Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2356/19.2T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE MANUEL LOUREIRO
Descritores: TRABALHO NO ESTRANGEIRO
CONDUTOR PROFISSIONAL
TEMPO DE TRABALHO
TEMPO DE DESCANSO
Data do Acordão: 11/27/2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO DO TRABALHO DE LEIRIA – JUIZ 1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 197º, NºS 1 E 2, E 199º DO C. TRABALHO/09. DIRETIVA 2002/15/CE DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, DE 11 DE MARÇO DE 2002.
Sumário: I – Segundo o CT/09, o tempo de trabalho corresponde ao período em que o trabalhador está a trabalhar ou se encontra à disposição da entidade empregadora e no exercício da sua atividade ou das suas funções, bem como determinadas interrupções ou intervalos como tal taxativamente enunciados e dos quais não importa aqui cuidar p
or nenhum deles estar em equação – art. 197º/1/2 do CT/09.

II - O tempo de descanso obtém-se por exclusão, no sentido de que deve ser considerado como tal todo o tempo que não possa qualificar-se como de trabalho – art. 199º do CT/09.

III - Á luz do CT/09 e por exclusão, esse tempo de permanência do autor no estrangeiro em descanso ou sem exercer a condução profissional não pode deixar de ser considerado como tempo de descanso.

IV - Considerando o mesmo problema à luz da Diretiva 2002/15/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Março de 2002, relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem atividades móveis de transporte rodoviário, não vemos como a solução correspondente possa deixar de ser a mesma.

V - Com efeito, nos termos do art. 3º dessa Diretiva, “… entende-se por:

a) "Tempo de trabalho"SD:

1. No caso dos trabalhadores móveis, o período compreendido entre o começo e o fim do trabalho, durante o qual o trabalhador se encontre no seu posto de trabalho, à disposição do empregador e no exercício das suas funções ou actividades, ou seja:

- o tempo consagrado a todas as actividades de transporte rodoviário. Essas actividades incluem, nomeadamente:

i) condução;

ii) carga e descarga;

iii) assistência aos passageiros que entrem ou saiam do veículo;

iv) limpeza e manutenção técnica;

v) todas as restantes tarefas destinadas a assegurar a segurança do veículo, carga e passageiros ou a satisfazer as obrigações legais ou regulamentares directamente ligadas à operação específica de transporte em curso, incluindo o controlo das operações de carga e descarga, formalidades administrativas com a polícia, alfândegas, serviços de imigração, etc.

- os períodos durante os quais não pode dispor livremente do seu tempo, sendo-lhe exigida a presença no posto de trabalho, pronto para retomar o trabalho normal, desempenhando certas tarefas associadas ao serviço, nomeadamente períodos de espera pela carga ou descarga cuja duração previsível não seja antecipadamente conhecida, isto é, antes da partida ou imediatamente antes do início efectivo do período em questão, ou de acordo com as condições gerais negociadas entre os parceiros sociais e/ou previstas pela legislação dos Estados-Membros.

(…)

São excluídos do tempo de trabalho os períodos de pausa referidos no artigo 5.o, os períodos de repouso referidos no artigo 6.o e ainda, sem prejuízo da legislação dos Estados-Membros ou de acordos entre os parceiros sociais que prevejam a compensação ou limitação desses períodos, o tempo de disponibilidade referido na alínea b) do presente artigo,”.

VI - Á luz desta Diretiva comunitária o tempo de permanência do autor no estrangeiro em descanso ou sem exercer a condução profissional não pode ser considerado como tempo de trabalho.

Decisão Texto Integral:






Acordam na 6.ª secção social do Tribunal da Relação de Coimbra

I – Relatório

O autor propôs contra a ré a presente acção com a forma de processo comum e emergente de contrato de trabalho, tendo deduzido o pedido seguidamente transcrito: “Nestes termos e nos melhores de direito, deve a presente acção ser julgada procedente, por provada e condenando-se a Ré a pagar ao A. a quantia de 11.132,87€ acrescida dos juros moratórios sobre este montante à taxa legal a contar de 01/11/2018 e até integral pagamento.”.

Alegou, em resumo, que tendo sido trabalhador subordinado da ré, resolveu, com justa causa subjectiva para o efeito, o contrato de trabalho entre ambos celebrado; do contrato de trabalho e da sua concreta forma de cessação emergiram para si os direitos de crédito que melhor enuncia e quantifica na petição, sendo que a satisfação coerciva destes pressupõe a prévia condenação da ré a reconhecê-los e a satisfazê-los.

Citada, a ré contestou para, no essencial reconhecer dever ao autor a quantia de €152,64 a título de férias não gozadas, e a quantia de €75,00 correspondente à viagem ocorrida em 1/11/2018 entre a Bélgica e Portugal; no mais pugna pela improcedência da acção por considerar que não assistem ao autor os demais créditos por ele invocados.

O processo prosseguiu os seus regulares termos, acabando por ser proferida sentença de cujo dispositivo consta, designadamente, o seguinte:

Tudo ponderado, decidimos julgar a ação parcialmente procedente e em consequência:

a) condenar a ré a pagar ao autor a quantia de €152,64 a título de retribuição por férias não gozadas;

b) a quantia de €75,00 a título de viagem da Bélgica para Portugal ocorrida no dia 01.11.2018;

c) condenar a ré a pagar ao autor quantia a apurar em liquidação em execução de sentença no que respeita a despesas com as deslocações entre o aeroporto de Lisboa e a residência do autor em ...;

d) condenar a ré a pagar ao autor quantia a apurar em liquidação em execução de sentença quanto às despesas de alimentação que o autor suportou quando deslocado no estrangeiro que excedam a quantia de €11.825,00 já paga pela ré.

e) absolver a ré do demais peticionado.

Custas por autor e ré na proporção dos decaimentos a atender a final e que se fixa por ora na percentagem de 50% para cada um.

Valor da ação: €11.132,87

Registe e notifique.”.

Não se conformando com o assim decidido, apelou o autor, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas:
...

Não foram apresentadas contra-alegações.

Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da parcial procedência da apelação, condenando-se a ré a pagar ao autor “… os dias de descanso (sábados, domingos e feriados) passados no estrangeiro ao serviço daquela ...”; no mais, deveria a apelação improceder.

Colhidos os vistos legais, importa decidir

II - Principais questões a decidir

Considerando que é pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 – NCPC – aplicável “ex-vi” do art. 87º/1 do Código de Processo do Trabalho – CPT), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir:

1ª) se a matéria de facto foi incorrectamente julgada, devendo ser alterada;

2ª) se assiste ao autor qualquer crédito referente a férias não gozadas para lá dos €152,64 que a esse respeito foi reconhecido na sentença recorrida;

3ª) se o crédito ilíquido reconhecido ao autor na sentença recorrida e referente a despesas com deslocações entre o aeroporto de Lisboa e a povoação de ..., onde o autor residia, deve ser liquidado também na base do pressuposto de que não existiam transportes públicos directos entre aqueles dois locais;

4ª) se a ré deve ser condenada a pagar o autor as despesas com a deslocação do autor de Portugal para a Bélgica (Leuze) em 31/1/18, para iniciar o contrato, e com a deslocação Bélgica (Leuze)/Portugal no dia 1/11/18, após o termo do contrato, tudo no valor global de 636,11€;

5ª) se a ré deve ser condenada a pagar o autor a diária de 55€ por cada um dos dias de viagem Bélgica/Portugal e Portugal/Bélgica para o autor gozar em Portugal dias de descanso e férias;

6ª) se a ré deve ser condenada a pagar o autor a quantia por este reclamada com fundamento em 4 dias de descanso compensatório a que tinha direito e que lhe não foram concedidos por reporte aos dias 4, 11, 18 e 25 de Fevereiro, 4, 11, 18, 25 e 30 de Março, 8 e 15 de Abril, todos de 2018;

7ª) se a ré deve ser condenada a pagar o autor, a título de despesas com alimentos, 55€ por cada um dos dias que o autor permaneceu no estrangeiro;

8ª) se a ré deve ser condenada a pagar o autor a remuneração correspondente a 65 dias de descanso passados no estrangeiro ao serviço da ré, à razão diária de 80,32€;

9ª) se a ré deveria ter sido condenada a pagar ao autor as quantias a cujo direito se arrogou na petição inicial com fundamento em aplicação da denominada “Lei Macron”;

10ª) se a ré deveria ter sido condenada a pagar ao autor as quantias a cujo direito se arrogou na petição inicial e correspondentes ao valor das dormidas a que tinha direito, mas que não usufruiu, em estabelecimentos de hotelaria, nos termos do disposto nos nºs 6 e 8 do art. 8º do Regulamento (CE) nº 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15/03/2006 e cláusula 4ª, nº 5, do Contrato de Trabalho.

III – Fundamentação

A) De facto

Factos provados

O tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos:
...

B) De direito

Primeira questão: se a matéria de facto foi incorrectamente julgada, devendo ser alterada.

Pretende a ré que do ponto 10º) dos factos provados seja retirada a expressão “… e férias…”, passando a constar do mesmo o seguinte “O autor trabalhava 6 semanas no estrangeiro e vinha 2 semanas a Portugal, para gozar descansos compensatórios, saindo do aeroporto de Bruxelas quase sempre num sábado e regressando após 2 semanas à Bélgica quase sempre num domingo, ao mesmo aeroporto de Bruxelas.

A matéria ora em discussão está relacionada com as alegações contidas nos arts. 17º) e 21º) da petição inicial, na parte em que se sustenta que as vindas do autor a Portugal eram apenas para gozar descansos compensatórios, e nos arts. 12º) e 16º) da contestação, na parte em que neles se sustenta que as vindas do autor a Portugal eram para gozo de descansos compensatórios e de férias.

Todo o raciocínio discordante do autor referente a esta temática assenta no pressuposto por si sustentado de que as cláusulas 4ª/4 e 11ª/a/b do contrato de trabalho escrito em que o mesmo e a ré outorgaram impediam o tribunal recorrido de dar como provado que também foram em gozo de férias pelo menos parte dos períodos de duas semanas passadas pelo autor em Portugal após os períodos de seis semanas passadas pelo autor em trabalho no estrangeiro.

Não acompanhamos o autor na afirmação daquele pressuposto.

Nos termos da cláusula 4ª/4, “Após cada período de 6 semanas de trabalho o TRABALHADOR goza de 2 semanas de descanso em Portugal.”; nos termos da cláusula 11ª/a/b “Para complemento dos elementos informativos determinados pelo Artº 106º do Código do Trabalho, consigna-se o seguinte:

a) A duração das férias do TRABALHADOR é determinada segundo as regras dos artºs 238º a 245º do Código do Trabalho.

b) Que o gozo do período de férias é interpolado respeitando-se o critério estabelecido no nº 8 do Artº 241 do Cod. do Trabalho”.

Ora, deve distinguir-se entre o regime contratual acordado entre as partes num determinado contrato de trabalho, por um lado, e o concreto regime praticado pelas mesmas partes durante a execução contratual real, por outro lado, nada obstando a que existam discrepâncias entre aqueles dois regimes, consensualizadas ou não entre os contraentes.

Aliás, a existência de tais discrepâncias é admitida pelo próprio legislador ao erigi-las como um dos pressupostos da responsabilidade civil contratual regulada nos arts.  798º e ss do CC.

A significar que a circunstância de se ter demonstrado um determinado regime contratual acordado entre as partes não implica que tenha de dar-se como demonstrado que esse regime foi realmente o executado.

Por reporte ao caso concreto, a circunstância de se ter dado como provado que o apelante e a apelada acordaram por escrito no sentido de que seriam de descanso os períodos de duas semanas passadas pelo autor em Portugal após os períodos de seis semanas de trabalho no estrangeiro, não obrigava o tribunal recorrido a dar como provado que foram apenas de descanso, com exclusão de férias, aqueles períodos de duas semanas passadas pelo autor em Portugal.

Como assim, a referida cláusula 4ª/4 não obstava a que o tribunal recorrido desse como provado que pelo menos parte dos períodos de duas semanas passadas pelo autor em Portugal o foram em gozo de férias.

O mesmo se diga em relação ao critério determinativo da duração das férias do autor e em relação ao carácter interpolado do gozo de férias a que se alude nas alíneas a) e b) da supra transcrita cláusula 11ª.

Queda insustentado, pois, o pressuposto de que o apelante parte para fundamentar a sua argumentação discordante e sem a verificação do qual se desmorona toda essa argumentação.

Refere o apelante, também, que o autor e a ré “… concordaram que após 6 semanas de trabalho o trabalhador gozava 2 semanas de descanso em Portugal.

Portanto, não pode a Ré como fez, vir alegar que deu férias a gozar ao A. em Portugal, exactamente dentro desses períodos de 20 dias.”.

Admitindo que a incapacidade seja toda nossa, não conseguimos compreender esta argumentação, posto que o número máximo de dias seguidos que duas semanas de calendário comportam são 14 dias – podendo até estar em causa apenas 10 dias úteis - ficando sem se perceber a razão pela qual não poderiam ser contabilizados como de férias os restantes dias daqueles períodos de 20 dias.

Por outro lado, importa considerar que o tribunal recorrido deu como provado que também eram de férias alguns dos dias integrantes daqueles períodos de duas semanas com fundamento “… nos esclarecimentos prestados pelo Administrador da Ré no seu depoimento, em conjugação com o depoimento da testemunha ..., motorista a prestar funções na Ré há 2 anos e 7meses, portanto em data anterior à data de admissão do autor, que confirmou aquele depoimento de parte, referiu … que que a1s férias seriam interpoladas com descansos compensatórios e repartidas nas 2 semanas em que ficavam em Portugal…”.

Contra o assim exarado pelo tribunal recorrido, com fundamento nos meios de prova para o efeito especificamente invocados, o apelante não apresentou nenhum argumento tendente a demonstrar que aquele tribunal incorreu em erro que importasse reparar em sede recursiva fáctica.

A significar que o recorrente não satisfez uma das condições básicas de procedência de uma qualquer impugnação da decisão da matéria de facto, qual seja o da obrigação de se proceder ao exame crítico dos meios de prova convocados na decisão fáctica recorrida e de outros que o próprio apelante invoque nas alegações de recurso em benefício da sua pretensão recursiva, tendente a demonstrar que o tribunal recorrido deveria ter retirado desses meios de prova uma conclusão diferente daquela que foi explicitada na decisão impugnada.

Com efeito, segundo o enunciado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Dezembro de 2015, proferido pela Secção Social, P.1348/12.7TTBGR.G1.S1, disponível in www.dgsi.pt, “Na verdade, o recorrente ao dizer que determinado facto não devia ser dado como provado pelo confronto da prova testemunhal com a documental fazendo uma transcrição da primeira, não está a fazer uma análise critica da prova, nem sequer a fornecer os elementos necessários para permitir que o tribunal a faça, deixando nas mãos do tribunal uma actividade “recolectora” de todos os documentos e dos depoimentos identificados, não sendo assim possível ao tribunal de recurso refazer o percurso/raciocínio lógico-jurídico que o próprio recorrente fez para concluir de forma diferente daquilo que a instância inferior decidiu.

Uma correta impugnação que cumpra o ónus previsto no art. 640º do Código de Processo Civil, passaria por identificar que determinado facto provado foi incorrectamente julgado, enunciando-o e apresentando o porquê de tal incorreção, isto é, dever-se-ia apresentar uma análise crítica dos elementos de prova de que o julgador deveria retirar uma conclusão diferente da que retirou, e apresentar o facto tal como deveria ter sido dado como provado e não provado”.

A necessidade do recorrente fáctico proceder a uma análise crítica da prova também foi referida acórdão do STJ proferido nos autos 8948/15.1T8CBR.C1.S1, consultável em www.dgsi.pt/jstj, onde se considerou  que “A omissão, a insuficiência ou a suficiência da análise crítica, pelo recorrente, das provas a reapreciar é questão que tem a ver com o mérito da impugnação, com a procedência ou improcedência do recurso, mas não com a sua liminar rejeição ou aceitação”.

A significar que para a procedência de qualquer pretensão recursiva fáctica, o recorrente tem de proceder a uma apreciação crítica dos elementos de prova convocados pela decisão fáctica recorrida e de outros que o próprio apelante invoque em benefício da sua pretensão recursiva, apresentando as concretas razões pelas quais desses meios de prova se impunha retirar conclusões fácticas diversas daquelas a que chegou o tribunal recorrido, sendo que no domínio da prova testemunhal essa apreciação crítica não se basta com a invocação de alguns depoimentos e com a mera transcrição dos mesmos.

Tendo o apelante omitido o exame crítico a que se vem fazendo alusão, radica nessa omissão um segundo fundamento de improcedência da pretensão recursiva fáctica que está em consideração.

Improcede, assim, esta pretensão recursiva fáctica.


Δ

Pretende a ré que do ponto 15º) dos factos provados seja eliminado o segmento “… e também gozo de férias”, por forma a que desse ponto passe a constar que “As 5 viagens que o A. realizou de Bruxelas para Portugal tiveram como objectivo o gozo de descansos compensatórios.”.

A argumentação aduzida por reporte a esta pretensão fáctica é a mesma que foi convocada a respeito do já apreciado ponto 10º) e que, como se viu, não logrou acolhimento por parte deste tribunal.

Como assim, sem necessidade de outras considerações para lá das aduzidas a respeito daquele ponto 10º), improcede esta pretensão recursiva fáctica.


Δ

O apelante propõe que se altere o ponto 32º) dos factos provados, onde se escreveu “As horas de Trabalho Suplementar realizadas pelo autor em dias de sábado, eram pagas a este sob a rubrica “Hora Trabalho Suplementar Sáb., Dom., Fer.” no valor de €10,04 nos montantes que constam dos recibos de vencimento juntos aos autos.”, de modo a que o mesmo passe a ter a seguinte redacção: “Dos dias de descanso (sábados, domingos e feriados) cujo pagamento foi peticionado pelo A. pelo valor horário declarado nos recibos de 10,04 € a Ré apenas lhe pagou os sábados.”.

Como fundamento da sua pretensão recursiva convoca uma confissão escrita constante dos recibos de vencimento entregues pela apelada ao apelante no sentido de que o valor da hora de trabalho suplementar, aos sábados, domingos e feriados era de 10,04 €.

A apelada é uma sociedade anónima, sendo que nas sociedades desta natureza “O conselho de administração tem exclusivos e plenos poderes de representação da sociedade.” (art. 405º/2 do CSC); “A não ser que o contrato de sociedade o proíba, pode o conselho encarregar especialmente algum ou alguns administradores de se ocuparem de certas matérias de administração.” (art. 407º/1 do CSC); “O contrato de sociedade pode autorizar o conselho de administração a delegar num ou mais administradores ou numa comissão executiva a gestão corrente da sociedade.” (art. 407º/3 do CSC); “Os poderes de representação do conselho de administração são exercidos conjuntamente pelos administradores, ficando a sociedade vinculada pelos negócios jurídicos concluídos pela maioria dos administradores ou por eles ratificados, ou por número menor destes fixado no contrato de sociedade.” (art. 408º/1 do CSC); “O contrato de sociedade pode dispor que esta fique também vinculada pelos negócios celebrados por um ou mais administradores-delegados, dentro dos limites da delegação do conselho.” (art. 408º/2 do CSC); “Os actos praticados pelos administradores, em nome da sociedade e dentro dos poderes que a lei lhes confere, vinculam-na para com terceiros, não obstante as limitações constantes do contrato de sociedade ou resultantes de deliberações dos accionistas, mesmo que tais limitações estejam publicadas.” (art. 409º/1 do CSC).

Resulta de quanto se refere no antecedente parágrafo que a confissão por parte da ré tinha de ser assumida pelos administradores, pelos administradores-delegados ou pela comissão executiva.

Analisados os recibos juntos pelo apelante com a petição inicial (documentos 2 a 10), verificamos que deles não consta qualquer palavra escrita ou assinatura aposta por quem seja administrador, administrador-delegado ou membro de comissão executiva da ré.

Também deles não resulta que os mesmos tenham sido pessoalmente emitidos ou validados por quem seja administrador, administrador-delegado ou membro de comissão executiva da ré, sendo corrente, aliás, que não sejam pessoas com esses estatutos organizacionais, mas sim trabalhadores que integram os departamentos administrativos ou financeiros dos empregadores, quem procede ao processamento e emissão de documentos desse tipo.

Como assim, não acompanhamos o apelante no seu entendimento de que dos recibos em questão resulte qualquer confissão escrita por parte da ré que justifique a alteração da redacção do ponto 32º) em análise.

Por outro lado, analisados esses recibos, deles apenas pode extrair-se que a ré pagou ao autor um determinado número de horas, à razão de 10,04 euros, sob a rubrica “Hora Trabalho Suplementar Sáb., Dom., Fer.”.

Deles não se extrai que o número de horas pagas corresponda a disponibilidade para o trabalho ou trabalho prestado em domingos e feriados.

Face ao referido no antecedente parágrafo e não estando excluído que todas as horas pagas na referenciada rubrica correspondessem a disponibilidade para o trabalho ou trabalho prestado exclusivamente em sábados, dos referidos recibos também não pode extrair-se que a ré tivesse aceitado pagar à razão de 10,04 euros a disponibilidade para o trabalho ou o trabalho aos feriados e domingos.

Acresce dizer que a ré jamais aceitou que: i) o apelante tivesse trabalhado ou tivesse estado disponível para trabalhar para a ré aos domingos e feriados, negando mesmo que tal tenha ocorrido (cfr. arts. 34º da petição e 46º da contestação); ii) pagasse ou devesse pagar 10,04 euros por hora de trabalho ou de disponibilidade para o prestar aos domingos e feriados, tendo inclusivamente impugnado o que o autor alegou nesse sentido (cfr. arts. 32º da petição e 11º da contestação).

Assim sendo, não faz sentido dar como provado que a ré aceitou pagar à razão horária de 10,04 euros a disponibilidade para o trabalho ou trabalho prestado em dias desse tipo.

Improcede, assim, esta pretensão recursiva fáctica.


Δ

Pretende o apelante que o ponto 44º) dos factos provados seja totalmente eliminado, constando deste que “O autor gozou 15 dias de férias no ano de 2018, nos seguintes períodos: de 14.06 a 26.06 de 2018; de 09.08 a 17.08 de 2018.”.

Justifica a sua pretensão nos termos seguintes: “… do Ponto 11 dos Factos Provados consta que o A. realizou entre outras as seguintes viagens Bélgica/Portugal e Portugal/Bélgica:

- de 13/06/2018 a 27/06/2018

e

- de 08/08/2018 a 22/08/2018

ORA

na viagem de 13/06/2018 a 27/06/2018 o A. passou em Portugal 13 dias e na viagem de 08/08/2018 a 22/08/2018 passou em Portugal outros 13 dias ora o A. nem sequer chegou a gozar os 20 dias de descanso acordados na Clª 4ª nº 4 do contrato para cada viagem, pelo que, é impossível em termos jurídico probatórios será considerar que desses 26 dias, passados em Portugal nessas duas viagens, 15 fossem de férias.”.

Tal como aconteceu no tocante ao argumentado relativamente ao ponto 10º) dos factos provados que supra se apreciou, o raciocínio discordante do autor referente à temática ora em análise assenta no pressuposto por si sustentado de que só podiam ter sido de descanso, que não também de férias, os períodos de duas semanas passadas pelo autor em Portugal após os períodos de seis semanas passadas pelo autor em trabalho no estrangeiro.

Daí que não pudessem ser considerados de férias nenhum dos dias compreendidos nos períodos de duas semanas passadas pelo autor em Portugal e compreendidas de 13/06/2018 a 27/06/2018 e de 8/8/2018 a 22/08/2018.

Ora, como visto a respeito do aludido ponto 10º), este tribunal não acolheu aquele raciocínio discordante, considerou que poderiam ter sido de férias alguns dos dias compreendidos nos períodos de duas semanas passadas pelo autor em Portugal, sendo que, por isso, manteve inalterado o aludido ponto 10º) do qual consta, designadamente, que “O autor trabalhava 6 semanas no estrangeiro e vinha 2 semanas a Portugal, para gozar descansos compensatórios e férias” – destaque da nossa responsabilidade.

Por isso, nada obsta a que pudessem ter sido considerados de férias alguns dos dias compreendidos nos períodos de duas semanas passadas pelo autor em Portugal e compreendidas de 13/06/2018 a 27/06/2018 e de 8/8/2018 a 22/08/2018, concretamente os períodos de 14/6 a 26/6 de 2018 e de 9/8 a 17/8 de 2018 referidos no ponto 44º) ora em apreciação.

Improcede, assim, esta pretensão recursiva fáctica.


Δ

O apelante pretende que se elimine dos factos não provados o segmento dele constante de que “…o autor nunca tivesse gozado férias;” passando a constar dos factos provados que “O A. nunca gozou férias.”.

Argumenta o apelante que “… a aceitar-se que o A. não gozou as férias constantes do art. 44 dos Factos Provados cuja eliminação se pediu, resulta, em consequência que efectivamente o A. nunca gozou férias, pelo que se requer a eliminação desta frase dos Factos não Provados e que a mesma seja levada aos Factos Provados com a redacção seguinte…”.

Como resulta do transcrito no antecedente parágrafo, a procedência da pretensão recursiva ora em apreciação dependia da prévia procedência da pretensão recursiva do autor formulada a propósito do ponto 44º) dos factos provados, por sua vez dependente da procedência daquela que se formulou em relação ao ponto 10º) dos factos provados.

Ora, estas duas últimas pretensões recursivas fácticas foram julgadas improcedentes.

Assim sendo, sem necessidade de outras considerações, improcede a pretensão recursiva que ora está em apreciação.


Δ

Pretende o apelante que se elimine dos factos não provados o segmento deles constantes no sentido de que “… não haja transportes públicos entre o aeroporto de Lisboa e a residência do autor …”.

Num primeiro plano, argumenta o autor nos termos seguidamente transcritos: “Ora o A. o que disse no art. 23º da p.i. é que não havia transportes públicos diretos entre o aeroporto de Lisboa e a povoação da ..., onde vivia.

Portanto, a não se provar só poderia ser considerado como não provado

- que não haja transportes públicos diretos entre o aeroporto de Lisboa e a povoação de ...

o que implicava que o contrário é que era verdadeiro, isto é,

Que existiam transportes públicos diretos entre o aeroporto de Lisboa e a povoação de ..., o que é um completo disparate.”.

Não acompanhamos este primeiro argumento.

Com efeito, da circunstância de se ter julgado como não provado um determinado facto não pode extrair-se a conclusão de que se provou o facto contrário; a única conclusão que pode validamente extrair-se dessa circunstância é a de que esse facto não está provado, tudo se passando, para efeitos decisórios, como se esse facto não tivesse sequer sido alegado – neste sentido, por exemplo, acórdãos do STJ de 22/10/1992, proferido no processo 085232, de 6/6/1998, proferido no processo 039543, de 29/5/2012, proferido no processo 7615/06.1TBVNG.P1.S1.

 “A prova do facto contrário diverge da resposta puramente negativa em que esta equivale à não alegação do facto não provado, fazendo jogar as regras da distribuição do ónus da prova.” - José Lebre de Freitas, Montalvão Machado, Rui Pinto, CPC Anotado, 2º Volume, 2001, p. 630.

Por isso, ao contrário do propugnado pelo apelante, da circunstância de se ter dado como não provado que “… não haja transportes públicos entre o aeroporto de Lisboa e a residência do autor …” não pode extrair-se a conclusão de que se provou que havia transportes públicos diretos entre o aeroporto de Lisboa e a povoação de ...

Num segundo plano, argumenta o apelante que “A Ré, efetivamente, não põe em causa a afirmação do A. de que não existem Transportes públicos diretos entre o aeroporto de Lisboa e a povoação de ... onde o A. residia…”.

Uma vez mais não acompanhamos o apelante.

De facto, no art. 23º) da petição o autor alegou que não existiam transportes públicos diretos entre o aeroporto de Lisboa e a povoação de ..., onde o autor residia.

Esse artigo 23º) e o seu conteúdo foram impugnados no art. 11º) da contestação, por consequência do que não pode lograr acolhimento o argumento do autor que ora está em consideração.

Nenhum outro argumento ou meio de prova vem aduzido no sentido da demonstração de que o tribunal recorrido incorreu em erro que importe corrigir ao dar como não provado que não havia transportes públicos entre o aeroporto de Lisboa e a residência do autor.

Em função do exposto, improcede esta pretensão recursiva fáctica.


Δ

Considerando o alegado nos arts. 21º) e 23º/f) da petição, 7º) e 20º) da contestação, elimina-se dos factos não provados o segmento segundo o qual não se provou que o autor tivesse feito a viagem Leuze/Bélgica para a sua residência em viatura própria aquando da cessação do contrato, acrescentando-se aos factos provados o nº 46, com a seguinte redacção: Aquando da cessação do contrato, o autor fez a viagem Leuze/Bélgica para a sua residência em viatura própria.

Δ

Pretende a ré que se elimine dos factos não provados o segmento segundo o qual “… o A. tivesse prestado efetivo trabalho, estando ao serviço, sob as ordens e fiscalização da ré nos dias referidos em 34ª da petição inicial.”, transitando esse segmento para os factos provados.

Comece por dizer-se que não podem confundir-se, como parece fazer o apelante, duas realidades distintas, a saber: uma de natureza fáctica e consubstanciada na prestação efectiva de trabalho ao empregador por parte do trabalhador, materializada, no caso dos autos, pela execução de todas ou de algumas das funções integrantes do conteúdo funcional do motorista profissional do transporte internacional rodoviário de mercadorias, por um lado; outra de dimensão jurídica e consistente na contabilização, para efeitos remuneratórios, de um determinado dia como dia de trabalho efectivo prestado pelo trabalhador ao empregador, apesar de nesse dia o trabalhador não ter prestado trabalho efectivo ao empregador por não ter executado nenhuma daquelas funções, por outro lado.

A primeira realidade situa-se no domínio dos factos, sendo passível de integração na decisão da matéria de facto; a segunda situa-se no plano das conclusões a extrair da integração jurídica dos factos provados e não provados, integrando-se, assim, na denominada matéria de direito que, por definição, deve ser expurgada da decisão da matéria de facto.

Tratam-se, assim, de realidades distintas, sendo que pode concluir-se no sentido de que se verifica a segunda mesmo na impossibilidade de se afirmar a verificação da primeira.

Por outras palavras, a afirmação jurídica de que um determinado dia deve ser contabilizado como dia de trabalho para efeitos de remuneração não implica necessariamente a afirmação fáctica de que nesse dia o trabalhador prestou efectivamente o seu trabalho ao empregador.

Assim sendo, ao contrário do sustentado pelo apelante, não pode partir-se da conclusão jurídica de que um determinado dia deve ser contabilizado como dia de trabalho para, no plano dos factos, dar-se como provado que nesse dia o trabalhador prestou efectivamente trabalho ao empregador.

Do mesmo modo, a circunstância de se dar como não provado que num determinado dia o trabalhador prestou efectivo trabalho ao empregador não impede que esse dia possa ser contabilizado como dia de trabalho para efeitos remuneratórios.

Ora, o que o tribunal recorrido deu como não provado foi, apenas, que o autor tenha prestado efectivo trabalho à ré nos dias referidos no art. 34º) da petição inicial, sem que tal implique necessariamente considerar-se que esses dias não foram de trabalho para efeitos remuneratórios, devendo situar-se no plano jurídico, que não no plano fáctico, a questão de saber se aqueles dias devem ou não ser contabilizados como dias de trabalho efectivo apesar de nenhum trabalho ter sido prestado efectivamente.

Por outro lado, não vem invocado qualquer meio de prova que se tenha produzido no sentido de que nos dias referidos no art. 34º) da petição inicial o autor executou efectivamente para ré algumas das suas funções de motorista, razão pela qual deveria o tribunal recorrido ter dado como provado que o apelante teria prestado trabalho efectivo à apelada.

Acresce dizer que integra matéria de direito, devendo excluir-se da decisão fáctica, uma afirmação segundo a qual uma dada pessoa – o trabalhador – se encontrou sob as ordens e fiscalização da outra pessoa – o empregador.

Em face de quanto vem de expor-se, improcede a pretensão recursiva fáctica que está em apreço.


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Segunda questão: se assiste ao autor qualquer crédito referente a férias não gozadas para lá dos €152,64 que a esse respeito foi reconhecido na sentença recorrida.

A procedência desta pretensão jurídica do autor dependia, na própria economia das alegações do apelante, da prévia procedência da sua pretensão recursiva fáctica referente aos pontos 10º), 15º) e 44º) dos factos dados como provados.

Tendo improcedido esta pretensão fáctica, não pode deixar de improceder aquela pretensão jurídica.


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Terceira questão: se o crédito ilíquido reconhecido ao autor na sentença recorrida e referente a despesas com deslocações entre o aeroporto de Lisboa e a povoação de ..., onde o autor residia, deve ser liquidado também na base do pressuposto de que não existiam transportes públicos directos entre aqueles dois locais.

O autor peticionou a este respeito a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 564,77€, convocando-se para o efeito os pressupostos fácticos de que: i) não havia transportes públicos entre o aeroporto de Lisboa e a residência do autor; ii) a esposa do autor foi buscá-lo e levá-lo ao referido aeroporto em automóvel próprio, percorrendo 374 kms em cada uma das 4 viagens efectuadas para o efeito, devendo cada um desses kms ser remunerado à razão de 0,26€.

A sentença recorrida decidiu condenar a ré a pagar ao autor “… a quantia a apurar em liquidação em execução de sentença no que respeita a despesas com as deslocações entre o aeroporto de Lisboa e a residência do autor em ...;”.

 Argumentou-se assim na sentença recorrida: “Porém não tendo ficado provado que o autor se deslocasse em veículo particular nessas viagens, nem qual o montante que despenderia em viagens através de transportes públicos, têm tais montantes que ser relegados para liquidação em execução de sentença.

Tendo em conta, no entanto que a ré reconhece dever ao autor a quantia de €75,00 pela viagem ocorrida em 01.11.2019 nessa quantia irá desde já condenada a ré.”.

Na apelação pretende o autor que a ré seja condenada a pagar-lhe o valor correspondente a despesas de deslocação entre o aeroporto e a sua residência, a liquidar oportunamente, mas tendo por pressuposto, também, o de que não existiam transporte públicos directos entre aqueles dois locais.

Ora, aqueles dois pressupostos fácticos em que o autor assentou a sua pretensão em análise foram dados como não provados, sendo que: i) a pretensão recursiva fáctica do autor referente ao primeiro desses pressupostos foi julgada improcedente; ii) o apelante não impugnou o fundamento jurídico aduzido na sentença recorrida para a improcedência da pretensão exacta do autor que está em apreciação, qual seja o de que não se provou que as deslocações entre a aeroporto e a residência do autor tivessem sido efetuados em viatura particular do autor.

Como assim, indemonstrados aqueles pressupostos fácticos e não impugnado aquele fundamento jurídico, não se vislumbra fundamento para se julgar procedente a pretensão do autor que está em analise, com a consequente improcedência da mesma.


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Quarta questão: se a ré deve ser condenada a pagar o autor as despesas com a deslocação do autor de Portugal para a Bélgica (Leuze) em 31/1/18, para iniciar o contrato, e com a deslocação Bélgica (Leuze)/Portugal no dia 1/11/18, após o termo do contrato, tudo no valor global de 636,11 €.

O autor peticionou a este respeito a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 636,11€, convocando-se para o efeito os pressupostos fácticos de que: i) o autor realizou essas deslocações em viatura própria; ii) em cada uma dessas deslocações o autor despendeu, pelo menos, a quantia de 278,22€.

Ora, consta explicitamente dos factos não provados, sem impugnação do apelante, que não se provou  “…que o autor se tivesse deslocado da sua residência para Leuze/Bélgica em viatura própria no dia 31.01.2018 para iniciar o seu trabalho…”, sendo que nesta matéria o ónus de alegação e prova competia exclusivamente ao autor (art. 342º/1 do CC).

Assim, no que concerne a esta viagem de 31/1/2018 nenhum crédito poderia ser reconhecido ao autor.

Já no que concerne à viagem de 1/11/2018, resulta do novo nº 46 dos factos descritos como provados que “Aquando da cessação do contrato, o autor fez a viagem Leuze/Bélgica para a sua residência em viatura própria.”.

Porém, o autor não logrou demonstrar, e sobre essa temática nenhuma pretensão recursiva fáctica manifestou, no sentido de que os custos dessa viagem tivessem corrido por sua conta, em especial que despendeu nessa viagem a quantia de 278,22€ por si alegada ou qualquer outra de que não tivesse sido ressarcido em medida superior aos 75€ que a ré reconhece dever a esse respeito (art. 20º da contestação), sendo que nesta matéria o ónus de alegação e prova também competia exclusivamente ao autor (art. 342º/1 do CC).

Aliás, excluído não está, a este respeito, que possa corresponder à realidade dos factos o alegado pela ré no sentido de que “Em caso da viagem de ou para Portugal ser efectuada por meio de veículo automóvel ficou estabelecido entre o Autor e a Ré, logo no momento da contratação, que esta suportava a importância de €75,00, sendo o remanescente por conta do Autor,” (art. 19º da contestação), matéria exceptiva que o autor não impugnou nos termos e para os efeitos do art. 60º/5 do CPT[1].

Assim, no que concerne a esta viagem de 1/11/2018, nenhum crédito poderia ser reconhecido ao autor que excedesse os referenciados 75€.

Resta dizer que a condenação da ré a pagar ao autor, a este respeito, a quantia de 75 euros reportada à viagem de 1/11/2018 assentou no fundamento, que não foi objecto de impugnação, de que a ré confessou na contestação dever essa quantia ao autor, independentemente de se saber se as viagens foram feitas ou não com utilização de viatura particular do autor e se este despendeu o que quer que fosse com essas viagens.

Como assim, não tendo o autor satisfeito aqueles ónus probatórios e não justificando este fundamento a condenação da ré a pagar o que quer que seja para lá dos referenciados 75€, não se vislumbra fundamento para a condenação da ré no pagamento da quantia de 636,11€ peticionada pelo autor a este respeito, com a consequente improcedência dessa pretensão.


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Quinta questão: se a ré deve ser condenada a pagar o autor a diária de 55€ por cada um dos dias de viagem Bélgica/Portugal e Portugal/Bélgica para o autor gozar em Portugal dias de descanso e férias.

A respeito desta questão escreveu-se no acórdão deste Tribunal da Relação de 6/12/2019, com o mesmo relator e adjuntos do presente, o seguinte: “Comece por dizer-se que não está demonstrado qualquer acordo entre o autor e a ré no sentido de que esta devesse pagar àquela o valor das “diárias” que está em consideração.

A despeito do acabado de referir, o autor parte do princípio de que são tempos de trabalho os tempos de viagem de e para o local de trabalho na Bélgica para efeitos de serem gozados em Portugal os descansos compensatórios por trabalho no estrangeiro aos sábados, domingos e feriados, razão pela qual sustenta que a ré estava legalmente obrigada ao pagamento das “diárias” em consideração.

Não vislumbramos fundamento legal que nos permita acompanhar o entendimento do apelante.

Assim, começando pelo CT/09, o tempo de trabalho corresponde ao período em que o trabalhador está a trabalhar ou se encontra à disposição da entidade empregadora e no exercício da sua actividade ou das suas funções, bem como determinadas interrupções ou intervalos como tal taxativamente enunciados e dos quais não importa aqui cuidar por nenhum deles estar em equação – art. 197º/1/2 do CT/09.

O tempo de descanso obtém-se por exclusão, no sentido de que deve ser considerado como tal todo o tempo que não possa qualificar-se como de trabalho – art. 199º do CT/09.

Ora, não é do primeiro tipo o tempo compreendido entre o início das viagens em Leuze ou no aeroporto belga de embarque e o termo dessas viagens em Portugal[2], para o autor gozar descansos ou férias.

Outrossim, não é desse tipo o tempo compreendido entre o início das viagens em Portugal[3] e o termo dessas viagens na Bélgica[4], para o autor retomar o seu trabalho na Bélgica.

Acresce dizer que esse tempo também não é passível de ser considerado como “tempo de disponibilidade” passível de ser contabilizado como tempo de trabalho, ou seja, aquele em que o trabalhador se mantém em presença física no local de trabalho - cfr. o acórdão do STJ de 02/11/2004, proferido no Recurso n.º 340/04 - 4.ª Secção (https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/social2004.pdf), numa situação em que estava em causa uma relação de trabalho referente a motorista profissional; o acórdão do STJ de 23/02/2005, proferido no processo 04S3164; o acórdão do STJ de 19/11/2008, proferido no processo 08S0930; o acórdão da Relação de Coimbra de 08/11/2007, proferido no processo 482/05.4TTVIS.C1; os acórdãos do STJ de 20/6/2018, proferido no processo 641/15.1T8LSB.L1.S1, de 2/5/2018, proferido no processo 157/14.3TTSTR.E1.S1, da Relação de Lisboa de 17/12/2014, proferido no processo 715/13.3TTVFX.L1-4, da Relação de Évora de 14/9/2017, proferido no processo 97/14.6T8STR.E1, de 16/2/2017, proferido no processo 618/13.1TTFAR.E1.

Como assim, à Luz do CT/09 e por exclusão, esse “tempo de viagem” não pode deixar de ser considerado como tempo de descanso.

Considerando o mesmo problema à luz da Directiva 2002/15/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Março de 2002, relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem actividades móveis de transporte rodoviário, não vemos como a solução correspondente possa deixar de ser a mesma.
Com efeito, nos termos do art. 3º dessa Directiva, “… entende-se por:
a) "Tempo de trabalho"SD:
1. No caso dos trabalhadores móveis, o período compreendido entre o começo e o fim do trabalho, durante o qual o trabalhador se encontre no seu posto de trabalho, à disposição do empregador e no exercício das suas funções ou actividades, ou seja:
- o tempo consagrado a todas as actividades de transporte rodoviário. Essas actividades incluem, nomeadamente:
i) condução;
ii) carga e descarga;
ii0i) assistência aos passageiros que entrem ou saiam do veículo;
iv) limpeza e manutenção técnica;
v) todas as restantes tarefas destinadas a assegurar a segurança do veículo, carga e passageiros ou a satisfazer as obrigações legais ou regulam00entares directamente ligadas à operação específica de transporte em curso, incluindo o controlo das operações de carga e descarga, formalidades administrativas com a polícia, alfândegas, serviços de imigração, etc.
- os períodos durante os quais não pode dispor livremente do seu tempo, sendo-lhe exigida a presença no posto de trabalho, pronto para retomar o trabalho normal, desempenhando certas tarefas associadas ao serviço, nomeadamente períodos de espera pela carga ou descarga cuja duração previsível não seja antecipadamente conhecida, isto é, antes da partida ou imediatamente antes do início efectivo do período em questão, ou de acordo com as condições gerais negociadas entre os parceiros sociais e/ou previstas pela legislação dos Estados-Membros.
(…)
São excluídos do tempo de trabalho os períodos de pausa referidos no artigo 5.o, os períodos de repouso referidos no artigo 6.o e ainda, sem prejuízo da legislação dos Estados-Membros ou de acordos entre os parceiros sociais que prevejam a compensação ou limitação desses períodos, o tempo de disponibilidade referido na alínea b) do presente artigo,”.

Como assim, à luz desta Directiva comunitária o “tempo de viagem” em consideração não pode ser considerado como tempo de trabalho.

Além disso, não se vislumbra que esse “tempo de viagem” possa ser qualificado como tempo de trabalho à luz do DL 237/2007, de 19/6, que transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2002/15/CE.

À mesma conclusão se chega tendo em consideração o IRCT aplicável, designadamente a cláusula 41ª/6 que o apelante convoca em seu benefício e nos termos da qual “Por cada dia de descanso semanal ou feriado em serviço no estrangeiro o trabalhador, além do adicional referido nos n.ºs 1 e 2 desta cláusula, tem direito a 1 dia de descanso complementar, gozado seguida e imediatamente à sua chegada.”.

Com efeito, dessa cláusula não resulta minimamente que deva qualificar-se como tempo de trabalho o “tempo de viagem” que ora está em equação.”.

Não se vislumbra razão para actualmente se divergir do que acaba de transcrever-se.

Assim sendo, aplicando o assim transcrito ao caso dos autos, com as devidas adaptações, não pode deixar de improceder a pretensão recursiva do autor ora em apreciação.


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Sexta questão: se a ré deve ser condenada a pagar o autor a quantia por este reclamada com fundamento em 4 dias de descanso compensatório a que tinha direito e que lhe não foram concedidos por reporte aos dias 4, 11, 18 e 25 de Fevereiro, 4, 11, 18, 25 e 30 de Março, 8 e 15 de Abril, todos de 2018.

Da conjugação do que se deu como provado nos pontos 5º) a 7º), 11º), 15º) e 17º) dos factos descritos nessa qualidade, resulta que em cumprimento do acordado entre o autor e a ré no correspondente contrato de trabalho, o autor permaneceu deslocalizado no estrangeiro durante 11 dias de domingo e feriados compreendidos entre 4/2/2018 e 15/4/2018.

Da conjugação do estatuído na cláusula 4ª/4 do contrato referido no ponto 3º) dos factos provados com o que se descreve nos pontos 10º), 25º) e 44º) dos factos dados como provados, resulta que por causa daqueles 11 dias o autor gozou em Portugal sete dias de descanso compensatório.

Está em causa, assim, o problema de saber se o autor tem direito a um qualquer crédito correspondente aos 4 dias de descanso compensatório para se perfazerem os 11 dias correspondentes aos 11 dias passados no estrageiro.

Cumpre esclarecer que a questão se coloca porque resulta dos pontos 18º) a 24º) dos factos descritos como provados que o autor não exerceu a sua actividade de condutor profissional para a ré nalguns daqueles dias.
À relação de trabalho entre o autor e a ré aplicava-se o CCTV outorgado entre a FESTRU, actual FECTRANS, e a ANTRAM, publicado no BTE 1ª série, nº 9, de 8/3/80, com as sucessivas actualizações de que foi objecto (cfr. BTE´s nºs 16/82, 18/86, 12/81, 16/82, 18/83, 18/86, 18/87, 28/88, 20/89, 19/90, 18/91, 25/92, 25/93, 24/94, 20/96 e 30/97), ex-vi das Portarias de Extensão publicadas nos BTE nº 30, de 15/08/1980, e 33 de 08/09/1982).
Por outro lado, importa ter em consideração que a situação do autor – condutor profissional que é colocado numa base localizada no estrangeiro para, partindo daí e aí regressando, exercer a actividade profissional de motorista do serviço internacional, com deslocações a outros países estrangeiros – não é mesma de outros motoristas do mesmo serviço internacional que têm o seu local de trabalho em Portugal, partindo de uma base sita em Portugal com direcção a países estrangeiros e daí regressam à referenciada base, tudo em execução de viagens de transporte internacional de mercadorias.

O primeiro tinha a sua base permanente de trabalho no estrangeiro, sendo igualmente no estrangeiro que desenvolvia toda a sua actividade de motorista do serviço internacional, sendo que: “Nos dias em que não conduzia, nomeadamente aos domingos e feriados, o autor tinha autodisponibilidade para usufruir desse dia como entendesse, podendo realizar atividades pessoais, como por exemplo ler, ir às compras, conviver com os demais colegas, fazer os telefonemas particulares que entendesse, ouvir música, ver um filme, estar no Facebook com a família.” (ponto 27º dos factos provados); “Nesses dias, o veiculo atribuído ao autor ficava ou em parques de áreas de serviço ou nas instalações da empresa associada da ré em Leuze, frequentados por outros motoristas da ré, e nas quais os camiões e os motoristas permanecem em segurança, dado tratarem-se de instalações vedadas, vigiadas através de câmaras de segurança, de acesso restrito. (ponto 28º dos factos provados); “Na base logística de Leuze existem balneários, refeitório equipado que os motoristas da ré podem usar.” (ponto 29º dos factos provados); “Nesses locais, o autor aparcava o camião que lhe estava confiado e podia ausentar-se de junto do mesmo pelo tempo que desejasse e para fazer o que entendesse, dispondo para si desse dia de descanso.” (ponto 30º dos factos provados).
Os segundos têm a sua base de trabalho em Portugal e deslocam-se ao estrangeiro, daí regressando à base de trabalho portuguesa, exercendo parcialmente em território nacional e parcialmente no estrangeiro a sua actividade de motoristas do serviço internacional, sendo que, em relação a eles: i) não ocorre, sequer por semelhança, o referido nos pontos 27º) a 30º) acabados de transcrever, não beneficiando, por isso, da autodisponibilidade de gozo de dias de descanso proporcionada pelo assim descrito; ii) existe, além do dever de condução da viatura propriamente dita, o dever de a manter, assim como a correspondente carga, à sua guarda e em condições de segurança, o que os impede, designadamente, de abandonarem as viaturas e gozarem como melhor entenderem os dias de descanso ou de imobilização legal ocorridos no estrangeiro.
Por isso, não tem necessária aplicação ao primeiro a jurisprudência consolidada nos nossos tribunais superiores no sentido de que “… tratando-se de um motorista de transportes internacionais rodoviários de mercadorias, se a entidade patronal o encarrega de realizar um serviço no estrangeiro e trabalha em dias de descanso semanal, obrigatório ou complementar, intercalados entre outros que correspondem a dias de trabalho semanal, é lícito inferir - tendo em conta o normal funcionamento e o desenvolvimento económico de uma empresa de transportes internacionais de mercadorias - que a entidade empregadora sabia que aquele se encontrava a prestar serviço no seu interesse e que não se opôs a que tal serviço fosse prestado…”,  e de que “… a actividade objecto do contrato de trabalho em causa envolve, nas deslocações, não apenas a condução da viatura, mas também a sua guarda e manutenção em boas condições e, particularmente no estrangeiro, a permanente disponibilidade ao serviço do empregador, perdendo o trabalhador … a auto-disponibilidade para usufruir os dias de descanso com a família e os amigos, que só se adquire com o regresso…”, razão pela qual  “… os dias de sábado, domingo ou feriado, em que o motorista está retido no estrangeiro, por razões de organização ou por imperativo da legislação rodoviária, têm de ser encarados como de prestação de trabalho efectivo, uma vez que o motorista está disponível para o fazer…” – acórdão do STJ de 17/12/2009, proferido no processo 949/06.7TTMTS.S1; no mesmo sentido, acórdão do STJ de 18/1/2005, proferido no processo 04S923, acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 22/5/2020, proferido no processo 322/19.7T8CVL.C1, acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 3/11/2016, proferido no processo 286/13.0TTVNF.G1.

No caso em apreço, o autor foi colocado a exercer as suas funções no estrangeiro, com um regime de descansos específico: “Pelo tipo de actividade que o EMPREGADOR desenvolve, encontra-se sujeita às disposições do Regulamento (CE) nº 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, publ. Em 15 de Março de 2006 alterado pelo Regulamento (CE) nº 1073/2009 de 4 de Dezembro que estabelece os tempos de pausa e repouso dos motoristas. Assim, os dias de descansos semanal, quando o TRABALHADOR realize serviços no estrangeiro igual ou superior a três dias, coincidirão obrigatoriamente com os dias de repouso semana cumpridos para efeitos do Regulamento (CE) nº 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Março de 2006 alterado pelo Regulamento (CE) nº 1073/2009 de 4 de Dezembro, mesmo que esses dias não coincidam com aqueles que correspondem aos dias de semanal obrigatório e complementar (Sábado e Domingo). Quando durante o circuito seja gozado apenas um dia de repousos semanal, este corresponderá ao dia de descanso obrigatório.” – cláusula 4ª, nº 3, do contrato de trabalho celebrado entre o autor e a ré.
Por seu turno, nos termos da cláusula 20ª do CCT aplicável, “O dia de descanso semanal coincidirá sempre que possível com o domingo.” (nº1), e “O dia de descanso completar tem de ser fixado imediatamente antes ou a seguir ao dia de descanso semanal” (nº 2).
A significar que ao contrário do que parece ser sustentado pelo apelante, desta última cláusula não resulta que o dia de descanso semanal é obrigatoriamente o domingo, sendo necessariamente sábado ou segunda-feira o dia de descanso complementar – neste sentido, por exemplo, acórdãos do STJ de 5/6/2002, proferido no processo 02S345, e de 6/3/2002, proferido no processo 00S3916; acórdãos deste Tribunal da Relação de 25/2/2016, proferido no processo 33/13.7TTGRD.C1, e de 23/10/2020, proferido no processo 1870/19.4T8LRA.C1.
No caso particular do autor e de acordo com o regime específico de descanso semanal em que acordou com a ré, os dias de descanso semanal obrigatório e complementar poderiam ser em dias distintos dos sábados, domingos e segundas-feiras, embora com estes também pudessem coincidir.
Finalmente e por definição os dias de feriado (arts. 234º e 235º do CT/09) não são dias de descanso (art. 232º do CT/09), apesar de em determinadas circunstâncias de tempo poderem coincidir.

Ora, a cláusula 41ª/6 do CCTV supra identificado, estipulava que “Por cada dia de descanso semanal ou feriado em serviço no estrangeiro o trabalhador, além do adicional referido nos nºs 1 e 2 desta cláusula, tem direito a um dia de descanso complementar, gozado seguida e imediatamente à sua chegada.”.

Como assim, a pretensão do autor em apreço só poderia lograr acolhimento se fosse possível sustentar, face aos factos dados como provados, que: i) o autor trabalhou no estrangeiro um determinado número de dias correspondentes a dias de descanso obrigatório ou complementar ou feriados[5], concretamente todos ou alguns dos 11 dias identificados no ponto 17º)  dos factos provados; ii) a ré concedeu um número de dias de descanso compensatório em número inferior a esses 11 dias em que o autor trabalhou para a mesma[6], com inobservância do disposto na cláusula 41ª/6 do CCTV supra identificado.

Ora, resulta dos pontos 18º) a 24º) dos factos provados, que: i) nos dias 4 e 11 de Fevereiro o autor esteve de descanso; ii) nos dias 18 e 25 de Fevereiro, 4, 11, 18, 25 e 30 de Março de 2018, e 15 de Abril, o autor percorreu 0 Kms; iii) o autor não trabalhou no dia 8 de Abril.

Por outro lado e concordantemente, enuncia-se nos factos não provados que não se demonstrou que o autor tivesse prestado efectivo trabalho em nenhum desses mesmos dias.

  A significar que o autor não logrou provar: i) ter trabalhado para a ré em algum daqueles dias; ii) que esses dias correspondiam a dias de feriado ou a dias descanso obrigatório ou complementar como tal qualificáveis ao abrigo do regime de descanso contratualmente acordado.

É certo que o autor parece sustentar que são tempos de trabalho os tempos correspondentes a todos os sábados, domingos e feriados que passou no estrangeiro, mesmo que em descanso ou sem exercer a condução profissional, razão pela qual sustenta que a ré estava legalmente obrigada a conceder-lhe um número de descansos compensatórios igual à soma dos sábados, domingos e feriados que passou no estrangeiro.

Não vislumbramos fundamento legal que nos permita acompanhar o entendimento do apelante.

Assim, começando pelo CT/09, o tempo de trabalho corresponde ao período em que o trabalhador está a trabalhar ou se encontra à disposição da entidade empregadora e no exercício da sua actividade ou das suas funções, bem como determinadas interrupções ou intervalos como tal taxativamente enunciados e dos quais não importa aqui cuidar por nenhum deles estar em equação – art. 197º/1/2 do CT/09.

O tempo de descanso obtém-se por exclusão, no sentido de que deve ser considerado como tal todo o tempo que não possa qualificar-se como de trabalho – art. 199º do CT/09.

Ora, não é do primeiro tipo o tempo que o autor permaneceu no estrangeiro em descanso ou sem exercer a condução profissional.

Acresce dizer que esse tempo também não é passível de ser considerado como “tempo de disponibilidade” passível de ser contabilizado como tempo de trabalho, ou seja, aquele em que o trabalhador se mantém em presença física no local de trabalho - cfr. o acórdão do STJ de 02/11/2004, proferido no Recurso n.º 340/04 - 4.ª Secção (https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/social2004.pdf), numa situação em que estava em causa uma relação de trabalho referente a motorista profissional; o acórdão do STJ de 23/02/2005, proferido no processo 04S3164; o acórdão do STJ de 19/11/2008, proferido no processo 08S0930; o acórdão da Relação de Coimbra de 08/11/2007, proferido no processo 482/05.4TTVIS.C1; os acórdãos do STJ de 20/6/2018, proferido no processo 641/15.1T8LSB.L1.S1, de 2/5/2018, proferido no processo 157/14.3TTSTR.E1.S1, da Relação de Lisboa de 17/12/2014, proferido no processo 715/13.3TTVFX.L1-4, da Relação de Évora de 14/9/2017, proferido no processo 97/14.6T8STR.E1, de 16/2/2017, proferido no processo 618/13.1TTFAR.E1.

Como assim, à Luz do CT/09 e por exclusão, esse tempo de permanência do autor no estrangeiro em descanso ou sem exercer a condução profissional não pode deixar de ser considerado como tempo de descanso.

Considerando o mesmo problema à luz da Directiva 2002/15/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Março de 2002, relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem actividades móveis de transporte rodoviário, não vemos como a solução correspondente possa deixar de ser a mesma.
Com efeito, nos termos do art. 3º dessa Directiva, “… entende-se por:
a) "Tempo de trabalho"SD:
1. No caso dos trabalhadores móveis, o período compreendido entre o começo e o fim do trabalho, durante o qual o trabalhador se encontre no seu posto de trabalho, à disposição do empregador e no exercício das suas funções ou actividades, ou seja:
- o tempo consagrado a todas as actividades de transporte rodoviário. Essas actividades incluem, nomeadamente:
i) condução;
ii) carga e descarga;
iii) assistência aos passageiros que entrem ou saiam do veículo;
iv) limpeza e manutenção técnica;
v) todas as restantes tarefas destinadas a assegurar a segurança do veículo, carga e passageiros ou a satisfazer as obrigações legais ou regulamentares directamente ligadas à operação específica de transporte em curso, incluindo o controlo das operações de carga e descarga, formalidades administrativas com a polícia, alfândegas, serviços de imigração, etc.
- os períodos durante os quais não pode dispor livremente do seu tempo, sendo-lhe exigida a presença no posto de trabalho, pronto para retomar o trabalho normal, desempenhando certas tarefas associadas ao serviço, nomeadamente períodos de espera pela carga ou descarga cuja duração previsível não seja antecipadamente conhecida, isto é, antes da partida ou imediatamente antes do início efectivo do período em questão, ou de acordo com as condições gerais negociadas entre os parceiros sociais e/ou previstas pela legislação dos Estados-Membros.
(…)
São excluídos do tempo de trabalho os períodos de pausa referidos no artigo 5.o, os períodos de repouso referidos no artigo 6.o e ainda, sem prejuízo da legislação dos Estados-Membros ou de acordos entre os parceiros sociais que prevejam a compensação ou limitação desses períodos, o tempo de disponibilidade referido na alínea b) do presente artigo,”.

Como assim, à luz desta Directiva comunitária o tempo de permanência do autor no estrangeiro em descanso ou sem exercer a condução profissional não pode ser considerado como tempo de trabalho.

Além disso, não se vislumbra que esse “tempo de viagem” possa ser qualificado como tempo de trabalho à luz do DL 237/2007, de 19/6, que transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2002/15/CE.

É negativa, assim, a resposta à questão que está em apreciação.


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Sétima questão: se a ré deve ser condenada a pagar o autor, a título de despesas com alimentos, 55€ por cada um dos dias que o autor permaneceu no estrangeiro

Resulta dos factos provados que “A ré não pagava ao autor as refeições à fatura, nem antes da saída para as viagens lhe fazia os adiantamentos para esse efeito.” (ponto 8º), que “Em vez disso pagava-lhe uma diária de € 55,00 que levava aos recibos no “Código 34” a título de “Ajudas de Custo-Estrangeiro – Motoristas” (ponto 9º), e que “Todos os dias passados pelo autor no estrangeiro, quer correspondessem a dias de trabalho ou a dias de descanso a ré pagava ao autor a importância de € 55,00 a título de diária para “ajuda de custo”.  (ponto 31º).

Ora, nos termos da cláusula 47º-A do CCTV aplicável, o trabalhador deslocado no estrangeiro tem direito ao pagamento das despesas efectuadas com a refeições ou a um adiantamento para estas despesas à saída para as viagens.

A significar que a ré instituiu em matéria de pagamento aos trabalhadores das despesas com refeições um regime diferente do que era imposto pelo CCTV aplicável.

Ora, “I - A prestações previstas na lei ou em instrumento de regulamentação colectiva podem ser modificadas por acordo entre a entidade patronal e o trabalhador, ou mesmo unilateralmente, através de um compromisso vinculativo para a entidade patronal, desde que dessa alteração resulte um regime mais favorável para o trabalhador.

II - Compete à entidade patronal a prova de que o sistema remuneratório praticado em virtude dessa alteração é mais favorável para o trabalhador.

III - Caso não se prove que o acordo - ou a imposição unilateral da entidade patronal - é mais favorável ao trabalhador, deve ser declarada a nulidade da alteração na estrutura remuneratória, tendo, consequentemente, o trabalhador direito a reclamar da entidade patronal as quantias devidas por virtude da lei ou CCT aplicável e devendo o mesmo (trabalhador) restituir à entidade patronal as importâncias que recebeu desta, decorrentes do regime remuneratório praticado.” – acórdão do STJ de 15/11/2006, proferido no processo 06S2706; no mesmo sentido, apenas a título de exemplo, acórdão do STJ de 15/2/2005, proferido no processo 04S614, de 18/1/2005, proferido no processo 04S3034.

A nulidade é de conhecimento oficioso (art. 286º do CC) – neste sentido e a título de exemplo, acórdãos do STJ de 23/1/2008, proferido no processo 07S2186, de 14/3/2006, proferido no processo 1377/05, do Tribunal da Relação do Porto de 10/7/2019, proferido no processo 3386/17.4T8VFR.P1.

Assim, não resultando dos factos provados que o regime prestacional instituído pela ré fosse mais favorável do que o imposto pelo CCTV aplicável, deveria o tribunal recorrido declarar a nulidade desse regime prestacional praticado, o que fez, sem razões para censura por parte deste tribunal.

Do mesmo modo, deve aplicar oficiosamente o regime restitutivo decorrente dessa declaração de nulidade – Assento nº 4/95, DR, Iª série – A, de 17/5/1995, pp. 2939 a 2941.

Importa notar, igualmente, que o apelante apenas discordou da declaração da nulidade levada a efeito pelo tribunal recorrido, não tendo discordado do regime enunciado pelo tribunal recorrido na sequência dessa declaração de nulidade, no sentido de que “… sendo inquestionável que o autor teria despesas com alimentação nos dias de viagem e provando-se que a ré lhe pagava a quantia de €55,00/dia para pagamento das refeições, tem de se apurar quais as efetivas despesas que o autor teve com a alimentação, devendo as mesmas ser compensadas com os montantes pagos a tal título de “diária”, num total apurado de €11.825,00.

Pelo exposto, desconhecendo-se o montante das despesas, tem de se relegar para execução de sentença o apuramento do montante eventualmente pago pelo autor pelas despesas com alimentação ao qual se deve deduzir a quantia supra.”.

Assim sendo, tendo improcedido a pretensão da ré no sentido de que se declare a “… ilicitude da declaração de nulidade do montante de 55,00 fixado para a diária …,” subsiste intocado, por ausência de impugnação do apelante, o regime definido pelo tribunal recorrido na sequência dessa declaração de nulidade no que concerne ao ressarcimento do autor pelas despesas que teve com a sua alimentação durante a subsistência do contrato de trabalho.

A significar que na parte em apreço a sentença recorrida não merece censura, subsistindo o decidido nessa sentença.


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Oitava questão: se a ré deve ser condenada a pagar o autor a remuneração correspondente a 65 dias de descanso passados no estrangeiro ao serviço da ré, à razão diária de 80,32€.

Está em causa a remuneração a que o autor se arroga com direito com fundamento na circunstância de ter passado no estrangeiro, ao serviço da ré, 65 dias que deveriam ser qualificados como de descanso (arts. 34º e 35º da petição) e em relação aos quais a ré teria assumido uma prática remuneratória de pagamento à hora e à razão horária de 10,04€, mesmo que o autor não trabalhasse (arts. 31º e 32º da petição).

Para que pudesse proceder a concreta pretensão do autor que está em apreço, o mesmo tinha que provar (art. 342º/1 do CC), designadamente, a prática remuneratória a que acabou de aludir-se e que convocou no seu articulado inicial para efeitos de integração da causa de pedir correspondente ao pedido que formulou neste âmbito.

Na verdade, no que respeita à causa de pedir o NCPC consagra, tal como o consagrava o VCPC, a denominada teoria da substanciação de acordo com a qual a causa de pedir é integrada pelo facto ou factos produtores do efeito jurídico pretendido pelo demandante; a causa de pedir radica, pois, no facto gerador do direito, divergindo a causa de pedir sempre que seja diferente o facto constitutivo invocado.

Segundo Anselmo de Castro (Direito Processual Civil Declaratório, I, Almedina Coimbra, 1981, pp. 205 e seguintes), que considerada que é esta a que a nossa lei consagra, para a teoria da substanciação, a causa de pedir será o facto gerador do direito, divergindo a acção sempre que seja diferente o facto constitutivo invocado (diferente como acontecimento concreto).

Segundo Lebre de Freitas (Introdução ao Processo Civil, Conceito e Princípios Gerais, Coimbra Editora, 1996, pp. 54 e ss), para a teoria da individualização bastava ao autor indicar o pedido, com o que todas as possíveis causas de pedir podiam ser consideradas no processo, de tal modo que, ao responder afirmativa ou negativamente à pretensão, a sentença decidia em absoluto sobre a existência ou inexistência da situação jurídica afirmada pelo autor. E exemplificando escreve o mesmo autor que “…afirmada a titularidade do direito de propriedade, todas as causas possíveis de aquisição do direito podiam ser consideradas no processo, com a consequência, no caso de absolvição do pedido, de não poder o autor propor nova acção em que alegasse uma causa de pedir que não tivesse sido efectivamente considerada no processo anterior.”.

Para a teoria da substanciação ao invés, a afirmação da situação jurídica tem de ser fundada em factos que, ao mesmo tempo que integram, tal como os outros factos alegados pelas partes, a matéria fáctica da causa, exercem a função de individualizar a pretensão para o efeito de conformação do objecto do processo.”.

Segundo o mesmo autor, a definição do art. 498º/4 do CPC “…aponta, como referência fundamental do conceito, para as normas de direito substantivo em cuja previsão se contém o facto para a qual estatuem o efeito jurídico pretendido…”.

Igualmente Antunes Varela concorda que a nossa lei adjectiva rejeitou a teoria da individualização e consagrou a da substanciação, a qual “…exige sempre a indicação do título (facto jurídico) em que se baseia o direito do autor…”, ao passo que aquela “…prescinde, pelo contrário, da indicação desse título, sempre que, como sucede nas acções reais (e ao invés do que sucede nas acções creditórias), ela não seja necessária para identificar o direito invocado pelo autor…”. Daí a importância da alusão ao facto concreto (ocupação, acessão, usucapião), sendo certo que a instauração de uma acção com base na usucapião não obsta à instauração de uma nova acção com base noutro título. Isto porque, na sentença “…só constituirá caso julgado a resposta final dada à pretensão concretizada no pedido e coada através da causa de pedir…”, concluindo que a nossa lei perfilha uma concepção mais restrita da eficácia de caso julgado, confinando a respectiva autoridade à relação jurídica que serve de base à pretensão e afastando-a de todos os motivos da decisão que com aquela se não conformem – Manual de Processo Civil, 2ª edição, pp. 714, 718 e 719.

Também Abrantes Geraldes (Temas da Reforma do Processo Civil, 1 e 2, 1997, pp. 176 e 187) refere que é clara, no nº 4, do art. 498º, a opção legislativa pelo sistema da substanciação da causa de pedir em detrimento do da individualização. Neste, “…bastaria a indicação do pedido, devendo a sentença esgotar todas as possíveis causas de pedir da situação jurídica enunciada pelo autor, impedindo-se que após a sentença houvesse alegação de factos anteriores e que porventura não tivessem sido alegados ou apreciados.”. Naquele, é necessário “…articular os factos de onde deriva a sua pretensão, formando-se o objecto do processo e, por arrastamento, o caso julgado, apenas relativamente aos factos integradores da causa de pedir invocada…”.
Assim, “…
a causa de pedir é integrada pelo facto ou factos produtores do efeito jurídico pretendido e não deve confundir-se com a valoração jurídica atribuída pelo autor, a qual, de todo o modo, não é vinculativa para o tribunal, devido ao princípio, consignado no artº 664º, segundo o qual o tribunal conhece oficiosamente do direito aplicável…”, ou seja, “…a causa de pedir é consubstanciada tão só pelos factos que preenchem a previsão da norma que concede a situação subjectiva alegada pela parte.” - idem, p.177.

A significar que sob pena de alteração judicial não consentida da causa de pedir invocada pelo autor, porque efectuada à revelia das partes (cfr. art. 265º/1 do NCPC), estava vedado ao tribunal recorrido, assim como está vedado a este tribunal, deferir total ou parcialmente a pretensão do autor em análise com base em fundamentos fácticos diferentes daqueles que concretamente foram invocados pelo autor para suporte da sua pretensão.

Ora, o certo é que o autor não logrou provar a prática remuneratória por si convocada, no segmento em que se invoca o pagamento de 10,04€ à hora, mesmo nas situações de não prestação de trabalho pelo autor.

O que se provou a esse respeito foi, apenas, que: i) “As horas de trabalho suplementar realizadas pelo autor em dias de sábado eram pagas a este sob a rubrica “Hora trabalho suplementar Sab . Dom, Fe”, no valor de €10,04, nos montantes que constam dos recibos de vencimento juntos aos autos.”  (ponto 32º dos factos provados); ii) “A ré durante a relação laboral pagou ao autor sob a rubrica “hora trabalho suplem. Sáb. Do. Fe” o montante total de €622,48 (ponto 43º dos factos provados)[7].

Como assim, não pode ser com fundamento nessa prática que a ré deve ser condenada a pagar o que quer que seja.

Por outro lado, na cláusula 41º/1ª do CCT aplicável, sob a epígrafe de "Retribuição do trabalho em dias de descanso e feriados", dispõe-se que "O trabalho prestado em dias feriados ou dias de descanso, semanal e ou complementar é remunerado com o acréscimo de 200%".
Ora, como se sustentou a respeito da questão sexta, aqui se resumindo o que a respeito ali se enunciou, os dias de descanso semanal obrigatório e complementar do autor poderiam ser em dias distintos dos sábados, domingos e segundas-feiras, embora com estes também pudessem coincidir, razão pela qual os dias de descanso do autor poderiam ter coincidido, ou não, com todos ou alguns dos dias enunciados no art. 34º) da petição inicial, competindo ao autor provar que esses dias foram efectivamente os dias de descanso a que tinha direito de acordo com aquele regime específico, ónus esse que não satisfez porque dos factos provados tal não resulta.
Logo por aí se deveria concluir no sentido de que não podem ser considerados dias de descanso aqueles que são enunciados naquele art. 34º) da petição inicial, naufragando a pretensão do autor no sentido de que esses dias lhe fossem pagos como dias de descanso em que teria trabalhado ou teria estado disponível para trabalhar.

Por outro lado, no caso específico dos motoristas do serviço internacional colocados e a exercer as suas funções no local e condições em que se encontrava o autor, não podem ser considerados tempos de trabalho os tempos correspondentes a todos os dias de descanso passados no estrangeiro, mesmo que em descanso ou sem exercer a condução profissional, razão pela qual só podem ser considerados como tempos de trabalho para efeitos da citada cláusula 41ª/1 os períodos de tempo em que o autor tenha desempenhado efectivamente ou tenha estado disponível para desempenhar a sua actividade profissional para a ré.

Como assim, a pretensão do autor em apreço só poderia lograr acolhimento se fosse possível sustentar, face aos factos dados como provados, que: i) o autor trabalhou no estrangeiro um determinado número de dias correspondentes a dias de descanso obrigatório ou complementar, concretamente todos ou alguns dos dias identificados no art. 34º) da petição inicial; ii) a ré remunerou esses dias por montantes inferiores ao decorrente da cláusula 41º/1 citada.

Ora, resulta dos pontos 18º) a 24º) dos factos provados, que: i) nos dias 4 e 11 de Fevereiro o autor esteve de descanso; ii) nos dias 18 e 25 de Fevereiro, 4, 11, 18, 25 e 30 de Março de 2018, e 15 de Abril, o autor percorreu 0 Kms; iii) o autor não trabalhou no dia 8 de Abril.

Por outro lado, enuncia-se nos factos não provados que não se demonstrou que “…que o autor tivesse prestado efetivo trabalho, estando ao serviço, sob ordens e fiscalização da ré nos dias referidos em 34º da petição inicial;”.

  A significar que o autor não logrou provar: i) ter trabalhado para a ré em nenhum daqueles dias; ii) que esses dias correspondiam a dias de descanso obrigatório ou complementar como tal qualificáveis ao abrigo do regime de descanso contratualmente acordado.

Como assim, tal como decidido a respeito da questão dos descansos compensatórios correspondentes a trabalho prestado em dias de descanso ou feriados, improcede esta pretensão do autor no sentido da condenação da ré a pagar-lhe a remuneração específica que seria devida por trabalho prestado em dias de descanso.


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Nona questão: se a ré deveria ter sido condenada a pagar ao autor as quantias a cujo direito se arrogou na petição inicial com fundamento em aplicação da denominada “Lei Macron”.

Em 1 de Julho de 2016 entrou em vigor em França o decreto 2016-418, de 7/4[8], tendo por objecto a “adaptation de certaines dispositions du code du travail applicables aux entreprises établies hors de France détachant des salariés roulants ou navigants sur le territoire français pour tenir compte des spécificités du secteur des transports”, com vista  à “.. l'application des dispositions du chapitre unique du titre III du livre III de la première partie législative du code des transports, telles qu'issues de l'article 281 de la loi n° 2015-990 du 6 août 2015[9] pour la croissance, l'activité et l'égalité des chances économiques.”.

Originariamente, aquele decreto apenas se aplicava às empresas não residentes em território francês: i) que deslocavam motoristas para a França para realização de operações de transporte com origem ou destino em França; ii) ou com operações de cabotagem nesse país.

Só essas empresas ficaram sujeitas, designadamente, à obrigação do pagamento do salário mínimo interprofissional francês aos seus trabalhadores deslocados decorrente da conjugação daqueles diplomas legais.

Importa referir, ainda, que partir de 6/9/2018, por força da Lei 2018-771, de 5/9[10], a denominada Lei Macron passou a aplicar-se apenas nos casos em que o cliente do transportador seja uma empresa radicada em território francês.

Importa não perder de vista, igualmente, que o autor se arroga ao crédito que ora está em consideração com o fundamento fáctico específico que para o efeito convocou na petição inicial de que teria realizado transportes internacionais de mercadorias com operações de carga ou descarga em França realizadas nos 27 dias identificados no art. 51º) da petição inicial.

Ora, descreveu-se como não provado que “…autor tivesse efetuado serviço de carga/descarga em França nos dias indicados em 51º da petição inicial.”.

Esse segmento fáctico não foi objecto de impugnação no recurso incidindo sobre a matéria de facto, quedando por isso insufragável toda a argumentação aduzida pelo apelante no pressuposto de que se demonstrou a realização pelo autor, em França, de serviços de carga ou descarga.

Também não resulta dos factos provados que através do autor a ré realizasse em França operações de cabotagem, nem que aí realizasse viagens de transporte de mercadorias contratadas por empresas radicadas em território francês; apenas se provou que “Durante o tempo em que o contrato de trabalho vigorou o autor exerceu sempre a atividade de motorista de pesados no serviço internacional, em viagens no estrangeiro, conduzindo as viaturas pesadas de mercadorias pertença da ré, que esta lhe atribuía, incidindo os serviços de transporte, sobretudo, na Bélgica, Holanda, França, Luxemburgo.” (ponto 5º dos factos provados).

Tanto bastaria para que improcedesse, como improcedeu, a pretensão do autor que está em apreciação, não existindo nesse segmento fundamento para censurar a decisão recorrida.

É certo que “O trabalhador contratado por uma empresa estabelecida em Portugal, que preste actividade no território de outro Estado em situação a que se refere o artigo 6.º, tem direito às condições de trabalho previstas no artigo anterior, sem prejuízo de regime mais favorável constante da lei aplicável ou do contrato.” – art. 8º/1 do CT/09.

Certo é, igualmente, que: i) apesar da consagração do princípio da “autonomia privada” no art. 3º/1[11] da Convenção de Roma de 1980[12] sobre a lei aplicável às obrigações contratuais, em resultado do que as partes contratantes podem optar pela lei que irá regular o contrato de trabalho, o art. 6º/1[13] da mesma Convenção impõe o afastamento da aplicação daquela lei escolhida nas situações em que da mesma resulte a privação para o trabalhador da protecção emergente de disposições imperativas legais que lhe seriam aplicáveis na falta de escolha[14]; ii) o Direito da União prevalece sobre todo o direito interno, incluindo o Constitucional, razão pela qual o direito nacional deve ser interpretado conformemente ao direito comunitário e em termos de ser alcançado o resultado pretendido pelo último, devendo excluir-se a aplicação de normas internas contrárias ao disposto no direito comunitário[15]; iii) o artigo 3.º da Directiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Dezembro de 1996, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços, prescreve que “1. Os Estados-membros providenciarão no sentido de que, independentemente da lei aplicável à relação de trabalho, as empresas referidas no nº 1 do artigo 1º garantam aos trabalhadores destacados no seu território as condições de trabalho e de emprego relativas às matérias adiante referidas que, no território do Estado-membro onde o trabalho for executado, sejam fixadas:

- por disposições legislativas, regulamentares ou administrativas e/ou

- por convenções colectivas ou decisões arbitrais declaradas de aplicação geral na acepção do nº 8, na medida em que digam respeito às actividades referidas no anexo:

(...)
c) Remunerações salariais mínimas, incluindo as bonificações relativas a horas extraordinárias; a presente alínea não se aplica aos regimes complementares voluntários de reforma;

(...)
Para efeitos da presente directiva, a noção de «remunerações salariais mínimas» referida na alínea c) do nº 1 é definida pela legislação e/ou pela prática nacional do Estado-membro em cujo território o trabalhador se encontra destacado.

(...)
7. O disposto nos nºs 1 a 6 não obsta à aplicação de condições de emprego e trabalho mais favoráveis aos trabalhadores
.”; iv) o art. 8º/1 do CT/09 deve ser interpretado em termos de dever ser alcançado o desiderato prosseguido por aquela directiva de se salvaguardar, sem prejuízo de regime mais favorável, o direito de o trabalhador destacado ser remunerado em termos de nunca receber menos do que o salário mínimo vigente no país onde se encontra destacado.

Contudo, menos certo não é que resulta dos factos provados que o autor estava deslocalizado numa base sita na Bélgica (ponto 5º, 6º, 27º a 30º dos factos provados), nada permitindo concluir no sentido de que o autor alguma vez tenha estado deslocalizado em França nalguma das situações previstas no art. 6º/1 do CT/09.

Por isso, não tem o autor direito à legislação francesa referente às condições de trabalho previstas no artigo 7º do CT/09, designadamente à que regulamenta a retribuição mínima no Estado Francês, seja por inaplicabilidade do art. 8º/1 do CT/09, seja porque o autor não pode considerar-se deslocalizado em França para efeitos da Directiva 96/71/CE.

Como assim, soçobra a pretensão do autor a que lhe seja reconhecido o direito de crédito em causa no âmbito desta questão.


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Décima questão: se a ré deveria ter sido condenada a pagar ao autor as quantias a cujo direito se arrogou na petição inicial e correspondentes ao valor das dormidas a que tinha direito, mas que não usufruiu, em estabelecimentos de hotelaria, nos termos do disposto nos nºs 6 e 8 do art. 8º do Regulamento (CE) nº 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15/03/2006 e cláusula 4ª, nº 5, do Contrato de Trabalho.

Como fundamento desta pretensão alegou o autor, designadamente, que: i) tinha direito a ter pernoitado em estabelecimentos hoteleiros sempre que o repouso das 45 horas estabelecidas de 15 em 15 dias coincidisse com a estada do veículo pesado em França ou na Bélgica; ii) normalmente dormia no seu camião na base de Leuze na Bélgica, embora algumas vezes dormisse em França; iii) nunca dormiu em nenhum hotel; iv) cada uma dessas dormidas teria importado, em média, em cerca de 35 euros, tendo a ré ficado ilegitimamente enriquecida pelo facto de não ter proporcionado ao autor as referenciadas dormidas.

Lidos os factos provados, deles não resulta, sem que a respeito tenha sido manifestada qualquer divergência recursiva em sede de recurso incidindo sobre a matéria de facto, que: i) o autor dormisse normalmente no seu camião; ii) o autor nunca tenha dormido em hotel; iii) o autor alguma vez tivesse dormido em hotel.

Por outro lado, também não resulta desses factos que todos ou alguns dos períodos de repouso de 45 horas estabelecidos de 15 em 15 dias tivessem coincidido com a estada do veículo na Bélgica ou em França, pressuposto constitutivo do direito à dormida em estabelecimento hoteleiro, não estando excluído que todos ou alguns desses períodos tivessem coincidido com a estada do veículo na Holanda ou no Luxemburgo, países onde o autor também efectuava viagens de transportes de mercadorias (ponto 5º dos factos provados) e em relação aos quais o autor não se arroga o direito à dormida que está em apreciação.

Como assim, o autor não cumpriu o ónus da prova que sobre si impendia (art. 342º/1 do CC) dos factos que alegou como fundamento da pretensão que ora está em apreciação, razão pela qual esta deveria ter improcedido, como improcedeu.
Acresce dizer que o direito a que o autor se arroga se fundaria numa responsabilidade civil contratual emergente da violação da cláusula 4ª, nº 5, do Contrato de Trabalho, pois que não se vislumbra dispositivo legal que imponha o ali acordado entre o autor e a ré (dormida obrigatoriamente em hotel/hospedaria à escolha do autor), designadamente o REGULAMENTO (CE) n.º 561/2006 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, de 15 de Março de 2006, na redacção que lhe foi conferida pelos REGULAMENTO (CE) n.º 1073/2009 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, de 21 de Outubro de 2009, REGULAMENTO (UE) n.º 165/2014 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, de 4 de Fevereiro de 2014, e REGULAMENTO (UE) 2020/1054 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, de 15 de Julho de 2020, onde se estipula, apenas, que os períodos de repouso devem ser gozados num alojamento apropriado e adequado do ponto de vista do género, com instalações de dormida e sanitárias adequadas.

Ora, como é sabido e também decorre do art. 798º do CC, são pressupostos cumulativos da responsabilidade civil contratual os seguintes: a existência de um facto voluntário do agente; a ilicitude desse facto; que se verifique um nexo de imputação do facto ao lesante; que da violação contratual derive um dano; que haja um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima.

Relevam particularmente para efeitos desta decisão o primeiro e o último desses pressupostos.

O facto ilícito consubstancia-se num qualquer evento decorrente da acção humana (voluntária ou, ao menos, objectivamente controlável) e que seja lesivo de bens jurídicos pessoais e/ou patrimoniais.

Quanto ao dano, representa ele o concreto desvalor que o facto ilícito inflige na esfera jurídica de outrem. É em função deste que o instituto da responsabilidade civil opera a sua missão reintegradora, a qual há-de abranger tanto os danos passíveis de expressão pecuniária (danos patrimoniais), quanto aqueles que pela sua natureza imaterial, não o sendo embora, mereçam, atenta a sua gravidade, a tutela do direito, mediante adequada compensação (danos não patrimoniais).

Aquela primeira classe de danos engloba os prejuízos sofridos pelo património já existente do lesado (dano emergente) e, ainda, os ganhos que naquele património deixaram de ingressar em consequência da lesão (lucro cessante), conforme resulta do art. 564º do CC.

Ora, os factos provados não permitem concluir no sentido de que se encontram preenchidos estes dois pressupostos da responsabilidade civil contratual.

Por um lado, fica sem se perceber a razão pela qual o autor não teria usufruído das dormidas em questão, em especial se foi por qualquer conduta activa ou omissiva da ré[16] que consubstancie o facto ilícito a que se aludiu.

Não pode, pois, afirmar-se um facto ilícito cometido pela ré.

Por outro lado, desses mesmos factos não resultam concretos danos materiais ou morais suportados pelo autor por causa da circunstância de não ter usufruído das dormidas ora em apreço: desses factos não resulta que o autor tenha suportado um qualquer prejuízo empobrecedor da sua esfera jurídico-patrimonial, ou que nesta não tenha ingressado um qualquer ganho que teria permitido o correspondente enriquecimento do autor, ou ainda que o autor tivesse suportado quaisquer danos de natureza imaterial.

Esclareça-se que o enriquecimento da ré, invocado pelo autor, pelo facto de não ter suportado os custos com tais dormidas não traduz por si só qualquer dano emergente ou lucro cessante produzido na esfera jurídica do autor e consubstanciador de um dano causalmente decorrente daquele enriquecimento.

Ora, o dano na esfera jurídica do lesado decorrente do facto ilícito do agente também constitui um dos pressupostos constitutivos da responsabilidade civil contratual sem a verificação do qual tal responsabilidade não pode ser afirmada.

Também por esta via se verifica que não poderia proceder, como não procedeu, a pretensão do autor que está em apreciação.

Finalmente, tal como se escreveu no acórdão deste Tribunal da Relação de 17/1/2020, proferido no processo 46/19.5T8CTB.C1, subscrito como adjuntos pelo aqui relator e primeira-adjunta: “Está provado que a ré antes da saída para as viagens não lhe fazia os adiantamentos previstos na Clª 47-A do CCTV (facto 7), designada e concretamente, os adiantamentos relativos a despesas que o trabalhador tenha que efectuar consigo mesmo, nas quais se incluem, estamos em crer, as despesas com alojamento.

Mas já não se encontra provado, conforme alega o recorrente, que este não tivesse gozado os repousos semanais nos hotéis, ou seja, fora dos veículos que conduzia, porque a Ré não lhe tivesse feito esses adiantamentos.

Por outro lado, estipulou-se contratualmente que “o repouso regular de 45 horas, quando coincida com a estada do veículo pesado em França ou na Bélgica tem de ser efetuada obrigatoriamente em hotel à escolha do trabalhador, privilegiando a rede de Hotéis Fórmula 1 e IBIS, ficando o trabalhador obrigado a apresentar o recibo de pagamento da dormida de forma a ser reembolsado” nº 5 da Clª.4º do contrato de trabalho.

Esta cláusula contratual, salvo melhor opinião, não consagra, no nosso entendimento, um regime menos favorável, no que às dormidas concerne, do que aquele que resulta do CCTV pois este apenas determina que deve haver aditamentos não especificando o local ou locais onde devam ser gozadas as pernoitas nos dias de descanso.

Acresce que, no caso, nem sequer se provou (ónus que recaía sobre o autor) que a falta dos adiantamentos fosse a causa das pernoitas não terem sido passadas em hotel.

Por isso mesmo, entendemos que, a dita cláusula contratual é válida atento o disposto no artº artº 476 do CT.

Ora, como o autor não apresentou o recibo de pagamento de dormidas em hotel/hospedaria, não tem direito à quantia que reclama.”.

O assim decidido aplica-se, com as devidas adaptações à situação em apreço, considerando que não se provou que o autor: i) não tivesse pernoitado em hotéis porque a ré não lhe tivesse feito os correspondentes adiantamentos pecuniários; ii) tenha dormido em hotel/hospedaria em alguma noite; iii) tivesse entregado à ré os recibos de pagamento referidos na cláusula 4ª/5 supra transcrita.

Eis, pois, um último fundamento de improcedência da pretensão do autor que estão sob apreciação.

Em conclusão: improcede integralmente a apelação do autor.

IV- DECISÃO

Acordam os juízes que integram esta sexta secção social do Tribunal da Relação de Coimbra no sentido de julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pela apelante.

Coimbra, 27/11/2020.


(Jorge Manuel Loureiro)

(Paula Maria Roberto)

(Ramalho Pinto)



***


[1] Não importa aqui abordar a questão de saber se está aqui em causa uma mera faculdade ou um verdadeiro ónus de impugnação – sobre esta questão e em sentidos divergentes podem consultar-se o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23/2/2015, proferido no processo. 95961/13.8YIPRT.P1, e o. acórdão da Relação de Lisboa de 22/3/2018, proferido no processo 207/14.3TVLSB-2
[2] Quer se considere como local de termo da viagem o aeroporto português de desembarque ou o domicílio do autor em Portugal
[3] Quer se considere como local de início da viagem o domicílio do autor em Portugal ou o aeroporto português de embarque.
[4] Quer se considere como local de termo da viagem o aeroporto belga de desembarque ou Leuze onde estava sediada a base de trabalho do autor na Bélgica.

[5] No sentido de que é sobre o trabalhador que impende esse ónus de alegação e prova, acórdãos deste Tribunal da Relação de 25/2/2016, proferido no processo 33/13.7TTGRD.C1, e de 23/10/2020, proferido no processo 1870/19.4T8LRA.C1.
[6] No sentido de que é sobre o trabalhador que impende o ónus de alegação e prova do não gozo (integral ou parcial) dos descansos compensatórios, acórdãos do STJ de 9/3/2017, proferido no processo 633/13.5TTVIS.C1.S1, e deste Tribunal da Relação de 23/10/2020, proferido no processo 1870/19.4T8LRA.C1.

[7] Trata-se, pois, de retribuição referente a trabalho suplementar efectivamente prestado aos sábados, domingos ou feriados, que não se confunde com remuneração referente a dias de não prestação de trabalho.
[8] https://www.legifrance.gouv.fr/eli/decret/2016/4/7/2016-418/jo/texte
[9] https://www.legifrance.gouv.fr/affichTexte.do?cidTexte=JORFTEXT000030978561&categorieLien=id#JORFARTI000030978578
[10] https://www.legifrance.gouv.fr/jorf/id/JORFTEXT000037367660?r=7kTN8WRTJU
[11]O contrato rege-se pela lei escolhida pelas partes. Esta escolha deve ser expressa ou resultar de modo inequívoco das disposições do contrato ou das circunstâncias da causa. Mediante esta escolha, as partes podem designar a lei aplicável à totalidade ou apenas a uma parte do contrato.”.
[12] A que Portugal aderiu pela convenção assinada no Funchal, em 18/05/1992, aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 3/94 e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 1/94, diplomas publicados no DR, I Série-A, nº 28, de 03/02/1994, vigente na ordem jurídica portuguesa desde 01/09/1994 (Aviso n.º 240/94 de 30/08/1994, no DR, I Série-A, n.º 217, de 19/09/1994).
[13]Sem prejuízo do disposto no artigo 3º, a escolha pelas partes da lei aplicável ao contrato de trabalho, não pode ter como consequência privar o trabalhador da protecção que lhe garantem as disposições imperativas da lei que seria aplicável, na falta de escolha, por força do nº 2 do presente artigo.”.
[14] Cfr. acórdão do STJ de 12/5/2016, proferido no processo 2998/14.2TTLSB.L1.S1; acórdão do Tribunal da Relação de Porto de 5/5/2014, proferido no processo 525/09.2TTPRT.P1; acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 4/10/2018, proferido no processo 40/15.5T8BCL.G1
[15] Cfr., v.g, ,acórdãos do TJUE: Handelsgesellschaft, de 17/12/1970, proferido no processo 11/70, ECLI:EU:C:1970:114: Melloni, de 26/2/2013, proferido no processo 399/11, ECLI:EU:C:2013:107.
[16] O simples facto de a ré não fazer adiantamentos pecuniários para as refeições (ponto 8º dos factos provados) não equivale a que tais adiantamentos não fossem feitos no que concerne às dormidas, sendo que relativamente a estes os factos provados e não provados nada esclarecem.
Por outro lado, ainda que também não ocorressem os adiantamentos para as dormidas, ficaria sem se perceber se apesar disso o autor poderia ou não ter usufruído das dormidas em estabelecimentos de hotelaria, fazendo repercutir na ré os custos a tanto associados.
Por exemplo, mediante facturação directa do estabelecimento hoteleiro à ré no âmbito de eventual acordo existente entre a mesma e cadeias de estabelecimentos hoteleiros onde os seus motoristas devessem pernoitar; ou mediante o reembolso ao autor dos custos por este adiantados para usufruir das dormidas em questão, tal como parece estabelecer-se no contrato de trabalho em que outorgaram o autor e a ré.