Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3582/16.1TBLRA-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ANTÓNIO DOMINGOS PIRES ROBALO
Descritores: CUSTAS PROCESSUAIS.
CAUSAS DE VALOR SUPERIOR A €275.000
00.
REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA.
Data do Acordão: 05/15/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JC CÍVEL DE LEIRIA – J4
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Legislação Nacional: ARTºS 3º, 6º E 9º DO RCP (REGULAMENTO DE CUSTAS PROCESSUAIS)
Sumário: I – O Regulamento das Custas Processuais (RCP) consigna que as custas processuais abrangem “a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte” (artº 3º, nº 1), dispondo no nº 1 do seu art.º 6º: “A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela i-A, que faz parte integrante do presente Regulamento.

II - No n.º 7 desse art.º 6º consigna-se: “Nas causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento..

III - Na verdade, o citado n.º 7º do artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais visa atenuar, antes do termo da causa, a obrigação de pagamento da taxa de justiça nas ações de maior valor e está conexionado com o que se prescreve no fim da tabela I: O referido remanescente é considerado na conta final a realizar após o trânsito em julgado da decisão final.

IV - Nestes casos, os sujeitos processuais pagarão inicialmente o valor correspondente a uma ação de valor entre 250.000€ e 275.000€, mas o juiz poderá dispensar o pagamento do remanescente, atendendo à complexidade da causa e à conduta processual das partes, tendo em vista, além do mais, os critérios constantes do n.º 7 do artigo 530.º do CPC -artigo 6.º, n.º 7, do RCP.

V - Ou seja, o que sucede é que a lei, no que respeita às causas de valor superior a (euro) 275.000, não exige logo o pagamento da taxa de justiça pelo valor total, ou seja, com referência ao valor base de tributação, dispensando, temporariamente, o pagamento da taxa que corresponde ao montante que excede os €275.000, mas como não se trata de uma verdadeira isenção, esse remanescente que ficou por pagar será depois exigido.

VI - A maioria da jurisprudência vai em sentido de que as partes, mais a mais quando representadas por profissionais do foro, têm suficientes condições para anteverem o que lhes será exigido a título de remanescente da taxa de justiça, pelo que é antes de elaborada a conta que devem requerer a dispensa a que se reporta o art.º 6º, n.º 7, do RCP, sendo desajustado e extemporâneo fazê-lo em sede de reclamação da conta.

Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Cível (3.ª Secção), do Tribunal da Relação de Coimbra

Proc.º n.º 3582/16.1T8LRA-B.C1

1.-Relatório

1.1.-Na presente ação a requerente C... – Instituição Financeira de Crédito S.A. veio requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ou, subsidiariamente, se assim não for entendido, reduzir parcialmente o remanescente da taxa de justiça que se mostre devido em percentagem não inferior a 90%.
1.2. - A fls. 5 destes autos o M.P. tomou posição no sentido de não se opor à requerida dispensa, se assim for entendido.
1.3. – A fls. 6 a 13 destes autos foi proferida decisão a indeferir o requerido com o fundamento da sua extemporaneidade, do seguinte teor, que se transcreve:
“No âmbito dos presentes autos a decisão que lhes pôs termo foi proferida em 02.10.2017, tendo sido notificada às partes mediante notificações insertas no citius nesse mesmo dia.
Nada foi requerido, subsequentemente, tendo o processo sido remetido à conta.
Realizada a conta, em 30.11.2017, foram as partes dela notificadas e foram-lhes remetidas, nesse mesmo dia, as guias para pagamento do valor de custas em dívida.
Veio, então, a requerente, em 07.12.2017, requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ou, se assim não se entender, a redução do valor a esse título devido em percentagem não inferior a 90%.
Cumpre decidir.
E, quanto à situação verificada nos autos adere-se, em absoluto, ao entendimento vertido no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15.10.2015, proferido no processo nº 6431-09.3TVLSB-A.L1-6 (disponível no respetivo site da dgsi) -, cujo sumário é do seguinte teor:
“- Da interpretação conjugada do art. 6º, nºs 1 e 7 com os art.ºs 3º, nº 1, 14º, nºs 1, 2 e 9, 30º, nº 1, todos do Regulamento das Custas Processuais e Tabela I-A anexa ao mesmo regulamento, decorre que a pretensão da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça deve ser formulada pela parte (...) em momento anterior à elaboração da conta de custas.
- Existem razões preponderantes para que a decisão sobre a dispensa do remanescente da taxa de justiça deva ser tomada antes da elaboração da conta, omeadamente o princípio da economia e utilidade dos atos processuais, que tem afloramento no art. 130º do CPC, nos termos do qual “não é lícito realizar no processo atos inúteis”.
- A reforma ou a reclamação da conta não é o meio processual adequado para suscitar a questão da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça porquanto a reforma se destina a reformar a conta que “não estiver de harmonia com as disposições legais” (art. 31º, nº 2 do RCP) e a reclamação da conta visa corrigir erros materiais ou a elaboração de conta efetuada pela secretaria sem obedecer aos critérios definidos no art.o 30º, nº 3.”
- Esta interpretação do art. 6º, nº 7 do RCP não coloca em causa o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no art. 20º da Constituição da República Portuguesa.”
Para tal concluir, acerca da concreta questão do “momento e meio para requerer a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça”, mais é dito nesse douto Acórdão:
«Na decisão recorrida considerou-se, invocando doutrina[4], que “a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça só poderá ocorrer, oficiosamente ou a requerimento das partes, em momento anterior à contagem do processo” e que “a reclamação da conta não é o meio processual próprio para se formular a pretensão da redução ou dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente”. Na sequência destes considerados foram os requerimentos das partes indeferidos, no que tange à requerida dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça.
(...)
Preceitua-se no art. 6º, nº 7[5], do RCP, que “nas causas de valor superior a € 275.000,00 o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento” (sublinhado da nossa autoria, evidentemente, assim como os infra apostos em disposições legais).
É verdade que nesta norma não se prevê, expressamente, o momento em que as partes podem requerer ao juiz a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça mas, da sua adequada interpretação, resulta que a decisão do juiz – ainda que oficiosa - deve ser anterior à elaboração da conta a final, para nesta poder ser considerado e incluído – ou não – o remanescente da taxa de justiça.
Assim, a interpretação literal da norma em causa não dá acolhimento à tese das apelantes de que nada obstaria a que pudessem requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, depois de notificadas da conta de custas.
Nem se diga, como o faz a A apelante, que afinal o elemento literal não concorre para o sentido da decisão, porquanto a letra da norma alude a “dispensar o pagamento” e “só se pode dispensar de pagar o que se mostrar liquidado”. Tal argumentação não prova nada, pois parte dum pressuposto não demonstrado, a necessidade de liquidação. Aliás, que não é necessário a liquidação para o pagamento da taxa de justiça prova-o o facto de a própria A. ter pago a taxa de justiça, nos autos, sem qualquer liquidação da secretaria, mas apenas tendo em conta o valor da acção, a tabela I-A anexa ao RCP e o art. 14º deste mesmo regulamento.
Mas, além da interpretação literal da norma, a interpretação resultante da unidade do sistema jurídico e a que se impõe atender, como expressamente se preceitua no art. 9º do Código Civil, não só cauciona a interpretação a que acima procedemos, como afasta a tese das apelantes.
Na verdade, a taxa de justiça – que corresponde a um montante devido pelo impulso processual e que é fixada em função do valor e complexidade da causa (cfr. art. 6º, nº 1 e art. 529º, nº 2, este do CPC 2013) – é em princípio paga em uma ou duas prestações (cfr. nos 1 e 2 do art. 14º), prevendo-se expressamente que “nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do no 7 do artigo 6º e o responsável pelo impulso processual não seja condenado a final, o mesmo deve ser notificado para efectuar o referido pagamento, no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que ponha termo ao processo” (cfr. nº 9 do art. 14º).
A adequada interpretação desta última norma citada, nº 9 do art. 14º, afigura-se-nos ser no sentido de que a notificação para efetuar o pagamento já pressupõe que haja decisão sobre se deve ou não ser pago o remanescente nos termos do n. 7 do art. 6º e, consequentemente, que as partes já tenham suscitado a questão da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ao tribunal, o que podem fazer em qualquer altura dos autos, logo que considerem que estes fornecem os elementos necessários à ponderação exigida ao juiz pela norma em causa.
Aliás, em última análise, face à notificação da decisão que ponha termo ao processo, a parte está em condições, por ter então todos aqueles elementos necessários – máxime “a quantidade e complexidade de todo os atos processuais e diligências praticadas pelos tribunais”, como refere a A. apelante - para suscitar tal questão.
A qual é então perfeitamente tempestiva, até porque a referida notificação, para efetuar o pagamento – neste caso apenas por parte do responsável que não foi condenado a final, sublinhe-se - só deve ocorrer no prazo de 10 dias, a contar da notificação da decisão que ponha termo ao processo.
Ora, se quanto ao responsável que não foi condenado a final – que não é o caso das apelantes, sublinhe-se – o momento processual para suscitar a referida questão é aquele, não se compreenderia que o momento processual para a parte que foi condenada pudesse ir além dele. Até porque tal interpretação introduziria desigualdade de tratamento entre as partes, sem fundamento e violador do princípio da igualdade das partes.
Acresce que, abrangendo a conta de custas as custas da ação e nestas se incluindo a taxa de justiça (cfr. art.os 30º, nº 1 e 3º, nº 1), será ao elaborar a conta de custas que se tomará em consideração a taxa de justiça devida pela parte vencida – ainda que parcialmente – e será com a notificação da conta de custas que a parte é notificada para pagar o remanescente da taxa de justiça que deva ser pago, nos termos do art. 6º, nº 7.
Cremos, assim, que do art. 6º, nº 7 e da interpretação conjugada dos demais preceitos analisados, decorre que a pretensão da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça deve ser formulada pela parte – caso não seja conhecida antes oficiosamente pelo juiz, nomeadamente quando da prolação da sentença - em momento anterior à elaboração da conta de custas.
Nem se diga, como pretextam as apelantes, que só quando são interpeladas pela liquidação e para pagamento é que são confrontadas com quantias que podem ser “exorbitantes”, ou que só então “tomam real contacto com os montantes que lhe são exigidos”. Argumentação que parece vir na sequência dos Acs. do TCAS de 29.05.2014 (Relator Pedro Marchão Marques)[6] e 26.02.2015 (Relator Pedro Marchão Marques)[7] que invoca a A apelante, onde se refere que “não se veem razões preponderantes” para que a decisão deva ser tomada antes da elaboração da conta e que “será após a elaboração da conta, momento processual em que se fica a conhecer o valor exato dos montantes em causa, que o juiz inclusive melhor poderá decidir”.
Na verdade, não é minimamente correto afirmar-se que só após a elaboração da conta é que se fica a conhecer o valor exato dos montantes em causa e que só nessa altura podem as partes concluir que são exorbitantes.
Com efeito, caso não tenha sido determinado, oficiosamente pelo juiz, na sentença, a dispensa total ou parcial do remanescente da taxa de justiça, nos termos do nº 7 do art. 6º, quando da notificação da decisão final, a parte condenada em custas tem todos os dados para saber qual a taxa de taxa de justiça que será então devida e que será incluída na conta de custas, porquanto tal taxa de justiça tem então necessariamente por referência o valor da ação e a tabela I-A anexa ao RCP (cfr. parte final do nº 1 do art. 6º do RCP).
Por outro lado, ao contrário do que se considerou nos citados arestos, afigura-se-nos existirem razões preponderantes para que a decisão sobre a dispensa do remanescente da taxa de justiça deva ser tomada antes da elaboração da conta.
Além das acima enunciadas, sobre a correta e adequada interpretação do art. 6º, nº 7 do RCP, sendo certo que a interpretação sufragada pelos dois arestos atrás citados se nos afigura não ter na letra da lei um mínimo de correspondência verbal e, consequentemente, não poder ser subscrita, face ao disposto no art. 9º, nº 2 do Código Civil, uma outra razão se afigura relevante.
Consiste essa razão no princípio da economia e utilidade dos atos processuais, que tem afloramento no art. 130º do CPC 2013, nos termos do qual “não é lícito realizar no processo atos inúteis”. Ora, tendo as partes todos os dados de facto necessários para poderem requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça antes da elaboração da conta, até porque esta só é elaborada depois do trânsito em julgado da decisão final (cfr. art. 29º, nº 1), constituiria um ato perfeitamente inútil elaborar-se a conta de custas, para depois ser dada sem efeito – ou ser mandada reformar – na sequência de requerimento da parte, o qual podia ter sido apresentado antes da elaboração da conta.
Aliás, não pode deixar de se considerar, atento o disposto no art. 9º, nº 3 do Código Civil, nos termos do qual o interprete da lei deve presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, que se o propósito do legislador fosse permitir que a reclamação da conta pudesse ser usada para efeitos de se poder requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, não deixaria de o ter consagrado, na disposição do art. 31º, na sequência das alterações introduzidas no RCP, pela Lei no 7/2012. Como fez quanto ao pagamento da taxa de justiça, prevendo um momento próprio para o remanescente devido pela parte que não é condenada a final (cfr. nº 9 do art. 14º).
Por outro lado, também ao contrário do que pretexta a R. apelante, não cremos que a reclamação da conta seja o meio processual adequado para suscitar a questão da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
Na verdade, não consta da previsão do art. 31º que a reforma ou a reclamação da conta incluam a possibilidade de apreciar a questão da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça. Com efeito, a reforma da conta deve determinar-se apenas quando a conta “não estiver de harmonia com as disposições legais” (cfr. art. 31º, nº 2), o que não abrange o requerimento de dispensa do remanescente da taxa de justiça. Por outro lado, a reclamação da conta visa corrigir a elaboração de conta que tenha sido efetuada pela secretaria sem obedecer aos critérios definidos no art. 30º, nº 3, onde não se inclui a referida questão da dispensa do remanescente da taxa de justiça. Aliás, precisamente porque a “reforma” suscitada pela R. apelante tinha razão de ser quanto a um dos aspetos que suscitou, a de ter sido elaborada incorretamente quanto ao montante da responsabilidade da taxa de justiça devida pela R., que era de 1/5, como determinado no Acórdão do STJ, e não 1/3 como tinha sido calculada pela secretaria, é que a reclamação da R. foi parcialmente procedente na 1a instância.
Não acompanhamos assim, e pelo contrário dissentimos, do Ac. do T. R. Porto de 07.11.2013 (Relator: Aristides Rodrigues de Almeida)[8], invocado[9] pela A. apelante em abono da sua tese, nos termos do qual se considerou que a lei não definia o que podia ser objeto de reclamação da conta e, consequentemente, concluiu que através da reclamação podiam ser suscitadas questões como a da dispensa do remanescente do pagamento da taxa de justiça.
Acompanhamos, antes, a jurisprudência do Ac. do T. R. Lisboa de 16.06.2015 (Relator: Afonso Henrique)[10], onde se concluiu que “face à ratio do preceito em discussão, entendemos que até à notificação da conta final, pode a parte, ..., requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do disposto no art. 6º, nº7 do RCP”. Assim, como nos revemos na jurisprudência do Ac. do STA de 29.10.2014 (Relator Aragão Seia)[11] onde, depois de citar Salvador da Costa[12], se confirmou o despacho recorrido que tinha indeferido a reforma da conta requerida, por extemporâneo.»1
Sopesado o exposto e perante o entendimento acabado de citar – ao qual, repete-se, se adere na íntegra -, impõe-se concluir que a pretensão de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, na atual fase processual, é manifestamente extemporânea, motivo pelo cumpre indeferir o requerido.
No sentido da intempestividade do requerido – entendendo que a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem sempre de ser conhecida antes da elaboração da conta -, veja-se, ainda, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido no Processo no3943/15.3T8LRA-B.C1, em 14.03.2017 (também disponível no site da dgsi).
Na decorrência do sumariamente exposto, indefere-se o requerido, desde logo com fundamento na sua extemporaneidade.
4] Salvador da Costa, RCP Anotado, 4a edição, pp. 200/201.
[5] O no 7 em causa foi introduzido na redação dada ao art.o 6o pelo art.o 2o da Lei no 7/2012 de 13.02, diploma este que procedeu à sexta alteração ao RCP.
[6] Invocado pela A apelante na conclusão 1a das alegações, proferido no processo no 11701/14 e acessível em www.dgsi.pt
[7] Invocado pela A apelante na conclusão 1a das alegações, proferido no processo no 07270/13 e acessível em www.dgsi.pt
[8] Proferido no processo no 332/04.9TBVPA.P1, acessível em www.dgsi.pt
[9] Saliente-se que o Ac. do STA de 21.05.2014, invocado na conclusão 1a das alegações da A. apelante, não se pronuncia nem decide a questão aqui em análise, a qual é apenas abordada lateralmente, não constituindo assim fundamento/argumento para sustentar a tese da recorrente.
[10] Proferido no processo no 2264/06.7TVLSB-A.L1-1, acessível em www.dgsi.pt.
[11] Proferido no processo no 0547/14, acessível em www.dgsi.pt.
[12] Citação da qual se destaca a seguinte passagem:”

1.4. – Inconformado com tal decisão dela recorreu a requerente terminando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem:
...
1.5. – Feita a notificação nos termos do art.º 221.º do C.P.C., não houve resposta.
2. – Fundamentação
Os factos com interesse para a decisão são os constantes do relatório.
3. Apreciação

3.1. É, em princípio, pelo teor das conclusões do recorrente que se delimitam as questões a apreciar no âmbito do recurso (cfr. art.s 608, 635, n.º 4 e 639, todos do C.P.C.).

A questão em apreço consiste em saber se a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que julgue o requerimento apresentado como não extemporâneo.
A decisão recorrida seguindo a posição defendida no Ac. da Rel. de Lisboa de 15/10/2015, proc.º n.º 6431-09.3TVLSB-A-L1-6, relatado por António Martins, que opinou no sentido de que o mesmo era extemporâneo, entendendo que a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem sempre de ser conhecida antes da elaboração da conta.
Opinião oposta tem a recorrente que refere que o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais não contém qualquer comando que imponha às partes que o requerimento de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça tenha que ser elaborado antes da elaboração da conta, pelo que, não impondo a lei qualquer prazo preclusivo para a apresentação de tal pretensão o único limite temporal só pode ser a utilidade ou inutilidade do acto e que o acolhimento da tese defendida na decisão recorrida provocaria uma gritante desigualdade entre as partes uma vez que o prazo seria incerto e dependeria da maior ou menor celeridade do tribunal na elaboração da conta.
Vejamos

O Regulamento das Custas Processuais (RCP) consigna que as custas processuais abrangem “a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte” (artº 3º, nº 1), dispondo no nº 1 do seu art.º 6º: “A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela i-A, que faz parte integrante do presente Regulamento.

No n.º 7 desse art.º 6º consigna-se: “Nas causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento..

Na verdade, o citado n.º 7º do artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais, visa atenuar antes do termo da causa a obrigação de pagamento da taxa de justiça nas ações de mais valor e está conexionado com o que se prescreve no fim da tabela I (já mencionada atrás): O referido remanescente é considerado na conta final a realizar após o trânsito em julgado da decisão final.

Nestes casos, os sujeitos processuais pagarão inicialmente o valor correspondente a uma ação de valor entre 250.000€ e 275.000€, mas o juiz poderá dispensar o pagamento do remanescente, atendendo à complexidade da causa e à conduta processual das partes, tendo em vista, além do mais, os critérios constantes do n.º 7 do artigo 530.º do CPC - artigo 6.º, n.º 7, do RCP (VERR). Ou seja, o que sucede é que a lei, no que respeita às causas de valor superior a (euro) 275.000, não exige logo o pagamento da taxa de justiça pelo valor total, ou seja, com referência ao valor base de tributação, dispensando, temporariamente, o pagamento da taxa que corresponde ao montante que excede os €275.000, mas, como não se trata de uma verdadeira isenção, esse remanescente que ficou por pagar, será depois exigido.

A questão em apreço não é pacífica.

Na verdade, não desconhecemos que já se tem entendido que a dispensa em causa pode ser requerida pelas partes depois de estas serem notificadas da conta de custas (cfr. neste sentido Acs. do TCAS de 29.05.2014 e de 26/2/2015, relatados por Pedro Marchão Marques, onde se refere que “não se vêem razões preponderantes” para que a decisão deva ser tomada antes da elaboração da conta e que “será após a elaboração da conta, momento processual em que se fica a conhecer o valor exacto dos montantes em causa, que o juiz inclusive melhor poderá decidir”).

Porém, ao que sabemos, a maioria vai em sentido oposto, referindo que as partes, mais a mais quando representadas por profissionais do foro, têm suficientes condições para anteverem o que lhes será exigido a título de remanescente da taxa de justiça, pelo que é antes de elaborada a conta que devem requerer a dispensa a que se reporta o art.º 6º, n.º 7, do RCP, sendo desajustado e extemporâneo fazê-lo em sede de reclamação da conta (cfr. neste sentido Acórdão da Relação de Lisboa de 15/10/2015, proc.º n.º 6431-09.3TVLSB-A-L1-6, relatado por António Martins; Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 20/10/2015, proc.º nº 0468/15, da 1ª Secção; de 29/10/2014, proc.º nº 0547/14, da 2 Secção; acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 16/12/2015, proc. nº 09173/15 CT- 2.º Juízo; Ac. do T. R. Lisboa de 16.06.2015, proc.º n.º 2264/06.7TVLSB-A-L1-1relatado por Afonso Henriques; Ac. do STA de 29.10.2014, proc.º n.º 547/14, relatado por Aragão Seia; Ac. Rel. de Lisboa de 19 de Maio de 2016, proc.º n.º 670/14.2T8CSC.L1-2 , relatado por Ondina Carmo Alves, no qual cita no mesmo sentido (Ac. R.C. de 03.12.2013. Pº 1394/09.8TBCBR.C1); Acs.R.L. de 16.6.2015 (Pº 2264/06.7TVLSB-A.L1-1), de 15.10.2015, (Pº 6431-09.3TVLSB-A.L1-6) e ainda no Ac. R. L. de 28.04.2016 (Pº 473/12.9TVLSB-C.L1), n.º 670/14.2T8CSC.L1-2 in www.dgsi.pt.).
No mesmo sentido o Ac. do S.T.J. de 13 de Julho de 2017, Proc.º n.º 669/10.8TBGRD-B.C1-S1, relatado por Lopes do Rego, in
www.dgsi.pt., onde se escreve “As razões que antecedem permitem concluir que a norma extraída do n.º 7 do artigo 6.º do RCP, introduzido pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro, na interpretação segundo a qual é extemporâneo o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça apresentado no processo, pela parte que dele pretende beneficiar, após a elaboração da conta de custas, não viola o princípio da tutela jurisdicional efetiva, designadamente na dimensão de garantia de um processo justo, nem se vê que interfira com qualquer outro parâmetro constitucional, o que conduz à improcedência do recurso”

Neste sentido parece ir também Salvador da Costa, ao referir no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 20/10/2015, proc.º n.º 0468/15, da 1ª Secção, que «(…) A parte sabe que tem que pagar o remanescente e sabe o valor da causa pelo que, se o juiz não usou oficiosamente da possibilidade de, no momento da decisão decidir a referida dispensa, a parte deve fazê-lo em sede de pedido de reforma de custas».

Aliás, Salvador da Costa, in Regulamento das Custas Processuais anotado, 2013, 5ª edição, pág. 201, refere que “O juiz deve apreciar e decidir, na sentença final, sobre se se verificam ou não os pressupostos legais de dispensa do pagamento do mencionado remanescente da taxa de justiça. Na falta de decisão do juiz, verificando-se os referidos pressupostos de dispensa do pagamento, podem as partes requerer a reforma da decisão quanto a custas”, e mais à frente, págs. 354 e 355, refere ainda que“Discordando as partes do segmento condenatório relativo à obrigação de pagamento de custas, deverão dele recorrer, nos termos do artigo 627º, n.º 1, ou requerer a sua reforma, em conformidade com o que se prescreve no artigo 616º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil. Passado o prazo de recurso ou de pedido de reforma da decisão quanto a custas, não podem as partes, por exemplo, na reclamação do ato de contagem, impugnar algum vício daquela decisão, incluindo a sua desconformidade com a Constituição ou com algum dos princípios nela consignados”.

Saliente-se que quanto a esta questão o TC teve oportunidade de se pronunciar recentemente, decidindo no Ac. 527/16: Não julgar inconstitucional a norma extraída do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, introduzida pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro, na interpretação segundo a qual é extemporâneo o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça apresentado no processo, pela parte que dele pretende beneficiar, após a elaboração da conta de custas.

Aderimos a esta posição, porquanto se é verdade que o art.º 6, mormente o n.º 7, do RCP não se prevê, expressamente, o momento em que as partes podem requerer ao juiz a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, mas da sua adequada interpretação resulta que a decisão do juiz – ainda que oficiosa - deve ser anterior à elaboração da conta a final, para nesta poder ser considerado e incluído – ou não – o remanescente da taxa de justiça.

Temos para nós que a interpretação literal da norma em causa não dá acolhimento à tese da apelante de que nada obstaria a que pudessem requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, depois de notificadas da conta de custas.

Nem se diga que o elemento literal não concorre para o sentido da decisão recorrida, na medida em que a letra da norma alude a “dispensar o pagamento” e “só se pode dispensar de pagar o que se mostrar liquidado”. Tal argumentação não prova nada, pois parte dum pressuposto não demonstrado, a necessidade de liquidação. Aliás, que não é necessário a liquidação para o pagamento da taxa de justiça prova-o o facto das partes pagarem a taxa de justiça, sem qualquer liquidação da secretaria, mas apenas tendo em conta o valor da ação.

Mas além da interpretação literal da norma, a interpretação resultante da unidade do sistema jurídico e a que se impõe atender, como expressamente se preceitua no art.º 9º do Código Civil, não só cauciona a interpretação que advogamos, como afasta a tese da apelante.

Na verdade, a taxa de justiça – que corresponde a um montante devido pelo impulso processual e que é fixada em função do valor e complexidade da causa (cfr. art.º 6º nº 1, do RCP e art.º e art.º 529º nº 2, este do CPC 2013) – é em princípio paga em uma ou duas prestações (cfr. nºs 1 e 2 do art.º 14º), prevendo-se expressamente que “nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do nº 7 do artigo 6º e o responsável pelo impulso processual não seja condenado a final, o mesmo deve ser notificado para efetuar o referido pagamento, no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que ponha termo ao processo” (cfr. nº 9 do art.º 14º).

A adequada interpretação desta última norma citada, nº 9 do art.º 14º, afigura-se-nos ser no sentido de que a notificação para efetuar o pagamento já pressupõe que haja decisão sobre se deve ou não ser pago o remanescente nos termos do nº 7 do art.º 6º e, consequentemente, que as partes já tenham suscitado a questão da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ao tribunal, o que podem fazer em qualquer altura dos autos, logo que considerem que estes fornecem os elementos necessários à ponderação exigida ao juiz pela norma em causa.

Aliás, em última análise, face à notificação da decisão que ponha termo ao processo, a parte está em condições, por ter então todos aqueles elementos necessários – máxime “a quantidade e complexidade de todo os atos processuais e diligências praticadas pelos tribunais”.

Assim, temos para nós que do art.º 6º, nº 7, do RCP e da interpretação conjugada dos demais preceitos analisados, decorre que a pretensão da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça deve ser formulada pela parte – caso não seja conhecida antes oficiosamente pelo juiz, nomeadamente quando da prolação da sentença - em momento anterior à elaboração da conta de custas.

Na verdade, não é minimamente correto afirmar-se que só após a elaboração da conta é que se fica a conhecer o valor exato dos montantes em causa e que só nessa altura podem as partes concluir que são exorbitantes.

Com efeito, caso não tenha sido determinado, oficiosamente pelo juiz, na sentença, a dispensa total ou parcial do remanescente da taxa de justiça, nos termos do nº 7 do art.º 6º do RCP, quando da notificação da decisão final, a parte condenada em custas tem todos os dados para saber qual a taxa de taxa de justiça que será então devida e que será incluída na conta de custas, porquanto tal taxa de justiça tem então necessariamente por referência o valor da ação e a tabela I-A anexa ao RCP (cfr. parte final do nº 1 do art.º 6º do RCP).

Por outro lado, tendo presente o princípio da economia e utilidade dos actos processuais, que tem afloramento no art.º 130º do CPC vigente, segundo o qual “não é lícito realizar no processo atos inúteis”, tendo as partes todos os dados de facto necessários para poderem requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça antes da elaboração da conta, até porque esta só é elaborada depois do trânsito em julgado da decisão final (cfr. art.º 29º nº 1), constituiria um ato perfeitamente inútil elaborar-se a conta de custas, para depois ser dada sem efeito – ou ser mandada reformar – na sequência de requerimento da parte, o qual podia ter sido apresentado antes da elaboração da conta.

Aliás, não podemos deixar de considerar, dado ao preceituado no art.º 9º, nº 3 do Código Civil, nos termos do qual o interprete da lei deve presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, que se o propósito do legislador fosse permitir que a reclamação da conta pudesse ser usada para efeitos de se poder requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, não deixaria de o ter consagrado, na disposição do art.º 31º, na sequência das alterações introduzidas no RCP, pela Lei nº 7/2012. Como fez quanto ao pagamento da taxa de justiça, prevendo um momento próprio para o remanescente devido pela parte que não é condenada a final (cfr. nº 9 do art.º 14º).

Assim, face ao exposto não vemos razão para alterar a decisão recorrida, até porque a mesma não violou qualquer preceito legal, mormente o n.º 7 do art.º 6.º e n.º 9 do art.º 14.º, ambos do Regulamento das Custas Processuais;

4. Decisão

Nestes termos, julga-se improcedente o recurso mantendo-se a decisão recorrida.

Custas a cargo da recorrente.

Coimbra, 15/5/2018.

(Pires Robalo – Relator)
(Sílvia Pires – adjunta)
(Jaime Ferreira – adjunto)