Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
370/12.8PBLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BRÍZIDA MARTINS
Descritores: SUBSTITUIÇÃO DA PENA DE MULTA
PAGAMENTO DE MULTA A PRESTAÇÕES
TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE
REQUERIMENTO
PRAZO
Data do Acordão: 01/30/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 2.º JUÍZO DO TRIBUNAL CRIMINAL DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 489º E 490 CPP
Sumário: 1.- O prazo de pagamento da multa, quando esta for paga em prestações, decorre até se terem vencido todas as prestações;
2.- No caso de ter sido facultado o pagamento da multa em prestações, o arguido pode apresentar no decurso do seu prazo de pagamento, o pedido para substituição da pena de multa por trabalho a favor da comunidade.
Decisão Texto Integral: 1.1. No âmbito do processo sumário Que não “processo comum singular” como por lapso manifesto se mencionou no início da sentença proferida a fls. 22 e segs. supra elencado, através de sentença proferida em 13 de Abril de 2012, entretanto transitada em julgado, o arguido A..., com os demais sinais nos autos, foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, ou seja, na multa global de € 840,00.
Durante o decurso do prazo de pagamento voluntário dessa multa, cujo terminus ocorreria em 18 de Junho de 2012 [vd. fls. 40], concretamente no dia 8 de tal mês e ano, alegando nos moldes constantes de fls. 57/8, o arguido requereu o pagamento de tal multa em prestações, pedido esse deferido, pois que agora pelo despacho de fls. 71, prolatado no dia 18 de Junho de 2012, foi autorizado esse pagamento faseado em cinco prestações, cada uma no montante de € 180,00, a primeira até ao dia 15 de Julho de 2012 e as demais nos dias quinze de cada um dos meses subsequentes.
Notificado do despacho que lhe facultou este último pagamento, alegando nos termos inscritos a fls. 81/2, e ainda no dia 29 do dito mês e ano, respectivamente Junho de 2012, reiterou o arguido solicitando que a pena de multa aplicada fosse substituída por dias de trabalho a favor da comunidade nos termos do art.º 490.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
Sobre tal pretensão incidiu o despacho judicial de fls. 84, cujo teor reproduzimos:
«Indefere-se o requerido porque a questão foi decidida (pedido de autorização para pagamento da multa em prestações formulado a 8-6-2012), sendo o requerido posteriormente (para além de ter sido objeto de conhecimento judicial) extemporâneo.
Notifique
1.2. Inconformado com este despacho, recorre o arguido, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões:
1. Contrariamente ao expendido no despacho em crise, o arguido cumpriu todos os prazos legais que lhe incumbia acatar para poder colocar a questão da almejada substituição da pena de multa pela pena de prestação de dias de trabalho a favor da comunidade.
2. Nomeadamente o disposto no art.º 489.º, n.º 3 do Código de Processo Penal, em cujos termos o prazo de 15 dias mencionado no seu antecedente n.º 2 não se aplica no caso de o pagamento da multa ter sido autorizado em prestações.
3. O arguido apresentou o requerimento para substituição da multa por dias de trabalho no dia 29 de Junho de 2012 quando a 1.ª prestação da pena de multa a que foi condenado apenas se venceria no dia 15 de Julho de 2012.
4. Isto é, e como já dito, o arguido acatou todos os prazos legais, nomeadamente tendo requerido a substituição da multa por dias de trabalho antes do vencimento da 1.ª prestação.
5. Uma vez que o arguido não tem qualquer capacidade financeira para fazer o pagamento em prestações da multa em que foi condenado, apenas lhe restava requerer a sua substituição por dias de trabalho.
6. Impondo-se, consequentemente, a pronúncia do Tribunal a quo, ademais porque tempestiva a pretensão do arguido.
Terminou pedindo a revogação do despacho recorrido, substituindo-se por outro que determine tal apreciação.
1.3. Notificado nos termos e para os efeitos do art.º 411.º, n.º 6, do Código de Processo Penal, o Ministério Público na 1.ª instância respondeu ao recurso, pugnando pela sua improcedência [fls. 94 a 100].
1.4. Proferido despacho admitindo a impugnação e mantendo o decidido [fls. 102], foram os autos remetidos a esta instância de apelo.
1.5. Aqui, no momento processual a que alude o art.º 416.º, do Código de Processo Penal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer conducente ao provimento do recurso [fls. 109].
1.6. Cumprido o disposto no art.º 417.º n.º 2 do diploma adjectivo penal, o recorrente não exerceu direito de resposta.
1.7. Aquando do exame preliminar a que alude o n.º 6 do mesmo inciso, consignou-se que nenhuma circunstância impunha a apreciação sumária do recurso, ou obstava ao respectivo conhecimento de meritis, donde que a dever prosseguir seus termos com a recolha dos vistos devidos e submissão a conferência.
Tudo observado, urge ponderar e decidir.
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II. Fundamentação.
2.1. Nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 412.º do Código de Processo Penal, o âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, só podendo o tribunal ad quem apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer, oficiosamente, por obstarem à apreciação do seu mérito, como são os vícios da sentença previstos no art.º 410.º, n.º 2 do mesmo conjunto de normas.
In casu, atenta a inexistência de questão de que cuida ponderar oficiosamente, thema decidendum concreto é o de apurarmos se não intercede, tal como o entendeu o despacho sindicado, da intempestividade do pedido de substituição da pena de multa por prestação de trabalho a favor da comunidade.
Vejamos.
2.2. E, primeira nota que importa consignar a de que o entendimento coligido quer pelo recorrente, quanto pelo recorrido Ministério Público, arrimados no acórdão deste Tribunal prolatado em 13 de Junho de 2012, no âmbito do processo n.º 202/10.1 GBOBR.C1, tendo por Relator o ora M.mo Desembargador-Adjunto Orlando Gonçalves, não é transponível para o caso vertente pois que a materialidade aí em causa era distinta daquela que subjaz à hipótese presente. Com efeito nesse aresto ponderou-se da extemporaneidade de um requerimento de substituição da pena de multa por prestação de trabalho em favor da comunidade apresentado quando o Ministério Público já consignara que ia instaurar execução; logo, sufragou-se, tal requerimento mostrava-se apresentado já depois do prazo do pagamento voluntário a que alude o art.º 490.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, o qual remete para o antecedente art.º 489.º, n.ºs 2 e 3.
2.3. Feito este pequeno esclarecimento, logo se intui que por ele próprio, quanto pelo regime legal convocável, e materialidade supra descrita, não sofre controvérsia o sentido que deverá assumir a decisão reclamada.
Na verdade:
O art.º 48.º do Código Penal, sob a epígrafe Substituição da multa por trabalho, prevê a possibilidade de substituição da multa por dias de trabalho, dispondo o seu n.º 1 que “A requerimento do condenado, pode o tribunal ordenar que a pena de multa fixada seja total ou parcialmente substituída por dias de trabalho em estabelecimentos, oficinas ou obras do Estado ou de outras pessoas colectivas de direito público, ou ainda de instituições particulares de solidariedade social, quando concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”
Por sua vez, no capítulo [I do Título III, epigrafado Da Execução da pena de multa], estabelece o art.º 489.º, do Código de Processo Penal, reportando-se ao “Prazo de pagamento”:
1. A multa é paga após o trânsito em julgado da decisão que a impôs….
2. O prazo de pagamento é de quinze dias a contar da notificação para o efeito.
3. O disposto no número anterior não se aplica no caso de o pagamento da multa ter sido diferido ou autorizado pelo sistema de prestações.”
Isto é, o prazo de pagamento da multa, quando esta for paga em prestações, decorre até se terem vencido todas as prestações.
E, mais adita o subsequente art.º 490.º, sob a epígrafe “Substituição da multa por dias de trabalho” no seu n.º 1 que “O requerimento para substituição da multa por dias de trabalho é apresentado no prazo previsto nos nº 2 e 3 do artigo anterior, ….
Ou seja, na hipótese de ter sido facultado o pagamento da multa em prestações, o arguido pode apresentar no decurso do seu prazo de pagamento, pedido para substituição da multa por dias de trabalho.
Ora, a situação presente na qual como vimos, e decorre da materialidade consignada no Relatório que encima este aresto, durante o período para o pagamento faseado da multa o recorrente solicitou ao Tribunal a quo que essa mesma pena fosse substituída por dias de trabalho a favor da comunidade de acordo com o elencado art.º 490.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
Pretensão que não pode ser liminarmente denegada por extemporaneidade, como sucedeu, antes reclama, porque tempestivamente apresentada, que sobre ela incida ponderação do Tribunal a quo.
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III. Decisão.
Pelo exposto, decidimos em julgar procedente o recurso e em consequência revogar o despacho recorrido, o qual deverá ser substituído por outro que, considerando o pedido tempestivo, decida sobre a requerida substituição da multa por prestação de trabalho.
Sem custas.
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Coimbra, 30 de Janeiro de 2013