubio pro reo

Julgamos assim definitivamente fixada a matéria de facto, nos exactos termos em constam da decisão recorrida.

Não se reconhecendo ainda a violação pela decisão recorrida de qualquer das outras normas invocadas pela recorrente nas conclusões da motivação, importa manter a decisão recorrida e julgar improcedente esta segunda questão e, consequentemente, o recurso da arguida C....

            Decisão

       

             Nestes termos e pelos fundamentos expostos acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra em negar provimento aos recursos interpostos pelos arguidos B... e C... e, consequentemente, manter o douto acórdão recorrido.

             Custas pelos recorrentes, fixando em 4 Ucs a taxa de justiça a cargo de cada um deles (art. 513º, nºs 1 e 3, do C. P.P. e art.8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa), sem prejuízo do apoio judiciário concedido.

                                                                         *

Orlando Gonçalves (Relator)

Alice Santos


[1]  Cfr. BMJ n.º 458º , pág. 98.
[2]  Cfr. CJ, ASTJ, ano VII, tomo I, pág. 247.
[3]  Cfr. Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, Verbo, 2ª edição, pág. 350.
[4] Cfr., entre outros,  o acórdão do STJ , de 13 de Fevereiro de 1992 ( CJ, ano XVII , 1º , pág. 36) .
[5]  Cfr., entre outros, o acórdão n.º 680/98 , publicado no DR, II Série , de 5 de Março de 1995 .

[6] Cfr. acórdão n.º 27/2007, DR, 2ª Série, de 23 de Fevereiro de 2007.

[7] Neste sentido, entre outros, os acórdãos do STJ de 7/04/2010 ( proc. n.º 83/03.1TALLE.E1.S1, 3ª Secção, in www.dgsi.pt) de 6-4-2000 (BMJ n.º 496 , pág. 169) e de 13-1-1999 (BMJ n.º 483 , pág. 49) e os Cons. Leal- Henriques e Simas Santos , in “Código de Processo Penal anotado”,  vol. 2.º, 2ª ed., pág.s 737 a 739.
[8] Cfr. Cons. Leal Henriques e Simas Santos, obra citada, pág. 739.

[9] Cfr. obra citada, 2.º Vol.,  pág. 740 e, no mesmo sentido, entre outros , os acórdãos do STJ de 4-10-2001 (CJ, ASTJ, ano IX, 3º , pág.182 ) e Ac. da Rel. Porto de 27-9-95 ( C.J. , ano XX , 4º, pág. 231).

[10]   cfr. Prof. Cavaleiro de Ferreira , in “Curso de Processo Penal”, Vol. II , pág.300. 
[11]  cfr. Prof. Figueiredo Dias , “Direito Processual Penal”, 1º Vol., Coimbra Ed., 1974, páginas 203 a 205.
[12] Cfr. “Curso de Processo Penal”, Vol. II, Verbo, 5.ª edição, pág.186
[13] Obra citada, páginas 233 a 234

[14] “Sobre as proibições de prova em processo penal”, pág. 129; onde realça, ainda, que «o silêncio deve, por isso, ser tomado como a ausência pura e simples de resposta, não podendo, enquanto tal, ser levado à livre apreciação de prova. E isto (…) quer se trate de silêncio total quer, na parte pertinente, de silêncio meramente parcial.» ( páginas 128 e 129).

[15]  Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, Vol. II, pág. 256, edição Verbo, 2011.

[16] Cfr. entre outros , o acórdão do S.T.J. de 2 e Maio de 1996 , in C.J. , ASTJ , ano IV , 1º, pág. 177  .

[17] “Derecho Processal Penal”, Editores del Puerto, Buenos Aires, pág. 111.