Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
575/10.6T2AND.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FRANCISCO CAETANO
Descritores: PRESCRIÇÃO PRESUNTIVA
CESSÃO DE CRÉDITO
EMPREITADA
Data do Acordão: 06/20/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: CBV ANADIA JGIC JUIZ 1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ART. 317º B) CC
Sumário:             a) – Porque a prescrição presuntiva se funda na presunção de cumprimento, o devedor que conteste uma acção de dívida, para dela poder beneficiar, tem de invocar expressa e claramente que pagou o montante peticionado;

            b) - Porque as obrigações respeitantes a essa forma de prescrição estão ligadas às necessidades do quotidiano, onde não é usual a exigência de recibo, a sua razão de ser não é compatível com o contrato de empreitada de obras de construção civil ou sua reparação, cujos pagamentos envolvem, por norma, facturas e recibos;

            c) – A cessão de créditos não depende de forma escrita se o negócio originário (empreitada) também o não exigir;

            d) – O contrato de empreitada não está sujeito a forma escrita, o preço não tem de ser fixado ab initio, pode ser determinado em função da duração do tempo de trabalho (v. g., à hora) e as prestações tanto podem ser mais ou menos permanentes, como instantâneas.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

           

I. Relatório

A... propos contra B... e mulher C... acção com forma de processo ordinário pedindo a sua condenação no pagamento da importância de € 25.984,00, acrescida de juros de mora vencidos no valor de € 10.435,00, o que perfaz o total de € 36.419,00, e dos vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Alegou, para tanto, em resumo, que entre 1999 e 2005 prestou aos RR. e a pedido destes, vários serviços da sua actividade de canalização, instalação eléctrica e sanitária, fosse sozinho, fosse em conjunto com seu pai, fosse apenas este, cujos créditos, no entanto, cedeu ao A., com conhecimento e assentimento do R. marido, tendo facturado tais serviços em 28.9.06 no valor de € 28.550,00, de que o R. marido apenas pagou a quantia de € 2.566,00, mantendo-se em dívida a parte restante, no valor de € 25.984,00.

            Citados, contestaram os RR., por excepção, arguindo a nulidade do processo por ineptidão da petição inicial por contradição entre o pedido e a causa de pedir, a ilegitimidade activa do A. para peticionar créditos correspondentes aos trabalhos realizados por seu pai e por prescrição presuntiva, na medida em que todos os serviços prestados pelo pai do A. lhe foram integralmente pagos e, por impugnação, fundamentalmente negando a prestação dos serviços invocados na petição inicial, concluindo pelo pedido de absolvição do pedido e condenação do A. a título de litigância de má fé, em multa e indemnização não inferior a € 5.000,00.

            O A. replicou, no sentido da improcedência das excepções e reverteu o pedido de condenação a título de litigância de má fé, pedindo a esse título, agora, a condenação dos RR. em multa e indemnização não inferior a € 5.000,00, o que teve o contraditório e oposição destes últimos.

            Foi proferido despacho saneador onde foram julgadas improcedentes as excepções deduzidas, mormente a da prescrição, com fundamento em não poderem os RR. simultaneamente contestar a existência da obrigação e invocar a presunção do seu cumprimento e foram seleccionadas os factos assentes (FA) e organizada a base instrutória (b. i.), na sequência do que os RR. vieram pedir a reforma daquele despacho quanto à excepção da prescrição, que se lhes afigurou dever ser conhecida apenas a final, o que foi indeferido, como indeferida foi a reclamação que apresentaram aos FA.

            Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida a decisão sobre a matéria de facto, que não foi objecto de reclamação.

            Proferida sentença, foi a acção julgada parcialmente procedente e os RR. condenados a pagar ao A. a quantia de € 25.984,00, acrescida dos juros de mora à taxa anual de 4% desde a citação até integral pagamento, absolvendo-os da quantia correspondente aos alegados juros vencidos até à citação.

            Inconformados, recorreram os RR., o mesmo fazendo da decisão interlocutória da prescrição julgada improcedente no despacho saneador, apresentando alegações que remataram com as seguintes úteis conclusões:

a) – Atendendo a que o apelado alegou que o crédito peticionado lhe foi cedido por seu pai e que dizia respeito a trabalhos que este prestou aos apelantes e atendendo à data em que os mesmos foram alegadamente (sic) prestados e a data em que foi emitida a factura junta, já o mesmo tinha prescrito, uma vez que todos os trabalhos e serviços que o pai do apelado efectuou para os apelantes lhe foram integralmente pagos;

b) – Tendo os apelantes alegado o pagamento dos trabalhos/serviços que o pai do apelado lhes prestou e que segundo o apelado está a reclamar nos presentes autos, por os mesmos lhe terem sido cedidos e fundando-se a prescrição invocada na presunção de cumprimento, tal presunção só poderá ser ilidida nos termos do disposto nos art.ºs 313.º e 314.º do CC, o que o apelado não fez;

c) – Para além de os apelantes terem pago todos os serviços que o pai do apelado lhes prestou, tais serviços enquadram-se na alín. d) do art.º 317.º do CC uma vez que, analisando o teor da petição inicial, verifica-se que os alegados trabalhos pelo pai do apelado aos apelantes se prendiam com trabalhos pontuais em vários locais/residências, não podendo os mesmos ser considerados como se um contrato de empreitada tivesse sido celebrado, que nem sequer existe nenhum documento, nem fixação de preço e prazo de execução;

d) – Eram pequenos serviços ou de montagem, ou de reparação, em electricidade ou canalização, não sendo exigível aos apelantes, que não são comerciantes, que guardassem os recibos ou comprovativos dos pagamentos da execução de tais trabalhos quando foram executados em 1999, 2000, 2001, 2002 e 2003, como alega o apelado, pelo pai;

e) - Daí que o tribunal a quo devesse ter conhecido da excepção de prescrição e consequentemente julgado a mesma procedente, tanto mais que sempre aos apelantes seria legítimo, como meio de defesa, invocar a prescrição contra o apelado, nos termos do art.º 585.º do CC;

f) – As respostas dadas aos art.ºs 2.º a 4.º e 6.º a 55.º da b. i. enfermam de incorrecção de julgamento por baseadas única e exclusivamente no depoimento da testemunha D... , pai do apelado, que, titular originário do alegado crédito do A., não depos com isenção nem imparcialidade;

g) – O seu depoimento não foi espontâneo e serviu-se da leitura de cópia da base instrutória e outras folhas;

h) – Há contradição entre a resposta dada aos pontos 52.º e 54.º e 38.º, 39.º e 40.º e 42.º, 43.º, 45.º a 47.º, com o 54.º, da matéria de facto da sentença;

i) – O apelado não logrou provar os serviços aos apelantes nem as horas de execução dos trabalhos, muito menos com a factura junta, que apenas refere serviços prestados de canalização e electricidade na Quinta do K (...) e na sua residência em (...) , não referindo a casa da praia da Costa Nova ou “os serviços esporádicos e urgentes”, nem a cessão de créditos alegada pelo A.

j) – Não foi feita prova da cessão de créditos e muito menos a mesma poderia ter sido feita pelo testemunho do pai do apelado, com manifesto interesse directo na causa, tanto mais que nem sequer existe qualquer documento que demonstrasse existir o crédito na pessoa da testemunha D (...) ;

l) – Como não foi, da entrega da factura à apelante mulher;

m) – Porque o apelado só começou a exercer a sua actividade em Julho de 2004 não poderia dar-se como provada a quantia que cobrava à hora;

n) – Há contradição entre os pontos n.ºs 49 e o 52 da matéria de facto da sentença já que, cessando a actividade em Dezembro de 2003, não poderia o pai do A., após, cobrar pelos seus serviços;

o) – Porque o apelado só iniciou a sua actividade em Julho de 2004 e até 2003 trabalhou por conta do pai, não pode dar-se como provada a resposta dada ao ponto 50 dos factos provados na sentença em como em 2002 trabalhou por conta do A. um funcionário a € 6,00/h;

p) – Os pontos n.ºs 4 e 6 a 54 da matéria de facto da sentença devem ser dados como não provados;

r) – A relação contratual entre A. e RR. não é passível de ser qualificada como empreitada, não se tendo convencionado nem preço para os serviços, nem prazo para sua execução;

s) – Por violação do disposto nos art.ºs 312.º a 314.º e 317.º, alín. b) e 577.º e ss do CC haverá que ser revogada a sentença recorrida e condenar-se o apelado como litigância de má fé em multa e indemnização não inferior a € 5.000,00.

O apelado respondeu às alegações em defesa do julgado.

            Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo questões a apreciar:

a) – A prescrição presuntiva;

b) – A impugnação da matéria de facto;

c) - A reapreciação do mérito da causa, que passa por qualificar as relações contratuais estabelecidas entre as partes e a renovação do pedido de litigância de má fé do A.


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II. Fundamentação

a) - De facto

São os seguintes os factos provados, já corrigidos na sequência do deferimento parcial do pedido de impugnação da matéria de facto, objecto de recurso e da rectificação do ponto n.º 50 da matéria de facto da sentença:

1. O Autor emitiu a favor do Réu marido a factura n.º 024, datada de 28/09/2006, no valor de € 28.550,00 (vinte e oito mil quinhentos e cinquenta euros);

2. Os Réus pagaram, pelo menos, a quantia de € 2.566,00 (dois mil quinhentos e sessenta e seis euros);

3. O Autor dedica-se à actividade de canalização, instalação eléctrica e de sanitários;

4. No exercício da sua actividade o Autor prestou diversos serviços aos Réus, inicialmente prestados pelo seu pai e posteriormente por si, sendo todos, a partir do ano de 2004, facturados pelo Autor, o que era do conhecimento do Réu marido, que a tal não se opos;

5. O Autor iniciou a sua actividade de instalação, canalização e climatização em 2 de Julho de 2004;

6. Nos dias 25/06 (8h), 28/06 (8h), 01/07 (4h), 05/07 (4h), 08/07 (8h), 13/07 (9h), 14/07 (8h), 16/07 (4h) e 19/07, de 1999, o pai do Autor procedeu à instalação eléctrica da parte “antiga” da casa de (...) , num total de 61 horas;

7. Nos dias 09/08 (8h), 30/08 (8h), 06/09 (4h), 10/09 (8h), 15/09 (8h), 19/09 (8h), do mesmo ano, as obras efectuadas no referido local foram a remoção de radiadores e a instalação de aquecimento, na parte “antiga” da casa;

8. Em 13/10 (8h), 22/10 (10h), 23/10 (8h), 25/10 (8h), 11/11 (8h), 14/11 (8h), 18/11 (8h), 24/11 (4h), o pai do Autor fez os esgotos, instalação de dois quartos de banho da parte “antiga” da casa, assentamento de louças, tubagens, ligações de água e iniciou a parte eléctrica;

9. Em 05/11 (4h) o pai do Autor e o Autor consertaram a parabólica instalada na casa da Costa Nova, o que durou cerca de 4 horas;

10. Nos dias 10/12 (7h), 11/12 (5h), 12/12 (2h), 15/12 (7h), 16/12 (8h), 18/12 (4h), 20/12 (4h), 22/12 (8h), 23/12 (5h), 30/12 (8h) e 31/12 (8h), do ano de 1999, finalizou a parte eléctrica em duas salas, três quartos, hall, corredor e dois quartos de banho da parte “antiga” da casa;

11. As obras na casa dos Réus em (...) prosseguiram em 2000, sendo prestados os seguintes serviços: entre 13/01 (8h), 14/01 (8h), 17/02 (5h), 28/02 (8h), 29/02 (5h), 18/03 (8h), o pai do Autor instalou radiadores e reparou a instalação de aquecimento em toda a rede da casa;

12. Em 20/03 (8h), 21/03 (6h), 24/03 (5h), reparou o esquentador e a caldeira na casa da Costa Nova;

13. Nos dias 4 (4h), 10 (8h), 11 (5h) e 13 (4h) de Abril, 24 (8h), 25 (8h), 30 (10h), 31 (10h) de Maio, 01 (11h), 02 (8h), 05 (8h), 08 (8h), 09 (11h), 12 (5h), 14 (5h),16 (11h), 19 (4h), 21 (8h), 24 (8h), 26 (9h), 27 (9h), 28 (10h), 29 (10h), 30 (8h) de Junho e 06 (9h), 07 (2h), 25 (5h) de Julho, o pai do Autor procedeu à instalação da parte eléctrica, esgotos e águas da cozinha da parte “antiga” da casa;

14. … e colocou candeeiros no exterior junto à piscina;

15.… reparou a bomba de furo do poço e balão; o esquentador, o tanque de lavar roupa;

16. … colocou tomadas e cabos de antena num quarto (do pai) na parte “nova”da casa e projectores nas paredes de um quarto (“quarto das crianças”) na parte “antiga” da casa;

17. No dia 01 de Julho deslocou-se uma vez mais à casa da Costa Nova para reparar os pressores do jardim, trabalho que demorou 3 horas;

18. Em 26/07 (8h), 27/07 (2h) e 13/09 (4h), o pai do Autor reparou as redes de água de abastecimento à cozinha;

19. O Autor e o pai prestaram serviço para os Réus nas seguintes datas: 26/09 (8h cada um), 03/10 (8h cada um), 06/10 (8h cada um), 09/10 (8h cada um) e 17/10 (8h cada um);

20. Procederam à colocação de novo vídeo porteiro, instalaram interruptores, tomadas, ligações de banca na cozinha “antiga” e efectuaram diversas reparações nos quartos de banho, bem como trocaram as misturadoras;

21. No mesmo ano de 2000 o Autor executou diversos serviços para os Réus numa quinta de que estes são proprietários, sita em K (...) e denominada por “Quinta B (...) ”, nomeadamente o pai do Autor começou por fazer a instalação de electricidade em tubagens nos muros da entrada principal da quinta, nos dias 19/01 (8h), 17/03 (10h), 17/05 (8h), 18/05 (8h), 07/07 (11h) e 18/07 (8h);

22. O Autor e o pai efectuaram nos dias 19 (11h cada um), 20 (11h cada um) e 22 (10h cada um) de Julho, 02 de Agosto (11h cada um) e em 06 (8h cada um), 07 (8h cada um) e 10 (9h cada um) de Novembro, a mudança de quadros de obras e ligação na zona do estaleiro e fizeram as redes de água junto aos muros;

23. Na casa dos Réus de (...) , no ano de 2001, o Autor reparou os autoclaves dos motores da casa e piscina, bem como efectuou a iluminação exterior da zona da piscina;

24. Tarefas realizadas nos dias 04/01 (3h) e 25/05 (6h), 18/09 (2h), 21/09 (2h) e 04/11 (2h) pelo pai do Autor, e nos dias, 28/05 (8h cada um), 29/05 (8h cada um) e 17/09 (4h cada um), pelo Autor e pelo pai do Autor;

25. Em 23 de Fevereiro de 2001, o pai do Autor iniciou a electrificação e canalização dos currais do lado sul da quinta, tendo trabalhado 4 horas;

26. O que o Autor continuou, com a colaboração do pai, nos dias seguintes, 28/02 (8h cada um), 01/03 (8h cada um), 02/03 (8h cada um), 28/03 (8h cada um), e 29/03 (8h cada um) e onde efectuou a electrificação e canalização nos currais do lado sul da quinta;

27. Nos dias 02/04 (8h cada um), 09/04 (6h cada um), 08/06 (9h cada um), 11/06 (8h cada um), 15/06 (8h cada um), 27/06 (5h cada um), 10/07 (9h cada um), 16/07 (9h cada um), 01/0831/07 (10h cada um), 03/08 (10h cada um), 07/08 (8h cada um), 20/08 (8h cada um), 21/08 (9h cada um), 23/08 (9h cada um), 28/08 (7h cada um), 29/08 (11h cada um), 30/08 (8h cada um), 31/08 (9h cada um), o Autor e o pai efectuaram os esgotos nas placas dos anexos e as tubagens de electricidade, fizeram as instalações de águas, esgotos e electricidade nos currais dos anexos e nos anexos;

28. Nos dias 31/07 e 01/08 o pai do Autor continuou com as tarefas iniciadas nos dias anteriores, o que durou 5 e 10 horas, respectivamente;

29. (matéria não provada);

30. Na “quinta B (...) ” foram executados também diversos trabalhos pelo Autor, com a colaboração do pai e de um colaborador no ano de 2002,concretamente, o pai do Autor efectuou trabalhos nesse local nas seguintes datas: 08/01 (8h), 29/01 (8h), 30/01 (8h), 05/02 (8h), 06/02 (8h), 08/02 (8h), 13/02 (9h),14/02 (5h), 19/02 (8h), 20/02 (8h), 21/02 (8h), 22/02 (4h), 23/02 (4h), 28/02 (7h),01/03 (4h), 07/03 (9h), 08/03 (8h), 09/03 (4h), 28/05 (2h), 23/07 (9h), 29/07 (3h), 30/07 (10h), 31/07 (4h), 13/08 (5h), 21/08 (5h), 22/08 (8h), 26/08 (4h), 27/08 (8h),29/08 (8h), 11/09 (11h), 12/09 (5h), 16/09 (8h), 18/09 (10h), 23/09 (5h), 27/09 (8h),03/10 (9h), 08/10 (5h), 10/10 (4h), 17/10 (9h), 18/10 (9h), 28/10 (5h), 05/11 (9h),06/11 (8h), 12/11 (5h), 14/11 (8h) e 19/11 (8h);

31. No decorrer do ano de 2002 foram executadas reparações nos compressores do jardim na casa dos Réus sita na Costa Nova;

32. Foram executados trabalhos na quinta de K (...) nos dias 30/07 (10h), 31/07 (4h), 27/08 (8h), 29/08 (8h), 11/09 (11h), 12/09 (5h), 16/09 (8h), 18/09 (10h), 23/09 (5h), 27/09 (8h), 03/10 (9h), 17/10 (9h), 18/10 (9h), 28/10 (5h), 05/11 (9h), 14/11 (8h) e 19/11 (8h);

33. Naqueles dias e cargas horárias, o Autor terminou as instalações do salão (salão, cozinha e três quartos de banho), fez o assentamento de candeeiros no salão e no exterior e procedeu à alimentação de água nos jardins;

34. No ano de 2003 o Autor continuou com os trabalhos na quinta dos Réus, onde colocou candeeiros de jardim, procedeu à iluminação de jardins, alimentação de cabos para portões, reparações de tubagens junto ao furo de bomba, colocaram projectores na casa do pombal para iluminação exterior e iluminação da tenda;

35. Tais trabalhos foram executados nos dias 27/01 (3h cada um), 02/06 (4h cada um), 04/07 (5h cada um);

36. No ano de 2003 o Autor prestou serviços para os Réus na casa de (...) , onde foram colocados projectores e armaduras na cozinha da parte “nova” da casa;

37. Os serviços foram prestados pelo Autor e pelo seu pai no dia 02/06 (3h cada um) e pelo pai do Autor nos dias 27/01 (2h), 04/07 (3h) e 24/10 (3h);

38. Em 2004 o Autor cessou os seus serviços para os Réus na casa de (...) , onde encarregou o seu pai das reparações de águas da rede de aquecimento;

39. Os serviços foram desenvolvidos nos dias 10/03 (6h), 11/03 (4h), 29/04 (3h), 10/09 (8h), 14/09 (5h), 18/10 (3h), o que faz um total de 29 (vinte e nove) horas;

40. O pai do Autor foi incumbido, no dia 17/04 desse ano, de reparar uma ruptura de água, o motor do balão e de se deslocar a uma loja EDP para baixar as potências da luz, na casa dos sogros do Réu marido, sita em Vila Verde, o que demorou 4 (quatro) horas;

41. E no dia 20/08 reparou a caldeira na casa dos Réus na Costa Nova, trabalho que demorou 2 (duas) horas;

42. Durante o ano de 2004 o pai do Autor, por conta do Autor e a favor dos RR, trabalhou nos dias 11 (4h), 22 (3h), 23 (4h), 24 (3h), 26 (5h) de Março, 07 (5h), 20 (8h), 21 (8h), 22 (10h), 23 (10h), 24 (8h), 26 (5h), 30 (8h) de Abril, 01 (4h), 03 (5h), 20 (5h) de Maio, 05 (5h), 07 (9h), 09 (7h), 10 (4h), 11 (4h), 25 (3h), 29 (2h) de Junho, 01 (8h), 03 (4h) de Julho, 15 (8h), 16 (4h), 29 (5h9, 30 (4h) de Setembro e 01(4h) e 30 (3h) de Outubro, computando 169 (cento e sessenta e nove) horas;

43. O Autor trabalhou na quinta nos dias e horas supra, excepto nos dias11/03, 22/03, 24/03, 23/04, 26/04, 30/04, 03/05, 07/06, 09/06, 25/06, 29/06, 15/09, 30/09, 01/10 e 30/10, o que faz um total de 105 (cento e cinco) horas;

44. Em tais datas, foram feitas redes de água no pinhal e laterais da quinta, bem como as redes de esgotos na quinta, na zona do pinhal;

45. O Autor e o pai do Autor por conta do filho e em proveito dos RR fizeram tubagens e redes nos terrenos agrícolas e pinhal, ligação de bombas e acumulador de inox no pinhal;

46. (matéria não provada);

47. Os trabalhos foram realizados pelo pai do Autor, D (...) , por conta do filho e em proveito dos RR, nos dias 10 (2h) e 11 (4h) de Junho e 30 (4h) de Setembro;

48. No ano de 2000 o Autor cobrava € 4,5/hora; em 2001 € 5,00/hora, em 2002, 2003 e 2004 € 6,00/hora e em 2005 € 7,00/hora;

49. O trabalho prestado pelo pai do Autor foi sempre cobrado a 10 €/hora, entre o período entre 1999 e 2005, facto que sempre foi do conhecimento dos RR;

50. O serviço do colaborador do Autor, de nome Jorge, que trabalhou com aquele em 2002, na quinta dos Réus, foi prestado a € 6,00/hora;

51. A factura referida em A) foi entregue à Ré mulher;

52. Em Dezembro de 2003, quando o pai do Autor cessou a sua actividade, comunicou tal facto ao Réu, informando-o que mantinha a mesma actividade, mas agora por conta do filho;

53. Dando-lhe conhecimento, na mesma ocasião, que o crédito que mantinha sobre os Réus seria transmitido ao Autor, seu filho, no que o Réu marido concordou;

54. Todos os trabalhos realizados pelo Autor e pai deste, D (...) , foram pelos Réus solicitados a este, a cargo de quem, até 2 de Julho de 2004, o Autor trabalhava;


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            b) – De direito

1. A prescrição presuntiva

Dispõe a alín. b) do art.º 317.º do CC que prescrevem no prazo de 2 anos, além do mais, os créditos daqueles que exerçam profissionalmente uma indústria por execução de trabalhos, a menos que a prestação se destine ao exercício industrial do devedor.

Trata-se de uma prescrição presuntiva, que se funda na presunção de cumprimento (art.º 312.º do CC) e cuja explicação radica no facto de as obrigações a que respeitam costumarem ser pagas em prazo imediato (pronto pagamento) ou bastante curto e respeitaram a necessidades do quotidiano e não se exigir, por via de regra, quitação, ou pelo menos não se conservar por muito tempo a prova dessa quitação.

Decorrido o prazo legal a lei presume que o pagamento foi efectuado, dispensando-se o devedor da sua prova dada a dificuldade em fazê-lo.[1]

Destina-se, no fundo, a proteger o devedor contra o risco de satisfazer duas vezes dívidas de que não é usual exigir recibo ou guardá-lo durante muito tempo.[2]

Contrariamente à prescrição ordinária, também denominada de verdadeira, o decurso do tempo não confere, aqui, ao devedor a faculdade de recusar a prestação ou de oposição ao exercício do direito prescrito, já que não é extintiva de direitos, nem isenta do ónus de alegar o cumprimento, para lá da invocação da própria prescrição. É uma mera presunção de pagamento.

Quer a doutrina, quer a jurisprudência têm considerado ser incompatível com a presunção de cumprimento ter o devedor negado a existência da dívida.[3]

O devedor que conteste uma acção de dívida, para poder beneficiar da prescrição presuntiva, tem de invocar expressa e claramente que pagou o reclamado.[4]

Por outro lado, constituindo a razão de ser da prescrição presuntiva, como vimos, o pagamento imediato ou em curto prazo e sua quitação de prestações ligadas às necessidades do dia-a-dia, de serviços ou trabalhos cujo pagamento costuma ser feito sem recibo, tal não se coaduna com o objecto do contrato de empreitada de construção civil ou reparação de edifícios, que embora não sujeito à forma escrita, os pagamentos envolvem por norma facturas e recibos.[5]

Voltando ao caso em apreço, os RR., na contestação, negaram a existência da dívida reclamada, bem como a cessão de créditos que a envolve, do pai do A. a este, alegando, contudo, que todos os serviços  que aquele efectuou para os RR. lhe foram integralmente pagos “não devendo os RR. qualquer cêntimo ao pai do A.” e que “os pseudo créditos que o A. diz terem-lhe sido cedidos pelo seu pai (…) ainda que fossem devidos já se encontram (…) prescritos (…)”.

Confundindo aqui a prescrição presuntiva com a ordinária, que conduz à extinção dos direitos (no sentido de não poderem ser exercidos), os RR. enredaram-se, salvo o devido respeito, em mero jogo de palavras quanto ao cumprimento: que pagaram todos os serviços prestados pelo pai do A., mas…e os peticionados?

- Impugnaram-nos! Tanto que continuam a negar a sua prestação, impugnando ainda nesta instância a respectiva matéria provada, querendo-a não provada!..

Em suma, não assumiram claramente o pagamento dos serviços prestados e reclamados na acção.

Por outro lado, os créditos reclamados e provados respeitaram a instalações eléctricas, de aquecimento e sanitárias (água e esgotos), reparações de redes de água, instalação de candeeiros e projectores (…) em edifícios, cujo pagamento do preço foi estabelecido à hora e teve um carácter descontinuado (não permanente).

Dir-se-á que, conforme assinalado na sentença, as relações contratuais assim estabelecidas configuram um contrato de empreitada, legalmente definido como aquele em que uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra mediante um preço (art.º 1207.º do CC).

Preço cuja fixação ab initio não é essencial à caracterização do contrato (art.º 1211.º do CC).

Tratando-se de um contrato consensual (a par de sinalagmático, oneroso e comutativo) e contrariamente ao sustentado pelos recorrentes, não está sujeito a forma especial, dependendo a sua validade do mero consenso entre as partes (art.º 219.º do CC).[6]

Assim sendo, atenta a natureza da prescrição presuntiva, porque esta é incompatível com o contrato de empreitada, não lhe é aplicável a alín. b) do art.º 317.º do CC.

Uma terceira razão poderia ainda ser considerada a partir da matéria de facto resultante da discussão da causa e que, embora não levada aos factos provados, teve a ver com a natureza de alguma das obras de recuperação e implementação para eventos/casamentos, na quinta, em K (...) , e porque destinada ao exercício industrial dos RR. expressamente a alín. b) do art.º 317.º do CC as excluiria da prescrição presuntiva.

Em suma, improcedem as conclusões recursivas relativas à prescrição, com o que se mantém a sua improcedência decidida no despacho saneador.


*

            2. A impugnação da matéria de facto

Com se referiu, os recorrentes, exceptuando a resposta dada ao art.º 1.º da b. i., põem em causa a totalidade do julgamento da matéria de facto com a alegação de que as respostas à b. i. tiveram por fundamento única e exclusivamente o depoimento do pai do A., a testemunha D (...) , que não depos com isenção, muito menos com imparcialidade.

Compulsada a motivação da decisão sobre a matéria de facto, dela se vê que, afinal, o julgamento não assentou apenas no depoimento dessa testemunha.

Ressalvando que tal testemunha era parte interessada, referiu essa decisão que a mesma confirmou com precisão as horas de trabalho, locais, datas e serviços efectuados, para tanto se socorrendo de apontamento pessoal de sua autoria (não se referindo a qualquer cópia do despacho saneador ou da base instrutória) e fez assentar a sua credibilidade na coerência, consistência, razoabilidade e humildade com que depos e porque o seu depoimento foi conjugado com o das testemunhas oferecidas pelos RR. F (...) , pedreiro, que foi quem indicou o pai do A. aos RR. e presenciou o A. a trabalhar nas obras dos RR. e que explicou os preços/hora de qualquer electricista e G (...) , pedreiro, que igualmente  testemunhou que o pai do A. trabalhou em tais obras e ainda com os depoimentos das testemunhas J (...) que colaborou com o A. e o pai deste nas obras e L (...) , pedreiro que trabalhou para os RR. nas mesmas obras e nas mesmas ocasiões onde viu o A. e o pai a trabalhar, testemunhas que confirmaram alguns dos serviços efectuados.

Ora bem.

Não obstante o acabado de indicar, há que reconhecer, contudo, que quanto às datas e tempo dos trabalhos prestados pela própria testemunha e pelo A. (e um colaborador) o seu depoimento, que pese embora o seu interesse na causa prestou um depoimento objectivo e coerente, sufragando-se a convicção assumida na 1.ª instância, foi o único relevante já que, sobre tal matéria, mais nenhuma das testemunhas inquiridas em audiência depos, pelo que, a esse propósito, uma vez que não foram juntos os elementos por si usados ao prestar o depoimento, nem qualquer outro documento, relativamente à matéria da b. i. sobre o que não foi questionado em audiência não pode obviamente dar-se aquela como provada, sendo que mais nenhum outro meio probatório foi produzido.

Assim, seguindo a ordem da impugnação, temos o seguinte:

- Quanto à contradição entre os pontos 52 e 54 da matéria de faço da sentença, ou seja, de que há contradição com o facto de o pai do A. haver cessado a actividade de electricista e canalizador em Dezembro de 2003 e que o filho trabalhou a seu cargo até 2.7.04, ou seja, até se colectar, não há contradição nenhuma, uma vez que resultou assente que o pai cessou a actividade apenas para efeitos fiscais, continuando a prestar os mesmos serviços até 2.7.04, data em que o filho se colectou fiscalmente, e após, sob a tutela fiscal do filho.

O mesmo acontece quanto à pseudo-contradição entre os pontos 38, 39 e 40, 42, 43, 45 a 47 e 54.

Quanto a haver serviços provados para lá da factura, isso é irrelevante já que a causa de pedir é mais ampla que o aí vertido, como irrelevante é não constar desse (mero) documento a cessão de créditos entre pai e filho, até porque a cessão não depende de forma escrita e foi demonstrada (resp. ao art.º 3.º da b. i.), como demonstrado foi a sua entrega à Ré mulher, com base no depoimento da testemunha pai do A. e cuja convicção não foi abalada nem em rigor a impugnação nenhum outro elemento probatório contrapôs que pudesse destruir a convicção.

Irrelevante também se afigura a alegação e conclusão recursiva de que não podia ser dada como provada a importância cobrada à hora pelo A. antes de Julho de 2004 porque só desde aí começou o exercício da sua actividade.

Como acima se referiu, o facto de só em 2.7.04 ter inscrito nas Finanças o início de actividade, não significa que antes não exercesse, na prática, a actividade! É, aliás, isso uma prática comum, correcta ou incorrecta, não importa aqui considerar.  

A mesma irrelevância, ainda, quanto ao facto de o pai do A. continuar a cobrar 10 €/h após a cessação fiscal (et pour cause) da sua actividade.

Quanto ao ponto 50 importa rectificá-lo, em consonância com a resposta dada ao art.º 51.º da b. i. e, assim, sem objecto fica a alegação recursiva.

            Relativamente à falta de prova de alguns dias e horas de trabalho dados como provados, os recorrentes têm razão.

Como já dissemos, o único meio de prova produzido foi o depoimento testemunhal do pai do A. D (...) e que relativamente a alguns dos art.ºs da b. i. não depos em concreto, nem o tribunal, nem os mandatários das partes, v. g., a I. Mandatária do A., o questionando sobre parte dessa matéria.

            Assim, quanto à matéria dos pontos 6 a 10 da matéria de facto da sentença (coincidente com os mesmos art.ºs da b. i.), a sua resposta consta da transcrição de fls. 194 e 195, sendo que, se não foi referida a data de 22.10.99, terá sido por lapso com a data referida de 20.10.99 e que não altera da substância da prestação.

            Quanto ao ponto 13, a resposta está dada na transcrição de fls. 196.

            Quanto ao ponto 19 (= art.º 20.º da b. i.), a testemunha não se referiu aos dias (e horas) 26 e 27 de Outubro de 2000, 24, 27, 28 e 30 de Novembro e 4, 5, 6 e 7 de Dezembro, pelo que importará dar como não provada tal matéria (79 horas a € 10,00 e 79 horas a € 4,50, no valor global de € 1.145,50).

            Quanto ao ponto 22 (art.º 23.º da b. i.), não tem razão a impugnação. O dia 10 de Novembro está descrito pela testemunha inquirida na gravação e transcrição a fls. 201.

            Quanto ao 24 (art.º 25.º da b. i) igualmente o dia 4 de Janeiro impugnado foi, como tal, indicado pela testemunha, como pode ouvir-se da gravação, devendo-se a manifesto lapso de transcrição (fls. 205) a referência a 4.5.

            Quanto aos 28 e 29, se quanto ao 1.º a ele se referiu a testemunha, quanto ao 2.º nada disse nem nada lhe foi perguntado, pelo que terá que ser dado como não provado e, assim, serem eliminadas as horas aí indicadas (148), no valor de € 2.220,00.

            Quanto aos 35 e 37 (= 36.º e 38.º da b. i.), pelas mesmas razões, o 1.º terá que ser dado como só parcialmente provado, quanto aos dias (e horas) 27.1, 2.6 e 4.7.03, e assim não provadas as horas aí indicadas (167), no valor de € 2.672,00, nada havendo a alterar quanto ao 2.º, que é repetitivo quanto a essas datas.

            Quanto ao 43 (44.º da b. i.), a sua prova resulta da transcrição, a fls. 208.

            Quanto ao 46 e 47 (47 e 48 da b. i.), relativamente ao 1.º nada disse a testemunha, nem nada lhe foi perguntado, pelo que terá que ser dado como não provado e desconsiderar o n.º de horas (128) e respectivo valor de € 1.220,00. Quanto ao 2.º, só se pronunciou relativamente às datas de 10 e 11 de Junho e 30 de Setembro (de 2004) (ouça-se a gravação e v. transcrição a fls. 208), pelo que haverá a não considerar o n.º de horas de 157, no valor de € 1.570,00.

            Quanto ao 48 (49.º da b. i.), a resposta resulta do depoimento transcrito a fls. 200 e 209.

            Quanto à cessão de créditos (resp. aos art.ºs 3.º, 53.º e 54.º da b. i.), a prova resulta do depoimento gravado e transcrito (fls. 192, 196, 209 e 214) e cuja validade, como sustentaram os recorrentes, não depende, como já se disse, de forma escrita por o negócio originário (empreitada) também o não exigir, tornando-se eficaz com a aceitação do devedor (art.º 583.º, n.º 1, do CC).

            Em suma e com referência aos pontos da matéria de facto da sentença importa alterar parcialmente o ponto 19, o ponto 29 totalmente, o ponto 35 parcialmente, o 46 totalmente e o 47 parcialmente.


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            3. O contrato de empreitada

Quanto à natureza das relações contratuais estabelecidas entre as partes, já acima assinalámos, concordantemente com a douta sentença recorrida, tratar-se de relações típicas do contrato de empreitada, cuja obrigação de resultado (realização de certa obra) tem como sinalagma o pagamento do preço.

            Este, nada obsta que seja determinado em função do tempo de trabalho, não se confundindo com contrato de trabalho dada a autonomia, do credor, na execução da obra.[7]

            As prestações do contrato de empreitada tanto podem ser instantâneas, como mais ou menos permanentes[8], como o A. e o cedente do seu crédito assim prestaram.

            O preço correspondente ao tempo de trabalho prestado e apurado na presente acção está em falta, pelo que os RR. incumpriram a sua obrigação (art.ºs 406.º e 798.º do CC).

            Face à alteração da matéria de facto e considerando que relativamente aos pontos da sentença, n.º 19, importa reduzir o montante de € 1.145,50, correspondente ao tempo de trabalho cuja prestação se não provou, ao 29, € 2.220,00, ao 35, € 2.672,00, ao 46, € 1.220,00 e, ao 47, € 1.570, ou seja, o total de € 8.827,50, importa deduzir tal quantia à condenação, que, na procedência parcial do recurso de apelação, se fixa em € 17.156,50, no mais se mantendo a sentença, ou seja, quanto aos juros de mora.

            Quanto à má fé do recorrido, pese embora a alteração parcial da sentença recorrida, tal decorre da falta de prova de parte do pedido e não de dolo ou negligência grave por parte do A., pelo que, por inobservância do preceituado no art.º 456.º do CPC, não há lugar a sua condenação, a esse título.


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            III. Resumindo e concluindo

            a) – Porque a prescrição presuntiva se funda na presunção de cumprimento, o devedor que conteste uma acção de dívida, para dela poder beneficiar, tem de invocar expressa e claramente que pagou o montante peticionado;

            b) - Porque as obrigações respeitantes a essa forma de prescrição estão ligadas às necessidades do quotidiano, onde não é usual a exigência de recibo, a sua razão de ser não é compatível com o contrato de empreitada de obras de construção civil ou sua reparação, cujos pagamentos envolvem, por norma, facturas e recibos;

            c) – A cessão de créditos não depende de forma escrita se o negócio originário (empreitada) também o não exigir;

            d) – O contrato de empreitada não está sujeito a forma escrita, o preço não tem de ser fixado ab initio, pode ser determinado em função da duração do tempo de trabalho (v. g., à hora) e as prestações tanto podem ser mais ou menos permanentes, como instantâneas.


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            IV. Decisão

            Face ao exposto, na procedência parcial da apelação, acordam em revogar parcialmente a sentença e condenar os RR. recorrentes a pagar ao A. recorrido a importância de € 17.156,50, acrescida de juros de mora à taxa anual de 4% desde a citação até integral pagamento.

            Custas, em ambas as instâncias, por recorrentes e recorrido, de acordo com o decaimento.


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Francisco Caetano (Relator)
António Magalhães
Ferreira Lopes


[1] Almeida Costa, “Direito das Obrigações”, 3.ª ed., pág. 820.
[2] Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil, Anot.”, I, pág. 282.
[3] Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., pág. 283.
[4] Entre outros, v. Ac. STJ de 22.4.04, CJ/STJ, 2004, II-41.
[5] Neste sentido e por todos, v. Ac. STJ de 19.11.06, CJ/STJ, 2006, III-136.
[6] V. Pedro Romano Martinez, “Direito das Obrigações, Parte Especial, Contratos”, 2.ª ed., pág. 362.
[7] V. Pedro Romano Martinez, ob. cit., pág. 396.
[8] Idem, ibidem, pág. 362.