Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
157/10.2TBCVL-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS GIL
Descritores: TÍTULO EXECUTIVO
ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
ACTA
Data do Acordão: 06/20/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COVILHÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.45, 46 CPC, 363 CC, DL Nº 268/94 DE 25/10
Sumário: É título executivo a acta da assembleia de condóminos em que se deliberou liquidar certo montante de quotas de condomínio em dívida por certo condómino, relativas a certo período temporal, indicando-se no requerimento inicial executivo o valor mensal dessas quotas e o seu prazo de pagamento.
Decisão Texto Integral: Acordam, em audiência, os juízes abaixo-assinados da segunda secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

            1. Relatório

            A 22 de Março de 2010, por apenso à acção executiva sob forma comum com o nº 157/10.2TBCVL, pendente no 2º juízo do Tribunal Judicial da Comarca da Covilhã, G (..), Limitada veio deduzir oposição à referida acção executiva que Condomínio (…) Lda. instaurou contra si, excepcionando a ilegitimidade activa da exequente por não ser administradora do condomínio, nem comprovar essa qualidade, a inexequibilidade do título em virtude de não se mostrar assinado pela opoente, por na acta dada à execução não constar a fixação dos montantes das contribuições devidas ao condomínio ou das despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns ou serviços de interesse comum, bem como da parte de cada condómino nessas despesas, nem tendo fixado o prazo de pagamento, invocando ainda a invalidade da deliberação de que resultou a acta exequenda, por falta de convocação, referindo ainda que a exequente não descreveu os factos donde deriva a dívida exequenda, o que determina falta de causa de pedir e arguindo a nulidade da acta exequenda por força do disposto nos artigos 1424º, 1431º e 1432º, todos do Código Civil.

            A oposição foi liminarmente recebida, ordenando-se a notificação da exequente para, querendo, contestar.

            A exequente contestou a oposição pugnando pela sua total improcedência, oferecendo diversa prova documental.

            Proferiu-se despacho a fixar o valor da causa em € 19.129,12; a pretexto das excepções suscitadas pela opoente incidirem sobre matéria controvertida, relegou-se o seu conhecimento para final, decidindo-se pela abstenção de fixação de base instrutória.

            A opoente veio arguir a nulidade do processado a partir da apresentação da contestação em virtude de não ter sido notificada deste articulado, sendo proferido despacho a declarar a nulidade dos actos praticados após a junção da contestação e documentos, ordenando-se a notificação da contestação e dos documentos apresentados com a mesma.

            A opoente pronunciou-se sobre os documentos oferecidos com a contestação.

            De novo se proferiu despacho a fixar o valor da causa em € 19.129,12 relegando-se para final o conhecimento das excepções deduzidas e decidindo-se pela abstenção de fixação de base instrutória.

            As partes ofereceram as suas provas, requerendo ambas a gravação da audiência final.

            Realizou-se a audiência de discussão e julgamento em duas sessões, proferindo-se decisão sobre a matéria de facto na segunda sessão.

            Após isso, volvidos mais de dez meses sobre a data da conclusão, lavrou-se sentença que julgou improcedentes os embargos (sic), absolvendo-se a exequente do pedido.

            Inconformada com esta decisão, a opoente interpôs recurso de apelação contra a mesma terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:

1) A douta decisão de que se recorre, salvo devido respeito, julgou erradamente improcedentes por não provados os embargos e absolveu a exequente / oponida do pedido.

2) Desde logo decidiu erradamente ao entender que “a exequente é legítima administradora do condomínio”.

3) O artigo 1435.º n.º 1 do Código Civil dispõe que “o administrador é eleito e exonerado pela assembleia”, acrescentando o n.º 1 do artigo 1437.º que “o administrador tem legitimidade para agir em juízo, quer contra qualquer dos condóminos, quer contra terceiro, na execução das funções que lhe pertencem ou quando autorizado pela assembleia”.

4) Na ata junta dada à execução pode ler-se simplesmente que “foi deliberado por unanimidade dos votos presentes, que o administrador deverá diligenciar junto de Advogado a cobrança por via judicial das dívidas existentes até à presente data”, nada se dizendo efetivamente sobre quem é o administrador, nem quando foi eleito e para que período.

5) Na ata junta com o requerimento executivo nada se diz a esse respeito e a Exequente / Oponida não juntou qualquer documento que prove tal legitimidade.

6) A Exequente não tem legitimidade para representar o Condomínio em juízo, facto que o Tribunal “a quo” não podia ter ignorado, pelo que deveria ter decidido pela procedência da alegada exceção dilatória e, em consequência, declarar ilegítima a exequente por não ter poderes para representar em juízo o Condomínio do Edifício (…) absolvendo o Executado da ação executiva, conforme disposto nos artigos 493.º n.º 2 e 494.º al. e) do CPC.

7) Decidiu ainda o douto Tribunal “a quo” que “a ata é título executivo por dela constar a quantia em dívida ”.

8) Tem sido pacífico entre a Jurisprudência o entendimento segundo o qual a ata da reunião da assembleia de condóminos constitui título executivo desde que reúna os seguintes requisitos: 1) fixe os

montantes das contribuições devidas ao condomínio; 2) fixe o prazo de pagamento; e 3) fixe a quota-parte de cada condómino.

9) A Exequente / Oponida apresentou à execução, como título executivo, a acta número quatro, lavrada da reunião de condóminos do Edifício (...) realizada em 17 de Março de 2009.

10) A ata apresentada à execução não contém uma verdadeira deliberação da assembleia a fixar o montante das contribuições devidas pelos condóminos, em função da quota-parte de cada um deles, bem como quanto ao respetivo prazo e modo de pagamento.

11) Tal ata refere tão só as dívidas que foram apuradas por alguns condóminos, não documentando qualquer deliberação sobre as contribuições a cargo dos condóminos que estiveram na base dessa dívida, designadamente a que título é o eventual montante devido, nada se dizendo sobre a natureza da mesma.

12) A ata apresentada à execução não refere qualquer prazo de pagamento nem apresenta qualquer especificação das operações aritméticas que resultaram na quantia reclamada, elemento obrigatório do título executivo.

13) A ata apresentada à execução não reúne os requisitos impostos pelo artigo 6.º do DL. 268/94 de 25/10, não sendo, por isso, título executivo.

14) O artigo 802.º do CPC dispõe claramente que em face do título executivo, a obrigação exequenda deve ser certa, exigível e líquida.

15) Da ata apresentada à execução resulta, em última instância, que o único valor efetivamente apurado e vencido, embora não discriminado, sem que se saiba, por isso, da sua natureza, é de 12.623,09 € nada mais podendo reclamar, com base em tal ata, o exequente / oponido, por falta de título.

16) É entendimento pacífico entre a jurisprudência que entende que as prestações exequíveis são apenas aquelas que estão efetivamente vencidas à data da deliberação.

17) A decisão proferida pelo douto Tribunal “a quo” viola o disposto no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 268/94 de 25/10 e nos artigos 45.º n.º 1 e 802.º do Código de Processo Civil, pelo que deve revogar-se a

sentença recorrida e, dando-se provimento ao presente recurso, ser a mesma substituída por outra que julgue procedente a oposição à execução”.

Foram oferecidas contra-alegações em que se pugna pela total improcedência do recurso.

Dada a simplicidade das questões decidendas, dispensaram-se os vistos e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

            2. Questões a decidir tendo em conta o objecto do recurso delimitado pela recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 684º, nº 3 e 685º-A nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil

2.1 Da ilegitimidade activa da exequente;

2.2 Da inexequibilidade do título exequendo.

3. Fundamentos de facto constantes da decisão sob censura e que não foram objecto de qualquer impugnação, não impondo os elementos do processo decisão diversa, impassível de ser destruída por outras provas não tendo sido oferecido qualquer documento superveniente que por si só seja suficiente para destruir a prova em que a decisão recorrida assentou, a que se aditam os elementos que foram alegados no requerimento inicial e que não foram impugnados pela opoente


3.1

A exequente, na qualidade de administradora do condomínio do Edifício das (...), sito na Rua (...), Covilhã deu à execução acta n.º 4 da Assembleia de Condóminos, datada de 17 de Novembro de 2009[1], onde consta ter exercido as funções de presidente o Sr. (…) em representação da empresa Condomínio (…) Lda. (alínea A dos fundamentos de facto).

3.2

Mais consta da referida acta, no seu ponto n.º 6 “…Relativamente às quotas do condomínio em atraso, foi deliberado …. Que o administrador deverá diligenciar junto de advogado a cobrança por via judicial das dívidas existentes até à presente data e as que se vencerem respeitantes aos seguintes condóminos: - Proprietário da fracção B e C , no montante de 12 623,09 desde Maio de 2007 até Maio de 2009, bem como as quotas que se vencerem (alínea B dos fundamentos de facto).

3.3

O vencimento do funcionário do Centro Comercial é pago pela sociedade (…), Lda. (alínea C dos fundamentos de facto).

3.4

O condomínio emite um recibo atinente a despesas de condomínio por conta do valor pago pelo construtor (alínea D dos fundamentos de facto).

3.5

Apenas a fracção A destinada ao parque de estacionamento não dispunha até 10 de Outubro de 2009 de contador de electricidade autónoma (alínea E dos fundamentos de facto).

3.6

O montante da quota de cada condómino, fixado de acordo com a permilagem, foi deliberado num momento anterior à acta de 17 de Março de 2009 (alínea F dos fundamentos de facto).

3.7

Sendo que cada quota se vende[2] até ao dia oito de cada mês, deliberado em 27 de Abril de 2007 (alínea G dos fundamentos de facto).

3.8

A executada foi notificada dos factos descritos em F) e G) (alínea H dos fundamentos de facto).

3.9

Foram feitas sucessivas interpelações à executada para pagamento dos valores que se foram vencendo, mesmo com anteriores administrações, na pessoa do Sr. (…) (alínea I dos fundamentos de facto).

3.10

Foi endereçada carta registada ao Sr. (…), Galerias (…), sendo o Sr. (…) sócio gerente da Sociedade (…), Lda. com a convocatória de fls. 45, do seguinte teor:

Assembleia

Nos termos do artigo 1432º do Código Civil, serve este meio para convocar todos os condóminos para a Assembleia Geral de Condóminos do prédio sito em:

Rua (...)

(...) Covilhã

A Assembleia Geral decorrerá no local, data e hora abaixo indicados:

Escritório da Administração

Rua (...)

17-03-2009 às 20:30:00

Ordem de trabalhos prevista:

1. Esclarecimento sobre a comparticipação nas despesas do condomínio referentes às fracções “B” e “C”.

2. Aprovação de contas do Ano 2008.

3. Aprovação do orçamento para o Ano 2009.

4. Aprovação de orçamento para colocação de reclame luminoso na fachada do prédio e paineis destinados a publicidade no interior.

5. Aprovar sanções para quotas em dívida.

6. Outros assuntos de interesse para o condomínio.

Se decorridos 30 minutos depois da hora marcada, da assembleia geral acima referida, não estiverem presentes ou representados condóminos titulares da maioria do valor total do prédio, ou não for possível formar a maioria prevista nº nº 4 do artigo 1432º do Código Civil, fica também desde já convocado para nova reunião da Assembleia de Condóminos a realizar no mesmo local e com a mesma ordem de trabalhos, tendo lugar na data abaixo indicada.

Data alternativa: 0  Hora alternativa: 0

Não se verificando as condições acima referidas, a nova Assembleia poderá deliberar por maioria dos votos dos proprietários presentes ou representados, desde que constituam pelo menos um quarto do valor total do prédio, nos termos do nº 4 do citado artigo 1432º do Código Civil.

Com os melhores cumprimentos,

Covilhã, 4 de Março de 2009” (alínea J dos fundamentos de facto).


3.11

As assembleias realizadas do condomínio das (...) foram previamente convocadas, através de convocatória dirigida à oponente (alínea L dos fundamentos de facto).

3.12

Foram enviadas cópias das actas ao Sr. (…)(alínea M dos fundamentos de facto).

3.13

            O montante peticionado por Condomínio (…), Lda. no requerimento inicial executivo respeita às quotas de condomínio das fracções B e C do imóvel sito na Rua (...), Covilhã, à razão mensal de € 268,39 e de € 280,44, respectivamente, desde Maio de 2007 até Janeiro de 2010.

4. Fundamentos de direito

4.1 Da ilegitimidade activa da exequente

A recorrente pugna pela revogação da decisão recorrida com fundamento na ilegitimidade da exequente em virtude de não estar junto aos autos qualquer documento que comprove que a exequente foi eleita administradora do condomínio.

Cumpre apreciar e decidir.

A recorrente não impugnou a decisão da matéria de facto e, logo no ponto 3.1 dos fundamentos de facto, consta que a “exequente, na qualidade de administradora do condomínio do Edifício das (...), sito na Rua (...), Covilhã deu à execução acta n.º 4 da Assembleia de Condóminos, datada de 17 de Novembro de 2009, onde consta ter exercido as funções de presidente o Sr. (…) em representação da empresa Condomínio (…) Lda.

Não tendo sido impugnada a factualidade relativa à qualidade de administradora do condomínio por parte da exequente, tem este tribunal que acatar essa factualidade, já que não se verifica nenhum dos casos em que pode ocorrer a alteração oficiosa da matéria de facto (artigo 712º, nº 1, alíneas b) e c), do Código de Processo Civil).

Deste modo, face à factualidade provada, é manifesta a improcedência da excepção de ilegitimidade activa invocada pela recorrente.

4.2 Da inexequibilidade do título exequendo

A recorrente fundamenta a inexequibilidade do título exequendo na alegação de que a acta dada à execução não discrimina as importâncias nela compreendidas, não contendo a deliberação sobre as contribuições a cargo dos condóminos, nem fixando o prazo para pagamento, nem tão-pouco fixando a quota que compete a cada condomínio, nem o método seguido para determinação de tal valor. Finalmente, a exequente alega que se porventura for entendido que o título exequendo é título executivo, nunca poderão ser exigidos montantes vencidos após a deliberação exequenda, nem pedidos juros de mora por falta de fixação de prazo de pagamento.

Cumpre apreciar e decidir.

A acção executiva é aquela em que o autor requer as providências adequadas à reparação efectiva do direito violado (artigo 4º, nº 3, do Código de Processo Civil). Daí que para instaurar a acção executiva se exija um instrumento que, com grande probabilidade, comprove a existência do direito alegadamente violado. Esse instrumento é o título executivo pelo qual se aferem o fim e os limites da acção executiva (artigo 45º, nº 1, do Código de Processo Civil), bem como os sujeitos activos e passivos nessa acção (artigo 55º, nº 1, do Código de Processo Civil).

Os títulos executivos estão legalmente tipificados, de forma fechada (artigo 46º, nº 1, do Código de Processo Civil) e resultam de procedimentos de heterovinculação (sentenças condenatórias, requerimentos de injunção e certas certidões) ou de autovinculação (documentos autênticos, autenticados e particulares).

No caso dos autos, o título exequendo é constituído por documento particular (artigo 363º, nº 2, do Código Civil): acta de assembleia de condóminos.

Nos termos do disposto no artigo 6º, nº 1, do decreto-lei nº 268/94, de 25 de Outubro, “A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido na sua quota-parte.”

O antecedente legislativo desta previsão está no artigo 23º do decreto-lei nº 40.333, de 14 de Outubro de 1955 que veio regular, pela primeira vez entre nós, de forma global, o regime da propriedade horizontal[3], prevendo o referido artigo que a “acta da sessão que tiver deliberado quaisquer despesas constituirá título executivo, nos termos do artigo 46º do Código de Processo Civil, contra o proprietário que deixar de entregar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte, à qual acrescerão os juros legais de mora.

O artigo 3º do decreto-lei nº 47.344, de 25 de Novembro de 1966, que aprovou o Código Civil actualmente vigente, dispôs no seu artigo 3º que desde “que principie a vigorar o novo Código Civil, fica revogada toda a legislação civil relativa às matérias que esse diploma abrange, com ressalva da legislação especial a que se faça expressa referência.”

Nenhum dos artigos do decreto-lei nº 47.344, de 25 de Novembro de 1966 contém qualquer referência ao regime da propriedade horizontal.

A questão da vigência do artigo 23º do decreto-lei nº 40.333, de 14 de Outubro de 1955 após a entrada em vigor do Código Civil dividiu a jurisprudência, dando origem a decisões contraditórias.

Pela nossa parte, na senda dos acórdãos do Tribunal da Relação de Évora, de 14 de Abril de 1994[4] e do Tribunal da Relação de Coimbra, de 10 de Janeiro de 1995[5], cremos que o artigo 23º do decreto-lei nº 40.333, de 14 de Outubro de 1955, dada a sua natureza processual, continuou a vigorar após a entrada em vigor do Código Civil actualmente vigente[6]. Por outro lado, a previsão do artigo 6º, nº 1, do decreto-lei nº 268/94, de 25 de Outubro não conforta necessariamente a posição daqueles que entendiam que o citado artigo 23º tinha sido revogado tacitamente com a entrada em vigor do actual Código Civil. Ao invés, parece que tal previsão terá antes carácter interpretativo, visando pôr termo ao dissídio jurisprudencial até então existente, pelo que em nada colidirá com a interpretação da sobrevivência do citado artigo 23º à entrada em vigor do actual Código Civil.

De acordo com o que ficou exarado no preâmbulo do decreto-lei nº 268/94, é objectivo declarado deste diploma “procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros.

A jurisprudência tem-se dividido na delimitação das deliberações da assembleia de condóminos passíveis de servirem de título executivo nos termos previstos no artigo 6º, nº 1, do decreto-lei nº 268/94.

Entendem uns, de forma restritiva, que apenas são título executivo as actas em que estejam exaradas as deliberações da assembleia de condóminos que tiverem procedido à fixação dos montantes das contribuições devidas ao condomínio, fixando-se o prazo de pagamento e a quota parte de cada condómino[7], enquanto outros se bastam com a acta que retrate a deliberação do condóminos onde se procedeu à liquidação dos montantes em dívida por cada condómino[8].

Pela nossa parte, tendo em conta a letra do artigo 6º, nº 1, do decreto-lei nº 268/94, que alude ao montante das contribuições devidas e não à fixação dessas contribuições, tendo em conta a teleologia dessa previsão expressa no preâmbulo do citado decreto-lei e tendo ainda em conta que a detenção de um título executivo em que o devedor não teve intervenção não altera as regras gerais de distribuição do ónus da prova, cabendo por isso ao Administrador do Condomínio demonstrar os factos constitutivos do crédito exequendo, quando os mesmos sejam impugnados pelo devedor, afigura-se-nos que deve ser seguida a posição jurisprudencial de que é também exequível a acta que retrate a deliberação do condóminos onde se procedeu à liquidação dos montantes em dívida por cada condómino. Por outro lado, sendo tal acta integrada pela descrição dos factos constitutivos do crédito exequendo, nos termos previstos no artigo 810º, nº 1, alínea e), do Código de Processo Civil, o executado está em condições de exercer eficazmente o contraditório.

No caso em apreço, além da liquidação do montante global em dívida pelo executado até Março de 2009, o exequente discriminou no requerimento executivo os valores que correspondiam, mensalmente a cada fracção detida pela recorrente e o prazo de pagamento, alegações que não foram impugnadas pela opoente e que por se tiveram por assentes.

Ficou demonstrado o prazo de pagamento das quotas do condomínio (veja-se o ponto 3.7 dos fundamentos de facto), vencendo-se o montante de cada quota mensal no dia oito de cada mês, sendo devidos juros de mora sobre cada uma dessas quotas, à taxa supletiva legal, desde o dia oito do mês a que respeitam e até efectivo e integral pagamento (artigos 805º, nº 2, alínea a) e 806º, nºs 1 e 2, ambos do Código Civil).

Assente o prazo de pagamento das quotas do condomínio e o montante dessas quotas, nenhum impedimento havia a que se pedisse, como pediu a exequente, o pagamento das quotas vencidas após a deliberação exequenda e até à propositura da acção executiva, competindo ao opoente a alegação e prova do pagamento de tais prestações. De facto, a deliberação exequenda foi no sentido de que “o administrador deverá diligenciar junto de advogado a cobrança por via judicial das dívidas existentes até à presente data e as que se vencerem respeitantes aos seguintes condóminos: - Proprietário da fracção B e C , no montante de 12 623,09 desde Maio de 2007 até Maio de 2009, bem como as quotas que se vencerem” (ponto 3.2 dos fundamentos de facto).

Assim, por tudo quanto precede, conclui-se pela total improcedência do recurso.

5. Dispositivo

Pelo exposto, em audiência, os juízes abaixo-assinados da segunda secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra acordam em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto por Galerias (…) Limitada e, em consequência, em confirmar a sentença recorrida proferida a 07 de Fevereiro de 2012. Custas do recurso de apelação a cargo da recorrente, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, à taxa de justiça do recurso.


***

Carlos Gil ( Relator)

Fonte Ramos

Carlos Querido



[1] Corrigiu-se o ano, pois é patente que os factos não puderam ter-se passado no ano 209.
[2] Cremos que se terá querido dizer “vence”.
[3] Antes disso existiam previsões esparsas que se referiam ao fenómeno jurídico em causa, sem porém conterem um regime geral e tendencialmente global do instituto em causa, como ressalta do ponto 1 do preâmbulo do decreto-lei nº 40.333. Sobre a figura, no domínio do Código Civil de 1867, de forma resumida, veja-se, Da Propriedade e da Posse, Edições Ática, 1952, nº 2, da Colecção Jurídica Portuguesa, Doutor Luís da Cunha Gonçalves, páginas 101 a 109.
[4] Publicado na Colectânea de Jurisprudência, ano XIX, tomo II, páginas 263 a 265.
[5] Publicado na Colectânea de Jurisprudência, ano XX, tomo I, páginas 24 a 27.
[6] Neste sentido, na doutrina, vejam-se, A Propriedade Horizontal no Código Civil de 1966, Revista da Ordem dos Advogados, ano 30, 1970, I-IV, Armindo Ribeiro Mendes, páginas 68 e 69 e A Propriedade Horizontal no Código Civil, Almedina 1998, Rui Vieira Miller, páginas 316 a 318.
[7] Neste sentido vejam-se os seguintes acórdãos: do Tribunal da Relação do Porto, de 16 de Junho de 2009, proferido no processo nº 12447/06.4YYPRT-B.P1 e de 06 de Setembro de 2010, proferido no processo nº 2621/07.1TJVNF-A.P1; do Tribunal da Relação de Lisboa de 17 de Fevereiro de 2009, proferido no processo nº 532/05.4TCLRS-7; do Tribunal da Relação de Évora, de 28 de Janeiro de 2010, proferido no processo nº 6924/07.7TBSTB.E1, todos acessíveis no site do ITIJ; afirmam desnecessária deliberação que proceda à liquidação dos montantes em dívida os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, de 24 de Fevereiro de 2011, proferido no processo nº 3507/06.2TBMAI-A.P1 e de 18 de Outubro de 2011, proferido no processo nº 2728/07-5TBVFR-A.P1, ambos acessíveis no site do ITIJ.
[8] Neste sentido vejam-se: o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 02 de Junho de 1998, publicado na Colectânea de Jurisprudência Ano XXIII, 1998, Tomo III, páginas 190 a 192; os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de 02 de Março de 2004, proferido no processo nº 10468/2003-1, de 29 de Junho de 2006, proferido no processo nº 5718/2006-6, de 08 de Julho de 2007, proferido no processo nº 9276/2007-7; do Tribunal da Relação de Évora, de 17 de Fevereiro de 2011, proferido no processo nº 4276/07.4TBPTM.E1.