Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | SÍLVIA PIRES | ||
Descritores: | CONTRATO-PROMESSA COMPRA E VENDA PROMESSA UNILATERAL NULIDADE DECLARAÇÃO NÃO SÉRIA MÁ FÉ | ||
Data do Acordão: | 03/05/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DE LEIRIA – 5º JUÍZO CÍVEL | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE REVOGADA | ||
Legislação Nacional: | ARTºS 245º, 410º, NºS 1 E 2, E 411º DO C. CIVIL; 456º DO CPC. | ||
Sumário: | I – Contrato-promessa é a convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato – art.º 410º, n.º 1 do C. Civil. II - Conforme decorre dos art.º 410º, n.º 2 e 3, e 411º, ambos do C. Civil, o contrato-promessa embora na generalidade das situações se apresente como uma promessa bilateral, também pode, somente, configurar uma promessa unilateral, consoante a obrigação de celebrar o contrato prometido tenha sido assumida por ambas as partes ou apenas por uma delas. III - A promessa respeitante à celebração de contrato para o qual a lei exija documento, quer autêntico, quer particular, só vale se constar de documento assinado pela parte que se vincula ou por ambas, consoante o contrato-promessa seja unilateral ou bilateral (art.º 410º, n.º 2, do C. Civil). IV - Não tendo aqueles que figuravam no contrato-promessa como beneficiários da promessa de venda vontade de comprar os prédios em causa, a tal declaração necessariamente presidiu uma expectativa de que a sua falta de seriedade não fosse daqueles desconhecida, pelo que a referida declaração “carece de qualquer efeito”, devendo, neste caso, em que não se apurou a intenção que presidiu à elaboração do documento em causa, qualificar-se o respectivo vício como nulidade, atenta a aparência de negócio. V - As manifestações de promessa de venda e compra constantes de documento que não correspondam à vontade de nenhum dos outorgantes devem considerar-se como declarações em divergência com a vontade real em que, não se demonstrando que a elas tenha presidido uma particular intenção enganosa ou não, nem que tenha ocorrido qualquer viciação da vontade, devem ser residualmente qualificadas como declarações não sérias, nos termos do art.º 245º do C. Civil, uma vez que não corporizam uma qualquer vontade vinculativa. VI - Se a parte agiu com a consciência de que não tinha razão ou se não ponderou com prudência as suas pretensas razões, a sua conduta é ilícita, impondo o art.º 456º do C. P. Civil que seja condenada em multa e numa indemnização à parte contrária se esta o pedir. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra A Autora intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra B…, pedindo: 1. Ser chamado a intervir A…, representado pelo Administrador de Insolvência, Dr. …, como associado da autora., nos termos dos arts. 28º e 325º do CPC; 2. Declarar-se resolvido o contrato-promessa de compra e venda celebrado entre a D..., o chamado A… e o R., por incumprimento definitivo da parte do R. e por sua culpa exclusiva quanto aos prédios 2230 e 399 ambos da freguesia de …; 3. Condenar-se o R. a pagar à A. e ao chamado, o dobro do sinal entregue referente a estes prédios, em montante a apurar em liquidação de sentença, acrescido de juros de mora vincendos, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento; 4. Ser proferida sentença que, nos termos do art. 830º do CC, produza os efeitos da declaração negocial em falta da R. quanto aos prédios; Ou, em alternativa, 5. Declarar-se resolvido o contrato-promessa de compra e venda celebrado entre a A., o marido e o R., por incumprimento definitivo da parte do R. e por sua culpa exclusiva do R.; 6. Condenar-se o R. a pagar à A. o dobro do sinal entregue, no montante de € 75.000,00, acrescido de juros de mora vincendos, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento. Para fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese: Ø Mediante documento particular, o Réu, em 28.08.2003, prometeu vender à Autora e ao então seu marido os prédios descritos no artigo 8.º da petição inicial. Ø A Autora e o seu então marido, declararam comprar, assinando um exemplar que se encontra na posse do réu. Ø Com tal documento, a Autora e o Interveniente entregaram imediatamente o preço dos imóveis: € 37.500,00 e ficou acordado que qualquer das partes poderia marcar a escritura, avisando a contraparte. Ø Em Dezembro de 2008 a Autora marcou a escritura de compra e venda para o dia 15 de Janeiro de 2009, com a colaboração de …, então curadora nomeada a A…, no âmbito do processo de insolvência de obras A…, Lda., sendo que o Réu foi avisado por carta registada com aviso de recepção datada e remetida a 27.12.2008. Ø Não obstante, o Réu na data e hora marcada, não compareceu, nem justificou a sua ausência. Ø Teve agora conhecimento que o Réu vendeu os terrenos… Para justificar a intervenção activa do Réu como seu associado invocou a necessidade da presença do mesmo para assegurar a legitimidade activa para a acção. O Réu contestou, alegando, em síntese que o documento que está em causa nos autos, designado de contrato promessa, apenas serviu para justificar, perante o banco e/ou outras entidades, a transferência de capitais de Portugal para o Brasil, sendo por isso, um documento simulado e nulo. Impugnou todo o conteúdo do aludido contrato promessa de compra e venda alegadamente celebrado entre a Autora, o seu ex-marido e o Réu. Concluiu, pugnando pela improcedência da acção. Foi apresentada réplica, na qual a Autora manteve o por si alegado na petição inicial. Foi proferido despacho a admitir a intervenção de A... Veio a ser proferida sentença que julgou a acção nos seguintes termos: Pelo exposto, julgo a presente acção totalmente improcedente, por não provada, e, em consequência, absolvo o réu do pedido. Condeno a autora, como litigante de má-fé, no pagamento de multa que se fixa em 20 Uc’s. Inconformada a Autora interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões: … O Réu apresentou resposta, pugnando pela confirmação da decisão recorrida. Na sequência de despacho proferida pela Relatora, as partes foram notificadas nos termos e para os efeitos do art.º 3º, n.º 3, do C. P. Civil, para se pronunciarem sobre a possibilidade da nulidade do contrato-promessa em causa resultar da circunstância das declarações nele contidas não corresponderem à vontade das partes, conforme o conteúdo das respostas dadas aos quesitos formulados sob os n.º 29 e 30 da base instrutória. O Réu pronunciou-se pela nulidade do contrato-promessa, com fundamento na inexistência da vontade das partes quanto às declarações constantes do documento, tendo a Autora mantido a posição constante das suas alegações de recurso. 1. Do objecto do recurso a) O contrato-promessa invocado deve ser considerado como uma promessa de venda unilateral válida? b) A Autora não litigou com má-fé? 2. Dos factos Os factos provados são os seguintes: … 3. O Direito aplicável 3.1. Da existência de uma promessa unilateral de venda Com este recurso a Autora pretende que seja considerado que o contrato-promessa de compra e venda que alega ter outorgado com o Réu não seja considerado nulo pelo facto de no mesmo não constarem as assinaturas dos promitentes-compradores, mas seja considerado válido enquanto promessa unilateral que vinculou o Réu ao seu cumprimento. Contrato-promessa é a convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato – art.º 410º, n.º 1, do C. Civil. Conforme decorre dos art.º 410º, n.º 2 e 3, e 411º, ambos do C. Civil, o contrato-promessa embora na generalidade das situações se apresente como uma promessa bilateral, também pode, somente, configurar uma promessa unilateral, consoante a obrigação de celebrar o contrato prometido tenha sido assumida por ambas as partes ou apenas por uma delas. A promessa respeitante à celebração de contrato para o qual a lei exija documento, quer autêntico, quer particular, só vale se constar de documento assinado pela parte que se vincula ou por ambas, consoante o contrato-promessa seja unilateral ou bilateral (art.º 410º, n.º 2, do C. Civil). E quando um contrato-promessa bilateral é apenas assinado por apenas uma das partes contraentes, como ocorre no presente caso? Qual é a validade deste contrato? A decisão recorrida entendeu que, estando nós perante um contrato bilateral que não se encontrava assinado pelos promitentes-compradores, o contrato era nulo, por inobservância da forma prevista no referido art.º 410º do C. Civil. Desde os primeiros tempos de vigência do Código Civil de 1966 que se registam divergências na doutrina e na jurisprudência sobre as consequências da referida situação[1] e, apesar do S.T.J. ter emitido um Assento sobre ela, não se pode considerar que essa questão se encontre pacificamente resolvida. A jurisprudência começou por dividir-se entre aqueles que perfilhavam a tese da redução sistemática a promessa unilateral da promessa bilateral de contratar, indevidamente assinada por apenas um dos promitentes, e aqueles que defendiam a nulidade total do contrato-promessa[2]. Esta divergência veio a ser solucionada por um assento já extraído após ter sido modificada a redacção do art.º 410º do C. Civil, mas reportando-se ainda à redacção original, que fixou que o contrato-promessa bilateral de compra e venda de imóveis, exarado em documento, assinado apenas por um dos contraentes é nulo, mas pode considerar-se válido como contrato-promessa unilateral, desde que essa tivesse sido a vontade das partes (Assento de 29-11-1989)[3]. A formulação adoptada parecia adoptar a tese da possibilidade do negócio ter eficácia, mas sujeita à prova que essa tinha sido a vontade das partes, o que não só colocou dúvidas sobre a qualificação dessa possibilidade de aproveitamento, mas também sobre a sua praticabilidade[4]. Apesar de toda esta polémica, as alterações introduzidas pelos Decreto-Lei n.º 236/80 e 379/86 ao regime do contrato-promessa nada vieram esclarecer, tendo-se entendido ser preferível deixar a solução do problema aos instrumentos consagrados na parte geral do Código Civil. A jurisprudência, perante a ambiguidade daquele aresto uniformizador, dividiu-se entre o recurso à figura da redução[5] e da conversão[6]. Na doutrina, Vaz Serra[7], Pires de Lima/Antunes Varela[8], Almeida Costa[9] Jorge de Brito Pereira[10], Luís Gonçalves[11], Abel Delgado[12], Eridano de Abreu[13], Ribeiro de Faria[14], Carvalho Fernandes[15], Calvão da Silva[16], Gravato Morais[17] e Menezes Leitão[18], com algumas diferenças de opinião e de rigidez da solução, propenderam para que o contrato-promessa bilateral assinado por apenas um os promitentes pudesse ser reduzido, nos termos do art.º 292º do C. Civil. Já Inocêncio Galvão Telles[19], Santos Júnior[20], e Rodrigues Damas[21] sustentaram a aplicação da figura da conversão, prevista no art.º 293º do C. Civil, a qual exige que o fim prosseguido pelas partes com a celebração do contrato permita supor que elas o teriam querido, se tivessem previsto a invalidade. Victor Calvet[22] defendeu que, se apenas uma das partes confiar na validade do contrato, o caso pode ser solucionado através da responsabilidade pela culpa in contrahendo, ou pela intervenção da figura do abuso de direito, proibindo uma situação de venire contra factum proprium. Mas se ambos confiaram na validade do contrato, a invocação da sua invalidade formal só pode ser paralisada, em casos absolutamente excepcionais, pelo abuso de direito. Ana Prata[23] sustentou que a invocação da nulidade pelo contraente não subscritor, nestas situações, pode gerar uma responsabilidade pela culpa in contrahendo, enquanto a invocação da nulidade pelo subscritor do contrato permite à contraparte o recurso à figura da conversão. E Menezes Cordeiro[24], numa posição englobadora, entende que a chave destas soluções reside na boa fé e na confiança, preconizando uma conjugação do disposto nos artigos 292º, 293º, 239º e 334º, do C. Civil, que tenha em consideração a divisibilidade do negócio, para, em cada caso concreto, encontrar-se a solução adequada. No presente caso, face à escassa factualidade apurada sobre as circunstâncias que motivaram a falta de assinatura dos promitentes compradores e a vontade dos outorgantes, apenas a adesão à tese da aplicabilidade da figura da redução prevista no art.º 292º do C. Civil, permitiria conferir eficácia negocial ao documento apresentado pela Autora, qualificando-o como uma promessa unilateral. Contudo, neste caso, não se revela necessário tomarmos posição na acima relatada querela, porque, independentemente de poder existir um vício formal que determine a nulidade do negócio plasmado no referido documento, revela-se, face à matéria de facto provada, que o mesmo sofre de um vício substancial que determina a sua invalidade. Na verdade, apurou-se que o Réu não quis vender à Autora e a A… os imóveis constantes daquele documento nem estes quiseram comprar àquele tais imóveis. As manifestações de promessa de venda e compra constantes daquele documento não corresponderam, pois, à vontade de nenhum dos indicados outorgantes pelo que deve considerar-se que estamos perante declarações em divergência com a vontade real em que, não se demonstrando que a elas tenha presidido uma particular intenção enganosa ou não, nem que tenha ocorrido qualquer viciação da vontade, devem ser residualmente qualificadas como declarações não sérias, nos termos do art.º 245º do C. Civil, uma vez que não corporizam uma qualquer vontade vinculativa[25]. Se as declarações não sérias típicas da previsão do art.º 245º do C. Civil são aquelas a que preside uma intenção jocosa, didáctica, cénica ou publicitária, tal conceito tem, contudo, uma latitude de aplicação que lhe permite também acolher aquelas situações em que, apurando-se que a declaração não correspondeu a qualquer vontade negocial, não se apura qualquer intuito específico, enganoso ou não, nem qualquer vício da vontade. Certo é que nessas situações em que, apesar da sua aparência negocial, nenhuma das partes emitiu e entendeu a declaração com cariz vinculativo, a mesma deve ser qualificada como não séria e obedecer ao regime do art.º 245º do C. Civil. Não tendo aqueles que figuravam no contrato-promessa como beneficiários da promessa de venda vontade de comprar os prédios em causa, a tal declaração necessariamente presidiu uma expectativa de que a sua falta de seriedade não fosse daqueles desconhecida, pelo que a referida declaração “carece de qualquer efeito”, devendo, neste caso, em que não se apurou a intenção que presidiu à elaboração do documento em causa, qualificar-se o respectivo vício como nulidade, atenta a aparência de negócio[26]. Como justificou Rui Alarcão, nos trabalhos preparatórios do C. Civil[27], o § 118.º, do Código alemão diz que a declaração é nula (nichtig). Mas parece-nos preferível dizer, como se faz no preceito que sugerimos, que a declaração não produz efeito. É que, no tocante aos casos em que o declaratário conhecia ou devia conhecer a não seriedade da declaração - ou, pelo menos, quanto a alguns desses casos (declarações didácticas e cénicas) - , não falta quem sustente que a declaração se não deve considerar nula, pois que nem mesmo chega a haver uma verdadeira declaração negocial. A ambiguidade da expressão “carece de qualquer efeito” apontada por Heirich Hörster[28] foi, pois, intencional, visando permitir ao julgador optar pelo regime que melhor se adeqúe à aparência da declaração - nulidade, no caso de ela ter uma aparência negocial, e inexistência nas hipóteses em que nem essa aparência se verifique. Na caso sub iudice, deve considerar-se nula a declaração subscrita pelo Réu. Sendo ela nula, não pode produzir efeitos, pelo que não pode ser exigido o cumprimento da obrigação nela estipulada, nem o seu incumprimento gera qualquer obrigação de indemnizar. Por estes motivos não pode proceder a acção proposta pela Autora, pelo que o recurso interposto deve ser julgado improcedente, nesta parte, mantendo-se o decidido, mas com fundamentação diversa. 3.1 Da má-fé A decisão recorrida condenou a Autora por litigância de má-fé na multa de 20 Ucs, condenação contra a qual esta se insurge, defendendo que a sua conduta processual não justifica aquela condenação. Consta, a este respeito, da decisão recorrida: Ora, face à matéria de facto constante dos pontos 21. e 22. dos factos provados, parece-nos evidente existir um uso manifestamente reprovável do processo por parte da autora, criando um artifício a fim de lograr obter do réu o pagamento da quantia que alegadamente deu a titulo de sinal. Tal comportamento é grave e subsume-se à previsão da norma citada, devendo ser punido em conformidade; ponderando a intensidade do dolo e a dimensão das suas consequências, impõe-se a sua condenação em multa, que se fixa em 20 Uc’s. Os factos 21 e 22 têm o seguinte conteúdo: 21. A Autora tem pleno conhecimento que o Réu reside no Brasil desde o ano 1977. – resposta ao quesito 23.º da Base Instrutória. 22. E sabia que, na ocasião em que escreveu a carta mencionada em 8.º da base instrutória, o Réu se encontrava no Brasil. – resposta ao quesito 25.º da Base Instrutória. A carta referida foi remetida ao Réu em 27 de Dezembro de 2007 a dar-lhe conhecimento da marcação da escritura para 15 de Janeiro de 2008. Dispõe o n.º 2 do art.º 456º do C. P. Civil: Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave: a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou, protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão. A má-fé a que alude o citado preceito reveste-se de dois aspectos: a má-fé material, aquela a que se referem as alíneas a), b) e c), e a má-fé instrumental, a referida na alínea d). Ao direito concreto de exercer a actividade processual são impostas limitações pela ordem jurídica, nomeadamente, exigindo-se que o litigante esteja de boa-fé ou suponha ter razão. Se a parte agiu com a consciência de que não tinha razão ou se não ponderou com prudência as suas pretensas razões, a sua conduta é ilícita, impondo o art.º 456º do C. P. Civil que seja condenada em multa e numa indemnização à parte contrária se esta o pedir. A decisão recorrida, considerou que a Autora fez um uso manifestamente reprovável do processo e entendeu verificado, implicitamente, o pressuposto definido pela alínea d) do nº 2 do art.º 456º do C. P. Civil, revelador de dolo indirecto, que ultrapassou, claramente, a lide temerária. Com efeito, a má-fé instrumental, quer dolosa, quer com culpa grave ou erro grosseiro, esta última designada por lide temerária, a que se reporta a alínea b), diz respeito ao fundo da causa, à relação substancial deduzida em juízo. O dever de litigar de boa-fé, com respeito pela verdade é corolário do princípio da cooperação a que se reporta o art.º 266º do C. P. Civil e vem consignado no art.º 266º-A do mesmo diploma legal. Em qualquer caso, a conclusão pela actuação da parte como litigante de má-fé será sempre casuística, não se deduzindo mecanicamente da previsibilidade legal das alíneas do art.º 456º do C. P. Civil e a responsabilização e condenação da parte como litigante de má-fé só deverá ocorrer quando se demonstre nos autos, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu, conscientemente, de forma manifestamente reprovável, com vista a impedir ou a entorpecer a acção da justiça. Ora os factos em que se alicerçou a decisão para esta condenação – conhecimento da morada do Réu e envio da carta com cerca de 15 dias de antecedência da data marcada para a escritura – poderiam ter interesse para apurar a culpa do Réu no incumprimento do contrato-promessa mas, uma vez, que esse contrato foi julgado nulo, não se chegando a averiguar do seu incumprimento, tais factos não se chegaram a projectar na lide processual, pelo que os mesmos não são suficientes para sustentar a conclusão de litigância de má-fé, devendo, por isso, a condenação da Autora ser revogada. Decisão: Nos termos expostos, julgando-se parcialmente procedente o recurso, revoga-se a decisão recorrida na parte respeitante à condenação por litigância de má-fé, confirmando-se o demais decidido por fundamentos diversos. Custas do recurso pela Autora e Réu na proporção, respectivamente, de ¾ e ¼. Sílvia Pires (Relatora) Henrique Antunes José Avelino
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