Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1395/13.1TBCVL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MOREIRA DO CARMO
Descritores: PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO ( PER )
PLANO DE REVITALIZAÇÃO
CRÉDITO TRIBUTÁRIO
HOMOLOGAÇÃO
INEFICÁCIA
Data do Acordão: 01/13/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE CASTELO BRANCO - FUNDÃO - INST. CENTRAL - SEC.COMÉRCIO - J1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTS. 103 CRP, 17-F, 192, 194, 195, 196, 197, 215 CIRE, 30, 36, 42 LGT, 186, 189, 190 CRCSPSS
Sumário: 1.-Nos termos do art. 30º, nº 2, da LGT, o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua alteração, redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária.

2.- Face ao aditamento do nº 3 ao referido art. 30º da LGT, e em face das normas imperativas vigentes, deixou de ser legalmente possível homologar um plano de insolvência/revitalização de empresa que contemple a alteração, redução, extinção ou dilação temporal do pagamento de créditos de natureza tributária, sem que o Estado - a Fazenda Nacional/Segurança Social - tenha votado favoravelmente tal homologação;

3.- A homologação de plano de revitalização que inclua o pagamento em prestações de créditos sem o acordo da Segurança Social, constitui uma violação não negligenciável das normas legais aplicáveis, nos termos do art. 215º do CIRE e, por tal motivo, deve o juiz recusar oficiosamente a homologação do acordo na parte em que viola regras legais imperativas.

4.- Não obstante o plano de revitalização aprovado conter cláusula que viola o disposto nos arts. 30º, nº 2 e 3, e 36º, nº 2 e 3, da LGT, e 190º, nº 1, 2, a) e 6, do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, não deve ser o mesmo objecto de recusa de homologação judicial, antes enfermando de mera ineficácia, sendo, por isso, inoponível ao Instituto da Segurança Social.

Decisão Texto Integral:
I – Relatório

1. R (…), Lda, com sede na Covilhã, requereu processo especial de revitalização (PER).

Foi aprovado plano de recuperação, constante de fls. 609 a 655, de acordo com a maioria legal. Uma das entidades que votou contra foi o Instituto da Segurança Social, IP, Centro Distrital de Castelo Branco. Em tal plano estabeleceu-se, quanto ao reembolso da Segurança Social, o seguinte (Ponto 7.1.2):

“Os créditos reclamados pela Segurança Social são considerados Créditos Privilegiados, segundo a legislação portuguesa. A R (…) apresentava, à data da produção de efeitos do PER, acordos para pagamento dos montantes em dívida à Segurança Social (60 meses).

No âmbito do presente plano de reestruturação, foi assumido um plano de pagamento de 150 prestações mensais. Não havendo possibilidade de prestar garantias, a taxa de juro é a taxa de juro legal em vigor sem perdão de juros vencidos.

A primeira prestação vencer-se-á um mês após o fim do prazo previsto no nº 5 do artigo 17º D do CIRE.”.

O ISS deduziu oposição à homologação do plano, pugnando pela recusa oficiosa de tal homologação, por violação não negligenciável das normas aplicáveis ao seu conteúdo. A devedora apresentou resposta, dizendo que a oposição é infundada.   

*

Foi proferida sentença que homologou o plano de revitalização.

*

2. O Instituto da Segurança Social interpôs recurso, tendo formulado as seguintes conclusões:

a) A devedora R (...), Lda. requereu um Processo Especial de Revitalização;

b) Apresentou um Plano de Reestruturação que mereceu o voto desfavorável do ora recorrente, que também deduziu oposição à sua homologação;

c) Não obstante o Plano foi homologado por Sentença proferida no dia 6 de outubro de 2014;

d) A homologação de um Plano de Insolvência que implica modificação dos créditos da segurança social sem que esta tenha dado o seu consentimento é ilegal;

e) O plano apresentado não se coaduna com o regime geral de regularização de dívidas à Segurança Social, violando normas imperativas, designadamente a Lei Geral Tributária e o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social;

f) Nos termos do disposto no nº 3 do artigo 30º da LGT “o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária”;

g) Depende do acordo do Estado, em conformidade com as normas próprias da LGT e CPPT, nomeadamente, a redução ou extinção dos seus créditos fiscais e/ou concessão de moratória, créditos que não podem ser afectados, contra a sua vontade, pelo plano de insolvência.” – Acórdãos do TRP de 04-07-2011 e de 07-07-2011,

h) A autorização excecional do pagamento prestacional de dívida à segurança social, que é concedida por deliberação do Conselho Diretivo do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, só é permitida quando, cumulativamente, seja requerida pelo contribuinte, seja indispensável para a viabilidade económica deste e desde que se encontre em processo de insolvência, de recuperação ou revitalização - artigo 190º, nºs 1, 2 al. a) e 6 do Código Contributivo, na redação da Lei nº 20/2012, de 14/5);

i) A regularização prestacional da dívida à segurança social envolve uma modificação dos créditos na medida em que os mesmos passam a gozar de uma dilação temporal, sendo certo que o deferimento do pagamento de créditos públicos não foi autorizado;

j) É à Lei que cabe a regulação da obrigação contributiva e não a uma vontade colectiva, mormente a da Assembleia de Credores em sede de processo de insolvência;

k) O nº 2 do artigo 192º do CIRE dispõe que “o plano só pode afectar por forma diversa a esfera jurídica dos interessados, ou interferir com direitos de terceiros, na medida em que tal seja expressamente autorizado neste título ou consentido pelos visados”;

l) “O juiz recusa oficiosamente a homologação do plano de insolvência aprovado em assembleia de credores no caso de violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo (…) – artigo 215º do CIRE;

m) “A homologação de plano de revitalização que inclua o pagamento em prestações de créditos por tributos, sem o acordo da Fazenda Nacional e/ou Segurança Social, constitui uma violação não negligenciável das normas legais aplicáveis, caindo na previsão do artigo 215º do CIRE e, por tal motivo, deve o juiz recusar oficiosamente a homologação do acordo na parte em que viola regras legais imperativas” – Ac. TRC de 23-03-2014, in www.dgsi.pt (sublinhado nosso).

n) A Sentença que homologou o plano de revitalização violou o disposto no nº 3 do artigo 30º da Lei Geral Tributária (Decreto-Lei nº 398/98, de 17/12, na redacção da Lei nº 55-A/2010, de 31/12); artigo 125º da Lei nº 55-A/2010, de 31/12; artigo 190º, nº 1, nº 2 al. a) e nº 6 do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (Lei nº 110/2009, de 16/09, alterada pela Lei nº 119/2009, de 30/12, pelo Decreto-Lei nº 140-B/2010, de 30/1 e pela Lei nº 55-A/2010, de 31/12), e artigo 215º do CIRE.

Nestes termos e nos mais que V. Exas. muito doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente e em conformidade a Sentença que homologou o plano de revitalização revogada ou em alternativa ser declarada ineficaz em relação aos créditos da Segurança Social, não lhe sendo oponível – Ac. STJ, de 01-04-2014; Ac. STJ de 18-02-2014; Ac. TRC de 23-03-2014; Ac. TRP, de 20-05-2014, in www.dgsi.pt.

COMO É DE JUSTIÇA!

3. Inexistem contra-alegações.

II – Factos Provados

Os factos provados são os que dimanam do relatório supra.

III – Do Direito

1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (arts. 639º, nº 1, e 635º, nº 4, do NCPC), apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas.

Nesta conformidade, a única questão a resolver é a seguinte.

- Não homologação do plano de recuperação.

2.1. Na decisão recorrida escreveu-se que:

“No mais, e depois de analisado todo o plano apresentado não vislumbramos qualquer violação não negligenciável de normas procedimentais ou aplicáveis ao conteúdo do plano que impeçam a sua homologação, não prevendo este quaisquer condições suspensivas ou quaisquer actos ou medidas que devem preceder a homologação (art. 215º do C.I.R.E. aplicável ex vi art. 17º-F nº 5 in fine do mesmo diploma).

Assim sendo, nada obstando e tendo em conta o disposto no art. 17º-F nº 5 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, deverá o plano de revitalização ser homologado”.

Vejamos, então, se existe violação de alguma norma que leve à não homologação do plano conforme sustentado pela recorrente. Sobre a temática posta à discussão pelas conclusões da apelante, vamos escrever o que já deixámos explanado noutros processos, em que fomos relator (por ex. no Proc.2045/09.6T2AVR-B, de 20.9.2011), com pequenas adaptações face ao caso concreto.

Será que o regime fiscal prevalece sobre o regime da insolvência/processo especial de revitalização ?
Ou, poderá uma maioria qualificada de credores (art. 212º ex vi do art. 17-Fº, nº 3, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas) alterar, reduzir, ou excluir os créditos do Estado/Segurança Social através do plano de insolvência/recuperação, apesar do voto contrário da administração fiscal/social, de modo que a homologação deva ser recusada ?
Para tratamento jurídico do caso, convocam-se as seguintes disposições legais.
O art. 103º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa consagra o princípio da legalidade tributária: «Os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes».
Estabelece-se no art. 30º, nº 2, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo DL 398/98, de 17.12, que:
“O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária.”
E prescreve o art. 36º:

Regras gerais

2 – Os elementos essenciais da relação jurídica tributária não podem ser alterados por vontade das partes.

3 – A administração tributária não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previstos na lei.

Na sequência do disposto no art. 42º, nº 1, da LGT, regulando o pagamento em prestações das dívidas fiscais, dispõem os arts. 186º, 189º e 190º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (Lei 110/2009, de 16.9, alterada pela Lei 119/2009, de 30.12, pelo DL 140-B/2010, de 30.1, e pela Lei 55-A/2010, de 31/12) que:

Artigo 186.º

Regularização da dívida à segurança social

1 — A dívida à segurança social é regularizada através do seu pagamento voluntário, nos termos previsto no presente Código, no âmbito da execução cível ou no âmbito da execução fiscal.

Artigo 189.º

Pagamento em prestações

1 — O diferimento do pagamento da dívida à segurança social, incluindo os créditos por juros de mora vencidos e vincendos, assume a forma de pagamento em prestações.

Artigo 190.º

Situações excepcionais para a regularização da dívida

1 — A autorização do pagamento prestacional de dívida à segurança social, a isenção ou redução dos respectivos juros vencidos e vincendos, só é permitida nos termos do presente artigo, sem prejuízo das regras aplicáveis ao processo de execução fiscal.

2 — As condições excepcionais previstas no número anterior só podem ser autorizadas quando, cumulativamente, sejam requeridas pelo contribuinte, sejam indispensáveis para a viabilidade económica deste e desde que o contribuinte se encontre numa das seguintes situações:

a) Processo de insolvência ou de recuperação;

6 — Sem prejuízo das competências próprias das instituições de segurança social nas Regiões Autónomas, a autorização a que se refere o n.º 1 do presente artigo é concedida por deliberação do conselho directivo do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I. P. (IGFSS, I. P.).

Nos termos do disposto no art. 17º-F, nº 5, do CIRE: “O juiz decide se deve homologar o plano de recuperação ou recusar a sua homologação … aplicando, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, em especial o disposto nos arts. 215º e 216º”.
O art. 192º, nº 1, do CIRE, estabelece no seu nº 1 que o pagamento dos créditos sobre a insolvência “podem ser regulados num plano de insolvência em derrogação das normas do presente código” e no seu nº 2 que «o plano só pode afectar por forma diversa a esfera jurídica dos interessados (…) na medida em que tal seja expressamente autorizado neste título [IX] ou consentido pelos visados».
Dispõe o art. 194.º do CIRE que:
1. O plano de insolvência obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objectivas.
2. O tratamento mais desfavorável relativamente a outros credores em idêntica situação depende do consentimento do credor afectado, o qual se considera tacitamente prestado no caso do voto favorável.»
O art. 195º do CIRE versa sobre o conteúdo do plano de insolvência, e reza assim:
1 - O plano de insolvência deve indicar claramente as alterações dele decorrentes para as posições jurídicas dos credores da insolvência.
2 - O plano de insolvência deve indicar a sua finalidade, descreve as medidas necessárias à sua execução, já realizadas ou ainda a executar, e contém todos os elementos relevantes para efeitos da sua aprovação pelos credores e homologação pelo juiz, nomeadamente:
a) A descrição da situação patrimonial, financeira e reditícia do devedor;
b) A indicação sobre se os meios de satisfação dos credores serão obtidos através de liquidação da massa insolvente, de recuperação do titular da empresa ou da transmissão da empresa a outra entidade;
c) No caso de se prever a manutenção em actividade da empresa, na titularidade do devedor ou de terceiro, e pagamentos aos credores à custa dos respectivos rendimentos, plano de investimentos, conta de exploração previsional e demonstração previsional de fluxos de caixa pelo período de ocorrência daqueles pagamentos, e balanço pró-forma, em que os elementos do activo e do passivo, tal como resultantes da homologação do plano de insolvência, são inscritos pelos respectivos valores;
d) O impacte expectável das alterações propostas, por comparação com a situação que se verificaria na ausência de qualquer plano de insolvência;
e) A indicação dos preceitos legais derrogados e do âmbito dessa derrogação.
O art. 196º do CIRE, sobre as providências com incidência no passivo, estabelece que:
1. O plano de insolvência pode, nomeadamente, conter as seguintes providências com incidência no passivo do devedor: a) O perdão ou redução do valor dos créditos sobre a insolvência, quer quanto ao capital, quer quanto aos juros, com ou sem cláusula “salvo regresso de melhor fortuna”; b) O condicionamento do reembolso de todos os créditos ou de parte deles às disponibilidades do devedor; c) A modificação dos prazos de vencimento ou das taxas de juro dos créditos; d) A constituição de garantias; e) A cessão de bens aos credores.

O nº 2 ressalva da redução, extinção ou condicionamento dos créditos apenas as garantias reais e privilégios creditórios de créditos de entidades europeias, aí mencionadas.
Prescreve o art. 197º do CIRE que: Na ausência de estatuição expressa em sentido diverso constante do plano de insolvência: a) Os direitos decorrentes de garantias reais e de privilégios creditórios não são afectados pelo plano; b) Os créditos subordinados consideram-se objecto de perdão total; c) O cumprimento do plano exonera o devedor e os responsáveis legais da totalidade das dívidas da insolvência remanescentes.
O art. 215º do CIRE epigrafado “Não homologação oficiosa”, dispõe que:
«O juiz recusa oficiosamente a homologação do plano de insolvência aprovado em assembleia de credores no caso de violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza (…)».

A resposta a tais questões era dada profusamente pelos tribunais, pronunciando-se as várias Relações de forma largamente maioritária pela afirmativa em ordem ao princípio da auto-regulação dos credores e defesa da sua vontade na modelação dos créditos do Estado enquanto credor a par dos credores particulares (vide neste sentido e sem esgotar a recensão, os seguintes acórdãos:

R. Porto de 1.7.08, Proc.0822193, de 22.1.09, Proc.0836370, de 10.9.09, Proc.485/08.7TYVNG, de 2.2.10, Proc.1671/08.5TJVNF, e de 7.4.11, Proc.2525/09.3TBSTS; R. Lisboa de 17.7.08, Proc.5511/2008-2, de 6.7.2009, Proc.644/06.7TYLSB, de 25.2.10, Proc.1192/07.3TYLSB, e de 22.3.11, Proc.843/090TYLSB; e R. Coimbra de 1.6.10, Proc.4091/08.8TBAVR, de 18.1.11, Proc.294/10.3TBVNO, e de 1.2.11, Proc.788/09.3TBMGR, todos em www.dgsi.pt).

Também o STJ trilhou o mesmo caminho quando foi chamado a decidir sobre a mesma situação (vide Acds. de 13.1.09, Proc.08A3763, de 4.6.09, Proc.464/07.1TBSJM, e de 2.3.10, Proc.4554/08.5TBLRA, todos no mesmo sítio).

Alinhando nesse entendimento maioritário, era preciso convir que aqueles preceitos de ordem fiscal têm o seu campo de aplicação na relação tributária em sentido estrito, ou seja, têm uma função de regular a relação Estado-contribuinte, nesse sentido se tratando de normas imperativas, pois é na veste de jus imperii, de defesa do interesse público, que o Estado intervém.

Nem se podendo entender, em adição, que haveria violação da reserva de lei em matéria fiscal.

Desde logo porque aquelas normas do CIRE, reguladoras do plano de insolvência, ou o plano acordado pelos credores, homologado por sentença, não criam quaisquer impostos, nem definem regras sobre a sua incidência ou pagamento, nem alteram quaisquer normas da LGT, isto é, não versam sobre a relação jurídico-tributária entre o Estado e os contribuintes, apenas regulam um concreto modo de pagamento de créditos sobre a insolvência.

Na verdade, no processo de insolvência essa relação dá lugar a uma outra em que o Estado se assume como credor despido daquelas prerrogativas e que, a par dos demais credores, exerce os seus direitos na assembleia de credores, regulada pelo CIRE, que é também lei e visa defender o interesse público de preservação do bom funcionamento do mercado e do futuro das empresas, o que, à partida, seria posto em causa com a manutenção dos privilégios que assistem aos créditos seja do Estado, seja da Segurança Social, uns e outros, por norma, avultados.

O princípio da igualdade de credores que subjaz a tal entendimento decorre, aliás, não só do preâmbulo do CIRE, como do seu citado art. 194º.

Pode concluir-se que o princípio da igualdade, trave basilar e estruturante na regulação do plano de insolência, não seria violado desde que todos os credores, com a mesma natureza de privilegiados, sejam afectados da mesma forma, desde que se trate de forma igual o que é igual e se distinga o que for diferente (Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE, Anot., 2ª Ed., 2008, pág. 642).

Afloração do princípio da igualdade é ainda o que supletivamente se contém no art. 197º do CIRE, dele resultando que os créditos garantidos e/ou privilegiados só não são afectados se os credores nada estipularem nesse sentido.
Ou seja, a fundamentação daquela solução, recorrendo-se aos textos legais e contributos jurisprudenciais, centrava-se essencialmente no seguinte:
- Na primazia da vontade dos credores, no âmbito do CIRE, conforme items 5 e 6 do preâmbulo do diploma que o aprovou;
- No princípio da igualdade dos credores, como consta consagrado no art. 194º do CIRE;
- No disposto nos arts. 195º e 196º do CIRE, sobre o conteúdo do plano;
- Num argumento “a contrario sensu” retirado do disposto no art. 197º do CIRE: a expressão ali contida, «na ausência de estatuição expressa em sentido diverso constante do plano de insolvência», atribui cariz supletivo ao preceito, o que implica que pode haver regulação diversa, contendendo com os créditos previstos nas als. a) e b), o que deve ser entendido como afloração do princípio da igualdade e reconhecimento de que, dentro da legalidade exigível, o plano pode regular a forma como os credores estruturam o plano de insolvência. Só assim não será se não houver expressa adopção de um regime diferente;
- Na circunstância de que nada nesse art. 197º fundamenta a imperatividade do acordo de todos os afectados para que as garantias possam ser atingidas;
- Nos arts. 202º e 203º que requerem o consentimento dos afectados pelo plano mas são omissos quanto à hipótese de se tratar de créditos fiscais;
- Na especialidade do regime do CIRE ou do respectivo processo que afasta a aplicação das normas tributárias invocadas e a actuação do princípio da legalidade fiscal.
Em síntese, entendíamos que: a) O regime do CIRE é especial em relação a outros regimes de direito, concretamente a LGT, o CPPT e o Código Contributivo independentemente da natureza imperativa das normas destes diplomas; b) O regime do CIRE, que contém normas substantivas e normas adjectivas, aplica-se à generalidade dos credores, incluindo a Fazenda Pública/Segurança Social como credora; c) A vontade manifestada pela maioria dos credores na aprovação do plano está coberta por lei, o CIRE, aprovado por DL autorizado pela Ass. República; d) Atenta a especialidade do regime do CIRE, não se verificando a previsão dos art. 215º e 216º, nº 1, do CIRE, não deve ser recusada a homologação do plano de insolvência, aprovado em assembleia de credores pela maioria legal, apesar de a credora Fazenda Pública/Segurança Social ter votado contra com base na ofensa de normas imperativas de direito fiscal.

Deste modo, em jeito de sumário, poderíamos concluir que: i) – Em processo de insolvência é legalmente admissível que o plano de insolvência, aprovado maioritariamente na assembleia de credores e homologado por sentença, defina o conteúdo e prazos de pagamento de créditos de que sejam titulares o Estado através da Fazenda Nacional/Segurança Social ainda que contra a sua vontade; ii) – As normas do CIRE respeitantes à adopção do plano de insolvência, que postergam normas fiscais reguladoras dos créditos fiscais do Estado, não padecem de qualquer inconstitucionalidade (orgânica ou material), desde logo porque não versam sobre a relação jurídico-tributária entre o Estado e os contribuintes, apenas regulam um concreto modo de pagamento de créditos sobre a insolvência.

Todavia, este ordenamento jurídico foi mudado.

Na verdade, o legislador veio a acrescentar um nº 3 ao citado art. 30º da LGT, nele estatuindo que: O disposto no número anterior prevalece sobre qualquer legislação especial. (A redacção do nº 3 foi dada pelo art. 123º da Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro - Lei do Orçamento de Estado -, com entrada em vigor no dia 1 de Janeiro de 2011)

Isto é, o legislador deixou bem marcado, sem margem para dúvidas, que o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua alteração, redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária, regra que prevalece sobre qualquer legislação especial, consequentemente sobre o CIRE.   
E se, mesmo assim, subsistisse ainda alguma hesitação interpretativa, o legislador deixou bem claro o que pretendia, pois estatuiu no art. 125º, daquela Lei 55-A/2010, sob a epígrafe “Disposições transitórias no âmbito da LGT” que:
“O disposto no nº 3 do artigo 30º da LGT é aplicável, designadamente aos processos de insolvência que se encontrem pendentes e ainda não tenham sido objecto de homologação…”.
Donde resulta, sem sombra de dúvida, não só a sua aplicabilidade aos processos de insolvência, mas também a necessidade de em tais processos, que estejam pendentes, ser respeitada tal regra de indisponibilidade dos créditos tributários, nos planos de insolvência. Como tais normas entraram em vigor em 1.1.2011, consequentemente antes da data da homologação judicial tem de ser observadas.

Note-se, ainda, que a LGT é subsidiariamente aplicável aos créditos da Segurança Social, nos termos do art. 3º, a), do referido Código Contributivo.  

Assim, o princípio geral de que o crédito tributário é indisponível, só podendo ser alterado, reduzido ou extinto com respeito pela igualdade e legalidade tributária impõe-se no processo de insolvência/processo especial de revitalização, ficando prejudicada a argumentação de que este último processo está regulado em lei especial e não foi feita qualquer ressalva para os créditos fiscais, os quais seriam tratados como quaisquer outros. O legislador afastou, pois, por forma expressa, a interpretação de que a lei especial (CIRE) derroga a aplicação da lei geral (LGT/Código Contributivo, no caso em apreço. Depende, pois, do acordo do Estado, em conformidade com as normas próprias da LGT e Código Contributivo, nomeadamente, a alteração, redução ou extinção dos seus créditos fiscais e/ou concessão de moratória, créditos que não podem ser afectados, contra a sua vontade, pelo plano de insolvência/plano especial de revitalização.
Afastou-se, por conseguinte, a interpretação que vinha sendo seguida pela jurisprudência, no sentido de que, tratando-se o CIRE de lei especial, os créditos fiscais e os créditos da segurança social, para efeitos de homologação do plano de insolvência, se encontravam em plano de igualdade com os restantes créditos, sendo hoje pacífico que tendo a lei determinado expressamente a aplicação do nº 3 do art. 30º da LGT aos processos de insolvência a única conclusão a tirar é a de que foi vontade do legislador afastar, de forma inequívoca e expressa, qualquer interpretação que pudesse continuar a efectuar-se, no sentido anteriormente defendido de que o regime especial do CIRE derroga o regime geral da LGT. Daí que após as alterações introduzidas ao art. 30º da LGT, em face das normas imperativas vigentes, deixou de ser legalmente possível homologar um plano de insolvência ou revitalização de empresa que contemple a alteração, redução, extinção ou mesmo a moratória de créditos de natureza tributária, sem que o Estado - a Fazenda Nacional/Segurança Social - tenha votado favoravelmente tal homologação (vide os Acds. indicados pela recorrente nas suas conclusões, a título de exemplo, com a rectificação que o desta Relação é de dia 25 e não 23, bem como o do STJ de 10.5.2012, Proc.368/10.0TBPVL-D, disponível, também, em www.dgsi.pt).

Ora, o plano apresentado não se coaduna com o regime geral de regularização de dívidas à Segurança Social, violando normas imperativas, como o disposto nos nº 2 e 3 do art. 30º e nº 2 e 3 do art. 36º da LGT, e no artigo 190º, nº 1, 2, a), e 6 do Código Contributivo.
Na verdade, face ao teor do plano de recuperação aprovado, e à sua rejeição pela recorrente Segurança Social, e tendo em conta que os elementos essenciais dos créditos fiscais são a sua incidência, as taxas, as formas e tempos de pagamento, bem como benefícios fiscais, constata-se que se considerou o pagamento da dívida em 150 prestações mensais (quando até à data da produção de efeitos do PER, a recorrida apenas tinha acordos para pagamento dos montantes em dívida à Segurança Social de 60 meses) em derrogação dos citados arts. 30º, nº 2 e 3, e 36º, nº 2 e 3, da LGT, e 190º, nº 1, 2, a), e 6 do Código Contributivo, quando não há notícia nos autos que a Segurança Social tenha dado o seu acordo.  

Ou seja, a regularização prestacional da dívida à segurança social envolve uma modificação dos créditos, na medida em que os mesmos passam a gozar de uma dilação temporal, de uma moratória, quando é certo que a Segurança Social não autorizou o diferimento temporal do pagamento de créditos públicos.
Assim, atento o aludido no transcrito art. 215º do CIRE, vemos que no caso se violaram relevantemente normas respeitantes à substância do plano. Consequentemente, havia lugar à recusa oficiosa de homologação do plano, pelo que a decisão recorrida não pode manter-se.
2.2. Resta saber quais as consequências da violação do plano. Verifica-se que existem basicamente duas correntes relevantes a considerar:
- uma que considera que um plano em que se verifique tal violação, não pode ser homologado in totum, por existir nulidade causada pela afectação da indisponibilidade dos créditos, quer da Segurança Social, quer da Fazenda Nacional (cfr. por ex. Ac. desta Relação de 1.10.2013, Proc.1786/12.5TBTNV, no aludido sítio);
- outra, emanada do STJ, que se tornou firme, de acordo com a qual a homologação de um plano de insolvência aprovado pela assembleia de credores, com o voto contra do Estado/Segurança Social, por o mesmo não respeitar o regime legal relativamente aos créditos tributários, é ineficaz em relação à Fazenda Nacional/Instituto de Segurança Social, não produzindo quaisquer efeitos relativamente a tais credores.
Transcrevemos o sumário do acórdão proferido pelo STJ em 18.2.2014, Proc.1786/12.5TBTNV (que revogou a decisão desta Relação de 1.10.2013 acabada de mencionar), pois nele constam, na nossa perspectiva, todos os pontos relevantes para a decisão, dada a sua clareza e profundidade:
1 – O Direito falimentar português tem sido objecto de reformas, sempre oscilando entre dois paradigmas, tendo em conta a situação da economia e das empresas – indissociável da conjuntura económica e financeira nacional e transnacional – num tempo histórico em que a globalização tornou vulneráveis as economias de muitos países, mormente daqueles cuja situação económica e financeira, por ser mais precária, foi mais atingida por uma nova realidade: um dando primazia à recuperação, outro privilegiando a liquidação de empresas em estado de insolvência iminente.
2 – A Lei nº 16/2012, de 20 de Abril, reformou aspectos do CIRE, em consequência das obrigações assumidas pelo Estado por imposição do Memorando da troika que, nos pontos 2.17, 2.18 e 2.19 – “Enquadramento legal da reestruturação de dívidas de empresas e de particulares”, dispõe:
“2.17. A fim de melhor facilitar a recuperação efectiva de empresas viáveis, o Código de Insolvência será alterado até ao fim de Novembro de 2011, com assistência técnica do FMI, para, entre outras, introduzir uma maior rapidez nos procedimentos judiciais de aprovação de planos de reestruturação.
2.18. Princípios gerais de reestruturação voluntária extrajudicial em conformidade com boas práticas internacionais serão definidos até fim de Setembro de 2011.
2.19. As autoridades tomarão também as medidas necessárias para autorizar a administração fiscal e a segurança social a utilizar uma maior variedade de instrumentos de reestruturação baseados em critérios claramente definidos, nos casos em que outros credores também aceitem a reestruturação dos seus créditos, e para rever a lei tributária com vista à remoção de impedimentos à reestruturação voluntária de dívidas”.
3 – Daqui decorre que o Estado, num quadro de forte constrangimento económico e financeiro, assumiu o compromisso de legislar no sentido de introduzir um quadro legal de cooperação e flexibilização dos seus créditos quando estiver em causa a aceitação de reestruturação de créditos de outros credores, ou seja, o Estado Português aceitou adoptar, legislativamente, procedimentos flexíveis quanto aos seus créditos, que, no direito português, como é consabido, se apresentam exornados de fortes garantias (v. g. privilégios creditórios), em ordem à salvaguarda das empresas, em comunhão de esforços com os credores particulares, dando primazia à recuperação.
4 – Esse foi o caminho trilhado pela Jurisprudência dos Tribunais Superiores, antes mesmo da Reforma de 2012, ao considerar que o Estado, no contexto do processo insolvencial, poderia ver os seus créditos afectados por decisão dos credores, porquanto as prerrogativas dos seus créditos, no contexto da relação tributária, não seriam, sem mais, transponíveis para o processo universal que a insolvência é, e, por isso, não estavam os créditos da Autoridade Tributária numa posição de intangibilidade, enquanto os credores privados renunciavam aos seus direitos na tentativa de recuperar a empresa e, reflexamente, outros interesses a ela ligados, onde nem sequer é despiciendo aludir aos benefícios que o erário público colhe quando uma empresa é recuperada e não liquidada pela inviabilidade da sua recuperação.
5 – O legislador alterou a Lei Geral Tributária blindando os créditos fiscais. O art. 30º, nº2 estatui – “O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária”, tendo o art. 125º da Lei nº 55-A/2010, de 31.12 (Lei do Orçamento para 2011), aditado um nº3 ao art. 30º, para que não restassem dúvidas: “O disposto no número anterior prevalece sobre qualquer legislação especial”.
6 – Reafirmando com indiscutível clareza a indisponibilidade dos créditos tributários, proibindo a sua redução ou extinção e tendo em conta a amplitude do conceito de “relação tributária” e o que a constitui – cfr. art. 30º, nº1, als. a) a e) – o direito insolvencial, após a reforma de 2012, quando conjugado com aqueles preceitos da LGT, é dificilmente harmonizável.
7 – Como é notório, quer os créditos do Estado, quer os de outras entidades, como a Segurança Social, representam, em grande número de casos, avultadas somas, daí que, a manterem-se intocados, todo o esforço de recuperação da insolvente ficará a cargo dos credores comuns ou preferenciais da insolvência, que terão de arcar com a modificabilidade e mesmo a supressão dos seus créditos e garantias, ante o Estado que, nada cedendo, se coloca numa posição de jus imperii, num processo em que, só excepcionalmente, deveria ter tratamento diferenciado.
8 – Numa perspectiva de adequada ponderação de interesses, tendo em conta os fins que as leis falimentares visam, pode violar o princípio da proporcionalidade admitir que o processo de insolvência seja colocado em pé de igualdade com a execução fiscal, servindo apenas para a Fazenda Nacional actuar na mera posição de reclamante dos seus créditos, sem atender à particular condição dos demais credores do insolvente ou pré-insolvente, que contribuem para a recuperação da empresa, abdicando dos seus créditos e garantias, permanecendo o Estado alheio a esse esforço, escudado em leis que contrariam o seu Compromisso de contribuir para a recuperação das empresas, como resulta do Memorandum assinado com a troika e até das normas que, no contexto do PER, o legislador fez introduzir no CIRE.
9 …
10 – O plano de insolvência, assente numa ampla liberdade de estipulação pelos credores do insolvente, constitui um negócio atípico, sendo-lhe aplicável o regime jurídico da ineficácia. Por isso, o plano de recuperação da empresa que for aprovado não é oponível ao credor ou credores que não anuíram à redução ou à modificação lato sensu dos seus créditos. – cfr., também, no mesmo sentido, o Ac. do STJ de 1.4.2014, Proc.185/13.6TBCHV-A e de 13.11.2014, Proc.217/11.2 [proferidos pela mesma 6ª Secção, à qual são distribuídos, nos termos do disposto no art. 42º, nº 2 da Lei 52/2008, de 28.8 (L.O.F.T.J. – Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), todos os processos mencionados no respectivo art. 121º “Especialização das secções”].  
Cremos ser de seguir a referida jurisprudência. Ponderando as considerações tecidas, atentas as finalidades e os princípios subjacentes ao PER, por um lado, e, por outro lado, que a LGT claramente afasta a possibilidade de homologação pura e simples do plano de revitalização acordado, com o voto contra ou sem a anuência da Fazenda Nacional/Segurança Social, cremos ser de afastar a primeira dos referidas correntes, pois afastava-se totalmente qualquer possibilidade de recuperação de uma empresa sempre que existissem dívidas ao Estado/Segurança Nacional, o que ocorrerá, com grande probabilidade, na maioria das situações em que uma empresa entre em incumprimento para com os seus credores comuns, como o nosso caso é um exemplo. Por isso, consideramos que, em casos como o do presente processo, a melhor interpretação da lei que adequadamente balanceia o interesse da intangibilidade dos créditos fiscais e o da recuperação da empresa ainda viável, é a que aplica à homologação do plano o regime jurídico da ineficácia, em face da qual o plano de recuperação, aprovado pela maioria legal, não é oponível aos créditos tributários, quando estes credores não anuíram à sua modificação, designadamente a uma dilação temporal do seu pagamento, mas mantém a sua eficácia quanto aos demais créditos, assim possibilitando a viabilização da empresa nos termos do plano acordado pela maioria dos credores.

3. Sumariando (art. 663º, nº 7, do NCPC):

i) Nos termos do art. 30º, nº 2, da LGT, o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua alteração, redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária;
ii) Face ao aditamento do nº 3 ao referido art. 30º da LGT, e em face das normas imperativas vigentes, deixou de ser legalmente possível homologar um plano de insolvência/revitalização de empresa que contemple a alteração, redução, extinção ou dilação temporal do pagamento de créditos de natureza tributária, sem que o Estado - a Fazenda Nacional/Segurança Social - tenha votado favoravelmente tal homologação;
iii) A homologação de plano de revitalização que inclua o pagamento em prestações de créditos sem o acordo da Segurança Social, constitui uma violação não negligenciável das normas legais aplicáveis, nos termos do art. 215º do CIRE e, por tal motivo, deve o juiz recusar oficiosamente a homologação do acordo na parte em que viola regras legais imperativas;
iv) Não obstante o plano de revitalização aprovado conter cláusula que viola o disposto nos arts. 30º, nº 2 e 3, e 36º, nº 2 e 3, da LGT, e 190º, nº 1, 2, a) e 6, do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, não deve ser o mesmo objecto de recusa de homologação judicial, antes enfermando de mera ineficácia, sendo, por isso, inoponível ao Instituto da Segurança Social.

IV - Decisão


Pelo exposto, julga-se procedente, parcialmente, a apelação do Instituto de Segurança Social, revogando-se, parcialmente a decisão recorrida, e decidindo-se que o plano homologado é ineficaz relativamente à recorrente ISS, não produzindo quaisquer efeitos quanto aos seus créditos, no demais se mantendo a decisão recorrida.

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Custas a cargo da devedora/recorrida.

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   Coimbra, 13.1.2015

Moreira do Carmo ( Relator )

 Fonte Ramos

Maria João Areias