Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
770/15.1T8PBL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MOREIRA DO CARMO
Descritores: HONORÁRIOS
ADVOGADO
MANDATO FORENSE
Data do Acordão: 11/03/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA - POMBAL - INST. LOCAL - SECÇÃO CÍVEL - J1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS. 1157, 1161, 1167 CC, 100 Nº3 EOA
Sumário: 1.- No âmbito de uma execução para pagamento de quantia certa, o crédito de honorários pelo exercício do mandato forense só se integra no património do profissional advogado, por inteiro, depois de prestados integralmente os actos em que se resolve.

2.- Caso o mandatário judicial abandone a execução e o seu mandato antes que esteja inteiramente paga a quantia exequenda aos exequentes seus clientes não pode calcular na sua nota de honorários, no que se refere ao item “resultado obtido”, mencionado no art. 100º, nº 3, do estatuto da Ordem dos Avogados, um valor como correspondendo à satisfação integral de tal quantia exequenda.

Decisão Texto Integral:

I – Relatório

1. J (…), advogado, com escritório em Pombal, instaurou acção declarativa contra C (…) e mulher M (…), residentes em Pombal, pedindo a condenação dos mesmos no pagamento da quantia de 8.870 €, acrescida de IVA, e de juros vincendos desde a citação.

Alega para tanto, em síntese, que no mês de Janeiro de 2004, na qualidade de advogado, patrocinou os réus como exequentes numa execução para pagamento de quantia certa e que finalizado o mandato, elaborou a respectiva nota de honorários, no montante peticionado, atenta a utilidade económica para os RR de 70.137,80 € e a sua boa capacidade económica, a qual enviou aos mesmos em Maio de 2013, mas que eles não liquidaram.

Os RR contestaram, alegando, em síntese, que o processo ainda não está concluído, apenas tendo recebido, à data, a quantia de 42.582,55 €, faltando ainda receber a quantia de 38.779,30 €, sendo que o A. nenhum trabalho teve ao nível de tal processo, pois foi o réu marido quem diligenciou junto do agente de execução pela penhora dos bens ali executados, sendo assim exagerados os honorários peticionados. Mais alegaram que sempre pagaram ao A. os valores de honorários reclamados, vivendo actualmente com dificuldades.

Foi emitido laudo, totalmente favorável, pela Ordem dos Advogados.

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A final foi proferida sentença que julgou a acção procedente e, em consequência, condenou os RR a pagar ao A. a quantia de 10.910,10 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a citação e até integral pagamento.

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2. Os RR interpuseram recurso, concluindo como segue:

1 – Os recorrentes pretendem ver sindicado o montante fixado, nos autos a título de honorários, por violação dos princípios geris e da moderação

2 – Em sede de fundamentação da matéria de facto, o Meritíssimo Juiz “ a quo “ ignora o facto de os recorrentes terem de constituir novo mandatário, face à renúncia do mandato ocorrida em 15/05/2013.

Pois

3 - Não está garantido o recebimento total da quantia exequenda pois possivelmente nunca se poderá dizer, como se fez consignar na aliás douta sentença que:

“Sem prejuízo de continuar a ser descontado no salário da ali executada por força da penhora, o montante de € 885,25”

4 – A medida total dos honorários deve representar apenas e só o tempo da sua intervenção processual.

5 – Resulta do processo – conforme confirmação via citius - que a partir de 15-05-2013, os ora recorrentes se viram forçados a constituir novo mandatário.

6 – Não pode um verdadeiro juízo de ponderação, realizado segundo critérios de moderação e equidade, ignorar a renúncia que obriga os recorrentes a pagar honorários a dois mandatários.

7 – O pedido exequendo mostra-se apenas garantido em cerca de 50%. Assim,

8 – Devem assim os honorários ser reduzidos nessa mesma proporção, ou seja para o montante de € 4.435,00 acrescido de IVA

9 – A fixação da justa remuneração dos serviços dos mandatários forenses, ou seja a fixação dos honorários, constitui matéria de direito, como se decidiu no Ac. S.T.J de 19-02-2002

10 – Assim, a aliás douta sentença violou além do mais o disposto no artº 100 nº 3 do E.O.A , artº 1157, e 1158 n º 2 do C.C.

Termos em que face ao exposto, deve revogar-se a aliás douta sentença, e substituir-se por outra que julgue parcialmente procedente a acção, revogando-se parcialmente a mesma com todas as consequências legais.

3. Inexistem contra-alegações.

II – Factos Provados

 

1) O autor é advogado na comarca de Pombal, desempenhando tal profissão de forma remunerada.

2) No mês de Janeiro de 2004, foi solicitado ao autor pelos réus, que exercício dessa actividade, instaurasse uma acção executiva para pagamento de quantia certa, por terem pago, na qualidade de fiadores, o montante de € 69.136,71, perante a Caixa de Crédito Agrícola de Pombal.

3) O autor estudou a questão e interpôs o competente o requerimento executivo,

4) No âmbito da referida execução, os ali executados deduziram oposição à execução, tendo esta sido contestada pelos aqui réus.

5) No âmbito da referida oposição à execução foi proferido despacho saneador e realizada a respectiva audiência de julgamento.

6) Foi proferida sentença julgando improcedente a oposição à execução.

7) Os ali executados recorreram para o Tribunal da Relação de Coimbra, que veio a confirmar a decisão da primeira instância.

8) Os ali executados interpuseram ainda recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, admitido a 16/04/2012, tendo sido proferido despacho a 15/06/2012 que julgou deserto o recurso, por falta de alegações.

9) Através de cartas datadas de 15/05/2013, com o teor constante de fls. 9 e 11 dos autos, o autor remeteu aos réus a nota de honorários com o teor constante de fls. 13 a 14 dos autos.

10) A execução supra referida ainda não se extinguiu pelo pagamento integral da divida exequenda.

11) No âmbito da referida execução, até 26/06/2013, os aqui réus e ali exequentes haviam recebido apenas a quantia de € 42.582,55, sem prejuízo de continuar a ser descontado no salário da ali executada, por força de penhora, o montante mensal de € 885,25.

12) O autor renunciou ao mandato que lhe foi outorgado pelos aqui réus, na referida execução, através de requerimento datado de 15/05/2013, renuncia essa que foi ali notificada a estes.

III – Do Direito

1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (arts. 639º, nº 1, e 635º, nº 4, do NCPC), apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas.

Nesta conformidade, a única questão a resolver é a seguinte.

- Redução do montante dos honorários fixados para metade.

2. A argumentação dos apelantes é muito simples. O tribunal condenou-os a pagar o montante de 10.910,10 €, dos quais 8.870 € correspondem a honorários e o restante a IVA. Como o A. renunciou ao mandato, não levando a execução até ao fim, e o pedido exequendo se mostra garantido apenas em cerca de 50%, então os honorários devem ser reduzidos para metade daquela quantia fixada a título de honorários.  

Na decisão recorrida escreveu-se que:  

“Nos termos do disposto no artigo 1157º do Código Civil, mandato é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra, sendo inequívoco que entre o autor e o réu se estabeleceu tal contrato.

Por sua vez, decorre do artigo 1158º do mesmo código que o mandato presume-se gratuito, excepto se tiver por objecto actos que o mandatário pratique por profissão, já que, neste caso, se presume oneroso.

Sendo neste último caso a medida da retribuição, não havendo ajuste entre as partes, determinada pelas tarifas profissionais; na falta destas, pelos usos; e, na falta de umas e outros, por juízos de equidade.

Dispondo, por sua vez, o artigo 100º nº 3 do Estatuto da Ordem dos Advogados que na fixação dos honorários, “(...) deve o advogado atender à importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais”.

Desta forma, “a lei não estabelece qualquer método decisório ou critério legal, antes consagra critérios ou parâmetros referenciais de carácter deontológico/estatutário a serem observados pelos advogados na fixação dos honorários respectivos” (cfr. neste sentido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01/03/2007, (base de dados da DGSI, processo nº 07A119).

Por outro lado, constitui obrigação do mandante, pagar ao mandatário a retribuição que ao caso competir e reembolsá-lo das despesas feitas que este fundadamente tenha considerado indispensáveis, com juros legais desde que foram efectuadas (artigo 1167º alíneas b) e c) do Código Civil).

O autor apresentou a nota de honorários e despesas constante de fls. 13/14, insurgindo-se os réus, grosso modo, quanto à fixação dos honorários, por os acharem excessivos, sem prejuízo de também terem alegado, de forma genérica, que o autor recebeu outras quantias que não identifica.

Desde logo, quanto à medida e justeza dos honorários reclamados, deverá ter-se presente que, não tendo o montante relativo a despesas sido impugnado, deverá o mesmo ter-se por assente.

Por outro lado, quanto aos honorários propriamente ditos, importa, por sua vez, ponderar que as partes não os ajustaram previamente, aquando do início do mandato.

Nesta medida, caberá ao tribunal suprir tal lacuna contratual, aferindo da justeza dos agora reclamados e em especial da sua conformidade com as regras supra referidas.

E em especial relevando que foi proferido laudo favorável pelo órgão competente da Ordem dos Advogados.

Como bem se salientou no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15/04/2013 (base de dados da DGSI, processo nº 84/06.8TBTBC.P1), “(...) o Laudo sendo um parecer técnico, constitui um meio de prova pericial sujeito à livre apreciação do julgador, servindo apenas de orientação, mas não se lhe pode negar o valor de uma perícia e deve merecer todo o respeito e atenção por parte do Juiz.”.

Sem prejuízo de se ter em linha de conta, como também se afirmou no acórdão Tribunal da Relação do Porto de 21/05/2013 (base de dados da DGSI, processo nº 4974/06.0TBVFR.P1), que “(...)a lei, nomeadamente o EOA, não estabelece uma forma de matematicamente fixar os honorários do advogado, estabelecendo antes critérios referenciais de carácter deontológico, complementados por um juízo equitativo sobre a matéria em litigio.

No pressuposto de que tais critérios são devidamente ponderados nos laudos pedidos à Ordem dos Advogados e emitidos nos termos do Regulamento nº 40/2005 de 20.05, aprovado por deliberação de 29.04.2005 do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, ao abrigo do art.º 43º nº 1 al. i) do EOA, vem a jurisprudência atribuindo a esses laudos uma função orientadora, de valor próximo da perícia ou de “parecer técnico” (sendo aliás assim qualificado no art.º 2º do citado Regulamento 40/2005), dada a especial qualificação de quem o emite, mas naturalmente sujeito à livre valoração por parte do tribunal (cfr. art. 655º nº 1), o que implica uma certa “discricionariedade”, no sentido civilístico, por parte do tribunal na fixação daqueles honorários. Cremos que, mais do que propriamente discricionariedade, do que se trata é da fixação dos honorários com recurso a critérios ou “juízos de equidade”, ao abrigo da referida regra geral do nº 2 do art.º 1158º do CC.

Importa ainda tomar em consideração que a fixação da justa remuneração dos serviços dos mandatários forenses, ou seja, a fixação dos honorários, constitui matéria de direito, como se decidiu no Ac. do STJ de 19.02.2002.”.

Daqui decorre que dever-se-ão dar aos laudos de honorários emitidos pela Ordem dos Advogados uma especial relevância, atenta a natureza de prova pericial de que os mesmos se revestem, sem que, todavia, daí decorra, necessariamente, que o tribunal, norteando-se por um juízo de equidade, não possa fixar os honorários, aquém ou além (desde que, neste último caso, se contenha nos limites do peticionado) do ali fixado (aliás, por natural decorrência, do disposto no artigo 389º do Código Civil).

No entanto, aderimos às considerações vertidas no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 22/02/2005 (base de dados da DGSI, processo nº 3701/04), no sentido do laudo de honorários apresentar-se, no caso, como um parecer técnico com um carácter probatório reforçado, a significar que a ele se deverá dar uma especial preponderância e que apenas deva ser colocado em causa quando relevantes motivos o imponham.

Como ali se deixou expresso, “(...) Para além do valor jurídico do Laudo, (...), tem de cuidar-se da sua importância e utilidade do ponto de vista técnico, profissional e social; …..

A organização sócio-profissional, …… tem virtualidades positivas que, como tudo na vida, podem degenerar num ou noutro aspecto negativo; por isso, se fala tanto hoje na auto-regulação, como mecanismo, eventualmente único, como alguns defendem, para potenciar os aspectos positivos e controlar os negativos, com o reconhecimento de não haver outra forma de controle democrático mais eficaz. Sendo assim, ignorar ou tirar importância à organização sócio-profissional e às suas atribuições e poderes seria perder a utilidade de um tal instrumento…...

Então, o Laudo, para além do seu valor jurídico (...), tem um outro valor sócio-jurídico que obriga à sua dignificação, em última análise como forma de incentivar a responsabilidade e o referido auto-controle.

Sendo assim, ele não pode ser posto de lado, a não ser com uma razão forte ou, pelo menos, devidamente motivada.”.

Aqui chegados, cumpre aferir se existirão razões fortes de discordância que ditem que se coloque em causa o laudo de honorários.

No fundo, cumpre determinar se resulta dos autos um quadro factual que, ao abrigo de especiais razões de justiça e equidade, permita afirmar da desadequação dos honorários apresentados pelo autor e já validados pela organização socioprofissional a quem cabe auto-tutelar o exercício da advocacia.

O que, desde já, diga-se, não nos parece.

Dos discriminados na nota de honorários, afigura-se-nos que os únicos que seriam susceptíveis de alguma ponderação, nos termos sobreditos, seriam os que contendem com os valores reclamados a título de valor/hora despendido com reuniões, estudo, análise preparação e sessões de julgamento (€ 3.000,00) e os referentes à utilidade económica (€ 5.000,00).

Para afirmar, desde logo, quanto a este último parâmetro, que o mesmo não se afigura desproporcionado, de forma a colocar em causa o referido laudo, considerando, em particular, o valor reclamado na execução e tendo presente que a acção executiva teve vicissitudes relacionadas com incidentes declarativos, no âmbito e na sequência da oposição à execução, nos quais os aqui réu obtiveram total ganho de causa.

Tendo ainda presente os valores já entregues aos aqui réus e que os restantes estão garantidos pela penhora de salários da executada. Sendo aqui irrelevante que os réus não tenham ainda em seu poder a totalidade da quantia exequenda (dado que o seu recebimento está apenas dependente do normal curso do processo, sem necessidade de qualquer impulso processual relevante), afigurando-se-nos que, no essencial, a intervenção do advogado mostra-se ali finda.

E no que concerne ao valor/horas despendidos com reuniões, estudo, análise preparação e sessões de julgamento (€ 3.000,00), também não se provaram quaisquer razões que permitam colocar em causa a bondade do montante fixado e corroborado pelo laudo já emitido.

Não tendo sido considerado pela Ordem dos Advogados, irrazoável o tempo alegadamente despendido para tais efeitos (mostrando-se compatível com as descritas vicissitudes da acção executiva) e nem o valor/hora desconforme com os usos e praxe do foro.

Tudo para concluir que, tendo o autor – no âmbito da sua actividade profissional e no interesse dos réus – prestado os serviços e incorrido nas despesas que se provaram, não à dúvida de que terá direito ao montante peticionado, não se revelando desproporcionada a quantia fixada a titulo de honorários.

Como tal deverão os réus ser condenados a pagar o montante de € 8.870,00, acrescido do IVA, à taxa de 23%, num total de € 10.910,10. Não existindo dúvidas quanto ao facto do autor ter peticionado efectivamente o referido valor acrescido do IVA. É o que resulta do pedido expresso formulado no confronto aliás com a nota de honorários”.

O discurso jurídico tecido na sentença recorrida merece a nossa concordância. Já a análise do caso em concreto não pode ser acompanhada na íntegra.

Brevitatis causa, diremos que no contrato de mandato judicial o advogado não garante ao mandante o sucesso da acção, sendo-lhe, todavia, exigível na execução do mandato proficiência no seu desempenho (vide Ac. da Rel. Évora de 24.1.2002, em CJ, T. 1, pág. 261).

No caso verifica-se que o A. foi contratado pelos RR para propor acção executiva para pagamento de quantia certa, o que fez, tendo a oposição deduzida pelos aí réus sido julgada improcedente, e, consequentemente, tendo sido reconhecido que a quantia exequenda era devida. Ficando por isso sujeita à respectiva cobrança coerciva.

Ao ser contratado pelos ora RR o A. ficou obrigado a praticar os actos compreendidos no mandato (art. 1161º, a), do CC), que naturalmente abarcavam a condução da dita execução até ao resultado final, que é o pagamento integral do devido pelos executados (art. 795º do NCPC = art. 872º do anterior CPC).

Ou seja, no âmbito de uma execução para pagamento de quantia certa, o crédito pelo exercício do mandato forense só se integra no património do profissional, por inteiro, depois de prestados os actos em que se resolve.

O que não aconteceu no nosso caso, pois a execução supra referida ainda não se extinguiu pelo pagamento integral da dívida exequenda (facto provado 10.), assim se discordando da passagem da decisão recorrida, atrás transcrita, em que se afirma que “Sendo aqui irrelevante que os réus não tenham ainda em seu poder a totalidade da quantia exequenda (dado que o seu recebimento está apenas dependente do normal curso do processo, sem necessidade de qualquer impulso processual relevante), afigurando-se-nos que, no essencial, a intervenção do advogado mostra-se ali finda”.

É verdade que por força da penhora no salário da aí executada, no montante mensal de 885,25 €, já foi entregue aos aqui recorrentes, até Junho de 2013, o montante de 42.582,55 €, e que o restante (38.799,30 €, segundo a liquidação do agente de execução, a fls. 22) está garantido pela penhora de salários da executada (facto provado 11.).

Ora, nada garante que a penhora do vencimento da executada se vai manter pelo largo período de tempo que ainda falta, cerca de 4 anos, bem podendo ocorrer qualquer vicissitude – isenção parcial ou total temporária da penhora, mudança de trabalho da executada, desemprego da executada, ida para a reforma, etc. – que exija outra necessária intervenção no processo executivo para que o pedido dos ora recorrentes venha a ser integralmente satisfeito. Intervenção, eventual, essa que, face à renúncia ao mandato do A. em Maio de 2015 (facto 12.), implicará a constituição de novo mandatário judicial (cfr. art. 58º, nº 1, do NCPC = ao art. 60º, nº 1, do anterior CPC).

Diga-se, como parêntesis, que os recorrentes afirmam, agora em recurso, que já constituíram novo mandatário nessa execução, o que desconhecemos, não sendo, contudo facto notório (art. 412º do NCPC) nem relevante no presente momento decisório.

Assim sendo, não estando o mandato judicial integralmente cumprido, a medida dos honorários deve representar essa realidade, em nome da boa-fé contratual e do princípio da proporcionalidade. Isto porque um dos items para fixação dos honorários dos advogados, referido no citado art. 100º, nº 3, do estatuto da OA é justamente o resultado obtido.

Na nota de honorários (a fls. 13/14, conforme facto 9.), elaborada pelo A. - com laudo favorável da AO, aceite pelo tribunal e, no final de contas também aceite pelos recorrentes que apenas a querem ver reduzida a metade por faltar cobrar cerca de 50% da quantia exequenda – verifica-se que o mesmo, além de valores atinentes a despesas, estudo, preparação e interposição da execução, estudo da decisão da 1ª instância e das alegações de recurso da parte contrária e valor/hora despendido com reuniões, estudo, análise, preparação e sessões de julgamento, fixou em 5.000 € o valor da utilidade económica considerando o valor reclamado na execução de 70.137,80 €. Esse valor, fixado pelo próprio, foi aceite pelo laudo da AO e pela sentença recorrida. Mas o que é certo, como dissemos, é que o recorrido não executou o seu mandato até ao fim, estando ainda a dita execução pendente e estando ainda por receber por parte dos exequentes cerca de 50% do devido, pelo que a utilidade económica total valorizada pelo apelado não pode ser integralmente aceite.

É, portanto, circunstância a ponderar na fixação de tal valor reportada ao aludido item.

Como já se mencionou e consta da lei um critério legal relevante a ter em conta é o da equidade e moderação.

Como assim, ponderando que na normalidade das situações a penhora do salário poderá decorrer, sem sobressalto, até ao fim, com pagamentos regulares aos recorrentes pelo agente de execução, como tem sucedido até aqui, o que não justificará intervenção de nenhum mandatário, mas que, ao invés, haverá sempre algum risco de anormalmente ocorrer alguma vicissitude processual (como as tipicamente acima referidas) que implique a constituição de mandatário por parte dos recorrentes/exequentes, e em última instância a não cobrança coerciva total da quantia exequenda, consideramos equilibrado, proporcional e justo reduzir tal quantia de 5.000 € em ¼, ou seja de 1.250 €, ficando aquela no valor de 3.750 €.

Desta maneira, a quantia devida a título de honorários pelos recorrentes será de 7.620 € (8.870 € - 1.250 €), a que acrescerá o indicado IVA de 23%.     

3. Sumariando (art. 663º, nº 7, do NCPC):

i) No âmbito de uma execução para pagamento de quantia certa, o crédito de honorários pelo exercício do mandato forense só se integra no património do profissional advogado, por inteiro, depois de prestados integralmente os actos em que se resolve.

ii) Caso o mandatário judicial abandone a execução e o seu mandato antes que esteja inteiramente paga a quantia exequenda aos exequentes seus clientes não pode calcular na sua nota de honorários, no que se refere ao item “resultado obtido”, mencionado no art. 100º, nº 3, do estatuto da Ordem dos Avogados, um valor como correspondendo à satisfação integral de tal quantia exequenda.

 

IV – Decisão

 

Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso, assim se revogando parcialmente a sentença recorrida, e, em consequência, condena-se os RR a pagar ao A. a quantia de 7.620 €, acrescido de IVA à taxa de 23%, mantendo-se o decidido na sentença a título de juros.

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Custas por apelantes e apelado na proporção do vencimento/decaimento.

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  Coimbra, 3.11.2015

  Moreira do Carmo ( Relator)

Fonte Ramos

Maria João Areias