Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
21/11.8TBCLB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: EXECUÇÃO
EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA
COMPETÊNCIA
AGENTE DE EXECUÇÃO
Data do Acordão: 06/23/2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA - C.BEIRA - JUÍZO C. GENÉRICA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS.132, 721 Nº3, 723 Nº1 C), 849 Nº3 CPC
Sumário: 1. Na acção executiva, o juiz exerce funções de tutela e de controlo mas não lhe cabe, em regra, extinguir a instância - extinta automaticamente, na sequência de comunicação electrónica do agente de execução -, a notificar ao executado, ao exequente e aos credores reclamantes, os quais poderão, então, reclamar para o juiz, ao abrigo do art.º 723º, n.º 1, alínea c), do CPC.

2. Esgotado o prazo de reclamação, a extinção da execução é comunicada, por via electrónica, ao tribunal, sendo assegurado pelo sistema informático o arquivo automático e electrónico do processo, sem necessidade de intervenção judicial ou da secretaria (art.º 849º, n.º 3 do CPC).

3. A instância executiva considera-se pendente até que ao tribunal seja efectuada a comunicação a que alude o n.º 3 do art.º 849º do CPC.

4. Tendo o juiz “determinado” que o agente de execução procedesse à extinção da execução mas se, então, o exequente pagara a “provisão” de honorários constante da respectiva “nota discriminativa” enviada com a cominação prevista no art.º 721º, n.º 3 do CPC, evidenciando-se, outrossim - pelos actos subsequentes e a tramitação de mais de cinco meses - a intenção de normal prosseguimento dos autos, é de considerar que o simples decurso do prazo de 30 dias indicado numa primeira notificação (e numa segunda e coeva notificação, a que se respondeu tempestivamente) não justifica que a execução seja, posteriormente, no descrito circunstancialismo, julgada extinta.

Decisão Texto Integral:                 

              

            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:       

I. Em 08.02.2011, S (…), S. A., instaurou contra L (…) e G (…) acção executiva para pagamento da quantia de € 13 976,23 (capital e juros), baseada numa livrança cujo valor não foi pago na data de vencimento.

Por despacho de 17.10.2019, a Mm.ª Juíza a quo, nos termos do art.º 721º, n.º 3 do Código de Processo Civil (CPC), julgou improcedente a reclamação da decisão proferida pela Sr.ª Agente de Execução (AE) no sentido de julgar extinta a execução.

Inconformada, a exequente apelou formulando as seguintes conclusões:  

1ª - Na sequência da decisão de extinção elaborada pela AE em 04.7.2019, com fundamento da falta de pagamento de provisão devida, o Exequente apresentou reclamação daquele acto.

2ª - O Mm.º Juiz de Direito, na sentença de que se recorre julgou a impugnação improcedente, mantendo a decisão proferida pela AE, entendendo que “a notificação foi efetuada, a exequente tomou conhecimento da mesma, dela não apresentou qualquer reclamação e, portanto, eram as quantias devidas, não tendo sido as mesmas pagas no prazo legalmente concedido para o efeito. Prazo esse que é peremptório e em relação ao decurso do qual a lei estabelece uma cominação específica: a extinção da execução.”

3ª - Em 25.01.2019, a AE requereu ao Mm.º Juiz de Direito do Tribunal autorização para levantamento do sigilo fiscal, para aferir junto do serviço de finanças, o domicílio fiscal dos co-herdeiros identificados na participação de imposto de selo.

4ª - Os autos aguardavam naquela data por autorização para proceder ao levantamento do sigilo fiscal com vista à concretização da penhora do quinhão hereditário da executada nomeado à penhora pelo Exequente oportunamente, que poderia não ser autorizado.

5ª - Na mesma data, a AE elaborou a sua nota de despesas e honorários e notificou o Exequente para proceder à sua liquidação, não se tratando de um mero pedido de provisão cujo pagamento fosse essencial para prosseguir com as diligências de penhora.

6ª - Nos termos do art.º 50º da portaria n.º 282/2013, de 29.8, “os honorários referidos no artigo anterior são pagos ao agente de execução no termo do processo ou procedimento, ou quando seja celebrado entre as partes acordo de pagamento em prestações.”

7ª - Nenhuma das situações supra referidas se verificava, pelo que não era oportuna a elaboração da nota de despesas e honorários pela AE, pelo que deveria a AE ter emitido um pedido de provisão no montante que entendesse necessário para acautelar os seus honorários ou as despesas futuras com as diligências requeridas pelo Exequente, e não elaborar a nota de despesas da AE.

8ª - Acresce que o teor do n.º 3 do art.º 721º do CPC, tem na sua origem o art.º 4º do DL n.º 4/2013, de 11.01, sob a epígrafe “Extinção da instância por não pagamento da remuneração devida a agente de execução”, donde se extrai que quando esteja em falta o pagamento de quantias devidas ao AE, a título de honorários e despesas, o AE notifica o exequente de que, se no prazo de 30 dias não efectuar o respectivo pagamento, a instância se extingue.

9ª - Os montantes que a AE notificou o exequente para liquidar, correspondem à nota de despesas e honorários do AE, que não se inclui no conceito de despesa devida a AE tipificada no n.º 1 do art.º 4º do DL n.º 4/2013, de 11/01, o qual também era interpretado em harmonia com o disposto na Portaria n.º 331-B/2009, de 30.3, diploma que regulamentava vários aspectos das acções executivas cíveis, entre os quais a qualificação das despesas devidas a agente de execução.

10ª - Dispunham os art.ºs 11º, n.º 1 e 21º, n.º 1 da aludida portaria que o AE tinha direito a ser reembolsado das despesas necessárias que realizasse no exercício das suas funções e que comprovasse devidamente.

11ª - As despesas a que se refere, portanto, o art.º 4º n.º 1 do DL n.º 4/2013, de 11/01 dizem respeito às despesas que já tenha efectuado, a expensas suas, e a cujo reembolso teria direito, não se incluem, assim, no conceito de despesas, as que efectivamente ainda não foram suportadas pelo AE, ou a nota de despesas e honorários deste, como era o caso dos autos.

12ª - A falta de pagamento pelo exequente do montante requerido pela AE a título de nota de despesas não consubstancia falta de pagamento de despesas devidas ao AE como configuradas, pelo que não nos deparamos com uma situação de incumprimento de um dever por parte do exequente correspectivo de um direito do AE de exigir o pagamento de quantia em dívida.

13ª - O pagamento solicitado corresponde ao cumprimento de um ónus, sendo certo que na data em que a AE elaborou a nota de despesas e honorários, a mesma não era admissível, pois não se verifica nenhuma das situações indicadas no art.º 50º da Portaria n.º 282/2013, de 29.8.

14ª - A falta de pagamento do montante indicado pela AE não se mostrava à data necessário para impulsionar o processo, os autos aguardavam pela autorização para levantamento do sigilo fiscal requerida pela AE.

15ª - Acresce que, em 14.6.2019, a AE notificou o Exequente para proceder ao pagamento do pedido de provisão emitido em 25.01.2019.

16ª - O art.º 721º, n.º 3 do CPC refere o pagamento de honorários e despesas, e não o pagamento da nota de despesas e honorários conforme solicitava a AE, pelo que não poderia enquadrar-se a situação dos autos nesta norma.

17ª - Após tal notificação o Exequente, em 21.6.2019, procedeu à liquidação do montante solicitado pela AE, que emitiu o respectivo recibo/factura em 26.6.2019, liquidação efectuada muito antes do prazo de 30 dias concedido para o efeito, pelo que inexiste fundamento para extinguir a acção executiva nos termos em que o fez a AE., e confirmou o Mm.º Juiz de Direito a quo.

18ª - Em 01.7.2019, a AE enviou ao Exequente outro pedido de provisão para obtenção de informações no Serviço de Finanças, que o Exequente também liquidou.

19ª - Em 04.7.2019, a AE elaborou decisão de extinção por falta de pagamento da nota de despesas e honorários elaborada em 25.01.2019.

20ª - Se a AE tivesse intenção de extinguir os presentes por falta de pagamento da nota de despesas e honorários elaborada em 25.01.2019, não deveria ter notificado o Exequente para fazer o pagamento da mesma em 14.6.2019, nem emitido outro pedido de provisão em 01.7.2019, ou emitindo os respectivos recibos.

21ª - A actuação da AE fez o Exequente crer que não havia considerado existir fundamento para extinguir os autos pela falta de pagamento da nota de despesas e honorários elaborada em 25.01.2019, pois se assim fosse teria desde logo extinto os autos, e não teria emitido novos pedidos de provisão em 14.6.2019 e 01.7.2019.

22ª - Assim, se em 14.6.2019, a AE enviou nova notificação ao Exequente, não pode aceitar-se que os autos sejam extintos com fundamento na notificação remetida em 25.01.2019, pois se posteriormente remeteu nova notificação, não poderá valer-se da primeira notificação, quando concedeu novo prazo ao Exequente para liquidar o montante, o qual foi cumprido.

23ª - Tratar-se-á de uma decisão surpresa que o Exequente não poderia antever, e que mais a mais se mostra contrária à actuação anterior da AE.

24ª - A sentença de que se recorre é nula por violação do art.º 721º, n.º 3 do CPC, pelo que deve ser revogada, ordenando-se o prosseguimento dos autos, revogando a decisão de extinção por falta de pagamento de provisão devida à AE.

Não houve resposta.

Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso[1], importa reapreciar e decidir, apenas, se a execução ficou extinta ou se assim não sucedeu e nada obsta ao seu prosseguimento.


*

II. 1. Para a decisão do recurso releva o relatório que antecede e os seguintes actos e tramitação:[2]

a) Em 23.3.2012 realizou-se a penhora de “1/3 da pensão que o executado aufere através da C(…), até perfazer o montante de € 17 154,71”.

b) Por despacho de 19.10.2015 foi autorizada a consulta de elementos protegidos pelo sigilo fiscal visando apurar a “entidade processadora dos rendimentos” auferidos pela executada G(…) e os elementos relativos à herança em que a mesma executada “consta como herdeira”.

c) Em 11.12.2018, a Mm.ª Juíza a quo determinou a notificação da AE para, “em cinco dias, sob pena de condenação em multa processual e comunicação ao caaj[3], vir dar imediato cumprimento ao disposto no art.º 750º, n.ºs 1 e 2 do CPC, comprovando-o nos autos, informando o Tribunal do estado das diligências”, e bem assim que caso não fossem “indicados bens penhoráveis no prazo legal de dez diasdeveria a AE “proceder à formalização da extinção da instância, respectivas notificações e informação aos autos[4].

Determinou-se, ainda, a notificação da exequente “para vir requerer o que tiver por conveniente, no prazo legal de dez dias, sob pena do decurso do prazo previsto no art.º 281º, n.º 5 do CPC”.

d) A 20.12.2018, a exequente comprovou haver dirigido à AE requerimento pedindo a penhora do quinhão hereditário da executada G (…) relativamente à herança aí identificada, para o que se devia indagar previamente as moradas dos demais herdeiros, atento o disposto no art.º 781º, n.º 1 do CPC.

e) Na mesma data, a exequente esclareceu o Tribunal daquele impulso dos autos de execução, dito em d).

f) Por despacho de 17.01.2019, a Mm.ª Juíza a quo ordenou a notificação da AE “para responder, no prazo máximo de dez dias, no cumprimento das suas funções, ao que lhe foi solicitado, pela exequente, no dia 20.12.2018, sob pena de condenação em multa processual e comunicação ao caaj”.

g) Veio então a AE requerer ao Tribunal, em 25.01.2019, o levantamento do sigilo fiscal para “a identificação e domicílio fiscal do participante e demais herdeiros identificados na participação de imposto de selo da herança da qual a executada consta como herdeira, porquanto tal informação não se encontra abrangida no despacho anteriormente deferido” (sic).[5]

h) O que foi atendido por despacho de 05.02.2019, autorizando-se “a consulta das bases de dados e outos elementos protegidos pelo sigilo fiscal e elencados a fls. 92, apenas para os fins aí mencionados”.

i) Em 25.01.2019, a AE solicitara à exequente a importância de € 252,73 “a título de provisão, conforme resulta do documento anexo” (sic). Mais referiu: “A provisão deve ser paga no prazo de 10 (DEZ) DIAS (…)./ Por razões de segurança solicito que me seja remetida uma cópia do comprovativo do pagamento (talão de depósito, ou confirmativo) por carta, mail, ou fax./ Tendo em consideração o disposto no n.º 3 do artigo 721º do Código do Processo Civil (CPC) o processo é declarado extinto decorrido o prazo de 30 dias sem que se mostre pago o valor devido.”

j) Consta do aludido “documento anexo”, reportado a 17.12.2018 (denominado no processo electrónico como “pedido de provisão simplificado”):

«NOTA DISCRIMINATIVA

HONORÁRIOS QUANTIDADE VALOR

1 Fase I - 127,50 €

            3.4 Por bem penhorado (não inclui móveis) 2 bem(s) - 51,00 €

4.1 (a) Citações via postal (efectiva) 1 acto(s) - 20,40 €

4.1. (b) Citações via postal (frustrada) 4 acto(s) -  40,80 €

4.3 Citações editais / Editais (Publicidade Venda) 1 acto(s) - 51,00 €

5.1 Notificações ou comunicações por via postal, fax ou meios electrónicos 26 acto(s) - 132,60 €

DESPESAS SUJEITAS A IVA

QUANT. DESCRITIVO VALOR UNITÁRIO SUB TOTAL

Expediente Geral e Fotocópias - 20,00 €

5 Selos de Autenticação 0,50 € - 2,50 €

2 Correio Simples 0,47 € - 0,94 €

13 Correio Registado Simples 3,32 € - 43,16 €

5 Citações via postal 7,15 € - 35,75 €

9 Notificações via postal 5,27 € - 47,43 €

0 REMUNERAÇÃO BANCOS – C(…) - 10,20 €

0 REMUNERAÇÃO BANCOS – B(…) - 10,20 €

0 REMUNERAÇÃO BANCOS – S (…) - 5,10 €

0 REMUNERAÇÃO BANCOS – B(…) - 10,20 €

0 REMUNERAÇÃO BANCOS – M(…) - 10,20 €

0 REMUNERAÇÃO BANCOS – M (…) - 10,20 €

DESPESAS NÃO SUJEITAS A IVA

QUANT. DESCRITIVO VALOR UNITÁRIO SUB TOTAL

Provisão AEDel - 120,98 €

Certidão do Serviço de Finanças - 8,56 €

RESUMO

Honorários - 423,30 €

Despesas sujeitas a IVA - 205,88 €

SUB TOTAL (1) - 629,18 €

TOTAL DE HONORÁRIOS SEM IVA - 629,18 €

IVA (23%) - 144,71 €

TOTAL A PAGAR A TÍTULO DE HONORÁRIOS - 773,89 €

Despesas não sujeitas a IVA - 129,54 €

TOTAL A PAGAR A TÍTULO DE EMOLUMENTOS - 129,54 €

SALDO A SER PAGO AO A.E. - 903,43 €

APURAMENTO DE RESPONSABILIDADE DE EXECUTADO

Quantia Recuperada - 521,16 €

Emolumentos entidades terceiras (adiantamento exequente deduzido - 129,54€)

Honorários e despesas c/ AE - 773,89 €

VALOR DE HONORÁRIOS POR LIQUIDAR - 252,73 €»

k) Em 12.6.2019, a Mm.ª Juíza a quo ordenou a notificação da AE “para, no prazo de cinco dias (uma vez que, após a notificação pela Secção, não se dignou a responder ao Tribunal), vir informar os autos do estado das diligências, nomeadamente, se foi dado cumprimento, e em que termos, ao despacho proferido em 17.01.2019 (há quase cinco meses), sendo que se não o fizer, no prazo estabelecido, será condenada em multa processual por omissão de colaboração com o Tribunal e será comunicada a sua actuação ao caaj.

l) A 14.6.2019, a AE informou o Tribunal do seguinte: “O M. I. Mandatário da Exequente requereu a penhora do quinhão hereditário que a Executada G.... é titular;/ - Nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 781º do CPC, a penhora do quinhão é efectuada mediante notificação do facto aos demais co-herdeiros;/ - Foi oficiado o Serviço de Finanças competente, para prestar a informação necessária para cumprimento do disposto no n.º 1 do art.º 781º do CPC, estando a aguardar resposta;/ - Foi ainda, na presente data, notificado o M. I. Mandatário da Exequente, que se encontra por liquidar o pedido de provisão efectuado em 25-01-2019, com a advertência que, tendo em consideração o disposto no n.º 3 do art.º 721º do CPC, o processo é declarado extinto decorrido o prazo de 30 dias sem que se mostre paga a

provisão devida ao Agente de Execução”.

            m) No mesmo dia, a AE solicitou ao Serviço de Finanças de Celorico da Beira “nos termos do disposto no n.º 5, do artigo 749º, do Código do Processo Civil” informação sobre “o domicílio fiscal do participante e demais herdeiros, relativamente à herança (…), da qual a executada G (…) (…) consta como herdeira, e cuja cópia da relação de bens se remete em anexo./ Mais informa, que a referida informação é necessária para que possam os herdeiros ser notificados nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do art.º 781º do CPC”.

            n) Também nessa data a AE notificou a exequente de “(…) que se encontra por liquidar o pedido de provisão efectuado em 25-01-2019, cuja cópia se remete em anexo./ Mais fica V. Exa. notificado, que tendo em consideração o disposto no n.º 3 do artigo 721º do CPC, o processo é declarado extinto decorrido o prazo de 30 dias sem que se mostre paga a provisão devida ao Agente de Execução./ DOCUMENTOS ANEXOS/ Pedido provisão/ DATA E ASSINATURA/ 14-06-2019”.[6]

            o) Em 25.6.2019, a AE procedeu ao pagamento das importâncias devidas às entidades bancárias referidas em j) e levantou a importância de € 196,63 a título de honorários a si devidos (a pagar até 02.7.2019).[7]

p) A 28.6.2019, a Mm.ª Juíza a quo proferiu o seguinte despacho: “Informação da Sr.ª A. E. que antecede:/ Em face da advertência que foi feita à exequente, pela Sr.ª A.E., em 25.01.2019 – há cinco meses! – a execução há muito deveria estar extinta (como escrito pela Sr.ª A.E.: “tendo em consideração o disposto no n.º 3 do art.º 721º do Código do Processo Civil (CPC) o processo é declarado extinto decorrido o prazo de 30 dias sem que se mostre pago o valor devido”), portanto a Sr.ª A.E., no cumprimento das suas funções, logo decorridos trinta dias da sua advertência efectuada em 25.01.2019 deveria ter extinguido a presente execução./ Assim, cumpra a Sr.ª A.E., no prazo máximo e peremptório de cinco dias o art.º 849º, n.º 3, aplicável ex vi art.º 721º, n.º 3 do CPC, ficando a Sr.ª A. E. advertida de que, se não cumprir o determinado no prazo concedido, tal lapso não será relevado e a mesma será condenada em multa processual (uma vez que a execução já devia estar extinta) e será comunicada a sua actuação ao caaj./ Alarme em conformidade e decorrido o prazo concedido abra conclusão. (…)

q) Face àquele despacho, por requerimento de 04.7.2019, a AE informou nos autos que «procedeu, na presente data, à extinção da execução, notificando as partes para o efeito

r) Em 04.7.2019, a AE proferiu a seguinte decisão:

“Compulsados os autos, verifica-se que, em 25-01-2019, foi a exequente notificada para proceder à liquidação do pedido de provisão, com a expressa advertência que ´tendo em consideração o disposto no n.º 3 do artigo 721º do Código do Processo Civil (CPC), o processo é declarado extinto decorrido o prazo de 30 dias sem que se mostre pago o valor devido`./ O exequente não procedeu à liquidação do valor devido à AE, no prazo estipulado para o efeito./ O pagamento ao agente de execução de quantias devidas a título de honorários e despesas é legalmente erigida como uma condição de prosseguimento da execução (n.º 2 do art.º 721º do CPC)./ Assim, nos termos e para os efeitos do disposto das disposições conjugadas do n.º 3 do art.º 721º e da al. f) do n.º 1 do art.º 849º, ambos do CPC, perante a falta de pagamento dessas quantias, extingue-se a execução por falta de pagamento da provisão devida ao Agente de Execução.”

s) Em 01.7.2019 e 24.7.2019, a AE notificou a exequente para lhe entregar a importância de € 11,37, a título de provisão, no prazo de 10 dias, sob cominação do disposto no n.º 3 do art.º 721º do CPC.

t) Em 14.8.2019, a exequente reclamou daquela decisão da AE e pugnou para que a mesma fosse dada sem efeito, prosseguindo os autos com a penhora dos bens indicados pela exequente.

u) A AE, notificada da mencionada reclamação para se pronunciar, querendo, no prazo de 10 dias, nada disse.

v) Com a reclamação dita em t), a exequente juntou um documento/cópia referente à factura B/5950/”Honorários e despesas”, no montante de € 252,73, e correspondente recibo, emitidos pela AE, datados de 26.6.2019.[8]

w) Perante tal reclamação, a Mm.ª Juiz a quo veio a decidir (a 17.10.2019):

«A fls. 50-52, veio a exequente impugnar a decisão proferida pela sra. AE, no sentido de julgar extinta a execução, nos termos do art.º 721º, n.º 3 do CPC.

Alegou, para o efeito, que: - a sra. AE elaborou uma nota de despesas e honorários e não um mero pedido de provisão; /- os honorários são devidos ao AE nas situações previstas no art.º 51º da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto, o que não era o caso dos autos; /- a falta de pagamento do montante indicado pela sra. AE não se mostrava necessário para impulsionar o processo, uma vez que os autos aguardavam pela autorização para levantamento do sigilo fiscal; /- o art.º 721º, n.º 3 do CPC refere expressamente o pagamento de provisão e não o pagamento de nota de despesas e honorários; /- a sra. AE efetuou nova notificação para pagamento a 21.6.2019, tendo a exequente procedido ao pagamento da quantia em causa no dia 26.6.2019, ou seja, antes do final do prazo de 30 dias concedido para o efeito; /- ao efetuar nova notificação no dia 21.6.2019 não pode a sra. AE pretender valer-se da anterior notificação no mesmo sentido.

A sra. AE, notificada para se pronunciar, remeteu-se ao silêncio.

Cumpre apreciar e decidir.

Compulsados os autos, verifica-se que, no dia 25.01.2019, foi notificada para proceder ao pagamento de 252,73€, a título de provisão. / Em anexo à referida notificação, enviou a sra. AE à exequente nota discriminativa de honorários e despesas. / Vem, nesta sede, a exequente alegar que não se tratava de um mero pedido de provisão, mas de uma verdadeira nota de honorários e despesas. / Em primeiro lugar, cumpre assinalar que poderia a exequente ter apresentado reclamação da referida nota, no prazo de 10 dias contados da notificação da mesma, nos termos do art.º 46º da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto. / Não o tendo feito, não incumbe, neste momento, ao Tribunal apreciar se os montantes eram efetivamente devidos, bem como se era oportuna a sua apresentação. / Com efeito, foi a nota discriminativa apresentada e não reclamada. / Ademais, acrescente-se ainda que os montantes devidos a título de honorários e despesas vão sendo adiantado pelo exequente, ao longo da execução, nos termos dos art.ºs 45º e 47º da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto e 721º, n.ºs 1 e 2 do CPC, ou seja, o AE pode exigir, a título de provisão, quantias por conta de honorários ou despesas. / Por outro lado, não tem razão a exequente quando refere que o art.º 721º, n.º 3 do CPC menciona expressamente o pagamento de provisão, não dizendo respeito à falta de pagamento de honorários e despesas. / Na verdade, dispõe o art.º 721º, n.º 3 do CPC que “[a] instância extingue-se logo que decorrido o prazo de 30 dias após a notificação do exequente para pagamento das quantias em dívida, sem que este o tenha efetuado, aplicando-se o disposto no n.º 3 do art.º 849º”. / Ora, por “quantias em dívida” deverá entender-se qualquer montante cujo pagamento seja solicitado pelo AE, não reclamado e não pago. / Destarte, conclui-se que o não pagamento da quantia solicitada por notificação efetuada a 25.01.2019 se enquadra na previsão normativa do art.º 721º, n.º 3 do CPC. / Falece ainda o último dos argumentos apresentados pela exequente: não é pelo facto da sra. AE, indevidamente, e decorridos cerca de 5 meses, ter efetuado nova notificação que a anterior deixa de produzir os seus efeitos. / Pelo contrário, a notificação foi efetuada, a exequente tomou conhecimento da mesma, dela não apresentou qualquer reclamação e, portanto, eram as quantias devidas, não tendo sido as mesmas pagas no prazo legalmente concedido para o efeito. Prazo esse que é perentório e em relação ao decurso do qual a lei estabelece uma cominação específica: a extinção da execução. / Pelo exposto, o Tribunal julga a presente impugnação totalmente improcedente, mantendo, na íntegra, a decisão proferida pela sra. AE. / Notifique e comunique

            x) Declarada a executada G (…)insolvente, por despacho de 27.4.2020, determinou-se a suspensão da execução em relação à mesma e o seu prosseguimento quanto ao executado.

2. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

O processo tem natureza eletrónica, sendo constituído por informação estruturada constante do sistema de informação de suporte à atividade dos tribunais e por documentos eletrónicos (art.º 132º, n.º 1 do CPC de 2013[9]). A tramitação dos processos, incluindo a prática de atos escritos, é efetuada no sistema de informação de suporte à atividade dos tribunais, nos termos definidos por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça (n.º 2)[10]. O processo pode ter um suporte físico, a constituir nos termos definidos por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça, com o objetivo de apoiar a respetiva tramitação (n.º 6).[11]

A tramitação dos processos executivos é, em regra, efetuada eletronicamente, nos termos do disposto no artigo 132º e das disposições regulamentares em vigor (art.º 712º, n.º 1). Todas as consultas a realizar pelo agente de execução com vista à efetivação da penhora, bem como quaisquer comunicações entre este e os serviços judiciais ou outros profissionais do foro e entidades públicas, nomeadamente para ordenar a realização de penhoras, a sua modificação ou levantamento, são, em regra, realizadas por meios eletrónicos (n.º 3).[12]

O registo informático de execuções contém o rol das execuções pendentes e, relativamente a cada uma delas, a seguinte informação: a) Identificação do processo de execução; b) Identificação do agente de execução; c) Identificação das partes, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 724º; d) Pedido; e) Bens indicados para penhora; f) Bens penhorados; g) Identificação dos créditos reclamados (art.º 717º, n.º 1). Do mesmo registo consta também o rol das execuções findas ou suspensas; o agente de execução deve manter atualizado o registo informático de execuções (n.ºs 2 e 4).

A consulta do registo informático de execuções pode ser efetuada: a) Por magistrado judicial ou do Ministério Público; b) Por pessoa capaz de exercer o mandato judicial ou agente de execução; c) Pelo titular dos dados (art.º 718º, n.º 4).

Cabe ao agente de execução efetuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz, incluindo, nomeadamente, citações, notificações, publicações, consultas de bases de dados, penhoras e seus registos, liquidações e pagamentos (art.º 719º, n.º 1). Mesmo após a extinção da instância, o agente de execução deve assegurar a realização dos atos emergentes do processo que careçam da sua intervenção (n.º 2). Incumbe (…) à secretaria notificar, oficiosamente, o agente de execução da pendência de procedimentos ou incidentes de natureza declarativa deduzidos na execução e dos atos aí praticados que possam ter influência na instância executiva (n.º 4).

Os honorários devidos ao agente de execução e o reembolso das despesas por ele efetuadas, bem como os débitos a terceiros a que a venda executiva dê origem, são suportados pelo exequente, podendo este reclamar o seu reembolso ao executado nos casos em que não seja possível aplicar o disposto no artigo 541º (art.º 721º, n.º 1, sob a epígrafe “Pagamento de quantias devidas ao agente de execução”). A execução não prossegue se o exequente não efetuar o pagamento ao agente de execução de quantias que sejam devidas a título de honorários e despesas (n.º 2). A instância extingue-se logo que decorrido o prazo de 30 dias após a notificação do exequente para pagamento das quantias em dívida, sem que este o tenha efetuado, aplicando-se o disposto no n.º 3 do artigo 849º (n.º 3). O agente de execução informa o exequente e o executado sobre as operações contabilísticas por si realizadas com a finalidade de assegurar o cumprimento do disposto no n.º 1, devendo tal informação encontrar-se espelhada na conta-corrente relativa ao processo (n.º 4).  

Sem prejuízo de outras intervenções que a lei especificamente lhe atribui, compete ao juiz: Julgar a oposição à execução e à penhora; Julgar, sem possibilidade de recurso, as reclamações de actos e impugnações de decisões do agente de execução, no prazo de 10 dias (art.º 723º, n.º 1, alíneas b) e c)).

A execução extingue-se nas seguintes situações: a) Logo que se efetue o depósito da quantia liquidada, nos termos do artigo 847º; b) Depois de efetuada a liquidação e os pagamentos, pelo agente de execução, nos termos do Regulamento das Custas Processuais, tanto no caso do artigo anterior como quando se mostre satisfeita pelo pagamento coercivo a obrigação exequenda; c) Nos casos referidos no n.º 3 do artigo 748º, no n.º 2 do artigo 750º, no n.º 6 do artigo 799º e no n.º 4 do artigo 855º, por inutilidade superveniente da lide; d) No caso referido na alínea b) do n.º 4 do artigo 779º; e) No caso referido no n.º 4 do artigo 794º; f) Quando ocorra outra causa de extinção da execução (art.º 849º, n.º 1). A extinção é notificada ao exequente, ao executado, apenas nos casos em que este já tenha sido pessoalmente citado, e aos credores reclamantes (n.º 2). A extinção da execução é comunicada, por via eletrónica, ao tribunal, sendo assegurado pelo sistema informático o arquivo automático e eletrónico do processo, sem necessidade de intervenção judicial ou da secretaria (n.º 3)[13].

3. A Portaria n.º 282/2013, de 29.8, regulamenta vários aspectos essenciais das acções executivas cíveis, em linha com a simplificação e agilização que se pretendeu operar por via da aplicação do Código de Processo Civil de 2013 (e, anteriormente, através do DL n.º 226/2008, de 20.11[14] e da Portaria n.ºs 331-B/2009, de 30.3), sabendo-se que execuções eficientes contribuem para a melhoria do ambiente económico e para a confiança dos agentes no sistema de justiça e salientando-se, designadamente, quanto à sua tramitação, a manutenção da obrigatoriedade de utilização do sistema informático de suporte à actividade dos agentes de execução pelos agentes de execução, garantindo-se a máxima transparência na tramitação processual, por força da comunicação automática entre este sistema informático e o sistema informático de suporte à atividade dos tribunais, bem como a tramitação e registo electrónico da prática de actos pelo agente de execução.[15]

Assim, no art.º 5º do referido diploma, refere-se que o processo executivo é tramitado por via eletrónica, através dos sistemas informáticos de suporte à atividade dos agentes de execução e do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais, nos termos previstos na portaria que regula a tramitação eletrónica dos processos judiciais (n.º 1). Os atos processuais do agente de execução são praticados através do sistema informático de suporte à atividade dos agentes de execução, ficando os mesmos a constar do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais (n.º 2). Os atos que não sejam praticados através do sistema informático de suporte à atividade dos agentes de execução, tais como as diligências externas, são registados no processo, pelo agente de execução, no sistema informático de suporte à atividade dos agentes de execução (n.º 3).

No entanto, em matéria de remuneração do agente de execução (honorários e despesas), a que se reportam, nomeadamente, os art.ºs 45º a 52º, aplica(va)-se à situação dos autos o disposto nos art.ºs 11º a 16º, 18º, 19º e 21º, da Portaria n.º 331-B/2009, de 30.3, na redacção conferida pela Portaria n.º 225/2013, de 10.7[16] (cf. os art.ºs 60º, alínea c), 62º, n.ºs 1 e 2 e 63º da Portaria n.º 282/2013, de 29.8).

4. A verificação da extinção da execução deixou de ser feita pelo juiz, como decorre do confronto entre a anterior e a nova versão dos n.ºs 1 e 2 do art.º 919º do CPC de 1961 (a partir da reforma da acção executiva operada em 2003) e o art.º 849º, n.ºs 1 e 2 do CPC de 2013; é o agente de execução que deve constatar a extinção da execução (cuja causa deve estar comprovada documentalmente nos autos); apenas se o fundamento extintivo vier da actuação do juiz - maxime, sentença de procedência de oposição à execução - é que o tribunal notificará as partes e o agente de execução da extinção.

O juiz exerce funções de tutela e de controlo mas não lhe cabe, nomeadamente, em regra, extinguir a instância executiva, extinção que deverá ser notificada ao executado, ao exequente e aos credores reclamantes, os quais poderão, então, reclamar para o juiz, ao abrigo do art.º 723º, n.º 1, alínea c). Esgotado o prazo de reclamação, a extinção da execução é comunicada, por via electrónica, ao tribunal, sendo assegurado pelo sistema informático o arquivo automático e electrónico do processo, sem necessidade de intervenção judicial ou da secretaria (art.º 849º, n.º 3).[17]

5. Perante o mencionado regime jurídico e a tramitação e restante factualidade descritas em I. e II. 1., supra, afigura-se, salvo o devido respeito por opinião em contrário, que a decisão da Mm.ª Juíza a quo, ao acolher uma leitura eminentemente formal da realidade e do preceituado nos art.ºs 721º, n.ºs 1 a 3 e 849º, n.ºs 1, alínea f) e 3, não dará o devido relevo à actuação dos diversos intervenientes processuais ao longo de cerca de 5 meses - desconhecendo-se a razão de ser da questionada postura omissiva da AE na sequência daquela notificação de 29.01.2019, omissão e silêncio reiterados depois de notificada da reclamação e despacho que precederam a decisão recorrida -, à insuficientemente apurada actividade processual (e que, na melhor das hipóteses, poderia, inclusive, levar à extinção da execução pelo pagamento da quantia exequenda…) e, por último, às exigências estabelecidas naqueles normativos para que a execução se considere extinta.

Acresce que a Mm.ª Juíza a quo, ao invés de providenciar, principalmente, pelo conhecimento do estado da execução no período em causa e da razão de ser dos actos praticados (por acção e omissão), terá feito uso da sua competência fiscalizadora e de controlo visando, em primeira linha, que a execução fosse extinta, como resulta, por exemplo, dos despachos de 11.12.2018 e 28.6.2019 (cf. II. 1., alíneas c) e p), supra). 

6. Importa realçar que, logo em 11.12.2018, o Tribunal a quo sublinhou - e bem - que, se verificada situação conducente à extinção da execução, deveria a AE “proceder à formalização da extinção da instância, respectivas notificações e informação aos autos” (cf. II. 1. c), supra).

No período em causa (Dezembro de 2018 a Junho de 2019), a exequente deu o necessário impulso à execução no sentido de serem efectivadas diligências para concretização das pretendidas penhoras e a AE não terá deixado de providenciar pela sua realização (cf., principalmente, II. 1., alíneas d), g), l) e m), supra), e é nesse contexto que surge a dita “nota discriminativa” e a habitual advertência ou cominação que lhe é associada, datada de 25.01.2019 (cf. II. 1., alíneas i) e j), supra).

Porém, decorre dos autos que, quando a AE “decidiu” formalizar a extinção da instância, já nada o justificava, quer porque decorrera actividade processual que não foi declarada nula, irrelevante ou inútil, quer porque a exequente, sem questionar/reclamar formalmente da “nota discriminativa de honorários e despesas”, tinha depositado/pago a importância indicada pela AE (cf., nomeadamente, II. 1., alíneas l), n), o), q) e r), supra).

7. Por razões que não vemos devidamente explicitadas, a exequente viria a pagar a quantia dos “honorários” - pretensamente em falta - apenas em Junho de 2019 mas a execução não deixou de prosseguir; a AE só terá elaborado e notificado o “despacho” de 04.7.2019 porque assim lhe foi “determinado” pela Mm.ª Juíza a quo (cf., principalmente, II. 1. p), q) e r), supra)![18]

Nessa altura, e independentemente da questão de saber se era justificado o adiantamento ou o pagamento de quaisquer honorários (cf. II. 1. j), supra)[19] - efectivamente pagos em data anterior -, da parte da exequente, tudo estaria “regularizado” (cf. II. 1. n), o) e v), supra), sendo que, no tempo pretérito, nunca se formalizara a extinção da execução a que aludiram os despachos da Mm.ª Juíza a quo, adequada formalização da competência/incumbência do AE (que deverá realizar todas as diligências relativas à extinção da execução, dando-o por “finda”)[20] e indispensável para se poder/dever concluir pela extinção da instância executiva (o processo executivo é extinto e arquivado automaticamente, na sequência de comunicação electrónica do AE, sem intervenção judicial ou da secretaria - cf. o art.º 849º, n.º 3).[21]

Ademais, a realidade coeva, e posterior, indiciava, claramente, o normal prosseguimento dos autos… (cf., v. g., II. 1. s), supra).

8. Confirma-se, pois, o já vislumbrado na decisão da reclamação[22], porquanto a questão substancial, de cariz ou pendor essencialmente adjectivo, envolvia, também, as “´circunstâncias` da prolação da decisão da AE de 04.7.2019”, tratando-se de uma “extinção da acção executiva por forma (…) avessa à que lhe é traçada pelas pertinentes normas adjectivas”.[23]

9. Esta, cremos, a ilação, conclusão ou resposta que se poderá/deverá extrair do apurado acervo fáctico, confrontado com o supra aludido quadro normativo, razão pela qual nada obstará ao prosseguimento da execução, que à data da prolação do despacho de 28.6.2020 (cf. II. 1. p), supra) não se encontrava extinta e sendo que já não se justificava o processado objecto da reclamação[24] e subsequente impugnação (por via do recurso).

10. Procedem, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso.


*

III. Pelo exposto, revoga-se o despacho recorrido (e subjacente decisão de extinção “por falta de pagamento da provisão devida” à AE, de 04.7.2019), com a consequente prosseguimento da instância executiva, como se indica em II. 9., supra.

Sem custas.


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23.6.2020

Fonte Ramos ( Relator )

Alberto Ruço

Vítor Amaral



[1] Admitido pelo Relator, a 12.02.2020, na sequência de reclamação ao abrigo do disposto no art.º 643º do CPC, tendo subido nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (art.ºs 643º, n.ºs 4 e 6º; 852º, 853º, 645º, n.º 1, alínea a) e 647º n.º 1, do CPC).
[2] Considera-se o que decorre dos processos físico e electrónico.
[3] Comissão para o Acompanhamento dos Auxiliares da Justiça.
[4] Sublinhado nosso, como o demais a incluir no texto.

[5] Ainda que não conste dos autos (nem do processo electrónico), a exequente refere que, em 25.01.2019, a AE informou os autos por meio do requerimento que «Notificadas as partes nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 750º do CPC, veio o M. I. Mandatário da Exequente, requerer a penhora do quinhão hereditário que a Executada G (…) é titular, nos termos previstos no artigo 781º do CPC, relativamente à herança indivisa, aberta por óbito de A (…);/ - Nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 781º do CPC, a penhora do quinhão é efectuada mediante notificação do facto aos demais co-herdeiros./ - Assim, foi requerido levantamento do sigilo fiscal, por forma de aferir junto do serviço de finanças, o domicílio fiscal dos co-herdeiros identificados na participação de imposto de selo, o que se aguarda./ Para tanto, Requer-se a V. Exa. que vá aos autos para os devidos efeitos.»
[6] Estes os documentos já referidos em II. 1. alínea j), supra.
[7] O que no processo electrónico se encontra discriminado sob os itens “pagamento de serviços(AE)” e “levantamento de honorários(AE)”, respectivamente.
[8] Desconhece-se se o pagamento ou a “liquidação do montante devido” ocorreu a 21.6.2019 (cf. a “conclusão 17ª”, ponto I., supra e o art.º 14º da reclamação de 14.8.2019).
[9] Codificação aplicável à situação dos autos por força do disposto no art.º 6º, n.º 1 da Lei n.º 41/2013, de 26.6, e a que pertencem as disposições doravante citadas sem menção da origem.
[10] No presente, a Portaria n.º 280/2013, de 26.8 (em vigor desde 01.9.2013 - art.º 38º), que regula vários aspetos da tramitação eletrónica dos processos judiciais.

    Afirma-se, no preâmbulo, que as alterações introduzidas “não são muito significativas, até porque a utilização de sistemas informáticos para a tramitação eletrónica de processos tem-se revelado, em Portugal, uma experiência bem sucedida, com larga aceitação entre os profissionais forenses que diariamente utilizam o sistema informático de suporte à atividade dos tribunais”), e prevê-se, no respectivo dispositivo (cuja redacção actual é idêntica à inicial), nomeadamente, os “aspetos” objecto de regulamentação (entre os quais, as comunicações entre tribunais e entre estes e os agentes de execução), a forma ou o sistema adoptados para a tramitação eletrónica dos processos judiciais, a apresentação de peças processuais e documentos por transmissão eletrónica de dados, as notificações por transmissão eletrónica de dados, o registo e a gestão de acessos ao sistema informático, a consulta de processos por parte de advogados e solicitadores e as comunicações entre os tribunais e os agentes de execução, incluindo notificações (cf., principalmente, os art.ºs  1º; 3º, n.º 1; 5º; 25º, n.º 1; 27º e 31º, n.º 1).

[11] Esta a redacção actual, introduzida pelo DL n.º 97/2019, de 26.7, sendo a redacção primitiva (Lei n.º 41/2013, de 26.6) a seguinte: «1 - A tramitação dos processos é efetuada eletronicamente em termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça, devendo as disposições processuais relativas a atos dos magistrados, das secretarias judiciais e dos agentes de execução ser objeto das adaptações práticas que se revelem necessárias. 2 - A tramitação eletrónica dos processos deve garantir a respetiva integralidade, autenticidade e inviolabilidade. 3 - A regra da tramitação eletrónica admite as exceções estabelecidas na lei.»
[12] Redacção actual (DL n.º 97/2019, de 26.7), constando da 1ª versão (Lei n.º 41/2013, de 26.6): «1 - A tramitação dos processos executivos é, em regra, efetuada eletronicamente, nos termos do disposto no artigo 132.º e das disposições regulamentares em vigor. 2 - O modelo e os termos de apresentação do requerimento executivo são definidos por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça. 3 - Todas as consultas a realizar pelo agente de execução com vista à efetivação da penhora, bem como quaisquer comunicações entre este e os serviços judiciais ou outros profissionais do foro são, em regra, realizadas por meios eletrónicos.»
[13] Em linha com a alteração introduzida ao CPC de 1961 (art.º 919º, n.º 3) pelo DL n.º 226/2008, de 20.11, que passou a prever que o agente de execução devia comunicar, por via electrónica, ao Tribunal a extinção da execução, sendo assegurado pelo sistema informático o arquivamento automático e electrónico do processo, sem necessidade de intervenção judicial ou da secretaria. 

[14] Diploma que na sua versão original e sucessivas alterações (introduzidas, inclusive, pela Lei n.º 41/2013, de 26.6) visou “tornar as execuções mais simples e eliminar formalidades processuais desnecessárias”, reservando a intervenção do juiz “para as situações em que exista efectivamente um conflito ou em que a relevância da questão o determine”, pelo que veio a ser reforçado “o papel do agente de execução (…), sem prejuízo de um efectivo controlo judicial, passando este a poder aceder ao registo de execuções, designadamente para introduzir e actualizar directamente dados sobre estas” e, igualmente, “a realizar todas as diligências relativas à extinção da execução, sendo esta arquivada através de um envio electrónico de informação ao tribunal, sem necessidade de intervenção judicial ou da secretaria”.
[15] Cf., sobretudo, o preâmbulo da referida Portaria.
[16] Assim, estabelecia o art.º 13º, n.º 1 que nos casos em que o pagamento das quantias devidas a título de honorários e despesas do agente de execução não possa ser satisfeito através do produto dos bens penhorados ou pelos valores depositados à ordem do agente de execução decorrentes do pagamento voluntário, integral ou em prestações, realizados através do agente de execução, os honorários devidos ao agente de execução e o reembolso das despesas por ele efetuadas, bem como os débitos a terceiros a que a venda executiva dê origem, são suportados pelo autor ou exequente, podendo este reclamar o seu reembolso ao réu ou executado.
  Previa-se nos art.ºs seguintes, designadamente, a possibilidade de qualquer interessado, no prazo de 10 dias contados da notificação da nota discriminativa de honorários e despesas, apresentar reclamação ao juiz (art.º 14º), as quatro “fases” para efeitos de adiantamento de honorários e despesas ao agente de execução (15º, n.º 1), bem como o tempo, a forma, os montantes e a comprovação dos pagamentos (n.ºs 2 e 3 do mesmo art.º e n.ºs 1 e 2 do art.º seguinte).
[17] Vide, nomeadamente, Rui Pinto, A Ação Executiva, AAFDL Editora, Lisboa/2018, págs. 961 e seguintes; J. Lebre de Freitas, A Ação Executiva, 6ª edição, 2014, Coimbra Editora, págs. 30 e seguintes; J. Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, CPC Anotado, Vol. 3º, Coimbra Editora, 2003, pág. 633 e seguinte e Carlos Lopes do Rego, Comentários ao CPC, Vol. II, 2ª edição, 2004, Almedina, págs. 21 e seguintes e 154.

[18] Assim, não se vê como objectar ao teor da “conclusão 20ª”, ponto I., supra: «Se a AE tivesse intenção de extinguir os presentes por falta de pagamento da nota de despesas e honorários elaborada em 25.01.2019, não deveria ter notificado o Exequente para fazer o pagamento da mesma em 14.6.2019, nem emitido outro pedido de provisão em 01.7.2019, ou emitindo os respectivos recibos

[19] De resto, não existem suficientes elementos sobre tal problemática e não se lobriga “controvérsia” que esta Relação deva conhecer sobre eventual “situação de incumprimento de um dever por parte do exequente correspectivo de um direito do agente de execução de exigir o pagamento de quantia em dívida” (cf. a “conclusão 12ª”, ponto I, supra).

[20] Competência atribuída pelo DL n.º 226/2008, de 20.11 (na redacção conferida ao art.º 919º do CPC de 1961) e mantida pelos diplomas leis posteriores - cf., sobre a matéria, as “notas 14 e 15”, supra, e, de entre vários, o acórdão da RG de 27.02.2014-processo 467/09.1TBBRG-A.G1[concluindo-se: «I - A partir da reforma da acção executiva, não apenas deixa de existir “espaço” para a prolação de uma sentença de extinção da execução, como, ademais, é o processo pendente no tribunal extinto automaticamente, na sequência de comunicação electrónica do agente de execução, sem intervenção portanto do juiz . II - Destarte, não tendo o juiz que lavrar sentença de extinção da execução, não apenas falece-lhe “competência” para a proferir, como, fazendo-o, o vício atinente ao acto então praticado, “aproximando-se” do da “inexistência jurídica”, não é então susceptível de produzir quaisquer efeitos, e, por isso, não carece sequer de ser anulado, não dando inclusive nunca lugar a caso julgado.»], publicado no “site” da dgsi. 

   Com alguma similitude sobre a concreta questão de envolver matéria da incumbência do AE, cf. também o acórdão da RG de 15.5.2014-processo 5523/13.9TBBRG.G1, publicado no “site” da dgsi.
[21] Cf. o citado acórdão da RG de 27.02.2014-processo 467/09.1TBBRG-A.G1, no qual também se concluiu e decidiu que a instância executiva se considera “pendente até que ao tribunal seja efectuada a comunicação a que alude o n.º 3, do art.º 849º, do CPC”.
[22] A que se alude sob a “nota 2”, supra.

[23] Algum relevo se deverá dar à seguinte asserção da recorrente: “se, em 14.6.2019, a AE enviou nova notificação ao Exequente, não pode aceitar-se que os autos sejam extintos com fundamento na notificação remetida em 25.01.2019, pois se posteriormente remeteu nova notificação, não poderá valer-se da primeira notificação, quando concedeu novo prazo ao Exequente para liquidar o montante, o qual foi cumprido” (cf. a “conclusão 22ª”, ponto I., supra).
[24] Obviamente, só após a sua prolação poderia a exequente reclamar da decisão de extinção da execução.