Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
308/09.0TBCBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE ARCANJO
Descritores: RESPONSABILIDADE MÉDICA
DEVER DE INFORMAR
CONSENTIMENTO INFORMADO
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 11/11/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VARA DE COMPETÊNCIA MISTA DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 342º, 483º E 800º C.CIVIL.
Sumário: 1- A responsabilidade médica enquadra-se civilmente no instituto da responsabilidade civil, tanto contratual, como delitual, podendo existir um concurso (real ou aparente) de ambas as responsabilidades.

2.- Se por determinação da Seguradora, o autor (sinistrado de acidente de trabalho) passou a ser seguido numa Clínica, na qual o médico prestava serviços, a situação é de responsabilidade contratual, podendo convocar-se o regime do art. 800º, nº1 do CC sobre a responsabilidade do devedor pelos “ actos dos auxiliares”.

3.- A acção de responsabilidade civil médica pode fundar-se no erro médico e/ou na violação do consentimento informado. Enquanto que na primeira, com a regras de arte se visa salvaguardar a saúde e a vida do paciente, na segunda o bem jurídico tutelado é o direito à autodeterminação nos cuidados de saúde.

4.- O ónus da prova do consentimento e da prestação da informação incide sobre o médico ou a instituição de saúde, porque o consentimento funciona como causa de exclusão da ilicitude, e a adequada informação é um pressuposto da sua validade, logo matéria de excepção, como facto impeditivo (art. 342º, nº2 CC), devendo atender-se ainda ao princípio da “distribuição dinâmica da prova“.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

I – RELATÓRIO


1.1.- O Autor – J… – instaurou na Comarca de Coimbra acção declarativa, com forma de processo ordinário, contra os Réus:

- Companhia de Seguros A…, S.A, com sede …;

- B…, S.A., com sede na …;

- C…

Alegou, em resumo:

Em 02/01/2006 sofreu acidente de trabalho de que resultaram lesões (entorce lombar e hérnia discal em L4/L5) e tendo accionado o contrato de seguro de acidentes de trabalho outorgado com a 1ª Ré, foi submetido a uma primeira intervenção cirúrgica lombar feita pelo 3º Réu ( médico neurocirurgião) nas instalações clínicas da 2ª Ré.

Contudo, porque não recuperou, o 3º Réu optou por nova cirurgia, mas o Autor não melhorou.

A 1ª Ré A… deu-lhe alta e o TTCBR fixou-lhe IPP de 46%. No entanto, continuou com dores na coluna, a recorrer ao médico de família, o IML recomendou novo tratamento, a 1ª Ré encaminhou-o para consulta de psicologia e programa de fisioterapia e em 22/10/2007 deu-lhe Alta Definitiva. Não obstante, o seu estado de saúde continuou e continua a deteriorar-se, o TTCBR considera que a IPP deve ser revista.

O Autor tem dificuldades de mobilidade motora, inibições sexuais, depressão nervosa com ideias suicidas, problemas económicos, e dependência de terceiros.

Reclama uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, com base na violação pelo 3º Réu das “legis artis” que deveriam ter presidido à sua actuação aquando das intervenções cirúrgicas que realizou; mas também na violação do dever de informação e bem assim no facto de, quer o 3º quer a 2ª Ré terem dado alta prematura ao Autor quanto aquele ainda carecia de tratamento.

Pediu a condenação dos Réus a pagar-lhe, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia de € 164.680,00, acrescida de juros desde a citação.

            Contestou a 1ª Ré, defendendo-se, em síntese:

            Uma vez que já foi ressarcido no âmbito do processo com o n.º 255/07.0 TTCBR, do Tribunal de Trabalho de Coimbra, verifica-se a excepção do caso julgado.

            Não ocorrem nenhum dos pressupostos da responsabilidade civil (contratual ou extracontratual), além do mais, porque não houve erro ou negligência médica por parte do 3º Réu, nem violação do dever de informação.

            Contestaram a 2ª e 3º Réus, defendendo, em síntese:

            A excepção do caso julgado em relação á sentença proferida no tribunal de trabalho (processo n.º 255/07.0 TTCBR)

A impugnação quanto à alegada violação do dever de informação e de negligência médica

O 3º Réu requereu a intervenção acessória provocada da companhia de seguros “P…– Companhia de Seguros, S.A.”, para a qual havia transferido a sua responsabilidade civil profissional através de seguro válido à data dos factos.

            A Seguradora P… contestou, nos termos da defesa do seu segurado.

            O Autor replicou contraditando a defesa por excepção.

            No saneador julgou-se improcedente a excepção do caso julgado, afirmando-se a validade e regularidade da instância.

1.2.- Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença a julgar a acção improcedente e absolver os Réus do pedido.

            1.3.- Inconformado, o Autor recorreu de apelação com as seguintes conclusões:

            Contra-alegaram os Réus no sentido da improcedência do recurso.


II – FUNDAMENTAÇÃO

            2.1. – O objecto do recurso

            A contradição de facto

            A impugnação de facto

            A responsabilidade civil médica (violação do dever de informação).

2.2.- A contradição de facto

Para efeitos do disposto no art. 662, nº 2, c) CPC (aprovado pela Lei nº 41/2013 de 26/6) só releva a contradição insanável que pressupõe a existência de posições antagónicas e inconciliáveis entre a mesma questão de facto.

A colisão deverá ocorrer entre a matéria de facto constante de uma das respostas e a matéria de facto de outra ou então com a factualidade provada no seu conjunto, de tal modo que uma delas seja o contrário da outra. Contudo, só há contradição entre os factos provados quando estes sejam absolutamente incompatíveis entre si, de tal modo que não possam coexistir uns com os outros.

            Consistindo o vício da contradição em erro de julgamento, ele tem, no entanto, que resultar do texto da decisão recorrida, sem recurso a elementos externos (designadamente a elementos de prova), logo não pode confundir-se com a alteração da matéria de facto, com base no erro notório na apreciação da prova.

Vejamos se, no caso concreto, a Relação, face aos elementos probatórios constantes do processo, está em condições de se substituir à 1ª instância e decidir a contradição.

2.3.- A impugnação de facto

            2.4. – Os factos provados

2.6.- A responsabilidade civil médica

A sentença recorrida, após enquadrar a responsabilidade médica em sede contratual, justificou a improcedência da acção com base nos seguintes tópicos:

(i) Não se provou a falta médica do neurocirurgião (3º Réu) ou seja, qualquer violação das regras de arte;

(ii) Não ficou demonstrado causalmente a origem das dores de que o Autor actualmente se queixa (por degenerescência da própria coluna de que já padecia anteriormente, compressão da raiz de L5 pela fibrose, a queda na garagem, ou qualquer outra causa) e a fibrose não teve origem em erro médico, pelo que o 3º Réu não violou as legis artis;

(iii) Não houve violação do dever de informação estando o Autor na posse dos elementos para um consentimento esclarecido.

Em contrapartida, objecta o Apelante dizendo ter havido violação do deveder de informação (o Autor não foi informado de que o seu estado de saúde poderia piorar, tornando o consentimento inválido), sendo fundamento para a responsabilização civil dos demandados (arts. 483, 485 e 486 CC), por todos os danos sofridos.

A responsabilidade médica enquadra-se civilmente no instituto da responsabilidade civil, tanto contratual, como delitual, podendo existir um concurso (real ou aparente) de ambas as responsabilidades.

Na situação de concurso, o Código Civil é omisso sobre esta matéria, muito embora Vaz Serra houvesse equacionado o problema nos trabalhos preparatórios, no sentido de conferir ao lesado a possibilidade de optar por um ou outro regime e até de cumular regras de uma e outra modalidade da responsabilidade ( BMJ 85, pág.115 e segs.).

Um dos exemplos clássicos do concurso aparente de responsabilidades é o do cirurgião que no decurso de uma intervenção cirurgia, por omissão dos deveres de cuidado, lesa a saúde ou a integridade física do paciente. Nestes casos, configura-se uma relação contratual, pelo que os danos causados pelo mau cumprimento do contrato assumem natureza contratual, apesar desses mesmos danos serem susceptíveis de reparação em sede de responsabilidade extracontratual, por violação culposa de direitos absolutos.

Segundo a teoria da opção, o lesado pode escolher uma das duas responsabilidades (cf., por ex., Vaz Serra, RLJ ano 102, pág.313; Pinto Monteiro Cláusula Penal e Indemnização, pág.714; Mota Pinto, Cessão da Posição Contratual, pág.411 ), sendo que para a teoria da consunção o regime da responsabilidade contratual consome o da extracontratual ( cf., por ex., Almeida Costa, Obrigações, 4ª ed., pág.356 ).

Na situação dos autos, por determinação da Seguradora o Autor (sinistrado de acidente de trabalho) passou a ser seguido na Ré B…, na qual o Réu C… (neurocirurgião) prestava serviços.

Neste contexto, estamos situados no âmbito da responsabilidade contratual (cf., por ex., Ac STJ de 15/12/2011, proc. nº 209/06.3TVPRT, em www dgsi.pt), conforme se observou na sentença e como caracterizou o Autor na petição inicial, pelo que, em tese geral, cabe ao autor a alegação e prova dos seguintes elementos: (i) a existência de vínculo contratual; (ii) o incumprimento ou cumprimento defeituoso do médico; (iii) a verificação dos danos; (iv) o nexo de causalidade entre a violação das legis artis e os danos.

Uma vez que a Ré Seguradora A… serviu-se de terceiros (auxiliares) para realizar a prestação a que estava adstrita, por força do contrato de seguro, tem directa aplicação o regime do art. 800, nº1 do CC sobre a responsabilidade do devedor pelos “actos dos representantes legais ou auxiliares”.
Esta norma, inserida no âmbito da responsabilidade obrigacional, postula o princípio geral da responsabilidade do devedor perante o credor pelos actos das pessoas que utilize no cumprimento da obrigação, uma vez que o risco resultante da actuação dos auxiliares do cumprimento é atribuído ao próprio devedor.
A responsabilidade não pressupõe qualquer dependência ou subordinação do auxiliar em relação ao devedor (como na hipótese do art. 500 do CC), verificando-se também quando o auxiliar é independente e autónomo, já que a razão de ser é a mesma, pois o critério relevante, para o efeito, é de que se trate de pessoas de quem o devedor se serve para o cumprimento da obrigação (cf., por ex., Vaz Serra “A responsabilidade do devedor pelos factos dos auxiliares, dos representantes ou dos substitutos”, BMJ 72, pág.274 e 277).

E o “cumprimento” referido no art. 800 nº1 do CC, vai para além da mera execução da prestação a que o devedor se vinculou, abrangendo os deveres laterais de conduta que integram a relação obrigacional complexa, onde se incluem os deveres de protecção e de informação (cf., Carneiro da Frada, Contrato e Deveres de Protecção, pág.209 e segs.).

            Discute-se se a responsabilidade (objectiva) do devedor pressupõe ou não a imputação do facto danoso ao auxiliar, ou seja, a culpa deste.

            Segundo determinado entendimento, o devedor só responde, nos termos do art. 800, nº1 do CC, se o houver culpa do auxiliar, pois que a responsabilidade (objectiva) requer uma imputação do facto ao auxiliar, tal como na responsabilidade do comitente (cf., por ex., Antunes Varela, Das Obrigações, II, pág.101).

            Noutra perspectiva, a responsabilidade do devedor não depende de prévia imputação do facto ao auxiliar, porquanto “ projecta-se o comportamento do auxiliar na pessoa do devedor, isto é, este será responsável logo que a actuação dos auxiliares, pensada na pessoa do devedor, preencha uma previsão de responsabilidade “ (cf. Carneiro da Frada, loc cit., pág.210; Maria Trigo, Responsabilidade Civil Delitual Por Facto de Terceiro, pág. 240 e segs.). É que a parte final do art. 800 nº1 (“ como se tais actos fossem praticados pelo devedor“) ficciona a  substituição do autor do facto pela pessoa do devedor, possibilitando “um alargamento da zona de responsabilidade e da tutela do lesado”.

            Como quer que seja, a culpa dos auxiliares está presumida ( art. 799 do CC), por incumbir ao devedor a prova da falta da culpa dos auxiliares ( cf. Vaz Serra, loc.cit., pág.282).

Problematiza-se no recurso não propriamente o erro ou falta do acto médico cirúrgico do médico neurocirurgião (C…), mas a responsabilidade pela violação do dever de informação.

Na verdade, a acção de responsabilidade civil médica pode fundar-se no erro médico e/ou na violação do consentimento informado.

Enquanto que na primeira, com a regras de arte se visa salvaguardar a saúde e a vida do paciente, na segunda o bem jurídico tutelado é o direito à autodeterminação nos cuidados de saúde.

As duas situações podem coexistir, mas aqui o objecto do recurso está limitado apenas à improcedência da acção com este fundamento.

Tem-se entendido que a obrigação de informação também constitui elemento essencial das legis artis (em sentido amplo), decorre do princípio geral da boa fé e como fonte de especiais deveres integrantes do contrato, cuja amplitude e intensidade é variável de caso para caso, assumindo, porém, autonomia, visto que esta particular regra de comportamento médico visa a tutela da autodeterminação (cf., por ex., Mariano Alonso Perez, “ La relación médico-enfermo pressuposto de responsabilidade civil em torno a la “lex artis”), em Perfiles de la Responsabilidad Civil en el Nuevo Milenio, 2000, pág. 14 e segs.; Vera Raposa, Do ato médico ao problema jurídico, 2014, pág. 14 e segs.).

Compreende-se a importância da informação, pois o consentimento do paciente(livre e esclarecido) é um dos requisitos da licitude da actividade médica, mas o seu conteúdo é “elástico” (Ac STJ de 9/10/2014, proc. nº 3925/07.9TVPRT, em www dgsi.pt), pelo que terá, além do mais, de adequar-se às especificidades de cada caso.

O deveder de informação e o consentimento informado tem consagração legal, nomeadamente, na Convenção sobre os Direitos do Homem e a Biomedicina (publicada no DR 1ª Série de 3/1/2001), Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (art. 3º), Arts. 25 e 26 da CRP, Art. 70 CC (direito geral de personalidade), Código Deontológico da Ordem dos Médicos (arts. 44 e 45), Lei de Bases da Saúde (Lei nº 48/99 de 24/8, alterada pela Lei nº 27/2002 de 8/11).

Quanto ao dever de informar sobres os riscos do tratamento, admite-se, segundo determinada corrente, que o médico tem o dever de comunicar ao doente os riscos graves que sejam previsíveis, excluindo-se os riscos graves, particulares, hipotéticos ou anormais.

E numa orientação mais abrangente, defende-se a “teoria dos riscos significativos” que impõe o dever de informação em razão da necessidade terapêutica, do grau e de frequência do risco, ou em função do comportamento do doente (cf., por ex., Vera Raposo, loc. cit. pág. 225 e segs.).

É controversa a questão do ónus da prova do consentimento e da prestação da informação.

Segundo determinada orientação, cabe ao lesado /demandante o ónus da prova da falta de informação, por configurar incumprimento ou cumprimento defeituoso (pressuposto do ilícito contratual), embora socorrendo-se da chamada prova da primeira aparência. Cf. , por ex., Ac STJ de 15/10/2009, proc. nº 08B1800, em www dgsi.pt): “Recai sobre o paciente o ónus da prova do vínculo contratual, a existência de factos demonstrativos do incumprimento ou cumprimento defeituoso do médico, os danos (e a sua extensão), do nexo causal entre a violação das regras da arte e tais danos e da preterição do dever de informação por parte do médico ao paciente com vista à obtenção do seu consentimento informado”).

Noutra perspectiva, sustenta-se que o ónus da prova incide sobre o médico ou a instituição de saúde, argumentando-se, em síntese, que o consentimento funciona como causa de exclusão da ilicitude, e a adequada imformação é um pressuposto da sua validade, logo matéria de excepção, como facto impeditivo (art. 342, nº2 CC), com o princípio da “distribuição dinâmica da prova“, a influência do direito comparado (cf., André Dias Pereira, O Consentimento Informado na Relação Médico-Paciente, pág. 194 e segs., Vera Raposo, loc. cit., pág. 242 e segs.)).

Vejamos na situação dos autos.

O Apelante alega que o seu consentimento não foi devidamente informado, porque o médico não o informou de que o seu estado de saúde poderia piorar, ou seja, da hipótese de se verificar um agravamento.

Sabe-se que o Autor sofreu uma entorse lombal e hérnia discal L4/L5, foi submetido a uma cirurgia para corrigir a lesão (13 de Março de 2006) e devido a uma fibrose pós-operatória foi de novo intervencionado (9 de Outubro de 2006). O Autor teve melhoras, a extirpação da hérnia foi efectuada com sucesso, mas depois disso continuou a sentir dores na coluna.

Demonstrou-se que o Réu C…, neurocirurgião, é um profissional competente, agiu com as melhores técnicas do estado da arte, segundo o protoclo médico, consensualmente aceite.

Por outro lado, as dores que o Autor sente não são consequência de qualquer erro médico por parte do Réu C…, podendo ter como causa as lesões degenerativas da coluna lombar que o Autor já apresentava anteriormente, para além de haver sofrido uma queda na garagem (após a primeira intervenção) que constitui causa suficiente de agravamento de sintomas dolorosos relativos às lesões degenerativas.

No tocante ao dever de informação, comprovou-se que sempre foi comunicado ao Autor que a intervenção cirúrgica era o único meio adequado a corrigir a lesão resultante do acidente sofrido, do objectivo da intervenção, ou seja, de extirpar a hérnia e de eliminar a dor ciática e dos precisos termos em que se processaria.

Foi alertado nas consultas pré-operatórias quanto ao facto de a cirurgia ser de realização simples, apresentando quadro favorável e recuperação, não se justificando o relato de complicações anormais e imprevisíveis.

Não se provou que a deterioração do seu estado de saúde e a situação depressiva tivesse sido consequência da actuação médica.

Neste contexto, em face dos elementos disponíveis, não parece que tenha havido violação do dever de informação e que o consentimento (para ambas as cirurgias) não haja sido devidamente informado. Para além de que não se demonstrou (cujo ónus impendia sobre o Autor) que a deterioração do estado de saúde tivesse origem nos riscos (previsíveis) inerentes às intervenções cirúrgicas.

2.7. Síntese conclusiva

1.- A responsabilidade médica enquadra-se civilmente no instituto da responsabilidade civil, tanto contratual, como delitual, podendo existir um concurso (real ou aparente) de ambas as responsabilidades.

2.- Se por determinação da Seguradora, o autor (sinistrado de acidente de trabalho) passou a ser seguido numa Clínica, na qual o médico prestava serviços, a situação é de responsabilidade contratual, podendo convocar-se o regime do art. 800 nº1 do CC sobre a responsabilidade do devedor pelos “ actos dos auxiliares”.

3.- A acção de responsabilidade civil médica pode fundar-se no erro médico e/ou na violação do consentimento informado. Enquanto que na primeira, com a regras de arte se visa salvaguardar a saúde e a vida do paciente, na segunda o bem jurídico tutelado é o direito à autodeterminação nos cuidados de saúde.

4.- O ónus da prova do consentimento e da prestação da informação incide sobre o médico ou a instituição de saúde, porque o consentimento funciona como causa de exclusão da ilicitude, e a adequada informação é um pressuposto da sua validade, logo matéria de excepção, como facto impeditivo (art. 342 nº2 CC), devendo atender-se ainda ao princípio da “distribuição dinâmica da prova“.


III – DECISÃO

Pelo exposto, decidem

1)

            Julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença.

2)

            Condenar o Apelante nas custas.

Jorge Arcanjo (Relator)

Teles Pereira

Manuel Capelo