Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1416/08.0TBPBL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FALCÃO DE MAGALHÃES
Descritores: PARTILHA ADICIONAL
REQUERIMENTO
FUNDAMENTAÇÃO
Data do Acordão: 12/09/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE POMBAL – 2º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 2122º CC E 1395º, Nº 1 DO CPC.
Sumário: I – A manifesta improcedência da acção, ou de um incidente que vise directamente fazer valer determinado direito substantivo, ocorre, por exemplo, quando, sem que omissão de alegação factual exista, os factos narrados na petição jamais possam conhecer um enquadramento jurídico - nomeadamente, aquele que o autor/requerente lhes dá -, que possibilite o reconhecimento do direito de que depende, necessariamente, a procedência do pedido.

II - Situação diversa é aquela que consiste na insuficiente alegação fáctica, como sucede, por exemplo, quando, não configurando caso de ineptidão, se empreguem, na alegação destinada a escorar factualmente o reconhecimento do direito em que se funda o peticionado, termos imprecisos, vagos ou conclusivos, em lugar dos respectivos factos materiais, simples e concretos. Nesta situação, a insuficiência ou imprecisão da alegação factual, não corresponde a uma situação de manifesta improcedência, cumprindo ao julgador convidar o autor/requerente a suprir essa insuficiência, o que se concretizará, se detectada numa fase liminar do processo ou incidente, através do convite ao aperfeiçoamento da petição/requerimento.

III - No caso de se vir a apurar, depois de transitada a sentença que no inventário homologue a partilha, que outros bens existiam nesse acervo hereditário e que não foram tidos em consideração nesse processo, tem de se proceder à partilha adicional desses bens.

IV - Esta partilha adicional não se funde com a partilha anteriormente efectuada, embora seja complemento desta, que, acentue-se, não vê a respectiva eficácia ou validade afectadas pela predita omissão (cfr. art.º 2122º do CC e art.º 1395, nº 1, do CPC).

V - Ao invés daquilo que sucede com o requerimento que dá início ao inventário, onde o requerente, quanto aos bens a partilhar, só tem de referir a sua existência, já no requerimento em que se pede a partilha adicional é óbvio que se terá de indicar, porque é “conditio sine qua non” da sua relevância, os bens omitidos na partilha homologada pela sentença transitada em julgado.

VI - A exigência da indicação dos bens omitidos não significa que, no requerimento em causa, se tenha de fazer uma rigorosa identificação daqueles bens, já que o requerente pode não ter elementos bastantes para o efeito, sendo que, a confirmar-se a omissão, o que só pode suceder no decurso do incidente, a identificação pormenorizada dos bens em causa pode ser alcançada quer por informação complementar que o requerente venha a obter e a fornecer aos autos, quer pelas declarações da cabeça de casal, quer, ainda, pelas diligências instrutórias que se entenda ser de fazer.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A) - 1) - No processo de inventário que M... e outros instauraram no Tribunal Judicial de Pombal por óbito de J..., falecido no estado de casado, em primeiras e únicas núpcias de ambos, segundo o regime da comunhão geral de bens, com N..., que exerceu o cargo de cabeça de casal nesses autos, foi proferida sentença, em 14/11/2013, que homologou a partilha nos termos constantes do mapa de fls. 320 a 323, adjudicando aos interessados os respectivos quinhões.

2) - Posteriormente ao trânsito em julgado da referida sentença, em 14/02/2014, veio a interessada L... requerer que se procedesse a partilha adicional, alegando, para tal e em síntese, que vinha de aceder à informação de que à data da morte do inventariado existiam, na titularidade dele e da respectiva cônjuge - a cabeça de casal, N... -, “quantias em dinheiro, de montante por si desconhecido, as quais não foram objecto de inclusão na correspondente relação de bens.”.

Para o efeito, requereu que a cabeça de casal fosse notificada para o exercício do contraditório, seguindo-se a ulterior tramitação processual e, para a hipótese de tal vir a ser julgado necessário e considerando o caso paralelo a que se refere o nº 2 do artigo 1344º do Código de Processo Civil:

- Que se oficiasse à Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Pombal, ao Banco Santander, agência de Pombal, como sucessor do Banco Totta e Açores para que informassem se, à data da morte do inventariado, os referidos J... e N... eram depositantes naquelas duas instituições bancárias e, na afirmativa, em que modalidade(s) e montantes respectivos;

- Que se oficiasse aos CTT, estação de Pombal, para que, com referência à mesma data, informasse se os aludidos J... e esposa eram clientes daquela Instituição, “máxime”, na modalidade de Certificados de Aforro e, em caso afirmativo, qual o montante investido.

3) Por despacho de 19/02/2014 o Mmo. Juiz do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Pombal indeferiu liminarmente o pedido de partilha adicional e condenou a requerente nas custas do incidente.

4) - Inconformada, veio a interessada L... interpor recurso desse despacho, recurso esse que veio a ser admitido, ao abrigo do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26/06, (doravante NCPC, para se distinguir daquele que o antecedeu e que se designará como CPP) como Apelação, a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

B) - A findar a alegação respeitante a esse recurso, a Apelante ofereceu as seguintes conclusões:

...

II - Em face do disposto nos artºs. 635º, nºs 3 e 4, 639º, nº 1, ambos do novo Código de Processo Civil (NCPC), o objecto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 608º, n.º 2, “ex vi” do art.º 663º, nº 2, do mesmo diploma legal.

Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, com as “questões” a resolver se não confundem os argumentos que as partes esgrimam nas respectivas alegações e que o Tribunal pode ou não abordar, consoante a utilidade que veja nisso (Cfr., entre outros, Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B3586[1]).

Assim, a questão a solucionar no presente recurso consiste em saber se o requerimento da ora Apelante podia, como sucedeu, ter sido indeferido “in limine”.

III - A) - O circunstancialismo processual e os factos a considerar na decisão a proferir são os enunciados em I - supra.

B) - O Mmo. Juiz do Tribunal “a quo”, no despacho recorrido, após lembrar que “Nos termos do disposto no artigo 1395° n° 1 do Código de Processo Civil, na redacção anterior à Lei n° 23/2013 de 5 de Março e à Lei n° 41/2003 de 26 de Junho (redacção a que nos reportaremos doravante, salvo menção em contrário), quando se reconheça, depois de feita a partilha judicial, que houve omissão de alguns bens, proceder-se-á no mesmo processo a partilha adicional, com observância, na parte aplicável, do que se acha disposto nesta secção e nas anteriores”[2], apoiou-se, essencialmente, para justificar o indeferimento liminar em causa, nos seguintes motivos:

- Havendo paralelismo entre a situação em causa e a da reclamação quanto à relação de bens prevista nos artigo 1348° e seguintes do mesmo código, “a reclamação requer que se especifiquem os concretos bens que dela são objecto e não facultar às partes um meio de investigar se existirão, em abstracto, outros ainda não relacionados ou apurar uma possível ou potencial sonegação de bens.”;

- “…o regime vigente pressupõe necessariamente que se faça uma identificação mínima e cabal dos bens, pelo menos, em termos suficientes para possibilitarem ao cabeça de casal uma tomada de posição, relacionando-os se os vier a reconhecer.”;
-“Não podendo a reclamação, incluindo em sede de partilha adicional, ser utilizada como um instrumento de mera investigação para apurar a existência de outros bens não identificados.

Isto porque caberá a qualquer interessado o ónus de investigar por si e eventualmente apurar a existência de outros bens concretos não relacionados e não utilizar o Tribunal como meio de investigação.”;

- “A aqui requerente limita-se a alegar que existirão quantias não relacionadas mas não as identificou minimamente.

No fundo retira-se do teor do seu requerimento meras suposições ou convicções sem qualquer suporte factual.”;

- “…caberá indeferir liminarmente o requerido pedido de partilha adicional por ausência dos factos donde decorra o seu fundamento legal e o demais requerido.”.

Como resulta do exposto, o Mmo. Juiz do Tribunal “a quo”, embora sem o dizer expressamente, acabou por alicerçar o indeferimento em causa na manifesta improcedência do pedido de partilha adicional, em consequência da ausência de alegação de factos de onde decorresse existir fundamento legal que sustentasse tal pedido, seguindo, afinal, o que no artº 234º-A do CPC se prevê quanto à petição inicial quando se conclua pela manifesta improcedência do pedido.

O artº 590º do NCPC preceitua, no seu nº 1, além do mais, que “Nos casos em que, por determinação legal ou do juiz, seja apresentada a despacho liminar, a petição é indeferida quando o pedido seja manifestamente improcedente…”

Por sua vez, o nº 4 do mesmo artigo estabelece: “Incumbe ainda ao juiz convidar as partes ao suprimento das insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada, fixando prazo para a apresentação de articulado em que se complete ou corrija o inicialmente produzido.”.

Sobre a expressão “for evidente que a pretensão do autor não pode proceder”, que justificava o indeferimento liminar da petição à luz do artigo 481º, nº 3º, do Código de Processo Civil de 1939 - e a que vieram a corresponder expressões similares nas várias versões que o CPC de 1961 conheceu, das quais se destacam, a que constava, na sua versão original, na parte final da alínea c), do nº 1 do artº 475º (“for evidente que a pretensão do autor não pode proceder”) e a expressão, “quando o pedido seja manifestamente improcedente”, consignada no artº 234º-A, nº 1, do mesmo CPC, na versão decorrente da reforma introduzida pelo DL nº 180/96, de 25/09 (expressão esta que se manteve, como se vê, no nº 1, do artº 590º, do NCPC) - o Professor José Alberto dos Reis[3], advertindo que tal previsão visava “…a hipótese de o mérito da causa se apresentar seriamente comprometido”, ensinava: “…pretensão viável é a que apresenta condições de sucesso, de êxito, de triunfo; pretensão inviável é a que não apresenta tais condições, a que está destinada a malogro, a insucesso, a naufrágio.”.

A manifesta improcedência da acção, ou de um incidente que vise directamente fazer valer determinado direito substantivo, ocorre, por exemplo, quando, sem que omissão de alegação factual exista, os factos narrados na petição jamais possam conhecer um enquadramento jurídico - nomeadamente, aquele que o autor/requerente lhes dá -, que possibilite o reconhecimento do direito de que depende, necessariamente, a procedência do pedido.

Situação diversa é aquela que consiste na insuficiente alegação fáctica, como sucede, por exemplo, quando, não configurando caso de ineptidão, se empreguem, na alegação destinada a escorar factualmente o reconhecimento do direito em que se funda o peticionado, termos imprecisos, vagos ou conclusivos, em lugar dos respectivos factos materiais, simples e concretos. Nesta situação, a insuficiência ou imprecisão da alegação factual, não corresponde a uma situação de manifesta improcedência, cumprindo ao julgador convidar o autor/requerente a suprir essa insuficiência, o que se concretizará, se detectada numa fase liminar do processo ou incidente, através do convite ao aperfeiçoamento da petição/requerimento.

Vejamos se o requerimento em causa estava em condições de poder despoletar o incidente da partilha adicional, se enfermava de insuficiência factual passível de correcção, ou se evidenciava logo a manifesta improcedência do que nele era peticionado quanto à partilha.

Do acervo hereditário fazem parte, como é sabido, todos os bens do “de cujus”, bem como os direitos e obrigações de que este era titular e que em consequência da sua morte não devam extinguir-se, em razão da sua natureza ou por força da lei (cfr. art.ºs 2024 e 2025, n.º 1 do CC).

Havendo necessidade de proceder à partilha desse acervo em face do chamamento de vários sucessores do “de cujus”, o processo de inventário apresenta-se, precisamente, como uma forma de por termo à comunhão hereditária, pois que o cônjuge meeiro ou qualquer co-herdeiro têm o direito de exigir essa partilha (art.ºs 2101, n.º 1, 2102, n.º 1, segunda parte, ambos do CC e art.º 1326, n.º 1, do CPC).

Daí que no caso de se vir a apurar, depois de transitada a sentença que no inventário homologue a partilha, que outros bens existiam nesse acervo hereditário e que não foram tidos em consideração nesse processo, se tenha de proceder à partilha adicional desses bens.

Esta partilha adicional não se funde com a partilha anteriormente efectuada, embora seja complemento desta, que, acentue-se, não vê a respectiva eficácia ou validade afectadas pela predita omissão (cfr. art.º 2.122º do CC e art.º 1395, n.º 1, do CPC)[4].

Não se negando, no incidente da partilha adicional, alguma similitude com a acusação da falta de relacionação de bens de que se trata nos artºs 1348º e ss. do CPC, afigura-se, porém, que tal similitude não permite tirar as conclusões que o Mmo. Juiz do Tribunal “a quo” daí extraiu.

O que nos parece ser de acentuar, mais do que ver no incidente de partilha adicional o paralelismo que no despacho recorrido se vincou, é que ele consubstancia, na sua essência, uma nova partilha, que, “ex vi” da parte final do nº 1 do citado artº 1395º, leva a que se observe, na parte aplicável, o que se acha disposto na secção em que tal norma se insere e nas secções anteriores, o que explica que Gama Prazeres haja escrito que isso implicaria (no caso de se assentar ter havido efectiva omissão, evidentemente) ter “…de proceder-se à descrição, avaliação e partilha dos bens omitidos.”[5].

Porém, ao invés daquilo que sucede com o requerimento que dá início ao inventário, onde o requerente, quanto aos bens a partilhar, só tem de referir a sua existência, já no requerimento em que se pede a partilha adicional, é óbvio que se terá de indicar, porque é “conditio sine qua non” da sua relevância, os bens omitidos na partilha homologada pela sentença transitada em julgado.

Mas não é logo em face do alegado no requerimento em que se pede a partilha adicional que o julgador se tem de convencer da existência, no acervo hereditário, dos bens que aí se dizem terem sido indevidamente omitidos na partilha realizada.

A exigência da indicação dos bens omitidos, que acima se apontou, não significa, também, que, no requerimento em causa se tenha de fazer uma rigorosa identificação daqueles bens, já que o requerente pode não ter elementos bastantes para o efeito, sendo que, a confirmar-se a omissão, o que só pode suceder no decurso do incidente, a identificação pormenorizada dos bens em causa pode ser alcançada quer por informação complementar que o próprio requerente venha a obter e a fornecer aos autos, quer pelas declarações da cabeça de casal, quer, ainda, pelas diligências instrutórias que se entenda ser de fazer.

De todo o modo parece-nos que não seriam algumas afirmações, porventura menos assertivas, utilizadas no requerimento em causa, ou a falta de uma pormenorizada identificação dos bens indicados, que legitimariam que o Mmo. Juiz do Tribunal “a quo” concluísse no despacho recorrido que tal requerimento se fundava em “meras suposições”.

Deve dizer-se - apesar de se salientar que não está agora em discussão se o Tribunal deve ou não solicitar às entidades identificadas no Requerimento ora em causa, as informações que a ora Apelante aí requereu que o Tribunal colhesse, “para a hipótese de tal vir a ser julgado necessário” - que, pelo menos, quanto alguns dos “bens” indicados nesse requerimento, a respectiva natureza, “per se”, justificava a razoabilidade da falta de uma mais pormenorizada descrição. Não nos estamos a referir ao que ocorre a respeito dos certificados de aforro (seja qual for a respectiva série - “A”, B” ou “C”)[6], - que são valores escriturais nominativos, reembolsáveis, representativos de dívida da República Portuguesa -, pois que as informações quanto àqueles certificados cujo respectivo titular aforrador falece, podem ser obtidas junto da “Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública - IGCP, E.P.E”, por qualquer herdeiro  desde que municiado com a devida documentação.[7]

Estamos a reportar-nos, concretamente, aos depósitos bancários na Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Pombal e no Banco Santander (agência de Pombal) - este último enquanto sucessor do Banco Totta e Açores - em nome do inventariado e da sua cônjuge sobreviva, pois as informações sobre contas detidas em instituições bancárias, quanto solicitadas por terceiros, costumam ser recusadas por estas, com invocação do segredo profissional e a possibilidade de este apenas poder ser quebrado por decisão do Tribunal da Relação competente.[8]

Efectivamente, não obstante a atenuação delimitada que o segredo bancário conheceu com a Lei n.º 36/2010, de 2/9, e o DL n.º 157/2014, de 24/10, ainda existem restrições impostas por tal segredo, mesmo no que concerne ao solicitado pelas autoridades judiciárias, excepcionados o foro penal (nº 2, d), do citado artº 79º) e, em determinadas condições, noutras áreas da justiça, como, por exemplo, na acção executiva - nº 2, f), do citado artº 79º, artº 749, nº 6, do NPCC - e na Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais n.º 34/2004, de 29 de Julho - artº 8º-B.

E o facto de a informação sobre as contas bancárias em nome de pessoa falecida ser solicitada por herdeiro desta, não modifica, quanto a nós, o entendimento atrás expendido, excepcionados os casos do sucessor universal devidamente habilitado, ou do herdeiro que, na sequência da partilha, viu o seu quinhão preenchido com tais “bens” (cfr. Acórdãos da Relação de Guimarães, de 15/11/2011, processo nº 134/09.6TBVLN-A.G1, e de 25/06/2003, processo nº2112/10.3TBVCT-A.G1)[9].

No requerimento em causa não se deixou de alegar o conhecimento pela Requerente, sobreveniente à partilha, da existência de bens que, integrando o acervo hereditário, nela deveriam ter sido incluídos, nem se deixou, também, pese embora que sem os pormenores e o rigor jurídico que seriam desejáveis[10], de indicar que “bens” eram esses, sendo que essa indicação - com as referências que a complementaram, designadamente, as relativas à identificação das entidades que, segundo a requerente, deteriam tais “bens” -, foi efectuada de forma suficiente a permitir o prosseguimento do incidente, habilitando, não só a uma posterior identificação mais pormenorizada dos bens em causa, como, também, à afirmação ou à negação da respectiva existência, por parte da cabeça de casal.

Resulta do exposto, pois, que não se pode, em face do alegado no requerimento “sub judice”, afirmar, que a pretensão da partilha adicional em causa seja manifestamente improcedente, nem que a factualidade alegada em tal requerimento padeça de insuficiência tal que impeça, sem o acréscimo da alegação de factualidade suplementar, o despoletar do incidente da partilha adicional, pelo que se tem de reputar de ilegal o indeferimento liminar de tal requerimento e, consequentemente, de revogar o despacho que o determinou.

IV - Decisão:

Em face de tudo o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em, julgando a apelação procedente, revogar o despacho recorrido e determinar que o Mmo. Juiz do Tribunal “a quo” o substitua por um outro em que, não havendo outro motivo que a isso obste, faça o incidente prosseguir os seus ulteriores termos normais.

Custas pelos Apelados (artºs 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6, 663º, nº 2, todos do NCPC).[11]

Coimbra, 9/12/2014

               (Luís José Falcão de Magalhães)

               (Sílvia Maria Pereira Pires)

    (Henrique Ataíde Rosa Antunes)


[1] Consultáveis na Internet, através do endereço http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabase, tal como todos os Acórdãos do STJ que adiante se citarem sem referência de publicação.
[2] Embora aqui não se aplique o actual “Regime Jurídico do Processo de Inventário”, aprovado pela Lei n.º 23/2013 de 5 de Março, cumpre salientar que este consagra previsão idêntica no seu artº 75º, nº 1.
[3] Código de Processo Civil Anotado, Volume II, Coimbra Editora, 1981, 3ª edição – reimpressão, páginas 378 e 379.
[4] Cfr. tb. Rabindranath Capelo de Sousa, Lições de Direito das Sucessões, II, 2.ª edição, pág. 375.
[5] Manual do Processo de Inventário Obrigatório (ou Orfanológico) e Facultativo (ou de Maiores), 1965, pág. 272.
[6] Advertindo-se que, no caso, se poderá ter de encarar a hipótese da prescrição a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública, atendendo a que o prazo para o efeito será o de 5 anos ou, no máximo, o de 10 anos – cfr., quanto a isto, o Decreto- Lei n.º 172-B/86, de 30 de Junho, o Decreto-Lei nº 122/2002, de 4 de Maio e o Decreto-Lei n.º 47/2008, de 13 de Março, em especial os artºs 1º, 2º, e 5º, nº 1, deste último; Cfr. no entanto, os Pareceres do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, n.ºs 20/2010, de 14/04/2011 (em “http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf/7fc0bd52c6f5cd5a802568c0003fb410/d2e7b572321729c2802577590039ec43?OpenDocument&Highlight=0,certificados,de,aforro”) e 20/2010-C, de 17/01/2013 (em “http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf/7fc0bd52c6f5cd5a802568c0003fb410/f1a5e96ed483a61980257a7c003d0674?OpenDocument&Highlight=0,certificados,de,aforro”).
[7] Artº 9º-A, nºs 1, 2 e 5, do referido DL nº 122/2002, aditado a este diploma pelo artº 4º do supra mencionado DL nº º 47/2008.
[8] Artºs 78º e 79º, nº 1, do REGIME GERAL DAS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO E SOCIEDADES FINANCEIRAS (DL n.º 298/92, de 31 de Dezembro com as suas sucessivas alterações).
[9] Ambos consultáveis em http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf?OpenDatabase.
[10] Já se tendo referido a natureza jurídica dos certificados de aforo, resta lembrar que o depósito bancário, como se diz no Acórdão da Relação de Lisboa, de 14/05/2004 (Agravo nº 4519/2004-7), consultável em http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf?OpenDatabase, “…constitui um depósito irregular, ao qual se aplicam as regras do mútuo na medida do possível, por meio do qual a posse e a propriedade do dinheiro depositado pelo cliente se transferem para o banco que recebeu o depósito, ficando o cliente depositário com um direito de crédito sobre o banco de outro tanto da soma depositada”.
[11] Sendo que, pelo pagamento da taxa de justiça é exclusivamente responsável a Apelante (artº 7º, nº 2, do Regulamento das Custas Processuais; Cfr. Acórdão da Relação de Lisboa, de 15/03/2011, proferido nos autos de recurso nºs 6730/09.4TVLSB.L1-7).