Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
563/08.2TBGRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARLINDO OLIVEIRA
Descritores: EXECUÇÃO EXTINTA
RENOVAÇÃO
NOTIFICAÇÃO
NULIDADE
Data do Acordão: 03/22/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GUARDA - 2º J
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 201.º, N.º 2; 919.º, N.º 2 E 920.º, N.º 2 DO CPC.
Sumário: 1. Constitui nulidade a omissão de notificação da decisão de extinção da execução aos credores reclamantes, prevista no artigo 919.º, n.º 2 do CPC.

2. Consequentemente conduz à anulação do cancelamento de penhora subsistente à data daquela decisão extintiva, de forma a facultar ao credor reclamante a possibilidade de requerer a renovação da execução extinta, nos termos do artigo 920.º, n.º 2.

Decisão Texto Integral:             Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

            “A..., L.da”, intentou a presente execução comum, para pagamento de quantia certa, contra B..., já ambos identificados nos autos, apresentando como título executivo o cheque junto a fl.s 8, ascendendo a quantia exequenda, de capital e juros, a 6.698,51 €.

            No prosseguimento dos autos, foram penhorados bens móveis e um imóvel, tal como consta dos autos de penhora de fl.s 24 a 29 e 49 a 52, respectivamente.

            Relativamente ao bem imóvel penhorado procedeu-se à citação dos credores, nos termos do artigo 864.º CPC, entre os quais a “C...”, na qualidade de credor com garantia real sobre o imóvel penhorado.

            Tendo esta sido citada através de aviso de recepção, entregue em 27 de Agosto de 2008 (cf. fl.s 67).

            Em face do que, cf. requerimento entrado em juízo em 12 de Setembro de 2008 (fl.s 2 e seg.s do apenso de reclamação de créditos), veio reclamar o seu crédito no valor global de 193.544,53 €, titulado por dois contratos de mútuo com hipoteca e procuração, que outorgou com o executado e cônjuge, englobando aquela o capital em dívida e respectivos juros.

            A fl.s 93, a exequente veio informar que tinha cedido o crédito exequendo a D....

            Conforme requerimento de fl.s 122, a Sr.ª Solicitadora de Execução, informou o Tribunal que o processo se encontrava liquidado, em função do que iria efectivar a extinção dos autos e solicitava a elaboração da conta.

            Efectuada a conta, conforme fl.s 127, a Sr.ª Solicitadora de Execução, declarou extinta a presente execução, em 22/06/2010.

            Como consta de fl.s 129 a 133, a Sr.ª Solicitadora de Execução, notificou desta decisão apenas a Ex.ma Mandatária da exequente e o executado.

            Por requerimento datado de 20 de Julho de 2010, constante de fl.s 134 acompanhado da certidão de fl.s 135 a 138, a Sr.ª Solicitadora de Execução, comprovou o cancelamento da penhora do imóvel efectuada por força dos presentes autos.

           

            Entretanto, no apenso de reclamação de créditos foi proferido, finda a apresentação dos créditos reclamados, em 01 de Outubro de 2008, um despacho a mandar que estes autos aguardassem conforme determinado na execução.

            E, em 08 de Setembro de 2010, a decisão aí constante de fl.s 59 a 61, que julgou extinta a instância nos autos de reclamação de créditos, por inutilidade superveniente da lide, com o fundamento em os autos de execução terem sido declarados extintos pelo pagamento.

            Conforme requerimento de fl.s 140 e 141, entrado em juízo em 20 de Setembro de 2010, a reclamante C...., veio requerer, em face da extinção da instância executiva, o prosseguimento da execução, para efectiva verificação, graduação e pagamento do seu crédito.

            Conclusos os autos ao M.mo Juiz a quo, este, por decisão proferida em 27 de Setembro de 2010, indeferiu o requerido pelo C...., nos seguintes termos:

            “Deste normativo (art.º 920.º CPC) resulta desde logo que, para o prosseguimento da execução tem de haver bens penhorados, o que, “in casu”, se não verifica já, atento o teor da cópia da certidão de cancelamento da penhora levado a efeito pelo agente de execução e que se encontra junta aos autos.

Acresce que, nos termos do nº 2 do sobredito normativo, o prazo para requerimento de prosseguimento da execução deve ser apresentado no prazo de 10 dias, contados da notificação da extinção da execução, pelo que, tendo a mesma, como supra se referiu, sido declarada extinta, pelo agente de execução, em 20/6/2010, é manifesto que o prazo para requerer a sua prossecução se encontra de há muito exaurido.

Nessa conformidade, atentas as normas invocadas e as considerações expendidas, o Tribunal indefere o requerido pela “ C.....”.

            Inconformada com a mesma, interpôs recurso a reclamante C...., recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo (cf. despacho de fl.s 179), concluindo as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

I) A instância “a quo” violou com a douta decisão recorrida as seguintes disposições legais:

a) Artigos 3º, N.º 1; 253º, N.º 1; 668º, N.º 1, alínea d); 919º, N.º 2 e 920º, N.ºs 2; 3 e 4, todos do Código de Processo Civil.

b) Artigo 20º, N.ºs 1; 4 e 5 da Constituição da República Portuguesa.

II) O Sr. Juiz da causa produziu nos autos principais, no dia 7 de Setembro de 2010, a aludida decisão, notificada à Recorrente, através da qual “julgou extinta a presente instância por impossibilidade superveniente da lide” ( SIC ).

III) Concluiu, por isso, a Apelante, de forma legítima, racional e lógica, que poderia, com base na mesma notificação, exercer o direito que lhe assiste, consagrado no Artigo 920º, N.ºs 2; 3 e 4 do C.P.C., o que fez.

IV) Com efeito, dirigiu aos autos o seu requerimento, cuja entrada em juízo ocorreu no dia 20 de Setembro de 2010, pugnando pelo prosseguimento dos mesmos autos, para cobrança do seu crédito e assunção da posição de Exequente.

V) Agiu a Recorrente no pressuposto, absolutamente pacífico e inarredável, de que só tomou conhecimento da extinção da instância, através do predito despacho, reportado a 7 de Setembro de 2010 e expedido à Apelante, na pessoa do seu Mandatário Judicial, a 9 do mesmo mês.

VI) Porém, o Sr. Juíz da causa, numa interpretação e visão, verdadeiramente insólitas, coarctou aquela faculdade à Apelante, sob os falaciosos pretextos de ter expirado o prazo para o efeito e de já haver sido promovido o cancelamento do registo de penhora, incidente sobre o imóvel, invocado nos autos.

VII) Ignorou, no entanto, a instância “a quo”, que a Recorrente não foi destinatária de qualquer anterior notificação, versando sobre a extinção da instância, facto este de que só teve conhecimento, após a notificação da referida decisão, proferida nos autos principais no dia 7 de Setembro de 2010.

VIII) Se houve inércia, no âmbito dos autos reflectindo a notificação tardia da extinção da instância à Credora-Reclamante, ora Recorrente, tal facto jamais poderá ser imputado a esta, mas tão-só e apenas, à instância “a quo”, que, com o devido respeito, não exerceu, com a diligência devida, os seus poderes jurisdicionais.

IX) Os invocados fundamentos e aduzidas razões, susceptíveis de prova, com recurso aos elementos e dados que os autos comportam, assumem a virtualidade de conduzir à revogação da decisão recorrida, o que se pretende obter, em sede do presente recurso.

X) Sem prejuízo do que se deixou expresso, admite ainda a Apelante que a decisão recorrida está ferida de nulidade, uma vez que o Sr. Juíz da causa, confrontado com o requerimento da Credora-Reclamante, através do qual solicitou, atempadamente, o prosseguimento dos autos, para cobrança do seu crédito, objecto de reclamação e sua assunção à posição de Exequente, concluiu, de forma linear e insubsistente, que se havia esgotado o prazo para o efeito e que já tinha sido promovido o cancelamento do registo da penhora, que impendia sobre o imóvel, identificado nos autos.

XI) Todavia, as considerações em que se estribou o Sr. Juíz da causa, não podem merecer qualquer guarida, porquanto, salvo o devido respeito, a Apelante, reafirma-se, só tomou conhecimento da extinção da instância, através da notificação da predita decisão, datada de 7 de Setembro de 2010.

XII) Questão esta sobre a qual não se pronunciou a instância “a quo”, o que, salvo melhor opinião, importa a nulidade da decisão recorrida.

XIII) Esta mesma decisão, porém, também está afectada de inconstitucionalidade, face ao que se deixou alegado, por manifesta violação do disposto no Artigo 20º, N.ºs 1; 4 e 5 da Constituíção da República Portuguesa, uma vez que a instância “a quo” vedou, infundadamente, à Apelante, o exercício da faculdade prevista no Artigo 920º, N.ºs 2; 3 e 4 do C. P. C.

            Termina, pedindo a declaração de nulidade da decisão recorrida, por a mesma não se ter pronunciado sobre a necessidade de a recorrente ser notificada da decisão de extinção da instância; a sua inconstitucionalidade, por violação do disposto no artigo 20.º, n.os 1, 4 e 5 da CRP e assim não se entendendo, a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que ordene o prosseguimento dos autos, nos termos requeridos.

            Não foram apresentadas contra-alegações.

           

            Dispensados os vistos legais, há que decidir.  

Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 684, n.º 3 e 690, n.º 1, ambos do CPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, a questão a decidir é a de saber se o despacho recorrido é nulo, atenta a falta de notificação da decisão que extinguiu a execução ou, assim não se considerando, inconstitucional, por violação do disposto no artigo 20.º, n.os, 1, 4 e 5, da CRP ou, ainda assim não se considerando, se a recorrente formulou, atempadamente, o pedido de prosseguimento dos autos, nos termos do disposto no artigo 920.º CPC e, consequentemente, se devem os autos prosseguir, como requereu.

           

            A matéria de facto a ter em conta é a que consta do relatório que antecede.

Passando à análise da questão de saber se o despacho recorrido é nulo, atenta a falta de notificação da decisão que extinguiu a execução ou, assim não se considerando, inconstitucional, por violação do disposto no artigo 20.º, n.os 1, 4 e 5 da CRP ou, ainda assim não se considerando, se a recorrente formulou, atempadamente, o pedido de prosseguimento dos autos, nos termos do disposto no artigo 920.º CPC e, consequentemente, se devem os autos prosseguir, como requereu, importa ter em linha de conta, fundamentalmente o disposto nos artigos 919.º e 920,º, ambos do CPC.

Alega a recorrente que a decisão recorrida é nula, porquanto não curou da questão de averiguar da necessidade de lhe ser notificada a decisão de extinção da execução, a qual, na sua óptica, decorre do disposto no n.º 2 do artigo 919.º, CPC.

Assim não se considerando, sempre a decisão recorrida terá de ser rotulada de inconstitucional, por violação do artigo 20.º, n.os 1, 4 e 5, da CRP, por lhe coarctar o exercício do direito de requerer a renovação da execução extinta, ao abrigo do preceituado no artigo 920.º, do CPC, atenta a sua qualidade de credor reclamante.

Por último, e para o caso de nenhum destes vícios ser declarado, solicita se revogue a decisão recorrida, considerando-se que o pedido de renovação da execução extinta, que formulou, o ter sido atempadamente, dado que só veio a ter conhecimento de que a execução havia sido declarada extinta, quando lhe foi notificada a decisão de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide nos autos de reclamação de créditos, decisão, esta, datada de 08 de Setembro de 2010 e que foi motivada pela pretérita declaração de extinção da execução, que não lhe foi notificada.

Pelo que, conclui, cumpriu o prazo estipulado de 10 dias, contados do conhecimento que teve (embora, pela referida via indirecta) da decisão de extinção da execução.

Por seu turno, como vimos, a decisão recorrida, para fundamentar o indeferimento do pedido de prosseguimento dos autos de execução formulado pela ora recorrente, assenta em dois argumentos:

- do artigo 920.º CPC, resulta que para ser viável o prosseguimento da execução tem de haver bens penhorados, o que não se verifica in casu, por já ter sido cancelada a penhora efectuada ao abrigo da presente execução e;

- por o requerimento a formular tal pedido de renovação da execução extinta ter sido formulado muito para além do prazo de 10 dias contados da notificação da extinção da execução, sendo que esta foi declarada extinta em 20 de Junho (a data certa é a de 22/06/2010 – cf. fl.s 127) e o requerimento a formular o pedido de renovação deu entrada em juízo em 20 de Setembro de 2010.

            Atento a que a execução em apreço deu entrada em juízo no dia 04 de Abril de 2008, é aplicável à situação sub judice, a redacção que foi dada aos artigos 919.º e 920.º do CPC, pelo DL 38/2003, de 8/3 (o DL 226/2008, de 20 de Novembro só entrou em vigor em 31/3/2009, cf. seu artigo 23.º).

            Dispõe o artigo 919.º do CPC, no seu n.º 1, que a execução se extingue, entre outros casos, quando for liquidada a quantia exequenda (note-se, que como consta de fl.s 122, a Agente de Execução, veio informar “que o processo se encontra liquidado”, e que iria efectivar a extinção dos autos).

            Acrescentando-se no seu n.º 2 que a extinção é notificada ao executado, ao exequente e aos credores reclamantes.

            De acordo com o que se estabelece no artigo 920.º, n.os 2 a 4, do CPC:

            “Também o credor cujo crédito esteja vencido e haja reclamado para ser pago pelo produto de bens penhorados que não chegaram entretanto a ser vendidos nem adjudicados, pode requerer, no prazo de 10 dias contados da notificação da extinção da execução, o prosseguimento desta para efectiva verificação, graduação e pagamento do seu crédito.” (n.º 2).

            Acrescentando-se nos demais números que a execução prossegue somente quanto aos bens sobre que incida a garantia real invocada pelo requerente, que assumirá a posição de exequente, sem necessidade de se repetirem as citações e aproveitando-se tudo o que tiver sido processado relativamente aos bens em que prossegue a execução, devendo ser os restantes credores e o executado notificados do requerimento.

            Como refere Lebre de Freitas, in A Acção Executiva, Depois da Reforma, 4.ª Edição, Coimbra Editora, 2004, a pág. 364, não obstante o artigo 920.º CPC se refira, em geral, à execução extinta, a renovação só poderá ter lugar quando a extinção da execução tenha ocorrido por extinção da obrigação exequenda, por desistência do exequente ou transacção.

            Ora, uma vez que, como já referido, a causa de extinção da execução foi a liquidação da dívida exequenda, nada obsta, por este prisma, a que a recorrente, na qualidade de credora reclamante, pudesse requerer o prosseguimento dos autos nos moldes em que o fez.

            Como nos diz Salvador da Costa, in O Concurso de Credores, Almedina, 1998, a pág. 301, o disposto no artigo 920.º CPC “… constitui uma excepção ao princípio de que a acção executiva só funciona em benefício do exequente, e pressupõe que ela seja declarada extinta sem que tenham sido vendidos todos os bens penhorados …”.

            Com as alterações que através dos DL 329-A/95, de 12/12 e 38/2003, de 8/3, a faculdade de fazer prosseguir a execução foi, primeiro, alargada a todos os credores reclamantes cujos créditos tivessem sido liminarmente admitidos e, num segundo momento, com a eliminação de despacho liminar no apenso de reclamação de créditos, a todos os credores, a partir do momento da reclamação.

            Por outro lado, suprimida que foi a sentença de extinção da execução, o credor passou a poder requerer o prosseguimento dos autos, para os fins previstos neste preceito, a partir do prazo de 10 dias após a notificação a que se alude no artigo 919.º, n.º 2, CPC.

            Desde a alteração feita pelo primeiro DL ora referido, o prosseguimento da execução deixou de ter apenas a finalidade do pagamento do crédito, para passar também a de o fazer verificar e graduar – veja-se, no sentido ora exposto Lebre de Freitas, in CPC, Anotado, Vol. 3.º, Coimbra Editora, 2003, a pág. 635.

           

            Como resulta da factualidade retratada nos autos, a ora recorrente, reclamou o seu crédito atempadamente, invocando a existência de uma hipoteca de que beneficia e onera o imóvel penhorado.

            Em 22 de Junho de 2010 a Solicitadora de Execução declarou extinta a execução.

             No entanto, como se constata de fl.s 128 a 133, a ora reclamante, na qualidade de credora reclamante não foi notificada desta decisão, quando a lei (artigo 919.º, n.º 2 do CPC) impõe que teria que o ser.

            O direito que lhe é conferido pelo n.º 2 do artigo 920.º do CPC, pressupõe a notificação da decisão que declarou extinta a execução, a qual, como vimos, não lhe foi feita, quando o deveria ter sido, como já assinalado, pelo que importa averiguar quais as consequências que derivam da omissão de tal notificação.

            E isto sem olvidar que para além desta omissão, logo a Solicitadora de Execução procedeu ao cancelamento da penhora que havia sido efectuada por via dos presentes autos.

            Facto que, segundo pensamos, levou o M.mo Juiz a quo a indeferir o requerido pela ora recorrente, com o argumento de que já não havia bens penhorados.

            Não obstante, tal argumentação não colhe.

            Em primeiro lugar, porque no n.º 2 se faz referência a “bens penhorados que não chegaram entretanto a ser vendidos nem adjudicados”, sendo esta, como acima já se referiu, uma das condições de procedibilidade do pedido de prosseguimento de execução extinta.

            Ora, tal condição tem de ter-se por verificada, dado que houve bens penhorados, que não foram vendidos nem adjudicados, independentemente de a penhora já ter sido cancelada.

            Mormente, quando este cancelamento se verifica após a omissão da notificação aos credores reclamantes da decisão de extinção da execução, prazo após o qual se começava a contar o prazo para o fazer e mais do que isso, tal condição é indispensável para que a reclamante pudesse exercer o direito que pretende ver satisfeito.

            Denegar tal direito, como consequência da omissão de um acto que a lei impunha, não nos parece curial, para além de que deixaria o credor reclamante sem protecção, vendo o bem penhorado ficar livre desse ónus e regressar, tal como antes da execução, à esfera jurídica do executado.

            Assim, não colhe a argumentação de que já não havia bem penhorado.

            De igual modo não pode relevar a intempestividade do pedido de renovação da execução, uma vez que este prazo só começa a contar-se a partir da notificação da extinção da execução, que ainda não foi feita.

            Consequentemente, não começou, sequer, tal prazo a correr.

            A omissão da notificação da decisão de extinção da execução aos credores reclamantes constitui uma nulidade, já que se traduz na omissão de um acto que a lei prescreve e que, sem margem para dúvidas, tem influência directa na decisão da causa – cf. artigo 201.º, CPC.

            Efectivamente, só com a notificação da decisão de extinção da execução é que o credor reclamante poderia lançar mão do disposto no artigo 920.º, n.º 2, do CPC.

            A formulação deste pedido depende daquela notificação.

            Do que decorre padecer a decisão recorrida da invocada nulidade, pois que devia ter conhecido da omissão de tal notificação e ordenar que à mesma se procedesse.

            Por outro lado, a mesma foi tempestivamente arguida, uma vez que a ora recorrente apenas tomou conhecimento da decisão de extinção da execução com a decisão de extinção da instância por inutilidade superveniente – cf. artigo 205.º, n.º 1, CPC.

            E ainda que assim se não considerasse, a mesma poderia ser arguida nas alegações do presente recurso.

            Dado que se trata de decisão que só com a respectiva notificação chegou ao conhecimento do destinatário, o prazo para a sua arguição conta-se a partir do dia em que ocorreu tal notificação – cf. artigo 205.º, n.º 1 do CPC e mediante a competente reclamação, nos termos da 2.ª parte do n.º 2 do artigo 202.º do mesmo Código, o que não aconteceu, vindo os recorrentes a fazê-lo só com a interposição deste recurso.

            Não obstante assim ter sucedido, somos de opinião que a mesma poderia, como o foi, ser arguida nas alegações que motivam o presente recurso, porque é a própria decisão recorrida que sanciona a nulidade em causa.

            Como já ensinava Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, edição de 1979, a pág. 183 “se a nulidade está coberta por uma decisão judicial que ordenou, autorizou ou sancionou, expressa ou implicitamente, a prática de qualquer acto que a lei impõe, o meio próprio para a arguir não é a simples reclamação, mas o recurso competente a interpor e a tramitar como qualquer outro do mesmo tipo. Trata-se em suma da consagração do brocardo: «dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se».

            O mesmo defendia Antunes Varela, in Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, a pág.s 378 e 379 e o Prof. Alberto dos Reis, in Comentário …, Vol. II, a pág.s 507 e 508.

            Assim, tem de se concluir que o meio próprio para conhecer da arguida nulidade sempre seria o presente recurso, pelo que a mesma tem de se considerar como tempestivamente arguida.

            Em conformidade com o n.º 2 do artigo 201.º, CPC, a anulação de um acto acarreta a anulação dos termos subsequentes que dele dependam absolutamente.

            É o caso, nomeadamente, do cancelamento da penhora.

            Consequentemente, tem o presente recurso de proceder, anulando-se os termos ulteriores do processo de execução subsequentes à declaração de extinção da execução, a qual deverá, nos termos expostos, ser notificada aos credores reclamantes, tal como preceitua o n.º 2 do artigo 919.º do CPC, tornando-se despiciente a análise das demais questões invocadas.

            Assim, procede o recurso interposto.

Nestes termos se decide:       

Julgar procedente o presente recurso de apelação, em função do que se declara a nulidade da decisão recorrida, por omissão da notificação a que se alude no n.º 2 do artigo 919.º que, por isso, se revoga, substituindo-se a mesma por outra que determine a realização da notificação omitida, seguindo, após esta, o processo os seus ulteriores termos.

Custas pelo apelado.


Arlindo Oliveira (Relator)
Emídio Francisco Santos
António Beça Pereira