Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
301/04.9TBSPS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARTINS DE SOUSA
Descritores: ACESSÃO INDUSTRIAL
COISA IMÓVEL
REQUISITOS
Data do Acordão: 03/16/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: SÃO PEDRO DO SUL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 1340º E 1376º DO C. CIV.; 5º DO REGIME DOS LOTEAMENTOS URBANOS ANEXO AO DEC. LEI Nº 448/91, DE 29/11.
Sumário: I – Do disposto no artº 1340º do C. Civ. resulta que são requisitos substantivos e cumulativos da acessão industrial imobiliária, a incorporação da construção em terreno alheio, com materiais pertencentes ao seu autor, de boa fé, e que o valor trazido pelas obras ao prédio seja maior do que o valor que este tinha antes.

II – A totalidade do prédio a que alude o artº 1340º do C. Civ., atentos os fins da acessão, só pode considerar-se como sendo a nova unidade económica formada pelo terreno e pela construção edificada, já que é apenas relativamente a estes que existe o conflito de direitos que a lei quer resolver.

III – É orientação do STJ que a aquisição por acessão tanto pode abranger a totalidade do prédio como a parte em que se incorporaram as obras; essencial é que com estas se tenha formado uma unidade económica distinta.

IV – Assim, para se considerar preenchido o requisito relativo ao valor acrescentado apenas cumpre encontrar a diferença entre o valor desta nova realidade económica resultante da incorporação e o valor que “o lote de terreno” onde a edificação foi construída tinha antes.

V – No artº 5º do Regime dos Loteamentos Urbanos vigente em 1996 – Dec. Lei nº 448/91, de 29/11 – prevê-se uma excepção ao licenciamento dos loteamentos, a operação urbanística do destaque, tida como verdadeira operação de loteamento (em sentido estrito) por consistir na divisão de um prédio, se bem que na sua expressão mais simples – dois lotes (o destaque de uma única parcela de prédio inscrito na matriz, desde que, cumulativamente, se cumpram os requisitos aí previstos, variáveis consoante ocorra no perímetro urbano ou fora dele).

VI – Os “destaques” podem ser levados a cabo no perímetro urbano sem prévio licenciamento ou autorização desde que as duas parcelas dele resultantes confrontem com arruamentos públicos e a construção erigida ou a erigir disponha de projecto aprovado pela câmara municipal.

VII – Fora do perímetro urbano, e cumulativamente, a lei exige que na parcela destacada só seja construído edifício destinado exclusivamente a fins habitacionais e não tenha mais de dois fogos e que na parcela restante se respeite a área da unidade de cultura fixada para a região.

Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA:

I.

         A.... e mulher, B..., propuseram no Tribunal Judicial de São Pedro do Sul a presente acção ordinária contra C... , alegando em síntese:

os Réus foram donos de um lote de terreno para construção, com a área de 844 mts2, inscrito na matriz urbana da freguesia de ...sob o artigo ...º, por eles adquirido por via do instituto da usucapião;

com o seu consentimento os AA construíram, no dito lote para construção, a sua casa de habitação (com a superfície coberta de 244 mts2 e logradouro com 644 mts2), a qual foi inscrita na matriz sob o artigo ...., encontrando-se omissa no registo predial;

atenta a relação de recíproca confiança quer a licença para as obras de construção da dita casa de habitação, quer a participação matricial da mesma, foi requerida pelos Réus;

na construção da casa de habitação, ocorrida durante os anos de 1995/96, os AA despenderam uma quantia superior a 125.000 euros, ao passo que o valor do lote de terreno não era então superior a 3.750 euros.

Terminam pedindo que o tribunal declare que adquiriram, por via de acessão industrial, o prédio no qual edificaram a sua casa de habitação que tem, hoje, a descrição, área e confrontações que apontam no artigo 6º da petição.

O Réu, regularmente citado, não deduziu qualquer oposição.

Suspeitando de que a pretendida acessão camuflava divisão predial irregular, o Senhor Juiz levou a cabo, durante anos, múltiplas diligências e recolha de documentos atinentes ao prédio/lote de terreno acima referenciado, nomeadamente, junto da Repartição de Finanças, Câmara Municipal e Conservatória de Registo Predial, locais, após o que proferiu sentença que julgou improcedente a acção, negando a acessão imobiliária que fora pedida por se traduzir num fraccionamento, destaque ou loteamento ilegais.

Inconformados os AA dela recorreram, alinhavando no termo de sua alegação as seguintes conclusões:

[……………………………………………………………………………….]

Não foi deduzida contra-alegação. E, ora, colhidos os vistos , cumpre apreciar.

II.

A factualidade enunciada na decisão recorrida que não foi objecto de impugnação foi a seguinte:

1 - O prédio inscrito na matriz urbana da freguesia de ...sob o artigo ....º, em nome do Réu, mostra-se ali descrito como composto de edifício destinado a habitação, com a superfície coberta de 244 mts2 e logradouro com 644 mts2, a confrontar do norte com ...., do nascente com a estrada, do sul e poente com o Réu, encontrando-se omisso no registo predial.

2 – Tal edifício foi construído no lote inscrito sob o artigo ...º.

3 – O prédio inscrito na matriz urbana da freguesia de ...sob o artigo ...º, em nome do Réu, mostra-se ali descrito como composto de lote de terreno para construção urbana, com a área de 685 mts2, a confrontar do norte com ...., do nascente com a estrada, do sul e poente com o Réu, o qual passou ao artigo ...., e estava anteriormente inscrito na matriz sob o artigo rústico 2830 (parte).

4 – O lote referido em 3 foi inscrito na matriz em 1996.

5 – O prédio inscrito na matriz rústica da freguesia de ...sob o artigo 2830º, em nome do Réu, mostra-se ali descrito como composto de pinhal, mato e pastagem, com a área de 8.940 m2, a confrontar do norte com caminho, do nascente, sul e poente com o Réu.

6 – O prédio descrito em 5 foi inscrito na matriz em 1986.

7 – No âmbito da reclamação administrativa nº 4/05, apresentada pelo Réu na repartição de finanças de ...em Janeiro de 2005, foi deferido o seu pedido de rectificação ao teor do artigo matricial ...º, no sentido de neste passar a constar que o prédio estava omisso na matriz, e não inscrito no artigo 2830º (parte) como até então estava matricialmente referenciado.

8 – A casa de habitação referida em 1 foi construída pelos AA. no lote de terreno descrito em 3, para o que tiveram o acordo e consentimento dos Réus.

9 – Tal casa foi edificada durante os anos de 1995-1996, tendo os AA despendido, nas correspondentes obras, uma quantia superior a 125.000 euros.

10 – À data de 1995 o valor do lote de terreno referido em 3 não era superior a 3.750 euros, valor este, entretanto, pago pelos AA aos Réus.

Deve ainda acrescentar-se-lhe o seguinte por via da documentação pedida à Câmara Municipal de ....: a construção erguida no lote de terreno a que acima se alude foi objecto de projecto aprovado pela dita Câmara que a licenciou e autorizou.

As conclusões dos recursos delimitam o âmbito da sua apreciação - conforme decorre do disposto nos artigos 684, n.º 3 e 690, n.º 1 do Código de Processo Civil (2) - pelo que, exceptuando as questões de conhecimento oficioso, apenas cabe conhecer das questões contidas nessas mesmas conclusões, e que devem ser apreciados pela ordem da sua interposição.

  Insurgem-se os Autores recorrentes contra a sentença que julgou improcedente a acção, negando a aquisição do imóvel por acessão imobiliária que fora pedida por se traduzir num fraccionamento, destaque ou loteamento ilegais do prédio, objecto da incorporação nela envolvida, colocando à apreciação deste Tribunal as questões que, resumidamente, assim se podem enunciar:

- A existência dos requisitos para a aquisição do direito de propriedade pelos Autores por acessão;

- e caso se conclua pela verificação de tais requisitos, verificar se da mesma resulta o fraccionamento ilegal do prédio, por violação de normas de carácter imperativo relativas ao loteamentos urbano, como se entendeu na sentença recorrida.

A.

 Do disposto no artigo 1340º do CC resulta que são requisitos substantivos da acessão industrial imobiliária, no caso que nos ocupa:

a) a incorporação da construção em terreno alheio,

b) com materiais pertencentes ao seu autor;

c) de boa fé;

d) e que o valor trazido pelas obras ao prédio seja maior do que o valor que este tinha antes.

Estes requisitos são cumulativos.

A incorporação é “uma ligação permanente que provoca a perda da individualidade das coisas unidas ao solo, pela formação de uma coisa única, um corpo único, não desmembrável sem alteração da substância do todo” - cfr Quirino Soares, "Acessão e Benfeitorias",  CJSTJ, ano IV, Tomo I, 1996, págs. 11 e segs..

Sendo manifesta a existência de incorporação, dos autos decorre ainda que o terreno em que a casa dos AA foi implantada era propriedade dos RR, portanto, terreno alheio, sendo o conjunto imobiliário final pertença dos AA.

Quanto à boa fé: de acordo com o estabelecido no artigo 1340, n.º 4, do CC, existe boa fé quando o autor da obra:

a) desconhecia que o terreno era alheio;

b) ou, conhecendo que o terreno era alheio, foi autorizada a incorporação pelo dono do terreno.

Assim determinados de forma taxativa os casos de boa fé para o efeito da acessão (cfr Pires de Lima e A. Varela, Código Civil, III, p. 149), no caso em apreço, sendo manifesto que os AA sabiam que o terreno em que edificavam a sua casa era alheio, não restam dúvidas, em face do apurado consentimento dos RR que essa incorporação foi por eles autorizada.

Vejamos, por fim, se o valor trazido pela obra à totalidade do prédio é ou não maior do que o valor do prédio antes da incorporação, isto é, qual o valor acrescentado. Pela análise do citado artigo 1340º a importância da determinação do valor acrescentado decorre do facto de ser por este item que se estabelece a quem pertence o direito de adquirir, por acessão.

A totalidade do prédio a que alude o normativo do citado artº1340º, atentos os fins da acessão, só pode, efectivamente, considerar-se como sendo a nova unidade económica formada pelo terreno e pela construção edificada, já que é apenas relativamente a estes que existe o conflito de direitos que a lei quer resolver. Tal como vem sendo orientação do STJ a aquisição por acessão tanto pode abranger a totalidade do prédio como a parte em que se incorporaram as obras, essencial é que com estas se tenha formado uma unidade económica distinta (Acs. de 10.02.2000, revista n.º 1208/99 e de 14.02.2002, revista n.º 4402/01 in www.dgsi.pt).

Assim sendo, para se considerar preenchido o requisito relativo ao valor acrescentado apenas cumpre encontrar a diferença entre o valor desta nova realidade económica resultante da incorporação e o valor que o “lote de terreno”onde a edificação foi construída tinha antes.

Ora, considerando que o valor da construção (125.000€) efectuada pelos AA é manifestamente superior ao valor do terreno (3.750€) onde foi construída, como se veio a provar, é evidente que o valor da nova unidade económica resultante da incorporação é muito superior ao valor que o prédio tinha antes, pois, em termos de valores de mercado de habitação, o valor final da obra incorporada será, pelo menos, igual ao valor da construção acrescido do valor do terreno onde foi implantada (125.000€+3.750€].

Verificados, deste modo, os requisitos apontados, e considerando que os AA pagaram ao R o valor que o prédio tinha antes da construção, só restará reconhecer o direito de adquirir dos AA.

B.

 Porém, na peugada de alguma jurisprudência que cita, seguiu-se na sentença recorrida a orientação segundo a qual, mesmo verificados os apontados requisitos do citado artº 1340º, tal direito não pode ser exercido “… ao arrepio das limitações impostas por lei que condicionam o fraccionamento de prédios rústicos e, também, das que derivam do regime legal das operações de loteamento urbano, devendo o julgador, antes de se decidir pelo reconhecimento de uma aquisição parcelar, por efeito da acessão industrial imobiliária, certificar-se que não irá consolidar uma situação desconforme com as aludidas regras, tendo em vista a harmonia do sistema jurídico, por forma a que os vários institutos, quer de direito público, quer de direito privado, convergentes na questão decidenda, não se entrechoquem…” (cfr. o Ac. da RC de 13.3.06,processo 1467/06, in www.dgsi.pt).

Cabe assim apreciar, se, apesar de verificados os requisitos do direito exercido pelos AA, a final esse desiderato não é possível por implicar a consolidação pelo julgador de uma situação violadora das regras relativas ao fraccionamento de prédio ou às operações de loteamento urbano.

Considerou-se na sobredita sentença que “o prédio cuja titularidade e configuração se pretende que o tribunal reconheça (artigo matricial urbano ....), teve a sua origem num outro prédio urbano (lote para construção, inscrito na matriz sob o artigo ...), o qual – lote -, à data da instauração da presente acção, e já desde 1996, encontrava-se como tal inscrito na matriz, e aí referido como derivado de parte do artigo rústico ....º”.

Aí se ponderou seguidamente: “…bem vistas as coisas, pretende-se por via desta acção que o tribunal sancione uma operação de divisão de uma realidade física, na decorrência da qual foi ‘criado’ um lote para construção, no qual os AA vieram a erigir uma casa de habitação – cfr. os pontos 1 a 6 da factualidade assente.

Contudo, para além dos obstáculos de ordem privatística que a tal operação se podem opôr – artº 1376º, nº 1 do CC – de igual modo outros existem no âmbito do direito público, mormente na área do urbanismo – cfr. os artºs 3º, al. a) e 5º, ambos do DL 448/91 de 29.11 (regime jurídico dos loteamentos urbanos, aplicável à data da operação agora em análise)”.

Deve dizer-se, antes de mais e sem hesitação que a conclusão a que o Senhor Juiz chegou sobre a divisão de que teria sido objecto o prédio inscrito na matriz respectiva sob o artº ....º porque se fundamenta apenas em mera certidão matricial, se nos afigura demasiado ousada e temerária. Demasiado temerária porque sendo essa certidão objecto de rectificação posterior que inviabiliza tal conclusão, levada a cabo pelos mesmos serviços que emitiram a primeira, não se vê razão para a preterir em termos probatórios. Demasiado ousada porque, como é sabido, a inscrição/descrição matricial, só por si, não goza de sustentabilidade probatória irrecusável no tocante à definição dos prédios, seus limites, confrontações e áreas e muito menos à definição do respectivo estatuto jurídico e de seus titulares. E com tais limitações e sem outro “histórico” que não se limite à mera dedução ou suposição tabeliónica, manifesto é que se não pode ser tão assertivo quanto à pretensa divisão física do prédio acima referenciado, sua origem e modo.

Acresce que, no prédio que terá sido objecto da pretensa divisão ilegal foi incorporada a casa dos AA sobre cujo projecto e licenciamento recaíram actos administrativos definitivos e consolidados de autorização. Não se está, por isso, perante qualquer obra clandestina e cabendo “ às entidades intervenientes em qualquer processo de divisão – sublinhado nosso – (bem como emparcelamento ou reparcelamento de prédios) - câmaras municipais, mas também notários e conservadores do registo predial – detectar casuisticamente situações de fraude à lei, verificando designadamente da sua existência na situação concreta…”- Implicações Notariais e Registais das Normas Urbanísticas, de Fernanda P. Oliveira e Dulce Lopes, 44. pág 57, tais actos administrativos se não constituem irrecusável prova da regularidade da operação urbanística levada a cabo no vertente caso (e não há qualquer indício em sentido contrário) há-de, pelo menos, situar no campo da mera suposição a elucubração do Senhor Juiz em torno da pretensa injustificação do fraccionamento do dito prédio.

Ora, suspeitas ou suposições ou materializam-se em certezas de modo a, seguramente, se afirmar se houve fraccionamento e qual a operação urbanística concreta e real envolvida (puro fraccionamento, loteamento em sentido estrito, destaque ou outra) ou será de todo injustificado que se faça improceder a acção por via de meras hipóteses abstractas ou académicas.

Aceitemos, porém, a suposição do Senhor Juiz relativa à divisão predial suspeita. Aponta ele como obstáculo ao reconhecimento do direito de adquirir, a proibição de fraccionamento prevista no artº1376º do CC, as disposições relativas ao loteamento urbano ou ao destaque.

Como o próprio reconhece, a proibição de fraccionamento de terrenos aptos para a cultura não é aplicável, atenta a construção efectuada no lote em apreço ( cfr artº1377º, al c)), sendo certo que a sanção de anulabilidade de tais actos que supõe a acção a que se refere o artº1379º caducou o fim de três anos a contar do acto que procedeu à divisão.

Quanto ao loteamento, é mais que evidente a sua inexistência, como ressalta do exame do processo relativo ao licenciamento da construção da casa dos AA que o Senhor Juiz solicitou à Câmara Municipal e onde não consta qualquer alusão a essa operação ou ao alvará que a autentica, como seria curial. Acresce, também que segundo o diploma em vigor à data, são operações de loteamento "as acções que tenham por objecto ou por efeito a divisão em lotes, qualquer que seja a sua dimensão, de um ou vários prédios, desde que pelo menos um dos lotes se destine, imediata ou subsequentemente, à construção urbana" – artº2º, al a) do DL 448/91 de 29,11.

Por isso, ao invés do que se pretende na sentença, o regime aplicável à casa dos AA edificada numa parcela de terreno dos RR, não seria o imposto para o regime dos loteamentos urbanos, pura e simplesmente porque não só se não verificou qualquer operação de loteamento mas também porque, mercê da definição legal, essa operação implicaria a criação de, pelo menos, dois ou mais lotes (parcelas) de terreno, o que na suposição do Senhor Juiz não aconteceu.

Esta (operação) enquadrar-se-ia, pelos vistos, na excepção ao licenciamento dos loteamentos prevista no art.º 5º daquele diploma – a operação urbanística do destaque, tida como verdadeira operação de loteamento (em sentido estrito) por consistir na divisão de um prédio se bem que na sua expressão mais simples – dois lotes (cfr obra já citada, pág 65).

Prevê o referido normativo a possibilidade do destaque de uma única parcela de prédio inscrito na matriz, desde que, cumulativamente, se cumpram os requisitos ai previstos, variáveis consoante ocorra no perímetro urbano ou fora dele.

Os destaques podem ser levados a cabo no perímetro urbano sem prévio licenciamento ou autorização desde que as duas parcelas dele resultantes confrontem com arruamentos públicos e a construção erigida ou a erigir disponha de projecto aprovado pela câmara municipal. Fora do perímetro urbano, e cumulativamente, a lei exige que na parcela destacada só seja construído edifício destinado exclusivamente a fins habitacionais e não tenha mais de dois fogos e que na parcela restante se respeite a área da unidade de cultura fixada para a região (citado artº5º, nº 1, a) e b) e nº2, a) e b)).

Conforme resulta da matéria de facto supra descrita e dos documentos juntos aos autos, não impugnados, os prédios envolvidos na operação estão inscritos na respectiva matriz predial rústica, situando-se na freguesia de São Pedro do Sul e confrontando ambos com arruamento público (caminho e estrada). Além disso, a construção erigida na parcela destacada obedeceu a projecto aprovado pela entidade competente. Entendendo-se por perímetro urbano os solos urbanizados ou urbanizáveis (segundo João Pereira Reis e outros, in Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, 3ª ed, pág 44) não se oferecem dúvidas quanto à verificação dos requisitos do destaque em apreço, efectuado no perímetro urbano da freguesia de São Pedro do Sul.

Mas, suscitando-se dúvidas quanto à localização de tais prédios nesse mesmo perímetro urbano da freguesia de São Pedro do Sul, deve acrescentar-se que aquela matéria de facto e os documentos juntos e não impugnados, permitem também concluir que aquela construção se destina exclusivamente a fins habitacionais dos AA, não tem mais de dois fogos e que a parcela restante (do destaque) com mais de oito mil metros quadrados respeita a área de unidade de cultura fixada para a região – 2 hectares, segundo a previsão da portaria 202/70 de 21.04 para o distrito de Viseu – o que preenche também, os requisitos cumulativos para os destaques fora do perímetro urbano.

Em síntese, dando por certa a suposição da divisão material constante da sentença, o Senhor Juiz tinha à sua disposição nos autos suficiente alegação e prova para a apreciar no plano jurídico, como se procurou comprovar.

Do todo exposto resulta, portanto, e ao invés da decisão sob recurso, a verificação dos requisitos para a aquisição por acessão, já que da mesma não resulta a divisão ilegal do prédio dos RR, mormente, por violação de normas de carácter imperativo relativas ao loteamento urbano ou ao fraccionamento de prédio rústico.

III.

Destarte, julga-se procedente a apelação e revoga-se a sentença recorrida e, em consequência, declara-se que os AA A.. e B.... adquiriram, por via de acessão industrial, o prédio no qual edificaram a sua casa de habitação, inscrito na matriz urbana da freguesia de ...sob o artigo ....º, ali descrito como composto de edifício destinado a habitação, com a superfície coberta de 244 mts2 e logradouro com 644 mts2, a confrontar do norte com ...., do nascente com a estrada, do sul e poente com o Réu C.....

Custas a cargo dos AA, atento o disposto no artº449º,1 e 2, al a) do CPC.