Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1303/09.4PBLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BRÍZIDA MARTINS
Descritores: DESPACHO DE NÃO PRONÚNCIA
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
Data do Acordão: 04/06/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DE INSTRUÇÃO CRIMINAL DE LEIRIA (3.º JUÍZO).
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 97º Nº 4º E 123º CPP
Sumário: 1. O despacho de não pronúncia não está sujeito às exigências de fundamentação das sentenças, estabelecidas no artº 374º CPP, mas apenas ao dever genérico, previsto no nº 4 do artº 97º do mesmo diploma.
2.- Assim, a falta de fundamentação do referido despacho constitui uma irregularidade, sujeita ao regime geral do artº 123º CPP.
3.- Irregularidade a dever ser atempadamente suscitada perante o juiz de instrução, sob pena de se considerar sanada.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.

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I – Relatório.

1.1. Nos autos de instrução em causa, nos quais se mostra requerente o assistente GS..., e requerido o arguido AH..., ambos já devidamente identificados, foi proferida decisão instrutória, a fls. 351/367, com data de 28 de Setembro de 2010, que não pronunciou o arguido.

Decisão esta proferida findo o decurso da fase de instrução cuja abertura o assistente requerera no intuito de infirmar o despacho de arquivamento que o Ministério Público exarara relativamente a uma queixa que apresentara contra o dito arguido, alegadamente incurso na prática de factualidade consubstanciadora da autoria material consumada de um crime de furto qualificado, previsto e punido através das disposições conjugadas dos art.ºs 203.º e 204.º, n.º 1, alíneas a) e b), ambos do Código Penal.

1.2. O assistente irresignado interpôs recurso pugnando pela revogação dessa decisão e sua substituição por outra que pronuncie o arguido pelo denunciado crime de furto qualificado (por lapso manifesto, mencionou “homicídio por negligência”!), apresentando 74 conclusões, as quais todavia se podem, essencialmente, resumir no seguinte:

1. A matéria de facto dada como provada na decisão recorrida não se mostra consentânea com a produção de prova que foi feita, quer na primitiva fase de inquérito, quer ulteriormente já na presente fase de instrução.

2. Embora o despacho recorrido tenha começado por fazer o saneamento do processo, considerando não haver nulidades ou questões prévias e, seguidamente, passado a conhecer sobre o mérito do requerimento instrutório, tendo concluído pela não pronúncia do arguido,

3. Certo é que omite, no entanto, e completamente, a decisão fáctica, isto é, não descreve nem especifica quais os factos do requerimento instrutório que considera suficientemente indiciados e os que não considera suficientemente indiciados.

4. Só após essa enumeração é que se poderia seguir a tarefa de decidir se os factos indiciados eram ou não suficientes para a sujeição do arguido a julgamento pelo crime imputado.

5. O cumprimento dessa exigência é essencial para a fixação dos efeitos do caso julgado da decisão de não pronúncia, ficando o valor deste despacho, consequentemente, afectado por via de tal omissão.

6. Sendo assim, a decisão recorrida padece de irregularidade que pode ser conhecida oficiosamente, por aplicação ao caso do disposto no artigo 123.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

7. O despacho de não pronúncia de que ora se recorre, está enfermo de contradição, na medida em que a prova produzida no inquérito e na instrução, impunham decisão diversa da constante do despacho recorrido.

8. De acordo com o disposto no artigo 308.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, a fase de instrução termina com a prolação do despacho de pronúncia sempre que, da prova recolhida no inquérito e nas diligências instrutórias, resultarem indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança.

9. Critério que é concretizado no artigo 283.º, n.º 2, aplicável ex vi do n.º 2 daquele artigo 308.º, no sentido de que os indícios devem ser considerados suficientes sempre que deles resultar a possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança.

10. Juízo de probabilidade sobre a verificação dos elementos objectivos dos tipos de crime (únicos que importam considerar para efeito da decisão instrutória) que, no presente caso, face aos elementos de prova recolhidos em inquérito e na instrução, deve considerar-se completamente assegurado, relativamente ao crime denunciado pelo recorrente e a que respeita este recurso.

11. Verifica-se que a prova testemunhal e documental constante dos autos não deixa persistir quaisquer dúvidas sobre o preenchimento dos elementos objectivos deste crime.

12. Ficou cabalmente demonstrado que o carro [ZP... de matrícula ...] foi comprado pelo assistente.

13. Vejam-se os depoimentos das testemunhas mencionadas ao longo da motivação, que confirmaram que quem comprou o veículo foi o assistente, quem escolheu o carro foi o assistente, e que o arguido nunca compareceu no stand de vendas onde o assistente comprou o dito carro – veja-se a venda a dinheiro junta aos autos a fls. 22 –.

14. O M.mo Juiz a quo preferiu dissertar acerca do que as testemunhas disseram, e interpretar tais depoimentos de forma que se tem por inadequada, sem pronunciar o arguido.

15. Na verdade, do decurso da instrução resulta provado que quem comprou efectivamente o carro foi o assistente.

16. Resulta provado também ser ele o seu proprietário.

17. Sendo quem detinha a sua posse, tendo efectivamente praticado actos de gestão, manutenção e utilização, de forma pública e pacífica.

18. Até o arguido haver decidido furtá-lo para si, o carro que não era seu, facto que conhecia.

19. Também resulta dos depoimentos colhidos que a forma que o arguido acordou com o pai do assistente para pagar uma dívida da venda de um barracão, era efectivamente aquele pagar o veículo ao assistente.

20. Porque o assistente na data em que o arguido acordou com o seu pai a forma de liquidação da sua dívida, andava à procura de um carro.

21. Como o pai do assistente não tinha forma de poder pagar o carro que lhe (ao seu filho) tinha prometido, resolveu então acordar com o arguido não receber o valor em falta da venda do barracão, desde que o arguido pagasse o valor do carro escolhido pelo assistente.

22. Foi o arguido quem negociou o seu próprio financiamento junto da entidade bancária para poder pagar o carro ao assistente.

23. Foi ele que contratou com a entidade financiadora um empréstimo com juros mais caros do que o normal, como o próprio se queixou nas declarações que prestou.

24. No despacho recorrido, o M.mo Juiz não valorou correctamente os depoimentos das testemunhas arroladas pelo assistente, e do próprio assistente, que se mostraram isentas e conhecedoras de toda a matéria factual, e sem pertencerem à família do assistente.

25. O M.mo JIC deu como provado, com o depoimento do irmão do arguido, uma conversa que diz que ouviu deste, sendo certo que “o quando” não soube precisar, que o assistente pagou àquele duas prestações.

26. Tal não é mais do que um disparate, pois o assistente não pagou ao arguido qualquer quantia, muito menos referente às prestações do carro.

27. Isto porque é claro, o assistente nada deve ao arguido.

28. Mas sim o contrário.

29. O arguido, quando prestou declarações, referiu que o assistente lhe entregara uma letra.

29. A afirmação foi negada pelo assistente, aquando das suas declarações, referindo este, que desconhecia qualquer letra na posse do arguido, bem como a assinatura que dela constava, quando confrontado com a fotocópia singela do documento.

30. Qual terá sido a motivação do M.mo JIC, quando considera provado que o assistente pagou ao arguido duas prestações – cujo valor não refere, nem a forma de pagamento, nem a data – e entregou uma letra – impugnada pelo assistente?

31. Após a produção da prova, o M.mo JIC não podia ter feito “suposições”.

32. Apenas e antes se deve limitar a demonstrar o que está ou não provado – de direito e de facto – e fundamentar, o que não se verificou, in casu.

33. Motivo pelo qual o despacho recorrido deve ser revogado e substituído por outro que pronuncie o arguido pelo cometimento de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos art.ºs 203.º e 204.º, alíneas a) e b), do Código Penal.

34. Mas, mesmo a subsistir tal despacho, verdade é que o arguido não poderia ter agido como agiu.

35. Isto porquanto à face do nosso ordenamento jurídico, não é permitido fazer justiça própria, ou melhor dizendo, fazer justiça com as próprias mãos.

36. O assistente refere no seu requerimento de abertura de instrução, e o arguido confessou aquando da sua inquirição, que o arguido aproveitou o facto de se encontrar com o assistente no escritório do mandatário do assistente numa reunião, para mandar vir um reboque e levantar o carro que na altura estava na posse do assistente.

37. Tal facto consubstancia-se num ilícito, que, mesmo que não se venha dar como provado ter existido, existem outras formas legais, para resolver essas questões;

38. Sucede que o M.mo Juiz a quo, ao arrepio do que devia ter feito, não apreciou essa questão suscitada pelo assistente, nem todas as provas constantes do processo, pois não considerou as que não constam da instrução.

39. A decisão recorrida não contém um único facto concreto susceptível de revelar, informar e fundamentar a real e efectiva situação que determinou a não pronúncia do recorrido.

40. Ademais do disposto nos art.ºs 307.º e 308.º, ambos do Código de Processo Penal, tal decisão violou ainda o disposto nos art.ºs 13.º; 27.º; 28.º; 32.º; 202.º, n.º 2; 204.º e 205.º, todos da Constituição da República Portuguesa.

1.3. Dado cumprimento ao disposto no art.º 413.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, responderam quer o Ministério Público, quer o arguido, sustentando ambos dever prevalecer a decisão recorrida.

1.4. Proferido despacho admitindo o recurso, foram os autos remetidos para esta 2.ª instância.

1.5. Aqui, com vista respectiva, nos termos do art.º 416.º, n.º 1, do mesmo diploma adjectivo, a Ex.ma Procuradora-geral Adjunta emitiu parecer conducente a idêntica manutenção do decidido, vale por dizer, de improvimento do recurso.

1.6. Acatado o estatuído pelo subsequente art.º 417.º, n.º 2, nada disse o recorrente.

No despacho a que alude o n.º 6 deste mesmo inciso, consignou-se que nenhuma circunstância sobrevinha impondo a sua apreciação sumária, e, igualmente, nada obstava ao conhecimento de meritis. Daí que devessem prosseguir os autos, com recolha de vistos e submissão à presente conferência.

Urge, pois, ponderar e decidir.


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II. Fundamentação.

2.1. Relevante para a ponderação ora reclamada, o excerto seguinte da decisão recorrida, que passamos a descrever:

“3. Fundamentação.

Dispõe o art.º 286.º n.º 1 do Código de Processo Penal que «A instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito, em ordem a submeter ou não a causa a julgamento».

Por outro lado, determina o art.º 283.º n.º 1 do mesmo diploma que «Se durante o inquérito tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se ter verificado o crime e de quem foi o seu agente, o Ministério Público deduz acusação contra ele».

Sobre o que sejam de considerar indícios suficientes, o art.º 283.º n.º 2 do Código de Processo Penal esclarece que «Consideram-se suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, uma pena ou uma medida de segurança».

Veio assim o legislador consagrar o entendimento que já se encontrava jurisprudencialmente sedimentado, de que é paradigma o Ac. da RL de 4 de Novembro de 1981, Col. Jurisp. T. V, p. 184 e ss, ao referir que são indícios suficientes, «...os factos ou conjunto de factos que, relacionados e conjugados, persuadem da culpabilidade do agente, e fazem nascer a convicção de que, a manterem-se a julgamento, virá aquele a ser condenado pelo crime que lhe é imputado, importando ter-se em mente, na avaliação em cada caso, dessa suficiência, que não deve o julgador sujeitar o arguido a vexames e despesas inúteis».

Quer-se com isto dizer que, enquanto a condenação, em sede de julgamento, apenas se basta com um juízo de certeza, para efeitos de acusação ou de pronúncia basta um juízo de razoabilidade de ter sido cometido um facto tipicamente ilícito e de determinado agente ter sido o seu autor.

Como refere Germano Marques da Silva (in «Curso de Processo Penal», vol. III, pág. 182-183), «...nas fases preliminares do processo não se visa alcançar a demonstração da realidade dos factos, antes e só, indícios, sinais de que o crime foi eventualmente cometido por determinado arguido». As provas recolhidas nas fases preliminares do processo não constituem pressuposto da decisão jurisdicional do mérito, mas sim mera decisão processual quanto à prossecução do processo até à fase de julgamento.

De tudo o exposto resulta que para a pronúncia, tal como para a acusação, a lei não exige a prova no sentido de certeza moral da existência do crime, bastando-se com a existência de indícios, de sinais da ocorrência do crime, dos quais se pode formar a convicção de que existe uma possibilidade razoável de que o crime foi praticado pelo arguido.

                                                                       *

O assistente, e em síntese, imputa ao arguido a prática dos factos que se traduzem em o mesmo no dia 13-11-2009 lhe ter retirado a viatura de marca ZP..., matrícula ... e que o mesmo vinha usando já desde algum tempo:

 - Apesar da viatura automóvel se encontrar registada em nome do arguido a mesma não lhe pertence, nem nunca lhe pertenceu;

 - A viatura foi vendida pelo Stand ..., ao arguido; a compra do veículo em causa, foi forma de liquidar parte do valor da venda das instalações que o mesmo comprou ao pai do assistente MM..., em ....

- Dai o arguido ter-se responsabilizado, pelo pagamento junto do banco, pois foi esse o negócio que celebrou com o pai do assistente, pelo que o requerente nunca deu qualquer autorização, quer escrita quer verbal, para o mesmo poder conduzir o veículo em causa.

 - Foi sempre o assistente que desde a data da sua aquisição, no Stand ... até à data em que o veículo foi removido, utilizou e usufruiu do referido veículo, pagando todas as suas reparações, zelando pela sua manutenção e limpeza; o assistente sempre esteve na posse, uso e fruição daquela viatura até ao dia da remoção por parte  da assistência em viagem; o assistente sempre praticou os factos e actos de posse pública e pacificamente à vista de toda a gente, e sem oposição de ninguém, pelo que a viatura é única e exclusiva do assistente, pelas razões invocadas;

- No interior da viatura em causa encontravam-se todos os objectos que constam do auto de apreensão de fls. 64;

- A quantia de 550 euros que existiam à data em que o veículo foi retirado pelo arguido ao assistente e se encontrava no interior da mesma, tendo utilizado em proveito próprio, bem sabendo que o mesmo não lhe pertencia. 

                                                                         *

Porém a prova coligida em sede de inquérito e de instrução não permite indiciar com suficiência os factos acima imputados ao arguido quando lhe imputam a prática de um crime de furto.

Vejamos a razão do nosso entendimento.

Nos termos do art.º 127.º do CPP, sempre que a lei não disponha de modo diverso, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador. O princípio da livre apreciação da prova é válido para todas as fases processuais, incluindo a da instrução. Não equivale a prova arbitrária. O juiz não pode decidir como lhe apetecer, passando arbitrariamente por cima das provas produzidas. A convicção do juiz não pode ser puramente subjectiva, emocional e portanto imotivável.

Ora, embora a decisão do juiz tenha sempre uma convicção pessoal, até porque nela desempenham um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis e mesmo puramente emocionais – v. Prof. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, vol. 1, ed. 1974, p. 204 –, tem sempre de ser fundamentada objectivamente, para permitir o seu controlo, constituindo uma garantia contra a arbitrariedade;

Como refere aquele professor, na ob. cit., p. 203, se a verdade que se procura é uma verdade prático-jurídica, e se, por outro lado, uma das funções primaciais de toda a sentença é a de convencer os interessados do bom fundamento da decisão… a convicção do juiz há-de ser… em todo o caso uma convicção objectivável e motivável, portanto, capaz de se impor aos outros … em que o tribunal tenha logrado convencer-se da verdade dos factos para além de toda a dúvida razoável; 

«O art.º 127.º do CPP, – como bem referiu o Ac. RP de 10-10-2001, relatado pelo Ex.mo Juiz Desembargador Clemente Lima, in www.dgsi.pt, indica-nos um limite à discricionariedade do julgador: as regras da experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica. Se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis segundo as regras da experiência, ela será inatacável, já que foi proferida em obediência à lei que impõe que ele julgue de acordo com a sua livre convicção».

Voltando ao caso verifica-se que a fls. 22 consta um documento intitulado «venda a dinheiro n.º …» segundo o qual o «Stand ...» teria vendido o veiculo ZP... 346 CD Coupe com a matrícula ... ao assistente GS... pelo preço de 26 000 euros e que este terá pago a pronto de pagamento.

Igualmente a fls. 69 dos autos consta um documento segundo o qual o Stand ... teria vendido o veículo em causa a GS... mas o crédito foi feito em nome do arguido AH....

Indicia-se assim que o Stand em causa terá vendido o veículo ... ao assistente GS....

Também as testemunhas vendedores de automóveis do «Stand ...» referiram que a negociação do veiculo ocorreu entre os mesmos e o assistente GS... não tendo o arguido AH... tido qualquer intervenção na escolha do carro e na conclusão da sua compra.

Tudo indicia pois que, tendo em conta o principio da consensualidade na transmissão dos direitos reais, e não carecendo o negócio de venda de automóvel qualquer formalismo em especial, o veículo foi vendido ao assistente.

Importa agora analisar a relação negocial ocorrida entre o assistente e o arguido.

O assistente sustenta que apesar do veículo se encontrar em nome do arguido na realidade o proprietário do mesmo era o próprio assistente, que aliás o vinha fruindo de um modo absoluto.

A prova coligida nos autos não permite concluir no sentido da versão do assistente, mesmo em sede indiciária.          

1. Sustenta o assistente que o crédito contraído pelo arguido perante a respectiva entidade bancária foi uma contrapartida do pagamento do resto do preço de umas instalações sitas em ... e que MM..., pai do assistente, tinha vendido ao arguido.

A prova reunida nos autos não permite concluir com credibilidade em tal sentido. Na verdade, o próprio assistente faz alusão ao negócio em causa de um modo muito geral e abstracto, sem a mínima concretização possível. O negócio das instalações (e que instalações?) terá sido realizado por 800 000 euros e o arguido continuou a pagar tal quantia e só não pagou o valor corresponde ao preço do carro. Ora não se compreende que tal obrigação do arguido não tenha ficado exarada na própria escritura do negócio celebrado. Também não se compreende que a obrigação do arguido não tenha sido redigida a escrito em documento «ad hoc».

2. Se na verdade o arguido se obrigou a pagar todas as prestações do carro, como contrapartida do tal negócio, não se compreende o motivo pelo qual o assistente tenha pago ainda ao arguido duas prestações do veículo – v. neste sentido o  depoimento de José de Oliveira, apesar de irmão do arguido -  quando referiu que em conversações que manteve com o arguido este lhe confidenciou que  o assistente tinha pago apenas duas prestações do carro e que depois não pagou mais nenhuma - v. fls. 283 – também nesta sede as declarações do arguido  a fls. 319 quando referiu que  em relação às duas primeiras prestações  deram-lhe um cheque de  900 euros  e posteriormente uma letra – afirmações que surgem contextualizadas.

3. Também não se compreende que tendo-se obrigado o arguido como dívida de parte do preço de um imóvel a pagar o preço do veículo perante o banco financiador e que o assistente tenha ainda assinado uma livrança em branco – v. fls. 208 - com vista a garantir   o valor do preço do veiculo à entidade financiadora. Se, na verdade, o arguido tinha de entregar o valor do preço do veiculo como contrapartida perante o pai do assistente não tinha o próprio assistente de assumir a obrigação perante a entidade bancária do valor do veiculo, pois corria o risco de se ver accionado pelo valor do veículo e perder a contrapartida no negócio de venda das instalações.

É claro que é fácil ao assistente negar, quando confrontado com a respectiva letra, que se trata da sua assinatura, mas não se vislumbrando qualquer interesse de tal alegada falsificação por parte do arguido, tanto mais que o documento original se encontra na posse da entidade financiadora. 

4. A obrigação assumida pelo arguido perante a respectiva entidade bancária – B... – de financiar a aquisição do veículo é compatível com o facto de o pai do assistente querendo comprar um veiculo ao seu filho e não dispondo de crédito – foi objecto de insolvência e encontrando-se no Brasil como resulta dos autos – e em face de uma relação de confiança com o arguido decorrente de negócios mantidos, este ultimo tenha assumido a obrigação de se vincular perante o banco, mediante, por sua vez, da obrigação do pai do assistente e/ou deste último virem a pagar, no futuro, as prestações do veiculo em causa – esta a versão transmitida pelo arguido e que perece verosímil.

5. Ou seja, a prova coligida nos autos permite apontar no sentido de o arguido, assistente e pai deste último terem acordado num contrato segundo o qual, embora o assistente tenha adquirido o veiculo ZP... ao respectivo stand, este direito de propriedade transferiu-se para o assistente como garantia do pagamento do preço do mesmo, em face da obrigação assumida pelo arguido perante a entidade bancária – B.... E com o pagamento da última prestação do veículo ZP... por parte do assistente, ou do seu pai ao arguido, então GS… passaria a ser o verdadeiro proprietário do veículo.

Na verdade, um conjunto de fortes indícios apontam neste sentido e além do já referido, há ainda que destacar:

- A propriedade do veículo automóvel foi registada em nome do arguido v. fls. 35 e 41;

- O veículo foi segurado em nome do arguido v. fls. 36; 44; 209;

- O imposto se circulação foi liquidado em nome do arguido v. fls. 45;

- A inspecção periódica foi realizada em nome do arguido v. fls. 210.

- O próprio arguido referiu que o que foi acordado foi que «o carro era para ficar em meu nome até que ele mo pagasse depois! Eu não ia fazer o crédito e deixar o carro em nome dele» v. fls. 314.

E claro está, na pendência do vencimento das prestações devidas à entidade bancária, o assistente podia ir fruindo as utilidades do veiculo, andando com ele fazendo as revisões. Mas com a falta de pagamento de tais prestações, e conforme parece resultar da vontade das partes envolvidas no acervo negocial, o arguido podia accionar a sua garantia que se traduz nos poderes formais que lhe conferem o direito de propriedade.

E em face do não pagamento por parte  do assistente e das sucessivas interpelações foi acordado uma reunião no escritório do ilustre advogado do assistente, onde chegou a ser sugerido ao próprio assistente – v. declarações do arguido de fls. 319 -  «se sabias  que não tinhas  condições para pagar aquele carro  não tinhas nada  que estar  a comprar  o carro (…) mas tu não tens condições para pagar o carro o que queres fazer?». Ao que o assistente terá respondido – segundo a versão do próprio arguido – «pronto, eu sei que lhe tenho de dar o carro, até lhe posso dar as chaves» ao que o arguido referiu «Pronto, deixa ver as chaves que eu levo o carro e acabou». Mas após um telefonema ao pai foi recusada a entrega das chaves.

Ora em face do incumprido e conforme vontade das partes aquando da negociação, o arguido procedeu à remoção do veiculo ZP... fazendo accionar os seus poderes de proprietário como garante do não pagamento das prestações devidas ao banco.    

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No que concerne ao imputado furto de 550 euros que se encontravam, alegadamente, em numerário no interior do veiculo aquando da sua remoção encontrando-se o veiculo fechado, cumpre referir que segundo a testemunha que procedeu à abertura do veiculo nas instalações da XX… – RM... v. fls. 62 -  e o próprio arguido que se encontrava presente, apenas se encontrava no  interior do mesmo a quantia de 50 euros , e não qualquer outra quantia. Tal quantia foi utilizada pelo arguido para proceder ao pagamento de várias infracções e dívidas do veículo ter transitado pela Via Verde – v. fls. 42 e 42 em valor superior a tal quantia.

Aliás, diga-se que os 50 euros se encontravam no interior de uma carteira pertencente ao assistente no interior do veículo. O alegado que se encontrariam 500 euros no interior do tablier do carro parece ir contra todas as máximas da experiência e não se revela credível, pois e na eventualidade de o veiculo ser furtado (o seu interior) como está sujeito qualquer veiculo estacionada numa rua da cidade de ..., de onde foi removido, correria um risco desnecessário já que não foi invocado qualquer motivo para tal quantia ter ficado no interior do veiculo.

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Imputa-se ao arguido a prática de um crime de furto qualificado p. e p. pelo art.ºs 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1 als. a) e b)  do Código Penal

Preceitua o art.º 203.º, n.º 1, do Cód. Penal que «Quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair coisa imóvel alheia, (...)».

São elementos do tipo legal em análise, a ilegítima intenção de apropriação e a subtracção de coisa móvel alheia.

A ilegítima intenção de apropriação é um elemento subjectivo do tipo de furto, que se traduz numa actuação do agente contrária ao direito, e por isso ilegítima, visando integrar no seu património ou no de terceiro uma determinada coisa, que sabe não ser sua.

Refere o professor José de Faria e Costa, Comentário Conimbricense do Código Penal, parte especial, tomo II, Coimbra Editora, pág. 33, que « (...) O elemento “intenção de apropriação” – que para além de tudo a lei exige ainda que seja ilegítimo, isto é, contrário ao direito – deve ser visto e valorado como a vontade intencional do agente de se comportar, relativamente a coisa móvel, que sabe não ser sua, como seu proprietário, querendo, assim, integrá-la na sua esfera patrimonial ou de outrem, manifestando, assim, em primeiro lugar, uma intenção de (des)apropriar terceiro.(...).

Outro elemento do tipo em análise é que a actuação do agente vise subtrair coisa móvel alheia, ou seja, que vise retirar da posse de terceiro, e contra a vontade desse terceiro, coisa que não é imóvel e que é susceptível de apropriação.

Refere o professor José de Faria e Costa, na obra supra-citada, pág. 39, que « (...) na obstante não apresentarem características de res corpórea, devem ser tidas como coisas para o direito penal desde que sejam controláveis e quantificáveis (...)». Por outro lado, e quanto ao carácter alheio, refere o mesmo professor, na obra citada, pág. 41, que « (...) É alheia (...) toda a coisa que esteja ligada, por uma relação de interesse, a uma pessoa diferente daquela que pratica a infracção.». Por último, e quanto ao entendimento que se deve ter do conceito subtracção, refere o ilustre professor, pág. 43, que « (...) Subtracção traduz-se em uma conduta que faz com que a coisa saia do domínio de facto do precedente detentor ou possuidor. Implica, por conseguinte, a eliminação do domínio de facto que outrem detinha sobre a coisa. (...)».

Sendo o crime de furto um crime doloso, este elemento é preenchido pelo dolo específico, concretizado na intenção do agente de, contra a vontade do proprietário, fazer a coisa sua, integrando-a na sua esfera patrimonial.

No caso concreto dos autos e em relação ao veículo automóvel de marca ZP... subtraído pelo arguido verifica-se que o mesmo era o seu verdadeiro proprietário à data dos factos pelo que não se encontra preenchida a condição de coisa alheia.

E note-se como flui das considerações realizadas que igualmente o poder com alguma estabilidade que o assistente vinha fruindo do veiculo em causa estava convencionalmente ligado a uma contraprestação da sua parte que era o pagamento das prestações do veiculo que se iam vencendo ao arguido que por sua vez as liquidava à entidade bancária respectiva.

O não pagamento de tais prestações, conforme acordado pela vontade hipotética das partes, à data da celebração do negócio, legitimava que fosse accionada em termos de facto os poderes formais do proprietário – o arguido – e desse modo pudesse – como veio a suceder – remover o veiculo em causa.

Em relação aos 50 euros que se encontravam no interior do veiculo ZP... e que pertenciam ao assistente vieram a ser gastos no pagamento de despesas de utilização do veiculo, a cargo do assistente, como tinha sido tacitamente acordado pelas partes e sendo o arguido credor, e em face de momentos antes ter apurado que o assistente não se encontrava em condições de lhe pagar o que lhe devia e reteve tal valor, que veio a utilizar no pagamento das despesas do veiculo em auto-estrada.

Em todo o caso e uma vez que a situação dos autos se enquadra no contexto de uma relação obrigacional complexa assumida entre arguido e assistente, a pretensão do assistente, poderá quando muito inserir-se no âmbito da responsabilidade civil contratual mas não no âmbito do Direito Penal.  

No caso concreto, a ponderação dos elementos de prova indiciária constantes dos autos apontam no sentido de se considerar fortemente provável, ou mais provável a absolvição do arguido se sujeito a julgamento do que a sua condenação, o que não justifica a submissão do mesmo a julgamento pelos alegados factos – cfr. Figueiredo Dias, in Direito Processual Penal, 1974, p. 133.

E isto tendo ainda em conta que a sujeição de alguém a julgamento é já um vexame, uma ignomínia, mesmo que no final se salde pela sua absolvição, sendo este o resultado final da prova coligida nos autos.

É equívoco considerar que no decurso de um processo-crime a prova evoluiu em crescendo, sendo menor no inquérito e plena na audiência de julgamento – cfr. Ac. RL de 30-4-97, www.dgsi.pt.

Se por um lado a prova produzida em julgamento – em relação à testemunhal – ganha muito com a imediação, com a produção quase simultânea, com a apreciação em conjunto, por outro lado perde quase tudo, com os inevitáveis anos decorridos desde a data dos factos e pela normal reconstrução psicológica, individual e colectiva, da memória, sendo que o aprofundamento da prova que pode ser feito em julgamento, tanto pode aumentar a convicção da condenação como a da absolvição – cfr, Ac. RC de 6-7-2005, no recurso n.º 753/05, na Instrução n.º 2363/03 do 3.º Juízo criminal de Leiria.              

Acresce que dos autos já se encontra praticamente toda a prova para o caso, não se vislumbrando a existência de outra que possa surgir em julgamento e apontar para o sentido diverso do exposto.”

2.2. Poderes cognitivos do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso:

Como flui do disposto no n.º 1 do art.º 412.º do Código de Processo Penal, e de acordo com jurisprudência pacífica e constante (designadamente, do STJ), o âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação.

As conclusões apresentadas pelo recorrente/assistente circunscrevem o recurso às seguintes questões:

- Se a decisão instrutória de não pronúncia é nula, nos termos do disposto nos artigos 308.º, n.º 2 e 283.º, n.º 3, ambos do Código de Processo Penal, por não conter a narração “dos factos apurados” e “dos factos não apurados”?

- Se resultam dos autos, indícios suficientes da prática, pelo arguido, de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos art.ºs 203.º e 204.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código Penal?

2.3. O dever de fundamentar uma decisão judicial é uma decorrência[1], em primeiro lugar, do disposto no art.º 205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, em cujos termos “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma previstas na lei”.

No entanto, tal dever de fundamentação, no âmbito do processo penal e na perspectiva do arguido, surge, igualmente, como uma das suas garantias constitucionais de defesa, expressas no art.º 32.º, n.º 1, da mesma Lei Fundamental.

Tal implica que, ao proferir-se uma decisão judicial, se conheçam as razões que a sustentam, de modo a permitir aferir se a mesma está fundada na lei.

É isso que decorre expressamente do disposto no art.º 97.º, n.º 4 do Código Processo Penal, ao estabelecer que “Os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão”.

Donde que essa exigência seja, simultaneamente, um acto de transparência democrática do exercício da função jurisdicional, que a legitima, e das garantias de defesa, ambas com assento constitucional, de forma a se aferir da sua razoabilidade e a obstar a decisões arbitrárias[2].

Daí que a fundamentação de um acto decisório deva estar devidamente exteriorizada no respectivo texto, de modo que se perceba qual o seu sentido, sendo certo que no caso de uma sentença deve obedecer ainda aos requisitos formais enunciados no citado art.º 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal[3].

Mas essa mesma exigência legal de fundamentação de uma sentença, não se encontra transponível para outras decisões judiciais, salvo para os acórdãos a proferir pelos tribunais superiores, mas aqui também com especificidades [425.º, n.º 4].

Tudo isto para se conhecer, ao fim e ao cabo, qual foi o efectivo juízo decisório em que se alicerçou o correspondente sentenciamento, designadamente os factos acolhidos e a interpretação do direito perfilhada, permitindo o seu controlo pelos interessados e, se for caso disso, por uma instância jurisdicional distinta daquela.
Assim e à partida, não cumprem estes requisitos os actos decisórios que não tenham fundamento algum, por mínimo que seja, e aqueles que se revelem insuficientemente motivados.

Porém, também não se deve exigir que no acto decisório fiquem exauridos todos os possíveis posicionamentos que se colocam a quem decide, esgotando todas as questões que lhe foram suscitadas ou que o pudessem ser.

O que importa é que a motivação seja necessariamente objectiva e clara, e suficientemente abrangente em relação às questões aí suscitadas, de modo que se perceba o raciocínio seguido.

Muitas vezes confunde-se motivação com prolixidade da fundamentação e esta apenas serve para confundir ou obnubilar a compreensibilidade que deve ser uma característica daquela.

A propósito da suscitada falta de descrição factual na decisão instrutória dos factos suficientemente “apurados” e dos “não apurados” mencionados no requerimento de abertura da instrução, a jurisprudência dos nossos Tribunais tem alinhado as seguintes três posições:

– A decisão instrutória deverá conter, ainda que resumidamente, os factos que possibilitem chegar à conclusão da suficiência ou insuficiência da prova indiciária, acarretando essa falta de descrição factual a nulidade da decisão instrutória [art.ºs 308.º, n.º 2, 283.º, n.º 3, al. b); Ac. do Tribunal da Relação de Évora, datado de 1 de Março de 2005, in recurso n.º 1481/04-1];

– A omissão da descrição e especificação dos factos do requerimento instrutório que se devam considerar suficientemente indiciados ou não, constitui uma irregularidade que influi no conhecimento da causa, que pode ser conhecida oficiosamente [art.º 123.º, n.º 2; Acs. do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 12 de Fevereiro de 2007, in recurso n.º 2335/06-1; de 4 de Julho de 2005, in Colectânea de Jurisprudência, Tomo IV, pág. 300];

- O despacho de não pronúncia não está sujeito às exigências de fundamentação das sentenças, estabelecidas no art.º 374.º, n.º 2, mas apenas ao dever genérico previsto no art.º 97.º, n.º 4, consistindo a falta de fundamentação numa irregularidade, sujeita ao regime geral do art.º 123.º, devendo para o efeito ser atempadamente suscitada perante o juiz, sob pena de se considerar sanada [Acs. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15 de Janeiro de 2004, in CJ, Tomo I, pág. 125; de 14 de Outubro de 2004, in CJ, Tomo IV, pág. 145; do Tribunal desta Relação de Coimbra, de 14 de Junho de 2006, in recurso n.º 823/06; do Tribunal da Relação do Porto, de 1 de Setembro de 2007, in recurso n.º 5119/07-1][4].

Num outro registo, anota o Ex.mo Desembargador Alberto Mira[5], ainda a propósito da questão suscitada, que “há quem entenda que se trata de uma irregularidade que pode ser conhecida oficiosamente, por aplicação ao caso do disposto no artigo 123.º, n.º 2, do Código de Processo Penal. Neste sentido, v. g., Acs. da Relação de Guimarães de 05-01-2004 (proc. n.º 293/04-1) e de 12-02-2007 (proc. n.º 2335/06-1); e Ac. da Relação do Porto de 16-12-2009 (proc. n.º 568/0 GFVNG.P1), todos publicados in www.dgsi.pt.

Diversamente, referem outros tratar-se de uma nulidade oficiosamente cognoscível em sede de recurso. Cfr. Acs. da Relação de Évora de 22-11-2005 (proc. n.º 1324/05-1); da Relação de Lisboa de 10-07-2007 (proc. n.º 1075/07-5); e da Relação do Porto de 17-02-2010 (proc. n.º 58/07.1 TAVNH.P1), os dois últimos publicados no sítio www.dgsi.pt.”

Precisando a posição sufragada no caso concreto, aduz ainda que “Quanto a nós, seguimos, ao “pé da letra”, a posição assumida no Ac. da Relação do Porto de 07-07-2010 Proc. n.º 102/08.5 PUPRT.P1, relatado por Jorge Gonçalves, in www.dgsi.pt., importando distinguir os casos de despacho de pronúncia com falta de narração dos factos indiciados dos casos de despacho de não pronúncia deficientemente fundamentado por não conter, ainda que resumidamente, os factos que possibilitaram chegar à conclusão da suficiência ou insuficiência de indícios.

A nulidade que se vislumbra decorre do disposto na alínea b) do n.º 3 do artigo 283.º, reportada ao n.º 2 do artigo 308.º, do CPP.

É de admitir que, quando referida a uma acusação ou ao despacho de pronúncia, tal nulidade, por omissão de narração dos factos imputados ao arguido, pelos quais deverá responder em julgamento, seja considerada insanável, tendo em vista a lógica do sistema e o princípio da acusação.

Efectivamente, nesta situação, se a falta de descrição dos factos na acusação pode ser conhecida oficiosamente, determinando a rejeição desta como manifestamente infundada [artigo 311.º, n.º 3, al. b) do CPP], seria destituído de todo o sentido que a falta de factos do despacho de pronúncia não consubstanciasse nulidade de conhecimento oficioso.

Dito de outro modo: os casos elencados no n.º 3 do artigo 311.º que se contêm na previsão das diversas alíneas do n.º 3 do artigo 283.º constituem uma forma de nulidade “sui generis”, insanável e de conhecimento oficioso.

Os demais casos do n.º 3 do artigo 283.º, não subsumíveis à previsão da acusação manifestamente infundada, reconduzem-se ao regime geral das nulidades sanáveis e dependentes de arguição.

Daí que, tratando-se, no caso, não de um despacho de pronúncia, mas de um despacho de não pronúncia, a falta de fundamentação se traduza numa nulidade que é sanável e, assim, dependente de arguição.

Consequentemente, deveria ter sido suscitada, pelo assistente, perante o tribunal a quo (e não em recurso), no prazo de 10 dias (artigo 105.º, n.º 1, do CPP), contados a partir da notificação ao arguido do despacho de não pronúncia. Porque assim não sucedeu, está sanada.”

Quid iuris?

Propendemos a aceitar como boa a terceira posição referida no aludido aresto de 5 de Janeiro passado, pois que a mais consentânea com o princípio da legalidade dos actos, tal como está actualmente consagrado no art.º 118.º.

Aí se estabelece no seu n.º 1 que “A violação ou inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei”, consagrando-se um apertado princípio da taxatividade ou de “numerus clausus” das nulidades.

Todos os demais vícios que não sejam expressamente atingidos pela nulidade, são irregularidades, tal como decorre da regra subsidiária do seu n.º 2 – aqui se alude que “Nos casos em que a lei não cominar a nulidade o acto ilegal é irregular”.

Ora, a deficiência de fundamentação das decisões jurisdicionais, não surge no catálogo das nulidades absolutas e como tal insanáveis do art.º 119.º, nem no quadro das nulidades relativas do subsequente art.º 120.º, nem expressamente em qualquer disposição legal.

É um facto que existe a injunção constitucional de fundamentação das decisões judiciais, imposta pelos citados art.ºs 205.º, da Constituição da República Portuguesa e 97.º, n.º 4.

Mas o legislador apenas quis acometer de nulidade da decisão instrutória aquela que represente uma alteração substancial dos factos descritos na acusação pública ou no requerimento para abertura da instrução conducente à pronúncia, face ao previsto no art.º 309.º, assim como aquela que, pronunciando, não respeite o registo legal descritivo da acusação, enunciado no art.º 283.º, n.º 3, mediante remissão do art.º 308.º, n.º 2.

Sucede que o rigor descritivo da pronúncia não se deve estender ao despacho de não pronúncia, porquanto o segmento normativo do art.º 283.º, n.º 3 é privativo da regulação daquele libelo, já que o seu proémio apenas menciona que “A acusação contém, sob pena de nulidade”, e isto sem que se mostre o despacho de arquivamento, previsto no art.º 277.º, sujeito aos mesmos rigores descritivos.

Aliás, caso se sustente essa interpretação extensiva do art.º 283.º, n.º 3 ao despacho de não pronúncia, estaria formalmente ausente do mesmo um juízo crítico da prova, tal como se impõe para a fundamentação da sentença, como resulta do art.º 374.º, n.º 2.

De resto, se o legislador quisesse ferir de nulidade a deficiência de fundamentação da decisão instrutória teria consagrado uma disposição idêntica à do art.º 379.º, n.º 1 que comina com esse preciso vício as circunstâncias aí enunciadas, que correspondem à preterição das menções referidas no artigo 374.º, n.º 2 e 3, b) [a)], à condenação por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, fora dos casos e das condições dos artigos 358.º e 359.º [b)] e à omissão ou excesso de pronúncia [c)].

Donde assim a conclusão de que o despacho de não pronúncia não está sujeito às exigências de fundamentação das sentenças, estabelecidas no art.º 374.º, n.º 2, mas apenas ao dever genérico previsto no art.º 97.º, n.º 4, consistindo a deficiência da sua fundamentação numa irregularidade, sujeita ao regime geral do art.º 123.º.

Irregularidade (ou, concedendo, mesmo nulidade sanável) a dever ser atempadamente suscitada perante o juiz de instrução, sob pena de se considerar sanada, não podendo desde logo e sem essa arguição prévia ser fundamento de recurso, o que só sucede quando se impugna uma sentença [379.º, n.º 2].

In casu, não tendo assim procedido o recorrente, não pode agora o mesmo, com este preciso fundamento, vir impugnar o despacho de não pronúncia.

Todavia, sempre urgirá dizer-se que relendo a decisão instrutória, e pese embora formalmente nela se não faça uma destrinça específica entre os factos “indiciariamente provados” e os “não provados”, certo é podermos constatar na economia da sua redacção – mormente indicando os fundamentos do assistente ao requerer a abertura dessa fase facultativa, e elencando os actos de instrução praticados e inferências probatórias deles extraída, concretamente na não produção de prova alicerçadora da tese do recorrente –, a ratio que a determinou, e, nesse circunspecto, se mostrar acautelado, na íntegra, o objectivo que tal fundamentação busca: a demonstração do raciocínio seguido e provas alicerçadoras da convicção do Tribunal.

2.4. Vejamos, acto contínuo, se os autos fornecem indícios suficientes da prática, pelo arguido, do assacado crime de furto qualificado.

A dedução de acusação findo o inquérito, como o despacho de pronúncia no caso de ter havido lugar a instrução, supõem a existência no processo de indícios suficientes de que se tenha verificado crime e de quem foi o seu agente – aludidos art.ºs 283.º, n.º 1 e 308.º, n.º 1 –.

O art.º 283.º, n.º 2, formata normativamente o conceito de “indícios suficientes”: «Consideram-se suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança».

Esta fórmula legal acolhe a noção, sucessivamente densificada pela doutrina e pela jurisprudência, de “indícios suficientes”.

Em formulação doutrinalmente bem definida, «os indícios só serão suficientes e a prova bastante quando já em face deles, seja de considerar altamente provável a futura condenação do acusado, ou quando esta seja mais provável do que a absolvição»[6].

«Afirmar a suficiência dos indícios deve pressupor a formação de uma verdadeira convicção de probabilidade de futura condenação. Não logrando atingir essa convicção, o Ministério Público deve arquivar o inquérito e o juiz de instrução deve lavrar despacho de não pronúncia»[7].

Traçando o limite de distinção entre o juízo de probabilidade e o juízo de certeza processualmente relevante, acrescenta o referido autor[8]: «o que distingue fundamentalmente o juízo de probabilidade do juízo de certeza é a confiança que nele podemos depositar e não o grau de exigência que nele está pressuposta. O juízo de probabilidade não dispensa o juízo de certeza porque, para condenar uma pessoa, o conceito de justiça num Estado de direito exige que a convicção se forme com na base na produção concentrada das provas numa audiência, com respeito pelos princípios da publicidade, do contraditório, da oralidade de da imediação. Garantias essas que não são possíveis de satisfazer no fim da fase preparatória».

Quer isto dizer que na suficiência dos indícios está contida a mesma exigência de verdade requerida para o julgamento final, mas apreciada em face dos elementos probatórios e de convicção constantes do inquérito (e da instrução) que, pela sua natureza, poderão eventualmente permitir um juízo de convicção que não venha a ser confirmado em julgamento; mas se logo a este nível do juízo no plano dos factos se não puder antever a probabilidade de futura condenação, os indícios não são suficientes, não havendo prova bastante para a acusação (ou para a pronúncia).

A jurisprudência, por seu lado, afinou a compreensão do conceito através da definição e enunciação de elementos de integração que se podem hoje rever na noção legal.

Indícios suficientes são os elementos que, relacionados e conjugados, persuadem da culpabilidade do agente, fazendo nascer a convicção de que virá a ser condenado; são vestígios, suspeitas, presunções, sinais, indicações, suficientes e bastantes para convencer de que há crime e de que alguém determinado é o responsável, de forma que, logicamente relacionados e conjugados formem um todo persuasivo da culpabilidade; enfim, os indícios suficientes consistem nos elementos de facto reunidos no inquérito (e na instrução), os quais, livremente analisados e apreciados, criam a convicção de que, mantendo-se em julgamento, terão sérias probabilidades de conduzir a uma condenação do arguido pelo crime que lhe é imputado.

O juízo sobre a suficiência dos indícios, feito com base na avaliação dos factos, na interpretação das suas intrínsecas correlações e na ponderação sobre a consistência das provas, contém sempre, contudo, necessariamente, uma margem (inescapável) de discricionariedade.

O despacho de pronúncia, como também a acusação, dependem, pois, da existência de prova indiciária, de prima facie, de primeira mas razoável aparência, quanto à verificação dos factos que constituam crime e de que alguém é responsável por esses factos.

Não se exigindo o juízo de certeza que a condenação impõe – a certeza processual para além de toda a dúvida razoável –, é mister, no entanto, que os factos revelados no inquérito ou na instrução apontem, se mantidos e contraditoriamente comprovados em audiência, para uma probabilidade sustentada de condenação.

Na posse de tais considerandos, precisemos então se a reconstituição processual dos elementos do inquérito e da instrução permite alcançar o nível de probabilidade necessário para a pronúncia do arguido pelo assacado crime de furto qualificado.


*

O assistente, pese embora tenha primeiramente apresentado queixa contra desconhecido (s) que lhe haveria (m) subtraído o veículo automóvel de matrícula ..., bem como certa quantia em dinheiro e objectos que se encontrariam no seu interior, acabou por imputar tal facto ao arguido, precisando que:

- O mesmo retirou a aludida viatura, quando se encontrava estacionada pelo assistente na Rua …, sem sua (do assistente) autorização, e enquanto este estava em reunião no escritório do seu advogado onde, aliás, também esteve presente o próprio arguido;

- Apesar de a viatura automóvel se encontrar registada em nome do arguido, certo é que a mesma lhe não lhe pertence, nem nunca pertenceu.

Com efeito,

- Conforme resulta dos autos foi passada uma venda a dinheiro do Stand ... (fls. 22), local em que foi adquirido o veículo, constando nesse documento o nome do assistente; a compra do veículo em causa foi forma de o arguido liquidar parte do valor da venda de umas instalações, sitas em ..., e que comprara ao pai do assistente – MM....

- Daí o arguido haver-se responsabilizado pelo pagamento junto do banco, uma vez o negócio que celebrou com o pai do assistente. O assistente jamais o autorizou, quer escrita quer verbalmente, a conduzir o veículo.

- Foi o assistente que sempre, desde a data da sua aquisição no Stand ... e até à data da remoção levada a cabo pelo arguido, quem o utilizou e usufruiu, pagando todas as suas reparações, zelando pela sua manutenção e limpeza; o assistente sempre praticou tais actos de forma pública e pacífica, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que fosse, o que denota que a viatura lhe pertence exclusivamente.

- Aquando da remoção efectivada pelo arguido, encontravam-se no interior da viatura todos os objectos que constam do auto de apreensão de fls. 64.

- Acrescendo a quantia de € 500,00 em dinheiro, que o arguido também fez sua, utilizando-a em proveito próprio, e bem sabendo que a mesma não lhe pertencia.

Na fase de inquérito, foram tomadas declarações ao arguido (fls. 40), que juntou então aos autos documentos comprovativos de multas por si pagas e conexionadas com a condução do veículo no período em que a fez o assistente, bem como de pagamento de prestações devidas por um contrato de financiamento feito em seu nome para aquisição do veículo em causa; à testemunha RM... (fls. 62) que realizou o serviço de abertura do veículo quando lhe foi presente pelo arguido e substituição do kit da fechadura; ao assistente (fls. 65), que corroborou a denúncia antes apresentada; e de JJ..., gerente da ... (fls. 68), que corroborou a venda pelo seu stand da viatura ao assistente porém mediante um financiamento feito em nome do arguido, desconhecendo contudo qualquer eventual acordo celebrado entre eles.

Seguiu-se então o despacho determinando o arquivamento do inquérito (fls. 71/2).

Requerida e deferida a abertura da fase de instrução, procedeu-se à inquirição da testemunha vendedor do veículo controvertido (fls. 213); de OJ..., irmão do arguido (fls. 227); do dito RM... (fls. 227); às reinquirições do arguido (fls. 228) e assistente (fls. 244), após o que foi lavrada a decisão recorrida.  

De todas estas diligências e documentos entretanto juntos aos autos o que se nos depara indiciado é o confronto de duas versões que tendo por suporte determinados factos objectivos (essencialmente, a realização da “compra” do veículo no stand ... pelo assistente, mediante o preço de € 26.000,00, stand esse que emitiu então uma venda a dinheiro em seu nome; a antecedente contratualização pelo arguido de um financiamento de € 28.000,00 [cujo diferencial para com aquele montante, o arguido explica reportar-se a uma dívida mais antiga do assistente para com o stand e que assim resolvera também pagar], cujas sucessivas prestações foram sendo pagas por si próprio; a subsistência do registo da viatura em nome da entidade financiadora [fls. 41]; a utilização da viatura após a aquisição pelo assistente, até ao momento em que o arguido a rebocou durante), permitindo concluir no sentido em que o veículo foi vendido ao assistente, já porém não logram esclarecer, ao menos nos termos por ora reclamados, o conteúdo do acordo prévio concomitantemente celebrado entre o mesmo assistente (e quiçá seu pai) e o arguido, acordo este fundamental para que se determinasse em termos “suficientes” se o assistente era, à data da remoção, o “dono” da viatura.

Na verdade, com o despacho recorrido, mantêm-se dúvidas que questionam da versão avançada pelo assistente. Assim:

- A referência que ele faz ao pretenso negócio mostra-se genérica e sem esclarecer, v.g., por que não ficou exarado na escritura o remanescente da dívida pelo arguido e que agora invoca ter subsistido;

- Se era obrigação do arguido proceder ao pagamento das prestações do carro, o que determinou o assistente (e/ou seu pai) a proceder ainda ao pagamento de duas delas, entregando-lhe (ao arguido) € 900,00?

- Se incidia sobre o arguido a obrigação de pagar o preço do carro como forma de satisfazer na íntegra o preço do negócio que estabelecera com o pai do assistente, o que justifica a subscrição por este último de uma livrança em branco para garantir o valor do preço devido à entidade financiadora (fls. 208)?

E, ao invés, a prova indiciária coligida nos autos, em termos de verosimilhança, aponta no sentido de o arguido, o assistente e seu pai terem acordado num contrato em cujos termos, embora o assistente tenha adquirido o veiculo ZP... ao respectivo stand, o respectivo direito de propriedade se transferiu todavia para o assistente como garantia do pagamento do preço do mesmo, em face da obrigação concomitantemente assumida perante a entidade bancária – B... – que financiou o pagamento do preço devido. Aquando do pagamento da última prestação do veículo ZP... por parte do assistente, ou do seu pai ao arguido, então aquele passaria a ser o seu verdadeiro proprietário. Isto baseando-nos na circunstância de a propriedade do veículo automóvel ter sido registada em nome do arguido, embora com reserva a favor da financiadora; o seguro do veículo ter sido feito em nome do arguido; ter sido ele a solver o respectivo imposto de circulação e a proceder à sua inspecção periódica; o próprio haver afirmado que «o carro era para ficar em meu nome até que ele mo pagasse depois! Eu não ia fazer o crédito e deixar o carro em nome dele» (fls. 314).

Negócio a justificar que durante o lapso de tempo em que se venceriam as prestações do financiamento fosse já o assistente a fruir o veículo, utilização que se mostra incontrovertida, aliás, e, por outro lado, que malogradas as interpelações do arguido para com o assistente no sentido em que este procedesse ao pagamento das ditas prestações, tivesse determinado o mesmo arguido a proceder à remoção do veículo.

Concede-se que eventualmente em acção directa.

Mas, sendo certo que de acordo com o art.º 1.º do Código de Processo Civil, “A ninguém é lícito o recurso à força com o fim de realizar ou assegurar o próprio direito...”, não menos verdade é que a consequência da infracção a esta regra redunda na mera responsabilidade civil e não na criminal como pretende o assistente.

De precisar também que relativamente à mencionada quantia de € 500,00 ainda mais exígua se mostrou a prova produzida. Segundo a testemunha RM... que procedeu à abertura do veículo nas instalações da XX… e o próprio arguido que se encontrava presente, apenas se encontrava no seu interior a quantia de € 50,00 e não qualquer outra.

Em síntese conclusiva, pode consequentemente afirmar-se que se não mostram preenchidos os elementos indispensáveis ao provável emergir de qualquer responsabilidade penal do arguido.

Os autos não evidenciam, com um grau de segurança exigível, que ele tenha subtraído o veículo e bens que se encontravam no seu interior contra a vontade do seu dono e no intuito de os fazer coisas suas.

A singeleza dos factos efectivamente indiciados apenas permite formular conjecturas (umas mais verosímeis que outras) no plano objectivo e sobremaneira subjectivo, mas sempre insusceptíveis de definição concreta de qualquer ilícito penal.

Nos termos expostos, por não estarem indiciados factos que preencham o tipo de crime de furto, bem decidiu o tribunal a quo ao não pronunciar o arguido.


*

III – Decisão.

São termos em que pelos fundamentos expostos, se nega provimento ao recurso interposto.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça devida em 5 Ucs.

Notifique.


*

Brízida Martins (Relator)

Orlando Gonçalves

[1] No sentido em que começaremos por expender, acompanharemos de perto o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 5 de Janeiro de 2011, relatado pelo Ex.mo Desembargador Joaquim Arménio Correia Gomes, no âmbito do recurso n.º 599/07.0 TAOAZ.P1, acessível no sítio www.dgsi.pt.

[2] MORENO, Cordon em “Las Garantias Constitucionales del Processo Penal, Aranzadi, Navarra, 1999, p. 178 e ss.

[3] Diploma de que serão os normativos doravante a citar, quando sem menção expressa da origem.
[4] Quando não publicitados como dito na CJ, acessíveis em www.dgsi.pt.
[5] Em aresto prolatado a 23 de Fevereiro de 2001, neste Tribunal da Relação de Coimbra, no âmbito do recurso n.º 258/09.0 GAFZZ.C1, também acessível em www.dgsi.pt.




 
[6] Cfr., Figueiredo Dias, in Direito Processual Penal, vol. 1, 1974, págs. 132-133.

[7] Cfr. Jorge Noronha e Silveira, in O Conceito de Indícios Suficientes no Processo Penal Português, Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Coordenação Científica de Maria Fernanda Palma, Almedina, pág. 171.
[8] Idem, pág. 172.