Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
540/08.3TBNZR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
PARTE COMUM
PRESUNÇÃO
ILISÃO
Data do Acordão: 02/14/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: NAZARÉ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS.1418º E 1421º CC
Sumário: 1 - O requisito geral de ilisão da presunção de comunicabilidade, previsto na al.e) do nº2 do artº 1421º do CC, qual seja a afetação ao uso exclusivo de um condómino, não tem de constar no título constitutivo, antes podendo resultar de uma provada afetação material, uma destinação objetiva, mesmo que verificada após a constituição da propriedade horizontal.

2 -Tal exclusividade densifica-se, determinantemente, através da utilidade funcional, do proveito objetivo que pode decorrer do uso do espaço em questão, pelo que, se a utilidade e proveito se provarem apenas quanto a um só dos condóminos, e não tendo os restantes, mesmo com possibilidade de acesso ao local, qualquer interesse, ou interesse relevante atendível, na sua fruição, deve ter-se por verificada a ilisão e, assim, a parte do edifício em causa integrante da propriedade exclusiva da fração daquele.

Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

E (…) e mulher S (…), intentaram contra Condomínio do Prédio, n.º (…) sito na Rua (…)na Nazaré a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário.

Pediram:
- se declare que os autores são proprietários exclusivos da varanda construída no terceiro andar esquerdo, com a área de cerca de 11,67 m2, por tal varanda fazer parte integrante da fracção autónoma designada pela letra “H”, correspondente aos 3.º e 4.º andares do prédio sito na Rua (…)na Nazaré, e;
- em consequência, se ordene a rectificação do respectivo registo da propriedade horizontal, no sentido de ser incorporada a mencionada varanda naquela fracção, mantendo-se os valores relativos e as permilagens nele constantes e ordenando-se o cancelamento do que em contrário conste ou venha a ser registado;
- caso assim não se entenda, se declare que essa varanda, embora comum, está afecta ao uso exclusivo da fracção H, destinação que se evidência pelos diversos sinais e factos.
Alegaram:
Que são donos e legítimos possuidores da fracção autónoma, designada pela letra H, correspondendo ao terceiro e quarto andares esquerdos, em duplex, sita em prédio urbano que identificam.
Que, em conformidade, quer com a planta aprovada e apresentada junto da Câmara Municipal quer com a ficha técnica da habitação foi construída, no terceiro andar esquerdo, uma varanda, com a área de 11,67, igual à varanda que existe imediatamente por cima desta, no quarto andar esquerdo, varanda essa que tem acesso directo e originário pela fracção H, através de uma porta com fechadura, existindo no hall comum correspondente ao 3.º andar do prédio, à saída do elevador uma porta com fechadura que dá acesso à sobredita varanda.
Que a varanda localizada no 3.º andar esquerdo da fracção H foi, desde o projecto inicial da obra, destinada a integrar esta fracção e, como tal, foi vedada e dividida com uma porta com fechadura, que impede o acesso à mesma a partir do hall comum referente ao 3.º andar do prédio, ficando esta varanda, sem acesso por outro lado, que não através da fracção H, de que é um complemento natural e tendo sido afecta ao uso exclusivo dos autores.
Que os autores para acederem à sua sala que se situa no 3.º andar esquerdo da fracção H, têm de passar sempre e obrigatoriamente por esta varanda, que não tem mais nenhum acesso directo, que não seja pela fracção dos autores, facto que é do conhecimento de todos os condóminos e da respectiva administração do condomínio.
Que é indubitável, claro e inequívoco que, desde sempre, existiu uma destinação objectiva desta varanda à fracção H dos autores evidenciada quer por sinais, quer pela porta de acesso do hall comum do 3.º andar, quer também pela porta de acesso da sala para a varanda dos autores, que foram quem, em exclusivo, pagou a referida varanda ao empreiteiro, tendo esse valor sido englobado no preço da fracção H, correspondente aos 3.º e 4.º andares esquerdos.
Que apenas por lapso do construtor, ou falta de conhecimento, é que não se mencionou tal varanda no título de constituição da propriedade horizontal, sendo que desde que tomaram posse da sua fracção, os autores começaram a utilizar aquela varanda, com exclusão de outrem, designadamente dos restantes condóminos, ali colocando vasos com plantas e cadeiras, à vista de toda a gente, sem qualquer interrupção e na convicção da sua posse legítima, desde então e até à presente data.
Contestou o réu.
Dizendo:
Que a varanda constitui parte comum do prédio, não estando vedado o acesso à mesma para os demais condóminos.
Que na escritura de constituição de propriedade horizontal nada consta acerca da utilização exclusiva da varanda por parte dos autores.
Que a porta ao nível do hall comum do 3.º andar do prédio que dá acesso à varanda, apesar de possuir uma fechadura, até à presente data nunca esteve trancada, a varanda sempre foi limpa pelo condomínio, tendo o réu, inclusivamente suportado o respectivo custo, o mesmo se passando em relação às luzes que iluminam a dita varanda, também estas ligadas às luzes do condomínio.
Que tal sucede com a varanda situada ao nível do primeiro andar do edifício, cujo acesso se encontra vedado por uma porta que dá acesso ao hall comum do primeiro andar, não tendo este facto, até à presente data, originado qualquer litígio entre os autores, o réu e demais condóminos. A questão em apreço já havia sido suscitada na Assembleia do condomínio realizada no dia 12 de Janeiro de 2008 pelo condómino proprietário da fracção I, onde se concluiu que a varanda em causa seria pertença do condomínio, sendo portanto, espaço comum.
Que do projecto apresentado e aprovado pela Câmara Municipal da Nazaré, nada resulta em como a referida varanda pertence à fracção H, resultando da Certidão emitida pela Câmara Municipal junta pelos autores que a fracção H apenas possui uma varanda, com a área de 11,67m2, situada ao nível do 4.º andar do edifício, em momento algum se fazendo qualquer tipo de referência à varanda situada no 3.º andar esquerdo.
Que a atribuição aos autores da propriedade exclusiva da mencionada varanda iria colocar em causa o direito de propriedade da fracção I, uma vez que esta fracção tem, na sala, duas janelas, que deitam directamente para a varanda objecto dos presentes autos.

2.
Prosseguiu o processo os seus legais termos, tendo, a final, sido proferida sentença que:
Julgou a acção totalmente improcedente, por não provada e, em consequência, absolveu o réu dos pedidos.

3.
Inconformados recorreram os autores.
Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:
1. Devem ser alteradas as respostas aos pontos 12 e 19 da matéria que constitui a base instrutória.
2. Devem ser dados como provados os factos constantes dos pontos 12 e 19 da base instrutória.
3. Conforme decorre da lei, o art.º 1421, nº 1 do C.C. elenca quais as partes que são consideradas comuns (imperativamente ou necessariamente comuns), ao passe que o nº 2 daquele preceito contém uma presunção iuris tantum das partes presumidamente comuns.
4. E como o próprio Tribunal recorrido citou, a interpretação do nº 2 do art.1421 do C.C, deu origem a duas teses.
5. Uma delas sufragada por uma jurisprudência já antiga e, segundo melhor opinião, já muito pouco seguida pelos nossos Tribunais, defendia que não se presumem comuns as partes dos prédios que estejam afectadas ao uso exclusivo de um dos condóminos. Só que essa afectação, para ser relevante, tem ela, também, de constar do título constitutivo da propriedade horizontal.
6. E uma outra tese, defendida e utilizada pela maioria da nossa jurisprudência, que preconiza que se do título constitutivo da propriedade horizontal não constar a afectação de parte de um prédio a alguma fracçãoautónoma, a presunção derivada da alínea e) do nº 2, do art.º 1421 do C.C. pode ser ilidida, designadamente se se demonstrar ab initio que essa parte esteve afecta em exclusivo a determinada fracção, não se exigindo que a afectação material conste do respectivo título constitutivo.
7. No que aos presentes autos diz respeito, os recorrentes não têm dúvidas que, actualmente, a jurisprudência maioritária segue e aplica a segunda tese, vide Acórdão do STJ, de 19/05/2009.
8. O supra citado aresto, vai mais longe dizendo que “ se fosse intenção do legislador considerar comuns todas as partes cuja afectação ao uso exclusivo de um dos condóminos não constasse do título, então não faria sentido o nº 2 falar em presunção, bastaria o preceito dizer: «são comuns, salvo menção em contrário no título constitutivo da propriedade horizontal» “.
9. No caso em apreço, discute-se tão só se a varanda do 3º piso está afecta ao uso exclusivo dos condóminos da fracção H ou se, ao invés, é parte comum do edifício condominial.
10. Da prova documental e testemunhal produzida no Tribunal de 1ª Instância, resultou provado que a varanda do 3º piso, dá acesso directo e originário à Fracção H, propriedade dos recorrentes, acedendo-se a esta Fracção H através de uma porta dotada com fechadura, sendo que o acesso a essa varanda é feito por uma porta com fechadura existente à saída do elevador no hall comum correspondente ao 3º andar do prédio. Os apelantes, para acederem à sua fracção têm de passar sempre e obrigatoriamente por aquela varanda, a qual, constitui a única entrada e acesso à referida fracção, sendo que a varanda situada no 4º andar esquerdo não tem qualquer acesso à fracção.
11. A sentença recorrida deu como facto provado que “ desde a data mencionada em 4) e até ao presente, os autores utilizam a varanda mencionada em 7), aí colocando cadeiras, uma mesa e um baú com brinquedos, à vista de toda a gente e sem interrupção”
12. Este facto, aliado ao depoimento do construtor-vendedor da Fracção H, (…) e da testemunha (…), deixou claro e inequívoco que o construtor-vendedor afectou ao uso exclusivo dos recorrentes a varanda situada no 3º piso do prédio, adquirindo estes a posse da respectiva varanda no acto da compra da Fracção H por tradição material do direito de uso efectuado pelo próprio construtor-vendedor e ante possuidor, direito de uso esse que deve ser reconhecido aos recorrentes.
13. A Juiz a quo, salvo melhor opinião, incorre num erro ao não considerar que a Fracção H tem o seu início na porta dotada de fechadura que dá acesso à varanda situada no 3º piso do prédio.
14. Para além da varanda em crise constituir o único acesso directo e originário à Fracção H, sendo utilizada pelos apelantes para acederem à sua Fracção, toda a matéria fáctica vertida nos presentes autos, nomeadamente prova documental e testemunhal, aponta para uma afectação material ab initio da varanda do 3º andar ao uso exclusivo da fracção dos recorrentes.
15. O construtor-vendedor quando vendeu a Fracção H aos recorrentes logo lhes disse que a varanda do 3º piso pertencia à Fracção H, sendo aquela varanda parte integrante do apartamento dos apelantes.
16. Mais, transmitiu apenas aos recorrentes e a mais nenhum condómino a chave de acesso à porta da varanda do 3º piso do prédio. Sendo que o condómino da Fracção I, (…), confirmou em Audiência de Julgamento que não recebeu das mãos do construtor qualquer chave de acesso à porta da varanda do 3º piso.
17. Ao contrário da porta de acesso à varanda do 3º piso, a porta de acesso à varanda do 1º piso não tem nem nunca teve fechadura, uma vez que esta varanda do 1º piso não constitui acesso directo e originário a qualquer fracção do prédio.
18. Esta varanda do 1º andar não serve qualquer fracção do prédio. Esta varanda do 1º piso é pois a única que é susceptível de ser utilizada por qualquer condómino, fazendo por isso, parte do edifício condominial.
19. Os únicos condóminos que receberam a chave da porta de acesso à varanda do 3º piso, foram os apelantes e mais ninguém.
20. Se fosse intenção do construtor-vendedor ou do arquitecto responsável pela planta da propriedade horizontal, tornar aquela varanda do 3º piso adstrita ao uso condominial, com certeza que o construtorvendedor entregaria uma chave da porta dessa varanda a cada condómino.
21. Se não o fez, foi porque considerou aquela varanda de uso exclusivo da fracção H. Se assim não fosse, o construtor-vendedor pelo menos dispensaria mais uma chave da porta daquela varanda ao condómino DB... da fracção I.
22. A testemunha (…), responsável pelo projecto de arquitectura do prédio e responsável pela elaboração da planta da propriedade horizontal, não teve pejo em afirmar que o título constitutivo da propriedade horizontal estava mal feito, continha lapsos e erros e não era uma transposição fiel da planta da propriedade horizontal para o título constitutivo da propriedade horizontal.
23. No que tange a estes erros e lapsos, afirmou a testemunha (…): “ Há qualquer coisa aqui que não está a funcionar” (…) “ o facto de não haver aqui linha, ou fiz isto com caneta de filtro ou há qualquer coisa que não percebo”.
24. “ quem fez a constituição da propriedade horizontal não ligou à planta”. “ quem faz a constituição da propriedade horizontal são imobiliários”. “ Uns ligam aos desenhos outros não”.
25. “Esta propriedade horizontal está mal feita” (…) “ a descrição da propriedade horizontal está mal feita “. (…) “ isto não tem nada a ver com o desenho” (referindo-se à escritura da propriedade horizontal). (…) “ eles fizeram isto aqui, não ligaram ao desenho que estava feito” ( referindo-se também à escritura da propriedade horizontal).
26. A própria ficha técnica da fracção H contém erros e lapsos e até o próprio autor da ficha técnica da fracção H, Sr. Eng.º (…), admitiu em audiência que não sabe a quem é que pertence a varanda do 3º piso.
27. Na sequência de tantos lapsos e erros, trazidos à colação pelas testemunhas atrás referidas, foi requerido, deferido e junto aos autos um relatório técnico elaborado pelo Sr. Eng.º Técnico (…) com o objectivo de verificar se a varanda do 3º piso é parte integrante da fracçãoH, ou se ao invés, é parte comum do edifício.
28. Da análise que o técnico efectuou aos documentos com os sinais nos autos, dúvidas não teve que a fracção H tem como acesso principal a porta de acesso à varanda.
29. Também este técnico detectou erros e lapsos na elaboração das fichas técnicas de habitação, levando a incoerências entre o apresentado no papel e o real, fortalecendo isto a ideia da pertença da varanda em crise à fracção H.
30. Na óptica deste técnico, existem várias incoerências entre as áreas apresentadas quer no projecto aprovado, quer na ficha técnica da habitação, quer na propriedade horizontal.
31. Conclui, sem margem para qualquer dúvida, que feita uma análise exaustiva à documentação com os sinais nos autos, a varanda do 3º piso não tem qualquer enquadramento para ser considerada parte comum do edifício, mas tem antes de ser considerada afecta ao uso exclusivo da fracção H.
32. Em contraposição a este relatório técnico, foi apresentado um outro da autoria da Sr.ª (…), o qual, salvo o devido respeito, é subjectivo, inconclusivo e baseado em factos que não correspondem à realidade.
33. A Sr.ª Arquitecta (…), defende que a varanda em crise teria de ser sempre considerada parte comum, uma vez que a fracção I tem uma sala com uma janela que deita para aquela varanda, sendo que a única entrada de luz e ventilação natural se faz por aquela varanda do 3º Piso.
34. É esta a única argumentação expendida pela Sra. Arquitecta ao longo do seu relatório técnico, para tentar provar que aquela varanda é parte comum.
35. É manifestamente pouco, uma vez que esta técnica não cuidou de cruzar documentação que estava nos autos, explicar cabalmente a que conclusão chegou, nunca procedendo de uma forma exaustiva a uma análise objectiva daqueles documentos, mostrando ao Tribunal a quo através de um raciocínio lógico-matemático a que resultado chegou, e se inclusivamente chegou a um resultado igual ou diferente do relatório elaborado pelo Sr. Eng.º Técnico (…), por forma a poder habilitar abundantemente o Tribunal a quo de factos e conclusões que lhe permitissem, sem margem para qualquer dúvida, concluir que aquela varanda do 3º andar é parte comum do edifício condominial.
36. O único argumento acolhido pelo Tribunal a quo, no que diz respeito a estes dois relatórios técnicos, foi o de que ao dar-se o uso exclusivo daquela varanda aos condóminos da fracção H, punha-se em risco a luminosidade e ventilação naturais da sala da fracção I.
37. Esta argumentação não colhe, uma vez que os condóminos da fracção H nunca poderiam tapar, parcial ou totalmente, a luminosidade e ventilação da sala da fracção I.
38. Se o fizessem, o condómino da fracção I teria ao seu dispor uma panóplia de instrumentos jurídicos, entre os quais se destacam as providências cautelares, no sentido de fazer valer o seu direito.
39. O tribunal a quo ao decidir como decidiu, e baseando-se como se baseou para proferir esta sentença, olvidou a posição dos AA., uma vez que estes também não estão livres de um destes dias ou o próprio condomínio colocar na varanda um qualquer objecto que obstaculize a entrada dos recorrentes na sua fracção, assim como também não estão livres do condómino da fracção I ou outro que lhe venha a suceder no direito, de colocar na varando do 3º piso um ou vários objectos que dificultem sobremaneira a passagem dos recorrentes ou mesmo a sua impossibilidade física de acederem à sua fracção.
40. E isto, decorre tão só do ponto 14 dos factos provados da sentença recorrida, segundo o qual “ A única entrada e acesso que os autores possuem para aceder à sua fracção é feita pela varanda referida em 7), sendo que a varanda situada no 4º andar esquerdo não tem acesso para o exterior da fracção”.
41. A sentença recorrida violou, assim, as disposições legais insertas nos artigos 1305, 1416, nº 2 e 1421, nº 2, alínea E), todos do Código.

Contra-alegou o recorrido terminando com as seguintes conclusões::

1ª- Deve ser mantida a resposta aos pontos 12 e 19 da matéria que constitui a base instrutória;
2ª- O artº. 1421, nº 1 do C.C. elenca quais as partes que são consideradas comuns e o nº 2 do referido artigo contêm uma presunção iuris tantu das partes presumidamente comuns.
As partes próprias de cada fracção, já estão especificadas no título constitutivo, artº. 1418, nº. 1 do C.C.
O artº. 1421 nº. 1 do C.C. determina quais as partes do edifício que são necessária ou forçosamente comuns, (solo, alicerces, colunas, pilares, paredes mestras e todas as restantes que constituem a estrutura do edifício, o telhado, ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso de qualquer fracção, as entradas, vestíbulos, escadas e corredores de uso ou passagem comum a dois ou mais condóminos e as instalações gerais de água, electricidade, aquecimento, ar condicionado, gás, comunicações e semelhantes (nº 1).
O nº. 2 do artº 1421 do C.C., refere as partes que se presumem comuns, pátios e jardins anexos ao edifício, ascensores, dependências destinadas ao uso do porteiro, as garagens e outros lugares de estacionamento e em geral as coisas que não sejam afectas ao uso exclusivo de um dos condóminos.
O nº. 3 do artº. 1421 do C.C., permite que o titulo constitutivo afecte ao uso exclusivo de um condómino certas zonas das partes comuns;
3ª - A interpretação do nº 2 do artº. 1421 do C.C. deu origem a duas teses;
4ª -Uma delas defende que não se presumem comuns as partes dos prédios que estejam afectas ao uso exclusivo de um dos condóminos, sendo que para essa afectação ser relevante tem de constar do título constitutivo da propriedade horizontal;
5ª- A outra tese defende que se do título constitutivo da propriedade horizontal não constar a afectação de parte do prédio a alguma fracção autónoma, a presunção derivada da alínea e) do nº 2 do artº. 1421, pode ser ilidida se se demonstrar que ab initio que essa parte esteve afecta em exclusividade e determinada fracção, não se exigindo que a afectação material conste do respectivo título constitutivo;
6ª- Da prova documental, testemunhal e inspecção judicial, com registo fotográfico, produzida no Tribunal a quo, resultou provado que a varanda do 3º piso, dá acesso directo e originário à fracção H;
7ª-Acede-se a essa varanda a partir do hall comum do 3º andar;
8ª- Os apelantes para acederem à sua fracção têm de passar por aquela varanda.
9ª- Após a emissão do alvará de utilização não foi solicitada mais qualquer alteração do edifício e a varanda de acesso à fracção “H”, não se encontra descrita na Câmara Municipal da Nazaré como fazendo parte integrante daquela fracção.
10ª- A varanda do 3º andar esquerdo sempre foi limpa pelo condomínio;
11ª- As luzes que acendem através de sensor estão ligadas às restantes luzes do condomínio;
12º- A porta de acesso à varanda situada no hall comum do 3º andar nunca esteve trancada nem fechada à chave, tal como acontece com a varanda situada ao nível do primeiro andar do edifício (e que não dá acesso a qualquer fracção).
13ª-Apesar de se ter provado e muito bem, que: “desde a data referida em 4) e até ao presente, os autores utilizam a varanda mencionada em 7) ai, colocando cadeiras, uma mesa e um baú com brinquedos à vista de toda a gente e sem interrupção.
14ª-Não ficou provado que os autores / apelantes, utilizavam a varanda com exclusão de outrem;
15ª Aliás, provou-se exactamente o contrário, tanto assim é que, a manutenção da referida varanda sempre foi efectuada pelo condomínio e a luz que é utilizada nesse local, era e é, gerada através do sistema de luz, pertença do condomínio;
16ª – É irrelevante o facto do construtor vendedor da fracção H, (…), aquando da aquisição da fracção por parte dos autores, lhe ter transmitido, (verbalmente), que a varanda mencionada fazia parte daquela fracção, uma vez que tal circunstancialismo não pode ser oposto ao restantes condóminos, constituindo res inter alia acta.
17ª- A propriedade horizontal foi constituída antes da celebração da escritura pública da fracção H e não o contrário;
18ª – A Meritíssima Juiz a quo não incorreu em qualquer erro ao não considerar que a fracção H tem o inicio na porta dotada de fechadura que dá acesso à varanda situada no 3º piso;
19ª – Os autores / apelantes nunca tiveram a afectação material ab initio da varanda do 3º piso, pois como já foi dito na conclusão nº 17, a propriedade horizontal foi constituída antes da celebração da escritura pública da fracção H e não o contrário;
20ª- Não têm qualquer fundamento as conclusões dos apelantes pois,
21ª- A douta sentença não padece dos vícios que lhe foram apontados pelos apelantes, antes merecendo ser integralmente confirmada.

4.
Sendo que, por via de regra: artºs 684º e 685º A do CPC - de que o presente caso não constitui excepção - o teor das conclusões define o objecto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes:

1ª - Alteração da decisão sobre a matéria de facto.
2ª – Natureza jurídica da varanda do 3º piso: comum ou pertença da fração dos autores.
5.
Apreciando.
5.1.
Primeira questão.
5.1.1.
Há que considerar que no nosso ordenamento vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, e fixa a matéria de facto em sintonia com a sua prudente convicção firmada acerca de cada facto controvertido -artº655º do CPC.
Perante o estatuído neste artigo pode concluir-se, por um lado, que a lei não considera o juiz como um autómato que se limita a aplicar critérios legais apriorísticos de valoração.
Mas, por outro lado, também não lhe permite julgar apenas pela impressão que as provas produzidas pelos litigantes produziram no seu espírito.
Antes lhe exigindo que julgue conforme a convicção que aquela prova determinou e cujo carácter racional se deve exprimir na correspondente motivação cfr. J. Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, 3º, 3ªed. 2001, p.175.
Na verdade prova livre não quer dizer prova arbitrária, caprichosa ou irracional.
Antes querendo dizer prova apreciada em inteira liberdade pelo julgador, sem obediência a uma tabela ditada externamente, posto que em perfeita conformidade com as regras da lógica e as máximas da experiência – cfr. Alberto dos Reis, Anotado, 3ª ed. III, p.245.
5.1.2.
Por outro lado há que ter em conta que as decisões judiciais não pretendem constituir verdades ou certezas absolutas.
Pois que às mesmas não subjazem dogmas e, por via de regra, provas de todo irrefutáveis, não se regendo a produção e análise da prova por critérios e meras operações lógico-matemáticas.
Assim: «a verdade judicial é uma verdade relativa, não só porque resultante de um juízo em si mesmo passível de erro, mas também porque assenta em prova, como a testemunhal, cuja falibilidade constitui um conhecido dado psico-sociológico» - Cfr. Ac. do STJ de 11.12.2003, dgsi.pt, p.03B3893.
Acresce que a convicção do juiz é uma convicção pessoal, sendo construída dialeticamente, para além dos dados objetivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, nela desempenhando uma função de relevo não só a atividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis e mesmo puramente emocionais AC. do STJ de 20.09.2004 dgsi.pt.
Efetivamente, com a produção da prova apenas se deve pretender criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente num grau de probabilidade o mais elevado possível, mas em todo o caso assente numa certeza relativa, porque subjetiva, do facto. – cfr. Acórdão desta Relação de 14.09.2006, dgsi.pt, citando Antunes Varela.
Uma tal convicção existirá quando e só quando o Tribunal tenha logrado convencer-se da verdade dos factos para além de toda a dúvida razoável.- Cfr. Figueiredo Dias, in Dto. Processual Penal I Pág. 205.
Nesta conformidade - e como em qualquer atividade humana - existirá sempre na atuação jurisdicional uma margem de incerteza, aleatoriedade, e, até, falibilidade, vg. no que concerne á decisão sobre a matéria de facto.
Mas tal é inelutável e está ínsito nos próprios riscos decorrentes do simples facto de se viver em sociedade onde os conflitos de interesses e as contradições estão sempre, e por vezes exacerbadamente, presentes, havendo que conviver - se necessário até com laivos de algum estoicismo e abnegação - com esta inexorável álea de erro ou engano.
O que importa, é que se minimize o mais possível tal margem de erro.
O que passa, tendencialmente, pela integração da decisão de facto dentro de parâmetros admissíveis em face da prova produzida, objetiva e sindicável, e pela interpretação e apreciação desta prova de acordo com as regras da lógica e da experiência comum.
É que a verdade que se procura, não é, nem pode ser, uma verdade absoluta -porque assente em premissas de cariz matemático-, mas antes uma verdade político-jurídica, a qual é consecutida se a sentença convencer os interessados diretos: as partes – e, principalmente, a sociedade em geral, do seu bem fundado: isto é, a sentença valerá acima de tudo se for validada e aceite socialmente.
5.1.3.
Nesta perspetiva há que considerar que a garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto não subverte, nem pode subverter, o princípio da livre apreciação das provas, nem pode significar a desvalorização da sentença de 1ª instância, que passaria a ser uma espécie de "ensaio" do verdadeiro julgamento a efetuar pelo Tribunal da Relação.
Na verdade e como dimana do preâmbulo do Dec-Lei nº 39/95, de 15 de Fevereiro: «a intenção do legislador, ao permitir um «2º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, não é a pura e simples repetição das audiências perante a Relação, mas mais singelamente, a deteção e correção de concretos, pontuais e claramente apontados e fundamentados erros de julgamento» - Acs. do STJ de 02.12.2008 e de 05.09.2011, dgsi.pt, ps. 08A3489 e 455/07.2TBCCH.E1.S1.
A função do Tribunal da 2ª Instância deverá circunscrever-se a "apurar a razoabilidade da convicção probatória do 1º grau dessa mesma jurisdição face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos - Ac. do Trib. Constitucional de 3.10.2001, in Acórdãos do T. C. vol. 51º, pág. 206 e sgs e Ac. da Rel. de Lisboa de 16.02.05, dgsi.pt.
«Assentando a decisão recorrida na atribuição de credibilidade a uma fonte de prova em detrimento de outra, com base na imediação, tendo por base um juízo objectivável e racional, só haverá fundamento válido para proceder à sua alteração caso se demonstre que tal juízo contraria as regras da experiência comum» -Ac. da Relação de Coimbra de 18.08.04, dgsi.pt.
Neste contexto, em recurso compete apenas sindicar a decisão naquilo em que de modo mais flagrante se opuser à realidade, pois há que pressupor que a imediação e a oralidade dão um crédito de fiabilidade que se presume já que por virtude delas na formação da convicção do julgador entram, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova e factores que não são racionalmente demonstráveis – Ac. do STJ de 19.05.2010, dgsi.pt, p. 696/05.7TAVCD.S1.
Sendo que estes princípios permitem ainda uma apreciação ética dos depoimentos - saber se quem depõe tem a consciência de que está a dizer a verdade -, mais importante do que a validade científica dos mesmos, pois que o julgador pode não estar habilitado a avaliá-los nesta vertente –Acs. do STJ de 19.05.2005 e de 23-04-2009 dgsi.pt., p.09P0114.
5.1.4.
Impetram os recorrentes, em sede de conclusões, que seja dado como provado os pontos 12 e 19 da base instrutória.
Mas nos autos inexiste BI a qual o juiz se absteve de organizar por considerar que a matéria de facto controvertida se reveste de simplicidade – cfr. fls.123.
E ainda que menos bem tenha andado o julgador pois que o caso não é de simplicidade que permitisse tal omissão, certo é que tal peça processual inexiste.
Tanto assim que as respostas foram dadas não por referencia a artºs da BI mas antes a artigos dos diversos articulados – BI, contestação e resposta á contestação.
Vistas as sua alegações, conclui-se que tal menção à BI se deveu a lapso material, pois que no corpo daquelas eles se reporta aos artº 12 e 19 da petição inicial – PI -.
Os quais têm o seguinte teor:
- Artigo 12º da P.I.
“ Ficando esta varanda, sem acesso por outro lado, que não através da fracção H, de que é um complemento natural”.
- Artigo19º da P.I.
“ Varanda esta que não tem mais nenhum acesso directo, que não seja pela fracção dos AA..”
Para tanto e relativamente aos aludidos pontos de facto aduziu o depoimento de (…)
Já a Sra. Juiza considerou tais factos como não provados: «face à ausência de qualquer prova segura da sua veracidade por quem lhe incumbia segundo as regras de distribuição do ónus de prova…resultou dos depoimentos conjugados das testemunhas (…) bem como das plantas remetidas pela Câmara Municipal e juntas aos autos que não é a varanda em causa nos autos que não tem outro acesso a não ser pela fracção H mas sim que é esta fracção que não tem acesso por outro local que não através da referida varanda, impondo-se assim que se considerassem tais factos como não provados.»
Vejamos.
Bem vistas as coisas, o que, com tais asserções, os autores querem dizer, é que no sentido contrário ao da entrada na varanda através da porta que, junto ao patamar do 3º piso do prédio lhe concede acesso, ou seja, no sentido da sua fração para a saída, não existe qualquer outra entrada ou acesso direto que não seja através da porta seu duplex,
É, em certa medida, o verso e o reverso da mesma moeda, com relação ao facto de a fração em causa não ter acesso por outro local que não através da única porta junto ao aludido patamar que permite a entrada na referida varanda.
E, efetivamente, o acervo factual dos artigos, expurgado do pormenor conclusivo ínsito na parte final do 12º, provou-se.
Desde logo porque se apurou que, no sentido da entrada para a sua fração, o acesso direto à varanda apenas se faz por uma única porta.
Depois porque outrossim se apurou – quer pelas declarações das testemunhas quer pelo teor dos documentos juntos, vg. fls. 407 e 463 e sgs - que a varanda «ficou vedada por muro».
Ou seja, trata-se de um espaço fechado ao qual apenas se poderá ter acesso por aberturas determinadas.
E quais são estas aberturas? No sentido da entrada na fração, e como se disse, a aludida porta junto ao do 3º piso. No sentido da saída, a porta da entrada da sala da casa dos autores.
Na verdade e considerando a arquitetura do prédio, apenas ou com maior probabilidade, a fração I poderia ter tal acesso direto.
Todavia purou-se que, não obstante no projeto arquitetónico inicial, estar prevista a existência de uma janela sacada para a fração I, esta apenas possui, no nível 3 que deita para a varanda, um vão somente para entrada de luz e que dista cerca de 40 cm do solo da mesma – pontos 19, 20 e 21 dos factos assentes.
Ou seja, tudo visto e ponderado tem de concluir-se, logica e razoavelmente, que no sentido da saída da fração dos autores, apenas através da porta da sala desta se tem acesso direto e linear ao espaço da varanda.
Naturalmente que, em termos de possibilidades das leis da física, é congeminável a possibilidade de outros acessos forçados, como seja através cordas, de escadas amovíveis, ou, desde logo, através do vão da fração I.
Mas tal nunca será um acesso direto, ou seja, um acesso efetivado linearmente e sem qualquer tipo de resistência ou necessidade de esforço adicional para ultrapassar obstáculo.
Acesso este que, obviamente, é o único que está ínsito no teor do alegado nos artºs 12 e 19.
Procede, assim, no essencial, a presente pretensão modificativa, pelo que aos pontos factuais mencionados se concede a seguinte resposta conjunta:
Provado que, no sentido da saída da fração dos autores para o patamar do 3º piso, inexiste outro acesso direto ao espaço da varanda que não seja pela porta de entrada de tal fração.
5.1.5.
Decorrentemente os factos a considerar são os seguintes:
1) A titularidade da fracção autónoma designada pela letra “H” do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Rua (…) concelho da Nazaré, composto por cave, rés-do-chão, primeiro, segundo, terceiro e quarto andares, inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Nazaré sob o número x... e descrito na Conservatória do Registo Predial da Nazaré sob o n.º z... encontra-se registada a favor dos autores mediante a Ap. 6 de 26/06/2006, por compra a “(…).”, (cfr. doc. de fls. 8 e ss cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) (resp. art.1.º p.i.).
2) Por escritura pública lavrada no Cartório Notarial da Nazaré em 28/07/2005, a fls. 1 a 10 do Livro de Notas 20-E, (…), na qualidade de únicos sócios e gerentes em representação da sociedade comercial denominada (…)”, declararam “(…) Que à sociedade sua representada pertence um prédio urbano, sito na Rua (…) concelho de Nazaré, onde esteve em construção um edifício de cave, rés-do-chão, primeiro, segundo, terceiro e quarto andares
(…). (…) Que pela presente escritura e pelo facto do edifício satisfazer os requisitos legais, submetem-no ao regime da propriedade horizontal com a constituição de dez fracções autónomas, independentes, distintas, isoladas entre si e com saída própria para a via pública ou para uma parte comum do edifício e desta para a via pública, cuja individualização e fixação dos respectivos valores relativos em permilagem constam de um documento complementar elaborado (…), que fica a fazer parte integrante desta escritura que arquivo e do qual dispensam a leitura (…)”, e no qual a Fracção H consta identificada como “Terceiro e quarto andares esquerdos, em duplex, destinada a habitação, composta no terceiro andar por uma sala, um quarto uma cozinha, um hall, uma casa de banho, e no quarto andar por três quartos, um hall, duas casas de banho, com a área de cento e três vírgula setenta e oito metros quadrados, efectuando-se o acesso entre pisos por umas escadas interiores de ligação, uma varanda com a área de onze vírgula sessenta e sete metros quadrados, sendo pertença desta fracção uma arrecadação com a área de quatro vírgula setenta metros quadrados, situada na cave e identificada com a mesma letra da fracção, e um lugar de estacionamento para viatura ligeira com a área de onze metros quadrados, situado no rés do chão e identificado igualmente com a mesma letra da fracção, somando tudo a área total de cento e trinta e um vírgula quinze metros quadrados, com o valor relativo atribuído de cento e trinta e oito mil do total do edifício. (…)” e que “São partes comuns a todas as fracções, em geral, as determinadas na lei aplicável ao regime de propriedade horizontal que não sejam afectas ao uso exclusivo de qualquer uma delas”, e ainda que a referida propriedade horizontal se encontra registada na Conservatória do Registo Predial da Nazaré mediante a Ap. 9, de 08/03/2005, (cfr. docs. de fls. 20 a 29 e 17 e ss., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (resp. art.2.º p.i.).
3) A dita fracção H inscrita na matriz predial urbana da freguesia da Nazaré, sob o n.º x..., é composta pelo terceiro e quarto andares esquerdos, em duplex, destinado a habitação, sendo pertença desta fracção uma arrecadação situada na cave identificada com a mesma letra da fracção e um lugar de estacionamento para viatura ligeira situado no rés-do-chão e identificado igualmente com a mesma letra da fracção, (cfr. doc. de fls. 8 e ss cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.). (resp. art.3.º p.i.).
4) Por escritura pública lavrada em 29/06/2006, no Cartório Notarial de Leiria do Notário AT..., a fls. 141 a 143 do Livro de notas para Escrituras Diversas 57-A, verso, (…) na qualidade de procurador e em representação da sociedade comercial por quotas “(…) declarou vender, e a autora, casada com E (…) sob o regime de comunhão de adquiridos, declarou comprar, pelo preço de 150.000,00€ “(…) a fracção autónoma designada pela letra “H” – terceiro e quarto andares esquerdos, duplex, destinado a habitação, sendo pertença desta fracção uma arrecadação situada na cave e identificada com a mesma letra da fracção e um lugar de estacionamento para viatura ligeira situado no rés-do-chão identificado igualmente com a mesma letra da fracção, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito em Rua (…) da Nazaré, inscrito na matriz sob o artigo y..., com o valor patrimonial tributário de 152.880,00€, descrito na Conservatória do Registo Predial deste concelho sob o número dois mil oitocentos e noventa e três/Nazaré, e aí registado o título constitutivo da propriedade horizontal pela inscrição F apresentação nove de três de Agosto de dois mil e cinco, e a aquisição registada a favor da vendedora pela inscrição G apresentação dois de quinze de Abril de dois mil e quatro. (…)”, (cfr. doc. de fls.32 a 36, cujo teor aqui se dá por reproduzido). (resp. art.4.º p.i.).
5) Desde a data mencionada em 4), os autores ocupam a fracção aí referida, ignorando lesar direitos de outrem, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja e praticando todos os actos próprios de um proprietário (resp. art.5.º p.i.).
6) De acordo com a planta apresentada na Câmara Municipal da Nazaré anexa ao projecto de arquitectura, constante de fls. 372 dos autos, existe uma varanda situada ao nível do 3.º piso (resp. art.30.º p.i.).
7) Em conformidade, quer com a planta aprovada e apresentada pelo empreiteiro construtor do imóvel junto da Câmara Municipal da Nazaré quer pela ficha técnica da habitação, foi construída, no terceiro andar esquerdo, uma varanda com a área de cerca de 11, 67m2, igual à varanda que existe imediatamente por cima desta, no quarto andar esquerdo (resp. art.6.º e 7.º p.i.).
8) A varanda mencionada em 7) ficou vedada por muro, de acordo com o projecto aprovado pela Câmara Municipal da Nazaré (resp. art.17.º p.i.).
9) Nos termos da certidão emitida pela Câmara Municipal da Nazaré constante de fls. 275 dos autos relativa ao prédio mencionado em 1) consta que, “(…) Após a emissão do alvará de autorização de utilização não foi solicitada mais qualquer alteração do edifício no âmbito do Proc. n.º20/2003. 3.De acordo com os elementos constantes do processo n.º 20/2003, a varanda de acesso à fracção “H” não se encontra descrita como fazendo parte integrante da dita fracção. Com efeito a fracção “H” apenas possui na sua descrição uma varanda que se situa no nível 4. Desconhece-se contudo se foi efectuada alguma alteração posterior à propriedade horizontal (…)”(resp. art.16.º, 17.º e 20.º contestação).
10) A varanda do 4.º andar esquerdo faz parte integrante da fracção H. (resp. art.15.º p.i.).
11) A varanda mencionada em 7) dá acesso directo e originário à Fracção H, acedendo-se a esta fracção através de uma porta dotada com fechadura. (resp. art.8.º e 10.º p.i.).
12) No hall comum correspondente ao 3.º andar do prédio, à saída do elevador, existe uma porta com fechadura que dá acesso à varanda mencionada em 7). (resp. art.9.º p.i.).
13) Os autores para acederem à sua sala que se situa logo após a transposição da porta referida em 11) têm de passar sempre e obrigatoriamente por essa varanda. (resp. art.18.º p.i.).
14) A única entrada e acesso que os autores possuem para aceder à sua fracção é feita pela varanda referida em 7), sendo que a varanda situada no 4.º andar esquerdo não tem qualquer acesso para o exterior da fracção. (resp. art.4.º e 5.º resp. cont.).
14-A)- no sentido da saída da fração dos autores para o patamar do 3º piso, inexiste outro acesso direto ao espaço da varanda que não seja pela porta de entrada de tal fração.
15) Desde a data mencionada em 4) e até ao presente, os autores utilizam a varanda mencionada em 7), aí colocando cadeiras, uma mesa e um baú com brinquedos, à vista de toda a gente e sem interrupção. (resp. art.5.º p.i.).
16) Aquando da aquisição da fracção H, o vendedor transmitiu aos autores que a varanda mencionada em 7) fazia parte daquela fracção. (resp. art.22.º p.i.).
17) A chave da porta referida em 12) foi entregue aos Autores pelo construtor e vendedor do prédio. (resp. art.17.º resp. cont.).
18) A porta mencionada em 12) nunca foi fechada à chave nem nunca esteve trancada. (resp. art.7.º contestação e 18.º resp. cont.).
19) A sala da fracção “I” possui um vão no nível 3 que deita para a varanda referida em 7), constituindo esse vão a única entrada de luz da referida sala. (cfr. fotografia n.º5 de fls.465, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.). (resp. art.24.º contestação).
20) No projecto arquitectónico inicial, no lugar onde foi construído o vão mencionado em 19) estava prevista a existência de uma janela sacada. (resp. art.35.º resp. cont.).
21) O vão referido em 19) dista cerca de 40 cm do solo da varanda. (resp. art.36.º e 37.º resp. cont.).
22) A varanda mencionada em 7) sempre foi limpa pelo condomínio. (resp. art.9.º contestação).
23) As luzes que iluminam a varanda mencionada em 7) acendem através de sensor. (resp. art.25.º resp. cont.).
24) As luzes que iluminam a varanda mencionada em 7) estão ligadas às restantes luzes do condomínio. (resp. art.10.º contestação).
25) Tal como acontece com a varanda situada ao nível do primeiro andar do edifício. (resp. art.11.º contestação).
26) O acesso à varanda situada ao nível do primeiro andar é feito através de uma porta situada ao nível do hall comum do primeiro andar. (resp. art.12.º contestação).
27) A varanda situada ao nível do primeiro andar não dá acesso a qualquer fracção autónoma. (resp. art.29.º resp. cont.).
28) A varanda situada no 1.º andar, ao contrário da varanda do 3.º andar esquerdo não possui fechadura. (resp. art.28.º resp. cont.).
29) Para aquisição da fracção mencionada em 4), os autores necessitaram de financiamento bancário, para suportar o pagamento do preço de aquisição, o qual foi concedido pelo Banco Santander Totta, SA. (resp. art.51.º e 52.º p.i.).
30) O referido financiamento foi concedido pelo Banco Santander Totta, SA, englobando o valor da varanda mencionada em 7) como fazendo parte da fracção “H”. (resp. art.53.º p.i.).
31) Consta da Acta n.º 4 da Assembleia-Geral de condóminos do prédio mencionado em 1), que constitui fls. 78 e ss dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, realizada no dia 12/01/2008, na qual estavam presentes o autor e os condóminos (…) na qualidade de proprietário da fracção “B”, (…), na qualidade de proprietário da fracção “F”, e (…), na qualidade de proprietário da fracção I, que “pelo Sr. (…) proprietário da fracção “I”, foi colocada em discussão a propriedade de uma varanda que se encontra ao nível do 3.º andar do prédio, pretendendo-se esclarecer se a supra mencionada varanda pertence ao condomínio ou se a mesma seria de uso exclusivo da fracção “H”, propriedade do condómino E (…) uma vez que o mesmo reclamava a propriedade da mesma. (…)”, e que “Na reunião foram apresentados vários documentos: a ficha técnica da fracção “H”, onde consta que a referida fracção tem início na referida varanda e ainda, a escritura de propriedade horizontal e o respectivo documento complementar, onde se verificou que nada consta acerca da referida varanda, pelo que a mesma, será considerada de uso comum ao prédio. (…)”.(resp. art.14.º e 15.º contestação).
32) Nos termos do documento que constitui fls.97 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, a administradora do condomínio do prédio mencionado em 1), procedeu à «Convocatória para Assembleia-Geral Extraordinária de Condóminos» para “Discussão da seguinte ordem de trabalhos: 1. Acção judicial intentada contra o condomínio. Informam-se os condóminos que a acção judicial intentada contra o condomínio foi interposta pelo condómino E (…) e destina-se ao reconhecimento da propriedade da varanda que dá acesso à sua fracção. (…)” (resp. art.9.º resp. cont.).

5.2.
Segunda questão.
5.2.1.
Estatui o art.1418.º do CC:
1. No título constitutivo serão especificadas as partes do edifício correspondentes às várias fracções, por forma a que estas fiquem devidamente individualizadas, e será fixado o valor relativo de cada fracção, expresso em percentagem ou permilagem, do valor total do prédio.

Perante este segmento normativo «colhe-se que as partes comuns não têm que ser especificadas no título constitutivo da propriedade horizontal, sendo delimitadas por exclusão de partes; A regra é a de que tudo que não estiver descrito no título constitutivo como parte própria é propriedade comum dos condóminos» - AC. da Relação de Lisboa de 14.04.2005, dgsi.pt, p. 2043/2005-6.
Por seu turno o artº 1421º estabelece, no seu nº1, as partes imperativamente comuns e, no nº2, as partes presumidamente comuns.
Em causa está a al.e) deste nº2, a qual se assume como residual ou genérica e na qual se prescreve que se presumem comuns, «em geral, as coisas que não sejam afectadas ao uso exclusivo de um dos condóminos»
Tal como bem se expende na sentença, estamos perante uma: «presunção iuris tantum (suscetível de ser ilidida mediante prova em contrário, isto é, desde que se prove que os referidos elementos foram atribuídos pelo título constitutivo da propriedade horizontal a um ou alguns dos condóminos, ou adquiridos por estes através de atos possessórios)…
Portanto e quanto às partes comuns, o legislador distingue aquelas que são insuscetíveis de apropriação privativa de todas as outras partes que serão próprias se um condómino provar – a presunção estabelecida inverte o ónus da prova – que há uma afetação da coisa ao seu domínio exclusivo.»
De entre as duas teses, bem explanadas na sentença, em que a primeira, defende que referida afetação é uma afetação formal que tem, necessariamente, de constar no título constitutivo – Sandra Passinhas, in “A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, 2.ª Edição, Almedina, 2006, p. 43/44 - e em que a segunda sustenta que apenas se exige uma afetação material, uma destinação objetiva, corrobora-se, sem margem para dúvidas, esta última – Ac. do STJ de 19.05.2009, dgsi.pt, p. 1793/05.4TBFIG.C1.S1 e outros arestos nele cits.
Na verdade se o legislador quisesse excluir da comunhão presumida apenas aquelas coisas cujo uso exclusivo estivesse afecto a um dos condóminos no título constitutivo da propriedade horizontal, teria utilizado uma outra fórmula legal do género São comuns salvo menção em contrário no título constitutivo da propriedade horizontal(…)” e não foi essa a fórmula utilizada.
E se assim não fosse, hipervalorizar-se-ía o título constitutivo, o qual até poderá ser lavrado com erro ou desconformidade com os projetos aprovados, sem que tal, atempadamente, se descortine – hipótese que, in casu, não é, de todo, descabida, dada uma certa confusão que grassou em todo o processo, designadamente oriunda de o título não ter acolhido o plasmado no projeto de fls. 407 no qual se indicava a fração H como iniciando-se no princípio do espaço da varanda o que o respetivo autor justificou em audiência, mas sem justificação plausível, como mero erro – e quasi se esvaziaria de conteúdo o teor do nº2 do artº 1421, dada a extrema dificuldade de ilisão da presunção nele consagrada.
Assim: «A exigência legal de escritura pública, havendo acordo de todos os condóminos, para a alteração do título constitutivo da propriedade horizontal respeita apenas à forma e declarações de vontade exigíveis para a alteração negocial da propriedade horizontal … esta exigência não pode impedir o funcionamento das normas legais atinentes à usucapião…se houver inversão do título de posse, que exige que os actos materiais capazes de conduzir à usucapião signifiquem inequivocamente que quem detém a coisa em nome alheio quer passar a possui-la só para si» - Ac. da Relação de Lisboa de 20.11.2007, dgsi.pt, p. 5404/2007-7.
Por outro lado, mais do que a afetação exclusiva, ou, no mínimo, para densificação do conceito de afetação exclusiva, importa atentar na utilidade funcional, no proveito objetivo que pode decorrer do uso da parte em questão.
Se tal utilidade ou proveito puder ser retirada por mais do que um condómino, a parte em questão não pode deixar de ser considerada comum.
Ao invés: «se o proveito (objectivo) se referir a um só dos condóminos nada impedirá já que a parte do edifício em causa integre a propriedade exclusiva da respetiva fração» - P. Lima e A. Varela, CC Anotado, 3º, 1972, p.364.
Efetivamente: «O que releva para efeito de os vestíbulos serem partes comuns do edifício não é o seu efectivo ou permanente uso ou utilização para passagem por dois ou mais condóminos, antes será a simples potencialidade ou possibilidade de tais uso ou passagem situação que naturalmente se presume face às regras de experiência…» - Ac. do STJ de 22.01.2004, dgsi.pt, p. 03B3615.
Obviamente que a utilidade ou proveito a considerar tem de ser minimamente relevante e atendível e não apenas decorrente de capricho ou atinente a interesse minudente e sem dignidade para ser jurisdicionalmente considerado e tutelado, máxime se for conflituante com outro de maior dignidade.
5.2.2.
No caso vertente a Sra Juíza considerou que a varanda é parte comum do prédio, e consequentemente, indeferiu a pretensão dos autores porque: «… da identificação da fracção H constante do título constitutivo da propriedade horizontal se verifica que a mesma apenas possui uma varanda, a qual corresponde à varanda do 4.º andar, que dela faz parte integrante.
Por outro lado…esta sempre se deveria ter por legalmente presumida nos termos da alínea e) do n.º2 do art.1421.º do CC porquanto se presumem comuns as coisas que não estejam afectadas ao uso exclusivo de um dos condóminos…
e o facto da varanda constituir o único acesso directo e originário à sua fracção, sendo utilizada pelos autores para a ela aceder não é suficiente para, por si só, afastar a presunção estabelecida no art.1421.º, n.º2, alínea e) do CC e concluir-se que a mesma está afectada ao uso exclusivo dos autores, desde logo porque a realidade objectiva que existia à data da constituição da propriedade horizontal e continua a existir é a de que o acesso à mesma se faz por uma porta, a partir de uma parte comum do prédio».
Todavia e algo antagonicamente expende, citando o Acórdão da Relação de Lisboa, de 02/07/2009,dgsi.pt, p. 4404/08-2: «a destinação objectiva de uma coisa presumidamente comum a uma fracção autónoma do prédio torna-a própria do proprietário da fracção o que há-de aferir-se pela estrutura objectiva, pela situação dela, como por exemplo pela circunstância de o único acesso a tal parte ter de se processar pelo acesso forçoso e necessário à fracção ou qualquer outra circunstância juridicamente relevante.» (sublinhado nosso)
E continuando a discorrer ainda, acertadamente que: «A destinação objectiva transfere ab initio a dominialidade desses espaços comuns para os adquirentes das fracções, sem necessidade da alegação e prova dos factos caracterizadores da posse, designadamente através de eventual inversão do título de posse nos termos do art.1406.º do CC já que se não pode falar verdadeiramente em mero uso permitido pelos restantes condóminos.».
Não obstante, a Sra Juíza entendeu que no caso vertente tal doutrina não tinha aplicação porque: «a propriedade horizontal foi constituída antes da celebração da escritura pública de compra e venda da fracção e não o contrário. Por outro lado, aquando da construção do prédio o construtor não afectou a varanda àquela fracção, tanto assim é que nem sequer colocou instalação eléctrica individualizada, isto é, ligada directamente ao quadro eléctrico da fracção, limitando-se apenas a entregar uma chave que dá acesso à varanda (mas sempre teria que o fazer sob pena dos autores poderem não vir a ter acesso ao interior da fracção).
Apenas se provou que desde a compra da fracção e até ao presente, os autores utilizam a varanda em causa, aí colocando cadeiras, uma mesa e um baú com brinquedos, à vista de toda a gente e sem interrupção.»
5.2.3.
Mas, salvo o devido respeito, não se corrobora tal entendimento.
Primus porque, como se viu, o facto de ela não constar no título constitutivo como pertença da fração H não é óbice à ilisão da presunção de comunicabilidade prevista na al.e) do nº2 do artº 1421º.
Nem o facto de a compra ser posterior à constituição da propriedade horizontal impede se considere a destinação objetiva de uma coisa presumidamente comum à esfera jurídico-patrimonial de um certo condómino, pois que tal exigência de anterioridade não resulta da lei, nem a mesma é, razoavelmente, de impor, até porque tal implicaria que a ilisão da presunção de comunicabilidade com base naquela destinação se tornaria meramente académica ou platónica, pois que, por via de regra ou até na esmagadora maioria dos casos, as aquisições são posteriores à constituição da propriedade horizontal.
O que importa é averiguar se tal destinação objetiva emerge dos factos apurados.
E tal verifica-se no caso vertente, desde logo atentos os factos provados nos pontos 8 a 17, relevando de entre estes, determinantemente que a única entrada e acesso que os autores possuem para aceder à sua fracção é feita pela varanda, que no sentido da saída da fração dos autores para o patamar do 3º piso, inexiste outro acesso direto ao espaço da varanda que não seja pela porta de entrada de tal fração, que, desde que compraram a casa e até ao presente, os autores utilizam a varanda aí colocando cadeiras, uma mesa e um baú com brinquedos, à vista de toda a gente e sem interrupção, que aquando da aquisição da fracção H, o vendedor transmitiu aos autores que a varanda fazia parte da mesma, tanto assim que ele lhes entregou a chave da porta que dá entrada na varanda.
Perante tal acervo fatual há que convir que o seu valor probatório no sentido defendido pelos recorrentes não é infirmado por outros fatos de menor dignidade e significado que, em certa medida, são relativamente antagónicos como seja a instalação eléctrica da energia consumida na varanda não estar ligada directamente ao quadro eléctrico da fracção.
Secundus porque mais do que a exclusividade do uso, tout court, no sentido literal e imediatista da expressão, deve valer e prevalecer o seu alcance último, a sua essência e a sua ratio e teleologia.
Para o que importa, de sobremaneira, atentar na utilidade ou proveito que se pode retirar de tal uso e a relevância dos mesmos.
Assim, mesmo que o uso não seja, em absoluto, e naquele primeiro e perfunctório sentido, exclusivo, importa atender nas utilidades que de tal fruição podem ser retiradas por quem necessária, impreterível, assídua, ou, no mínimo, normalmente, utiliza o espaço; e no proveito que pode advir para aqueles que, potencial, esporádica ou excecionalmente, também podem fruir do espaço, e com que fito ou objetivo.
No caso sub judice os autores necessitam, inelutável, necessária, e diariamente, de passar para a varanda para entrar na sua casa.
Conclui-se assim que a única, ou pelo menos, primordial, relevante e atendível, função de tal espaço é proporcionar o acesso à casa dos demandantes.
Não se alcançando para qualquer outro condómino qualquer utilidade ou proveito, com dignidade e/ou relevância e, assim, a considerar, que justifique ele ali passar.
Até porque se provou, nesta instancia recursiva, que, para além da porta do patamar do 3º andar que permite a entrada na varanda, apenas pela porta da entrada da sala da fração dos autores dela se pode sair (ou entrar, se perspetivado o sentido oposto ao da entrada pela porta do patamar).
Ou seja, outrem, que não os autores, ao entrarem na varanda, dela não podem sair a não ser que retornem pela porta de entrada.
E não se provando que a entrada na varanda seja necessária por qualquer motivo objetivamente relevante do condomínio ou de qualquer outro condómino- vg. aceder à utilização ou manutenção de qualquer bem, utensílio ou objeto-, restará, quando muito, uma utilização meramente hedonista, a qual nem se vislumbra com grande acuidade, porque a vista para um pátio interior do empreendimento não será a mais apelativa, ou, - e sem intuito pejorativo, mas apenas impressivo-, voyeurista, a qual não se admite, por respeito da privacidade alheia, máxime a dos autores e, até, a dos proprietários da fração I.
Nem sendo atendível o argumento que a fruição exclusiva da varanda por parte dos autores prejudica ou pode prejudicar a entrada de luz e até as vistas da fração I.
Na verdade, de jure, tal não poderá acontecer pois que tais direitos, ab initio e indelevelmente, estão adquiridos e garantidos pelos seus donos.
Não podendo os autores atuar, por qualquer forma, vg. através de obras na varanda ou, até, de colocação de objetos em frente das janelas, que impeçam ou prejudiquem os mesmos, sob pena de terem de ser responsabilizados.
Procede o recurso.
6.
Sumariando.
I -O requisito geral de ilisão da presunção de comunicabilidade, previsto na al.e) do nº2 do artº 1421º do CC, qual seja a afetação ao uso exclusivo de um condómino, não tem de constar no título constitutivo, antes podendo resultar de uma provada afetação material, uma destinação objetiva, mesmo que verificada após a constituição da propriedade horizontal.
II -Tal exclusividade densifica-se, determinantemente, através da utilidade funcional, do proveito objetivo que pode decorrer do uso do espaço em questão, pelo que, se a utilidade e proveito se provarem apenas quanto a um só dos condóminos, e não tendo os restantes, mesmo com possibilidade de acesso ao local, qualquer interesse, ou interesse relevante atendível, na sua fruição, deve ter-se por verificada a ilisão e, assim, a parte do edifício em causa integrante da propriedade exclusiva da fração daquele.

7.
Deliberação.
Termos em que se acorda conceder provimento ao recurso e, na revogação da sentença, declarar a propriedade e uso exclusivos dos autores relativamente à varanda em causa, com as legais consequências.

Custas pelo réu.



Carlos Moreira ( Relator )
Moreira do Carmo
Carlos Marinho