Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
713/09.1T2AND.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARTUR DIAS
Descritores: PROVIDÊNCIA CAUTELAR NÃO ESPECIFICADA
APREENSÃO DE VEÍCULO
ALUGUER DE AUTOMÓVEL SEM CONDUTOR
Data do Acordão: 09/07/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DO BAIXO VOUGA – JUÍZO DE MÉDIA E PEQ. INSTÂNCIA CÍVEL DE ANADIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 381º, Nº 1, DO CPC E 17º, Nº 4, DO D. L. Nº 354/86, DE 23/10
Sumário: I – Em sede de procedimento cautelar comum instaurado pela empresa de aluguer sem condutor contra o locatário, visando a apreensão do veículo automóvel locado por falta de restituição do mesmo após o termo do contrato, não constitui lesão dificilmente reparável a impossibilidade de dispor do veículo locado e de dele retirar rendimento, bem como a desvalorização e depreciação rápida e significativa por cada dia que passa, devidas ao decurso do tempo e à utilização da viatura por parte do requerido.

II – Do nº 4 do artº 17º do D.L. nº 354/86, de 23/10, não é possível extrair a presunção júris et de jure de que a falta de devolução do veículo locado importa para a locadora periculum in mora.

Decisão Texto Integral:          Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

         1. RELATÓRIO

         A..., anteriormente designada B..., com sede na..., intentou contra C..., com sede na ..., procedimento cautelar comum, pedindo a apreensão pela autoridade policial competente do veículo automóvel marca Renault, matrícula X... e respectivos documentos, bem como a entrega do mesmo à requerente.

Alegou, para tanto que:

No exercício da sua actividade comercial, a B... celebrou com a requerida o contrato de Aluguer de Veículo sem Condutor número ... composto de "Condições Gerais" e de "Condições Particulares", cuja cópia se junta como doc. 2, dando-se por integralmente reproduzido;

O referido contrato começou a produzir os seus efeitos em 04 de Dezembro de 2006 - nos termos da cláusula 3ª das “Condições Gerais” e das “Condições Particulares”;

Nos termos deste contrato, a B... veio a adquirir uma viatura automóvel, marca Renault, modelo TFI, matrícula X..., conforme cópia da factura que se junta como doc.3, tendo facultado a sua utilização à requerida nos termos do disposto nas cláusulas 1ª das “Condições Gerais” e das “Condições Particulares”;

A requerida estava obrigada, no quadro deste contrato, ao pagamento de 60 (sessenta) rendas mensais, a primeira no valor de € 936,05 (novecentos e trinta e seis euros e cinco cêntimos), as restantes no valor de € 776,05 (setecentos e setenta e seis euros e cinco cêntimos) cada;

Porém, a requerida incumpriu a obrigação de pagamento das rendas, pois não pagou as rendas vencidas a 30/06/2008, 30/07/2008, 30/08/2008, 30/09/2008, 23/10/2008, 30/10/2008, 30/11/2008, 30/12/2008, 30/01/2009, 01/03/2009, 30/03/2009, 30/04/2009, 30/05/2009, 30/06/2009, 30/07/2009;

A requerente procedeu a vários contactos com a requerida para que procedesse ao pagamento dos alugueres em dívida, contudo apesar das várias promessas a requerida não regularizou a situação;

A requerente enviou à requerida carta de interpelação, datada de 01 de Setembro de 2009, conforme cópia que se junta como doc. 4;

A requerida persistiu com o incumprimento do contrato, pelo que a requerente veio, usando da faculdade prevista na cláusula 11ª das “Condições Gerais”, resolver, por carta registada com aviso de recepção datada de 22 de Outubro de 2009, o Contrato de Aluguer, conforme cópias que se juntam como doc. 5 e 6;

O veículo automóvel descrito, locado ao abrigo do contrato de Aluguer referido, é propriedade da requerente, conforme atesta a certidão emitida pela Conservatória do Registo de Automóveis de Lisboa relativa à viatura automóvel que se junta como doc. 7;

O referido veículo automóvel, apesar dos insistentes e variados esforços da requerente, não lhe foi devolvido pela requerida, que a isso estava obrigada nos termos da cláusula 13ª das “Condições Gerais” do doc. 2;

Na carta por via da qual se procedeu à resolução do contrato, foi a requerida informada que deveria proceder à restituição do veículo;

A requerente tentou obter a restituição do veículo, através de outras diligências que resultaram negativas; 

Até ao momento a requerida tem sempre recusado devolver o veículo que lhe foi locado, pelo que resta propor contra ela a competente acção de condenação para restituição do veículo;

Sucede que a requerida continua a utilizar o veículo no seu dia a dia;

Ora, o referido veículo tem uma vida económica limitada, sendo certo que a não entrega do mesmo está a causar à requerente os seguintes prejuízos: a) Está esta impossibilitada de dispor do veículo e dele tirar qualquer rendimento no âmbito do seu comércio; b) Está o veículo automóvel a desvalorizar-se e a depreciar-se rápida e significativamente por cada dia que passa;

A lesão do direito da requerente resulta implícita da natureza do bem em causa e da natural degradação dos bens móveis, nomeadamente dos veículos automóveis;

Acresce que para além da não devolução da viatura a requerida não procedeu ao pagamento das rendas vencidas e não pagas supra identificadas, situação que se verifica há mais de um ano, nem pagou a indemnização contratual prevista;

De referir que as rendas vencidas e não pagas foram enviadas para cobrança na conta bancária da requerida e foram devolvidas sem pagamento por não haver saldo na conta bancária que permitisse a sua cobrança;

Está assim em causa o direito à restituição e simultaneamente o direito de propriedade da requerente, sendo este particularmente afectado pela manutenção em poder da requerida do referido veículo automóvel, sendo facto notório, aliás, que com o tempo e o uso, bens como o locado se deterioram apreciavelmente e desvalorizam economicamente, afectando dessa forma o conteúdo do direito de propriedade da locadora;

Requer-se, pois, que o veículo automóvel identificado seja entregue à requerente, de forma a evitar que com a sua contínua utilização pela requerida, o mesmo se deprecie ao ponto de perder qualquer valor económico;

O veículo automóvel deve ser entregue em bom estado de conservação e funcionamento - tal como se encontrava à data da sua entrega à requerida, com a excepção da deterioração resultante da sua utilização normal de então para cá - dotados de todas as eventuais benfeitorias que lhes hajam sido introduzidas, bem como dos respectivos documentos e acessórios;

A requerente receia que a audiência da requerida seja susceptível de pôr em risco o fim da providência, uma vez que a requerida tem recusado a restituição do veículo e este é facilmente ocultável e até destrutível, pelo que desde já se requer a sua não audição, nos termos do artigo 385º, n.º 1 do C.P.C..

Foi indeferida a dispensa do exercício do contraditório prévio e determinada a citação da requerida.

Regularmente citada, a requerida não deduziu oposição.

Seguidamente, foi proferida decisão em que, nos termos do art.º 484.º, n.º 1, aplicável ex vi art.º 385.º, n.º 5, ambos do Cód. de Proc. Civil, se consideraram confessados os factos articulados pela requerente, negando-se, contudo, o decretamento da providência cautelar requerida por se ter entendido que não foi alegada e provada factualidade suficiente para poder considerar-se verificado o indispensável requisito do fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável do direito da requerente.

Inconformada, a requerente interpôs recurso, logo apresentando a pertinente alegação que encerrou com as conclusões seguintes:

[…]

Não foi apresentada resposta.

O recurso foi admitido.

Nada obstando a tal, cumpre apreciar e decidir.


***

         Tendo em consideração que, de acordo com o disposto nos artºs 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 do Cód. Proc. Civil[1], é pelas conclusões da alegação do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, constata-se que à ponderação e decisão deste Tribunal foi colocada apenas a questão de saber se, “in casu”, está ou não presente o requisito do procedimento cautelar comum de fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável do direito da requerente.


***

         2. FUNDAMENTAÇÃO

         2.1. De facto

         Não tendo sido impugnada a decisão sobre a matéria de facto, nem havendo fundamento para oficiosamente a alterar, considera-se suficientemente indiciada, nos termos referidos pela 1ª instância, toda a factualidade alegada pela requerente no articulado inicial, já acima transcrita e que, por isso, nos abstemos de aqui transcrever de novo, dando-a como reproduzida.


***

         2.2. De direito

         São características comuns a todos os procedimentos cautelares (e, portanto, também ao procedimento cautelar comum) a instrumentalidade e dependência (cfr. artº 383, nº 1), o carácter sumário decorrente da necessária simplicidade e celeridade da tramitação (“summaria cognitio”), a suficiência da aparência do direito acautelado, bastando-se com a séria probabilidade da existência do mesmo (“fumus boni iuris”), o justificado receio de que a natural demora na resolução definitiva do litígio cause prejuízo irreparável ou de difícil reparação (“periculum in mora”), a provisoriedade e a celeridade[2].

         Da leitura e análise dos artºs 381º e seguintes pode concluir-se que são pressupostos do decretamento das providências cautelares não especificadas, epílogo normal dos procedimentos cautelares comuns[3]:

         - que muito provavelmente exista o direito tido por ameaçado (artº 381º, nº 1 e 387º, nº 1);

         - que haja fundado receio de que outrem, antes de proferida a decisão de mérito na acção principal, cause lesão grave e dificilmente reparável ao direito do requerente (artº 381º, nº 1 e 387º, nº 1);

         - que ao caso não convenha nenhuma das providências tipificadas (artº 381º, nº 3);

         - que a providência seja adequada a remover o periculum in mora concretamente verificado e a assegurar a efectividade do direito ameaçado (artº 381º, nº 1); e

         - que o prejuízo resultante da providência não exceda o dano que com ela se quis evitar (artº 387º, nº 2).

         No tocante à probabilidade de existência do direito invocado, o julgador poderá fundar-se num simples juízo de verosimilhança; mas deverá usar de um critério mais rigoroso na apreciação dos factos integradores do “periculum in mora”, com vista a evitar a admissão indiscriminada de protecção provisória, eventualmente com efeitos antecipatórios, capaz de fazer alcançar resultados inacessíveis ou dificilmente atingíveis num processo judicial pautado pelas garantias do contraditório[4].

         Como decorre da própria letra da lei, para se verificar o requisito do “periculum in mora” não basta um qualquer receio: tem de ser um receio fundado, isto é, “apoiado em factos que permitam afirmar, com objectividade e distanciamento, a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo”[5].

         E a lesão que se receia que seja causada não pode ser também uma lesão qualquer. Tem de ser grave e dificilmente reparável.

         Trata-se de conceitos genéricos e indeterminados, de difícil preenchimento, cabendo ao juiz, face ao caso concreto, avaliar do fundamento do receio e da gravidade e dificuldade de reparação da lesão, em termos de decidir se é ou não justificado o uso da celeridade e eficácia das providências cautelares, apesar da menor certeza e da maior insegurança que as acompanham[6].

         No caso em apreciação nestes autos a questão colocada a esta Relação consiste em saber se a requerente alegou[7] factualidade capaz de integrar o enunciado requisito do fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável.

         Na decisão sob recurso escreveu-se a tal propósito:

         “Ora, na situação sub judice, ficou por demonstrar qualquer factualidade concreta de que pudesse deduzir-se o aludido fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável.

Aliás, a requerente, salvo o muito devido respeito por entendimento diverso, quedou-se em conclusões e suposições genéricas assentes na mera falta de pagamento dos alugueres por parte da locatária – embora aludindo a falta a não pagamento das rendas por débito em conta, por nesta não haver saldo – e na não restituição do veículo cuja motivação pode radicar em fundamentos diversos, não se reconduzindo, necessariamente, à dificuldade de satisfação do crédito.

Acresce que a mera utilização do veículo e o decurso do tempo não traduzem um prejuízo de grave e difícil reparação, tanto mais que sempre assistirá à requerente o direito ao ressarcimento dos danos decorrentes do atraso na restituição do veículo.

Ademais, mesmo que se possa verificar a perda do bem locado – risco genericamente aludido no articulado petitório, referindo-se à mera possibilidade de ocultação, destruição ou colocação do veículo fora do país – sempre o locatário responderá pela mesma, nos termos desde logo previstos na lei – cfr. art.º 1044.ºdo Cód. Civil.

E não se vislumbra – já vimos – que exista qualquer risco concreto de a requerente não vir a poder obter esse efectivo ressarcimento.”

De acordo com os factos indiciados, a lesão grave e dificilmente reparável receada pela requerente traduz-se: (1) na impossibilidade de dispor do veículo locado e dele retirar qualquer rendimento no âmbito do seu comércio; e (2) na desvalorização e depreciação rápida e significativa por cada dia que passa, devidas ao decurso do tempo e à utilização da viatura por parte da requerida.

A requerente, como proprietária, tem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas, os poderes de uso, fruição e disposição do veículo automóvel locado (artº 1305º do Cód. Civil). Não o entregando, apesar de resolvido o contrato de aluguer, a requerida impede-a completamente de exercer esses poderes, violando de forma grave o seu direito de propriedade.

Mas, será essa violação dificilmente reparável?

Face ao contrato celebrado entre requerente e requerida, designadamente ao nº 3 da cláusula 13ª das “Condições Gerais”, “sem prejuízo de outras sanções previstas na lei, caso o veículo objecto do presente contrato não seja devolvido nos termos definidos no número 1 desta Cláusula, assiste à Locadora o direito de exigir do Locatário uma compensação pecuniária pela utilização indevida e não autorizada do seu veículo, a qual se apurará em função do preço do aluguer e do tempo que decorrer desde o termo do contrato até à efectiva devolução do veículo”.

De resto, o direito da locadora a ser indemnizada pelo atraso na restituição da coisa ou pela perda ou deterioração da mesma está contemplado nos artºs 1044º e 1045º do Cód. Civil, subsidiariamente aplicáveis ao contrato de aluguer de veículos automóveis sem condutor.

Não foi alegado, nem está, portanto, indiciado, que a situação económica da requerida seja tal que o eventual direito de indemnização da requerente fique desprovido da garantia patrimonial integrada pelo conjunto dos bens penhoráveis da potencial devedora.

A reparação da lesão do direito da requerente não assume, pois, dificuldade especial, não havendo fundamento sério para o seu invocado receio[8].

 

Não se olvida que existe uma corrente jurisprudencial que vem defendendo que, por força do disposto no artº 17º, nº 4 do Decreto-Lei nº 354/86, de 23/10 – segundo o qual é lícito à empresa de aluguer sem condutor retirar ao locatário o veículo alugado no termo do contrato – a empresa de aluguer sem condutor, em caso de não restituição espontânea e voluntária do veículo findo o contrato, pode recorrer ao procedimento cautelar comum pedindo a apreensão, sem necessidade de alegar e provar o requisito do fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável do seu direito, por ser de presumir, juris et de jure, o periculum in mora[9].

Argumentam o defensores desse entendimento, em síntese, que só assim ganha sentido útil o nº 4 do artº 17º do Decreto-Lei nº 354/86 na parte em que diz ser lícito à empresa de aluguer sem condutor retirar ao locatário o veículo alugado no termo do contrato, já que o direito à restituição do bem locado constitui um efeito típico do contrato de aluguer estatuído, em termos gerais para a locação, nos artigos 1038°, alínea i), e 1043°, n° 1, do CC, e que não carecia, por isso, de ser ali contemplado. E que a base de tal presunção radica nos dados da experiência, segundo os quais a não devolução do veículo, nessas circunstâncias, é suficientemente indiciadora da forte probabilidade do desaparecimento ou da significativa depreciação do bem locado, sendo que são razões similares as que justificam o regime de apreensão imediata do veículo nos casos previstos no artigo 15° do Dec. Lei n° 54/75, de 12/02, e do bem dado em locação financeira, nos termos do artigo 21° do Dec-Lei n° 149/95, de 24/06.

Com todo o respeito, tais argumentos não convencem.

Por um lado, a obrigação de o locatário, findo o contrato, restituir a coisa locada, instituída nos artºs 1038º, al. i) e 1043º, nº 1 do Cód. Civil, parece-nos não coincidir exactamente com o direito conferido pelo nº 4 do artº 17º do DL nº 354/86 à empresa de aluguer sem condutor de, no termo do contrato, retirar ao locatário o veículo alugado.

E, por outro, como se afirma no Ac. da Rel. Porto de 11/09/2008[10], já mencionado, que por sua vez cita o Ac. da Rel. de Lisboa de 04/07/2006, “se é certo que a natureza perecível do automóvel foi reconhecida pelo legislador nos decretos-lei n° 54/75 de 24 de Fevereiro e 149/95 de 24 de Junho, que em ambos os diplomas previu e regulou providências que visam assegurar o não perecimento do direito de propriedade sobre automóveis, e que, inclusive, dispensam a prova do periculum in mora, por o legislador presumir que a demora da acção principal causa prejuízo grave e de difícil reparação, não menos correcto será também concluir que quer a providência cautelar de apreensão de veículo prevenida pelo DL 54/75, quer a prevenida pelo DL 149/95, contêm normas excepcionais que não permitem aplicação analógica nos termos do artigo 11º do CC e por isso, quando naqueles diplomas se faz referência aos «contrato de alienação» e de «locação financeira», não se poderá entender como abarcando outras realidades contratuais, v.g., o contrato de aluguer de longa duração, sob pena de se subverter o sistema instituído que está feito, em termos racionais e teleológicos, para abarcar situações particulares, sem embargo de se poder constatar que novas realidades se impuseram no comércio jurídico e que não se coadunam com o sistema em vigor.

Mas aqui, trata-se de um problema de jure constituendo, alheio aos Tribunais, que não têm por missão a criação de Leis (a não ser que se imponha por inexistência de Lei aplicável ao caso, nos termos do artigo 10º, nº 3 do CC, o que não acontece no caso sub judicio)”.

         Soçobram, por conseguinte, todas as conclusões da alegação da recorrente, o que conduz à improcedência da apelação e à manutenção da decisão sob recurso.

         Cumprindo o disposto no artº 713º, nº 7 do Cód. Proc. Civil, elabora-se o seguinte sumário:

         I – Em sede de procedimento cautelar comum instaurado pela empresa de aluguer sem condutor contra o locatário, visando a apreensão do veículo automóvel locado por falta de restituição do mesmo após o termo do contrato, não constitui lesão dificilmente reparável a impossibilidade de dispor do veículo locado e de dele retirar rendimento, bem como a desvalorização e depreciação rápida e significativa por cada dia que passa, devidas ao decurso do tempo e à utilização da viatura por parte do requerido.

         II – Do nº 4 do artº 17º do Decreto-Lei nº 354/86, de 23/10, não é possível extrair a presunção juris et de jure de que a falta de devolução do veículo locado importa para a locadora periculum in mora.


***

         3. DECISÃO

         Face ao exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e, consequentemente, em manter a decisão recorrida.

         As custas são a cargo da recorrente.


[1] Diploma a que pertencem todas as disposições legais adiante citadas sem menção da origem.
[2] Cfr. António Abrantes Geraldes, Reforma do Código de Processo Civil - Procedimentos cautelares, edição do C.E.J., págs. 26 a 34.
[3]   Segundo o Acórdão da Relação de Évora, de 16/05/1991, in CJ, XVI, III, 287, a providência não especificada depende da concorrência dos seguintes pressupostos:
                - Probabilidade séria da existência do direito invocado;
                - Fundado receio de que outrem, antes da acção ser proposta ou na pendência dela, cause lesão grave e dificilmente reparável a tal direito;
                - Adequação da providência à situação de lesão eminente;
                - Não ser o prejuízo resultante da providência superior ao dano que com ela se pretende evitar;
                - Não existência de providência específica que acautele aquele direito.
[4]   Ibidem.
[5]   António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo civil, III vol., pág. 87.
[6] Transcreveu-se um excerto do Acórdão desta Relação de 28/10/2003, proferido nos autos de agravo nº 2712/03, consultável em www.dgsi.pt, relatado pelo aqui relator e também subscrito por um dos aqui Srs. Desembargadores Adjuntos.
[7] Como foi considerada suficientemente indiciada toda a factualidade alegada no requerimento inicial, se tiver sido alegada, também se encontra indiciariamente provada.
[8] Cfr. Acórdãos da Rel. Porto de 19/04/2007 (Proc. 0731622, relatado pelo Des. Fernando Batista); de 11/09/2008 (Proc. 0736163, relatado pelo Des. Pinto de Almeida); da Rel. Lisboa de 08/01/2008 (Proc. 7956/2007-1, relatado pelo Des. Rui Vouga), de 24/06/2009 (Proc. 9653/2008-4, relatado pela Des. Hermínia Marques) e de 08/10/2009 (Proc. 3432/08.2TBTVD-A.L1-8, relatado pelo Des. Caetano Duarte), todos in www.dgsi.pt.
 
[9] Cfr. Acórdãos da Rel. Porto de 18/06/2008 (Proc. 0833386, relatado pelo Des. José Ferraz) e de 09/07/2009 (Proc. 11881/08.0TBVNG.P1, relatado pela Des. Joana Salinas); da Rel. de Lisboa de 04/03/2008 (Proc. 912/2008-7, relatado pelo Des. Tomé Gomes); e da Rel. de Évora de 14/06/2007 (Proc. 1229/07-2, relatado pelo Des. João Marques); de 21/06/2007 (Proc. 1391/07-2, relatado pelo Des. João Marques); de 24/04/2008 (Proc. 820/08-3, relatado pelo Des. Mário Serrano) e de 18/09/2008 (Proc. 1403/08-2, relatado pelo Des. Tavares de Paiva), todos em www.dgsi.pt.
[10] Proc. 0736163, relatado pelo Des. Pinto de Almeida.