Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
14529/22.6YIPRT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HENRIQUE ANTUNES
Descritores: PROCEDIMENTO DE INJUNÇÃO
CRÉDITOS OBJECTO DE RECONHECIMENTO UNILATERAL DO DEVEDOR
CRÉDITOS RESULTANTES DE CLÁUSULA PENAL E DESPESAS COM A ACTUAÇÃO DO CRÉDITO
USO INADEQUADO DA INJUNÇÃO
ABSOLVIÇÃO DA INSTÂNCIA
Data do Acordão: 03/14/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE OLIVEIRA DE FRADES
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 3.º; 4.º; 7.º E 10.º, 1 E 2, DO RPOP
ARTIGOS 2.º, 1 E 2 E 10.º, 1 E 2, DO DL 62/13, DE 10/5
ARTIGOS 224.º; 232; 457.º A 463.º E 810.º A 812.º DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: I - Não é admissível, através do procedimento de injunção, a exigência de créditos pecuniários objecto de reconhecimento unilateral do devedor;
II - Ainda que através de negócio jurídico unilateral o devedor tenha reconhecido a dívida, o credor está vinculado, no procedimento de injunção, a alegar o contrato objecto da relação jurídica fundamental do qual a obrigação emerge;
III - O procedimento de injunção não é o adequado à exigência de créditos resultantes de cláusula penal com função indemnizatória ou despesas feitas pelo credor com a actuação ou exercício do crédito de que se diz titular;
IV- O uso inadmissível ou inadequado, ainda que meramente parcial do procedimento inquina e torna inaproveitável, in totum, a acção especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato em que o procedimento, por virtude da oposição, se convolou, e dá lugar a uma excepção dilatória, conducente à absolvição do requerido da instância.
Decisão Texto Integral:
Relator: Henrique Antunes
1.º Adjunto: Mário Rodrigues da Silva
2ª Adjunta: Cristina Neves


Apelações em processo comum e especial (2013)
Proc. n.° 14529/22.6YIPRT.C1


Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
1. Relatório.
AA promoveu contra BB procedimento de injunção para deste haver as quantias de € 12 602,00 de capital, de € 6 450,00, e de € 102,00 de taxa de justiça.
Fundamentou esta pretensão no facto de por documento particular de confissão de dívida datado de 18 de Dezembro de 2014, o requerido ter confessado dever-lhe a quantia de € 6 600,00, que lhe foi entregue na mesma data, e que se obrigou a pagar em 12 prestações, no valor de € 550,00, vencendo-se a primeira no dia 10 de Janeiro de 2015 e as restantes em igual dia dos meses subsequentes, importando a falta de pagamento de qualquer uma das prestações o vencimento imediato das restantes e o pagamento, a título de cláusula penal, de quantia igual ao valor em dívida, sendo por conta do requerido as despesas relacionadas com o incumprimento, designadamente honorários de advogado, e de o requerido apenas ter procedido ao pagamento da primeira prestação, encontrando-se em dívida o valor de € 12 100,00, relativo ao valor entregue e não pago e ao valor da cláusula penal, valor a que acresce o devido a título de honorários de advogado, no montantes de € 400,00.
O requerido defendeu-se, na oposição, por excepção dilatória, invocando o erro na forma de processo, por a injunção ser o meio inapto para a requerente peticionar as quantias a cujo direito se arroga e a cláusula penal estar excluída do seu âmbito, por impugnação, afirmando que, efectivamente, solicitou àquela um empréstimo, mas que desconhece, em absoluto, a existência da cláusula penal, e que a quantia mutuada é apenas de € 5 500,00, tendo a requerente, que se dedica a emprestar dinheiro a pessoas em situação económica difícil, feito constar do documento valor superior para logo haver juros e outras penalidades que decide estipular, e por excepção peremptória, alegando que os juros, fixados em 20%, são usurários, devendo ser reduzidos, que pagou, na íntegra o montante mutuado, que a dívida, por ter decorrido o prazo quinquenal, está prescrita, que a cláusula penal é usurária, excessiva, desproporcional e abusiva, devendo ser excluída ou reduzida a € 500,00, e que a requerente ao pedir os honorários de advogado duplica o carácter indemnizatório da cláusula penal, pedindo, por duas vias, indemnizações que não são cumuláveis.
Distribuído o processo ao Juízo de Competência Genérica ..., do Tribunal Judicial da Comarca ..., e junto o documento epigrafado de declaração da confissão de dívida, subscrito pelo requerido, na sequência de despacho de 9 de Junho de 2022, da Sra. Juíza de Direito, a requerente, notificada para se pronunciar sobre as excepções dilatórias invocadas pelo requerido na oposição ofereceu articulado de resposta no qual - depois de alegar, designadamente, que a cláusula penal é indemnizatória moratória, tendo o acordo das partes por finalidade liquidar a indemnização devida em caso de incumprimento definitivo ou de mora, pretendo as partes precisa e antecipadamente fixar o valor da indemnização pela mora, motvo pelo qual não são peticionados juros moratórios - se pronunciou também sobre as excepções peremptórias opostas pelo requerido, concluindo pela improcedência tanto de umas como de outras.
A Sra. Juíza de Direito, por despacho de 15 de Setembro de 2022, com fundamento em que não são alegados quaisquer elementos essenciais de um contrato, não é identificado, sequer, qualquer contrato, que encontramos, apenas, a referência a uma confissão de dívida que em rigor não constitui a celebração de um contrato, mas uma mera declaração unilateral, que do documento de confissão de dívida não se extrai expressamente, que paradigmático do que se realça é a própria circunstância de no campo próprio do requerimento de injunção, destinado à identificação do contrato, ter sido colocada a expressão: «outra», que compulsado o requerimento de injunção, resulta evidente que a Autora sustenta o pedido de condenação que formulou exclusivamente no facto de alegadamente ser portadora de uma confissão de dívida, sustentando, somente, ser titular de um direito de crédito, sem alegar a relação subjacente, concretamente a existência de um contrato, os seus elementos essenciais, do qual emirjam obrigações pecuniárias em sentido estrito, forçoso se mostra concluir que a Autora lançou mão de procedimento para o qual não estão reunidos os seus pressupostos e que ainda que se entendesse que a referência esparsa a contrato cumpriria tal desiderato, ainda assim, o requerimento de injunção ter-se-ia por se considerar inepto, considerando que não foram alegados os factos essenciais da causa de pedir, concluiu que a Requerente usou o procedimento de injunção para obter a cobrança de uma quantia aposta num documento particular, sem invocar a existência de qualquer contrato, o que fez indevidamente por não se mostrarem reunidos os pressupostos legais para a utilização desse procedimento, impondo-se, nessa medida, julgar verificada a exceção dilatória inominada de utilização indevida do procedimento de injunção, que inquina todo o processo e impede o conhecimento do mérito da causa, julgou verificada a exceção dilatória inominada de utilização indevida do procedimento de injunção, que impede o conhecimento do mérito da causa e obsta ao prosseguimento da ação especial em que se transmutou o procedimento de injunção, por não se mostrarem reunidos os pressupostos legalmente exigidos para a sua utilização e, em consequência, determinou a absolvição do Requerido BB da instância.
É esta decisão que a requerente impugna no recurso - no qual pede a sua revogação e substituição por outra que julgue improcedente a excepção e determine o prosseguimento dos autos - tendo encerrado a sua alegação com estas conclusões:
I. O presente recurso vem interposto da sentença que julgou procedente a excepção dilatória inominada de utilização indevida do procedimento de injunção e, em consequência, absolveu o requerido da instância.
II. Nos termos do disposto no artigo 1.° do DL n.° 269/98, de 01 de Setembro “É aprovado o regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a (euro) 15 000, publicado em anexo, que faz parte integrante do presente diploma.”
III. Mais se prevendo no artigo 7.° do Anexo ao citado DL que “Considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.° do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.° 32/2003, de 17 de Fevereiro.”
IV. Normativos de que resulta poder socorrer-se do procedimento de injunção qualquer credor com vista a obter título executivo contra o seu devedor, quando em causa esteja uma obrigação pecuniária emergente de contrato de valor igual ou inferior a € 15.000 ou quando a dívida resulte de uma transação comercial e o contrato não tenha sido celebrado com um consumidor.
V. No caso sub iudice, porque não estão em causa obrigações emergentes de transacções comerciais e porque a lei não especifica nem restringe a sua aplicação a um específico tipo de contrato, nem faz quaisquer exigências quanto à forma de fixação, por acordo ou unilateralmente, das obrigações pecuniárias, é admissível o recurso ao procedimento de injunção.
VI. Tanto mais que, no requerimento inicial a recorrente alegou os factos concretos que permitem aferir da existência do seu crédito; que o requerido se confessou devedor da quantia de € 6.600,00 (seis mil e seiscentos euros), quantia que lhe foi entregue na mesma data, e se obrigou a pagá-la em 12 prestações, o que tudo resulta da declaração da confissão de dívida.
VII. Documento que se encontra assinado pelo devedor, importando a constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, e prevê a obrigação do pagamento/restituição do valor entregue/emprestado, bem como o pagamento de uma cláusula penal em caso de incumprimento.
VIII. Assim, tendo a factualidade subjacente à emissão do documento sido alegada no requerimento inicial, não padece de qualquer vício, mormente da imputada ineptidão, atento o disposto na alínea a) do n.° 2 do artigo 186.° do CPC, ou qualquer exceção dilatória, de conhecimento oficioso.
IX. Na verdade a recorrente procedeu à indicação circunstanciada e motivada dos factos que justificam precisamente o petitório formulado a final, no qual se pretendeu ver o requerido condenado no pagamento da quantia peticionada.
X. E indicou e juntou os documentos que fundamentam a obrigação, os seus obrigados, a data a partir do qual o requerido deixou de cumprir a sua obrigação.
XI. Mas ainda que assim se não entendesse (o que se coloca por mera hipótese) o documento de confissão de dívida vale como declaração unilateral de reconhecimento de uma dívida (mesmo que no documento ou no requerimento inicial não se indique a sua causa), presumindo-se a existência da obrigação, competindo ao requerido ilidir tal presunção, como bem ensinam Almeida Costa, Direito das Obrigações, 11^ Edição, Revista e Actualizada, Almedina, páginas 467, Inocêncio Galvão Teles, Direito das Obrigações, 7.^ Edição reimpressão, páginas 182.
XII. Tanto mais que, o n.° 1 do artigo 458°. do CC expressamente dispensa o credor de invocar os factos constitutivos do direito invocado, fazendo recair sobre o devedor o ónus de ilidir ou afastar tal presunção no âmbito da oposição que eventualmente deduza.
XIII. A causa de pedir é o acto ou facto jurídico concreto e preciso, o facto material de que deriva o direito que se invoca ou no qual assenta o direito invocado e que este se propõe fazer valer. E a recorrente alegou que o requerido se confessou devedor da quantia que lhe foi entregue por aquela, daqui decorrendo que o recorrido se obrigou a restituir à recorrente o valor que lhe foi por esta disponibilizado/emprestado.
XIV. Não se verificando qualquer ineptidão do requerimento inicial nos termos do artigo 186.°, n.° 2, al. a) do CPC, pois o pedido formulado pela Recorrente é compatível com a exposição fática que corresponde à causa de pedir, não se verificando qualquer incongruência ou ininteligibilidade do pedido ou da causa de pedir.
XV. Tudo ao encontro dos ensinamentos de Alberto dos Reis e Abílio Neto que parafraseia aquele, Novo Código de Processo Civil Anotado, 2^ ed. Coimbra, Almedina, 2014, p. 239; Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, 2.^ ed., Coimbra, Almedina, 2017, p. 155, José Lebre de Freitas, Introdução ao processo civil, Conceito e princípios fundamentais à luz do código revisto, 3^ ed., Coimbra, 2013, p. 71; Rui Pinto, A Ação Executiva, Lisboa, AAFDL, 2020, pp. 311-314,
XVI. Não se vislumbra, pois, qualquer falta de indicação ou ininteligibilidade do pedido ou da causa de pedir, os quais, em abono da verdade, são naturalmente compatíveis.
XVII. Mas ainda que assim não tivesse entendido o Tribunal a quo, sempre, por força do estipulado no artigo 726.°, n.° 4 do CPC., se impunha que tivesse convidado a recorrente a suprir a hipotética irregularidade, convidando-a a alegar factos em que fundamenta a obrigação.
XVIII. Para além de que, na contestação apresentada o recorrido demonstrou ter compreendido na íntegra e cabalmente a factualidade exposta pela Autora, e que interpretou de forma clara, conveniente e adequada a petição inicial, tendo expressamente admitido “O Requerido solicitou, efectivamente, um empréstimo à Requerente.”
XIX. De tal modo que eventual vício de ineptidão (cuja existência se coloca apenas por necessidade de raciocínio) ficou sanado, nos termos do disposto no n.° 3 do artigo 186.° do CPC, neste sentido veja-se a anotação de José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, da referida norma in Código de Processo Civil anotado, Vol. 1.°, Coimbra Editora 1999, pág. 327.
XX. Entendimento unanimemente sufragado pela jurisprudência dos Tribunais superiores, veja-se a
título de exemplo o decidido nos Acórdãos do Tribunal da Relação de Évora no processo 1608/16.8T8FAR.E1, disponível                           in     http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005fO80b/bf9a4adbc2d58e4a802581ca0043c93f?OpenDocument; no processo 99/10.1TBMTL-E1, in http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/- /3C9A1FC12D34109A80257DE1O056F7O7.
XXI. Não estamos, pois, perante qualquer excepção dilatória, porquanto a petição inicial não é inepta, e consequentemente não se verifica a nulidade do processado, nem qualquer utilização indevida do procedimento de injunção.
Não foi oferecida resposta.
2. Factos relevantes para o conhecimento do objecto do recurso.
Os factos que relevam para o conhecimento do objecto, relativos aos fundamentos do pedido do apelante, ao processo em que actuou a pretensão correspondente e ao conteúdo da decisão impugnada, são os que, em síntese estreita, o relatório documenta.
3. Fundamentos.
3.1. Delimitação do âmbito objectivo do recurso.
O âmbito objetivo do recurso é delimitado pelo objecto da acção, pelos casos julgados formados na instância de que provém, pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, e pelo recorrente, ele mesmo, designadamente nas conclusões da sua alegação (art.° 635.° n.°s 2, 1^ parte, e 3.° a 5.°, do CPC).
A decisão impugnada, com fundamento em que a apelante, por não ter invocado um contrato, fez um uso indevido do procedimento de injunção, julgou verificada a excepção dilatória inominada correspondente, que inquina todo o processo e, em coerência, absolveu o requerido da instância. Como é natural, a requerente discorda, discordância que motiva na circunstância de ter alegado os factos concretos de que emerge o seu crédito, do qual o requerido, por declaração unilateral, se confessou devedor e se obrigou a satisfazer, declaração que, em qualquer caso, faz presumir a existência da obrigação, vinculando o requerido a proceder à ilisão da presunção correspondente.
Maneira que a questão concreta controversa colocada à atenção desta Relação não é outra senão a de saber se a apelante utilizou ou não indevidamente o procedimento de injunção.
A resolução desta questão vincula, evidentemente, por aplicação do critério técnico para a aplicação dos processos especiais, desde logo, à determinação do fim para o qual a lei criou aquele processo especial e qual o fim para o qual a requerente o utilizou; se estes fins forem divergentes, a conclusão a tirar, será claro, a do uso indevido ou inadmissível do procedimento.
No julgamento do recurso há, todavia, que ponderar o seguinte: para que este seja procedente não basta que o tribunal de recurso verifique um erro, quer in procedendo, quer in iudicando: é ainda indispensável que a decisão impugnada, apesar de se encontrar ferida com o erro invocado pelo recorrente, não possa ser confirmada por um fundamento diferente do utilizado pelo tribunal recorrido.
3.2. Fim do procedimento de injunção.
O processo de injunção visa conferir força executiva ao requerimento destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato de valor não superior a € 15 000,00, excepto se se tratar de uma dívida decorrente de transacção comercial, caso em que o credor pode recorrer à injunção, qualquer que seja o valor da dívida (art.°s 7.° RPOP, e 2°, n.°s 1 e 2, e 10.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 62/2013, de 10 de Maio)[1].
A finalidade conspícua - em harmonia, de resto, com uma orientação vincada do legislador - é de eliminar, relativamente àquelas pretensões, a acção declarativa, conferindo ao credor um acesso ágil e directo à acção executiva.
Apesar de se tratar de um procedimento acentuadamente marcado por finalidades de simplificação, celeridade e desoneração dos tribunais no tocante a pretensões pecuniárias, de pequeno e médio valor, relativamente às quais se pressupõe a inexistência de um litígio, a lei não deixa de reclamar ao requerente que, no requerimento de injunção, exponha sucintamente os factos que fundamentam a pretensão (art.° 10.°, n.°s 1 e 2, d), do RPOP).
Se o requerido deduzir oposição, o processo é apresentado, pelo secretário judicial, à distribuição, seguindo-se-lhe uma acção verdadeira e própria acção declarativa que tem por objecto o direito de crédito alegado e, evidentemente, a defesa que, contra essa alegação, foi produzida pelo requerido (art.°s 3 e 4 do RPOP)
Estes enunciados mostram que o perímetro de aplicação do procedimento de injunção não se determina exclusivamente pelo fim - a exigência do cumprimento de uma obrigação pecuniária - mas também pelo seu fundamento específico: um contrato, i.e., numa formulação simplificada e sintética, o acordo formado por duas ou mais declarações que produzem para as partes efeitos jurídicos conformes ao significado do acordo obtido (art.°s 224.° e 232.°, a contrario, do Código Civil). Do que linearmente decorre que o procedimento de injunção não é o adequado para exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de negócios jurídicos unilaterais, i.e., de negócios jurídicos em que a fonte da obrigação se resolve ou se traduz numa única manifestação de vontade (art.°s 457.° a 463.° do Código Civil).
Sempre que alguém, por uma declaração unilateral, sem invocação da respectiva causa, reconheça uma dívida ou prometa pagá-la, a procedência da pretensão do respectivo credor não fica prejudicada pela falta de demonstração da sua causa, ficando o devedor onerado com o encargo de demonstrar o contrário, i.e., que a causa não existe, ou cessou ou é ilícita (art.° 458.°, n.° 1, do Código Civil).
O reconhecimento de dívida - enquanto negócio jurídico unilateral causal - implica a isenção ou a dispensa do credor de fazer a prova da relação fundamental - desde que não esteja legalmente sujeita a formalidades específicas - cuja existência, até prova em contrário, se presume. Nesta situação peculiar, que a doutrina designa como de causalidade substancial e abstracção processual[2], o credor que invoca o acto unilateral de reconhecimento, está dispensado de invocar e provar a relação fundamental, que se presume; o devedor, pode, porém, fazê-lo, para contrariar a pretensão do credor, devendo, então, alegar e provar a insubsistência do crédito, por cumprimento, ou por prescrição, ou por invalidade da relação fundamental ou por outra razão que, no caso, possa ter esse efeito[3].
Maneira que, embora o acto de reconhecimento da dívida se não traduza numa relação jurídico- material, dotada da característica da abstracção - assentando, necessariamente na existência anterior de uma relação jurídica fundamental que suporta o acto de reconhecimento unilateral de um débito pré- existente - a presunção de existência de uma relação fundamental, traz implícita a desoneração do credor da demonstração da existência e validade dessa relação causal, subjacente ao negócio unilateral, recaindo, naturalmente, sobre o devedor o ónus ou encargo de ilidir essa presunção, no âmbito da oposição que formula contra a obrigação, v.g., nos embargos que deduza contra a execução em que tenha sido utilizado como título executivo o documento recognitivo correspondente. Quer dizer: a declaração unilateral de reconhecimento de uma dívida importa a actuação da presunção de existência da relação causal, cabendo, por isso, ao devedor executado afastar ou por em causa tal presunção, demonstrando a inexistência ou a invalidade do débito aparentemente reconhecido pela declaração unilateral invocada pelo credor.
É exacto que a doutrina não é acorde quanto à exacta extensão do regime da apontada abstracção processual, dado que, não falta quem entenda - em termos mais restritivos - que aquela abstracção apenas dispensa o credor do ónus de provar a relação fundamental subjacente ao negócio unilateral - mas não também do ónus de alegar essa mesma relação[4].
Em qualquer caso, deve notar-se que, em bom rigor, existe aqui ainda um negócio jurídico unilateral - embora aparentemente apenas com eficácia meramente declarativa - e que, havendo promessa de cumprimento ou reconhecimento de dívida, a obrigação preexistente já não é a mesma, dado que o reconhecimento, sendo declarativo, tem também eficácia constitutiva: para além do decisivo aspecto da prova, a dívida reconhecida nunca é precisamente a mesma[5].
Em face destas considerações pergunta-se: pode ser exigida através do procedimento de injunção uma dívida objecto de reconhecimento unilateral pelo devedor? A única resposta é só esta: não, não se pode. Por duas boas razões: porque tal reconhecimento se resolve num negócio jurídico unilateral e a lei é terminante na declaração de que aquele procedimento apenas é adequado para reclamar o cumprimento de dívidas - pecuniárias - emergentes de contrato; porque a lei vincula o requerente do procedimento a invocar, logo no requerimento inicial, a relação causal constitutiva do crédito pecuniário - o contrato do qual resulta a obrigação que o devedor não satisfez ou cumpriu (art.° 10.°, n.° 2, d) do RPOP). Dito doutro modo: ao contrário do que sucede noutros procedimentos em que por força do acto unilateral de reconhecimento do devedor, o credor fica dispensado de alegar e de provar a relação jurídica fundamental ou causal de que emerge o crédito, que se presume, no procedimento de injunção o credor está vinculado, ainda que disponha de um documento recognitivo, ao ónus de, ao menos, alegar a relação jurídica subjacente, que deve, necessariamente, consistir num contrato com eficácia constitutiva de obrigações pecuniárias.
Como o uso do procedimento apenas é admissível para o exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes ou constituídas por contrato, segue-se que os factos que fundamentam a pretensão do requerente que este está vinculado a expor, ainda que sucintamente, no requerimento inicial devem consistir, justamente, desde logo, nas declarações de vontade integrantes do contrato de que aquela obrigação emerge, quer dizer, na conclusão do contrato e na vinculação do requerido à realização da prestação pecuniária constituída através dele (art.° 10.°, n.° 2, d), do RPOP).
De outro aspecto, apenas é admissível, através deste procedimento, a exigência do cumprimento de obrigações pecuniárias, i.e., obrigações que têm por objecto uma prestação em dinheiro, através da qual o devedor visa assegurar um determinado valor patrimonial expresso num montante monetário nominal, e não também de obrigações de valor, também conhecidas como dívidas de valor, que são aquelas que têm por objecto prestações nas quais o dinheiro é utilizado como meio da respectiva quantificação e liquidação.
São realmente, frequentes as obrigações que, tendo embora por objecto uma prestação diversa de dinheiro no momento da sua constituição - visando proporcionar ao credor o valor económico de um determinado bem, serviço ou realidade patrimonial - são convertidas posteriormente numa soma em dinheiro, que assim funciona como simples instrumento necessário de medida desse valor e de cumprimento dessa obrigação. É o que sucede com a obrigação de indemnização quando a reconstituição natural não seja viável (art.° 566.° do Código Civil).
Segundo o entendimento corrente, as obrigações de valor são estrutural e funcionalmente distintas das obrigações pecuniárias, dado que têm por objecto próprio uma prestação de valor e não uma prestação de soma, na qual a moeda serve apenas como medida e não como verdadeiro instrumento de pagamento, além de que tal valor deverá corresponder, por regra, não ao valor nominal à data da constituição da obrigação, mas antes ao valo real apurado à data da sua posterior conversão ou liquidação. O caso mais emblemático, de fonte legal, consiste na obrigação de indemnização, em que a prestação pecuniária desempenha uma função instrumental e acessória: a obrigação de indemnização tem por objecto próprio sancionar a responsabilidade civil, designadamente contratual, e reintegrar o património do credor à situação em que se encontraria se a lesão ou dano se não tivesse verificado; todavia, não sendo viável essa reintegração em espécie, torna-se necessário recorrer à prestação consistente numa soma de dinheiro, correspondente ao valor do dano e da perda real patrimonial sofrida e liquidar a obrigação por essa via.
Dívidas há, realmente, que, sendo embora solvíveis em dinheiro, não têm directamente por objecto o dinheiro, mas atribuição de um poder aquisitivo de uma prestação de outra natureza. Tal é, justamente, o caso da obrigação de indemnizar - quando a indemnização se faz em dinheiro - da obrigação de restituir fundada no enriquecimento sine causa, da obrigação de alimentos, etc. A particularidade relevante da dívida de valor é a de não lhe ser aplicável o princípio nominalista e de, consequentemente, ser admissível fixação do seu montante em momento posterior ao da constituição da respectiva obrigação (art.° 550.° do Código Civil).
Trata-se, em geral, de obrigações ex-lege em que está primariamente em causa é a reintegração de um património ou a substituição do valor de um bem. Por isso antes da operação de liquidação do débito em moeda legal, há que proceder à avaliação e os critérios dessa avaliação, salvo convenção contratual diversa, não estão de antemão determinados: estas dívidas não seriam, pois, originariamente dívidas de dinheiro - mas, segundo a terminologia corrente, dívidas de valor. Neste sentido, a dívida de indemnização não é, pois, uma dívida pecuniária em sentido estrito, mas uma dívida de valor: o dinheiro é apenas o substituto ou sucedâneo do objecto inicial da prestação, porquanto é o valor que determina a quantidade.
E é esta, cremos, a razão essencial[6] subjacente à orientação jurisprudencial, constante e firme, que se julga correcta, segundo a qual, pelo procedimento de injunção apenas é exigível o cumprimento de obrigações pecuniárias em sentido estrito e, portanto, que não é o instrumento processual adequado para exigir o cumprimento de obrigações emergentes de cláusulas penais indemnizatórias ou a que deva assinalar- se ainda ou também uma função indemnizatória, apesar de cumulativamente, mas de forma subalterna ou
Apelações em processo comum e especial (2013) subordinada desempenhar também uma função de índole compulsória[7], i.e., aquelas em que a convenção das partes tem por finalidade liquidar a indemnização devida em caso de não cumprimento definitivo, de mora ou de cumprimento defeituoso - nem obrigações que tenham sido constituídas com a finalidade reparar os danos sofridos pelo credor com despesas, v.g., com honorários de advogado, realizadas para assegurar a satisfação do seu crédito, dada também a sua nítida feição ressarcitória (art.°s 810.° a 812.° do Código Civil)[8].
Relativamente à consequência jurídica do uso indevido do procedimento, a jurisprudência, convergindo na conclusão de que dá lugar a excepção dilatória inominada, reparte-se, contudo, por duas orientações: a excepção dilatória nominada da nulidade de todo, ou parte, do processo, resultante do erro na forma de processo; uma excepção dilatória inominada tout court[9].
Problema de solução difícil é o colocado pela cumulação objectiva de pretensões, em que alguma ou algumas das pretensões cumuladas sejam e outra ou outras não sejam exigíveis através do procedimento de injunção. Pergunta-se, realmente, qual deve ser a consequência jurídico-processual nas hipóteses em que o procedimento de injunção não é o meio processualmente adequado ou não é admissível - mas apenas no tocante a algumas das pretensões deduzidas no requerimento inicial. A orientação prevalecente na jurisprudência é a que conclui que a utilização indevida, ainda que meramente parcial, do procedimento de injunção - v.g., quanto ao pedido relativo à cláusula penal - inquina in toto, o procedimento de injunção e, bem assim, a acção declarativa especial para o cumprimento de obrigações emergentes de contrato, de valor inferior ao da alçada da Relação (AECOP) na qual se convolou, e portanto, torna esta totalmente inaproveitável mesmo para os pedidos para os quais o procedimento de injunção é adequado ou admissível[10]. Esta orientação não deixa de ser fundada se se considerar, por um lado, que se trata de uma consequência da estratégia processual do requerente que podendo, ab initio, ter lançado mão da acção especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, optou pelo instrumento da injunção, na expectativa, que não merece tutela, de, na falta de oposição, logo obter, ilícita ou ilegitimamente, um título executivo e, por outro, que importa obstar à fraude das normas injuntivas reguladores do procedimento de injunção e à ilicitude da obtenção, por essa via, daquele título.
Duas últimas observações: a constatação do uso inadequado do procedimento de injunção não é suprível por recurso à adequação processual[11] ou por convite ao seu aperfeiçoamento; as questões relacionadas com a eventual ineptidão do requerimento inicial do procedimento, v.g., por falta de causa de pedir, ou com a insuficiência da causa petendi só se colocam se o procedimento se tiver por admissível, i.e., se o requerido não dever ser absolvido da instância por verificação da apontada excepção dilatória, inominada ou não.
Este viaticum habilita, com suficiência, à resolução da questão concreta controversa enunciada.
3.3. Concretização.
A decisão impugnada concluiu pelo uso inadequado do procedimento de injunção e pela verificação da excepção dilatória inominada em que o mau uso desse processo se resolve e absolveu o requerido da instância.
Cremos que se decidiu bem - embora não exactamente pela razão invocada na decisão recorrida: a de que a requerente não alegou, com fundamento da obrigação pecuniária cujo cumprimento reclama do requerido, objecto do procedimento, um qualquer contrato.
Realmente, a apelante alegou como fundamento do crédito pecuniário, objecto do pedido, que no dia 18 de Dezembro de 2014, entregou ao apelado a quantia de € 6 600,00 e que este se obrigou a pagar-lha em 12 prestações, a primeira com vencimento no dia 10 de Janeiro de 2015 e as restantes em igual dia dos meses subsequentes. Esta causa petendi é subsumível, sem dificuldade, a um contrato que realiza uma função de troca - e de troca de dinheiro por dinheiro: o contrato de mútuo que, sendo oneroso, é o contrato pelo qual o mutuante entrega, ou se obriga a entregar, ao mutuário, uma determinada quantia em dinheiro, obrigando-se o mutuário a restituir tanto do mesmo género e qualidade - a pagar o capital acrescido dos correspondentes juros, que não tenham logo sido deduzidos no valor entregue (art.°s 1142.° e 1145.°, n.° 1, do Código Civil)[12].
É exacto que a requerente que se socorreu para construir a causa petendi do conteúdo do documento de reconhecimento de dívida subscrito pelo apelado - mas não o é menos que individualizou, com a suficiência exigível, no requerimento inicial, o fundamento de que a obrigação pecuniária emerge. Que assim é mostra-o, irrecusavelmente, o conteúdo da oposição deduzida pela requerido que admitiu, prontamente, a conclusão entre as partes do contrato de mútuo e opôs ao pedido da requerente uma multiplicidade concludente de excepções, dilatórias e peremptórias, o que inculca que apreendeu com nitidez o pensamento da requerente e a causa de pedir que construiu, i.e., que a pretensão daquela se fundava naquele contrato de troca de dinheiro por dinheiro, e pode organizar, sem o mínimo embaraço, a sua defesa.
Simplesmente, como se observou, o procedimento de injunção não é o adequado para exigir obrigações emergentes de cláusula penal indemnizatória - finalidade que a requerente expressamente imprime à poena convencional que, segundo ela, foi convencionada entre as partes - nem de despesas que a requerente suportou, v.g. com os honorários de advogado para actuar o crédito de que se diz titular. E, como de harmonia com a orientação jurisprudencial apontada, esse uso inadequado do procedimento inquina e torna inaproveitável, in totum, a acção especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato em que o procedimento, por virtude da oposição, se convolou, a conclusão pela verificação da excepção dilatória inominada da inadmissibilidade do procedimento - ou por erro na forma de processo, conforme o enquadramento que se julgue preferível - é exacta, e a absolvição do requerido da instância é correcta.
Em absoluto remate: apesar da incorreção da decisão impugnada, dado que assentou num fundamento - a inexistência da alegação da conclusão de um contrato entre as partes que não se considera exacto - existe um outro fundamento, distinto daquele que foi utilizado pelo tribunal recorrido, a que esta Relação é lícito atender, para confirmar aquela decisão.
Importa, assim, recusar provimento ao recurso.
A argumentação exposta, pode condensar-se nestas proposições:
- Não é admissível, através do procedimento de injunção, a exigência de créditos pecuniários objecto de reconhecimento unilateral do devedor;
- Ainda que através de negócio jurídico unilateral o devedor tenha reconhecido a dívida, o credor está vinculado, no procedimento de injunção, a alegar o contrato objecto da relação jurídica fundamental do qual a obrigação emerge;
- O procedimento de injunção não é o adequado à exigência de créditos resultantes de cláusula penal com função indemnizatória ou despesas feitas pelo credor com a actuação ou exercício do crédito de que se diz titular;
- O uso inadmissível ou inadequado, ainda que meramente parcial do procedimento inquina e torna inaproveitável, in totum, a acção especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato em que o procedimento, por virtude da oposição, se convolou, e dá lugar a uma excepção dilatória, conducente à absolvição do requerido da instância.
A apelante sucumbe no recurso. Deverá, por esse motivo, suportar as respectivas custas (art.° 527.°, n.°s 1 e 2, do CPC).
4. Decisão.
Pelos fundamentos expostos, nega-se provimento ao recurso.
Custas pela apelante.
2023.03.14






[1] João Luís Lopes dos Reis, Nota sobre a Injunção a propósito do DL n.° 404/93, de 10 de Dezembro, BOA, n.° 1/94, pág. 174, António Santos Geraldes, Injunção, CEJ, 1995, págs. 7 a 11, Antes Teles, Notas sobre a Providência de Injunção à Luz dos Princípios Orientadores da Reforma da Legislação Processual Civil, Forum Iustitiae, O Direito, Ano 131, 1999, III- IV, pág. 471 a 4987 e José Lebre de Freitas, Alguns Aspectos Fundamentais do Regime de Injunção, Forum Iustitiae, n.° 10, 2000, págs. 29 a 31. A doutrina é acorde no sentido de tratar de um procedimento finalisticamente orientado para a obtenção unilateral de um título executivo mas já diverge quanto á qualificação deste título. Para uns trata-se de um título executivo de natureza extrajudicial, especial ou atípico; para outros, porém, trata-se de um título judicial impróprio. No primeiro dos sentidos assinalados, Salvador da Costa, A Injunção e as Conexas Acção e Execução, 5° edição, Almedina, 2005, pág. 250 e Carlos Pereira Gil, Algumas Notas sobre os DL n.°s 269/98 e 274/97, CEJ, Lisboa, 1999, pág. 21; no segundo sentido, José Lebre de Freitas, A Acção Executiva depois da Reforma, 4.^ edição, 2004, pág. 63, Carlos Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. I, Coimbra, 2004, pág. 90 e Miguel Teixeira de Sousa, A Reforma da Acção Executiva, Lisboa, Lex, 2204, pág. 69.
[2] F. Pereira Coelho, Causa Objectiva e Motivos Individuais no Negócio Jurídico, in Comemorações dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977, Volume II (A Parte Geral do Código Civil e a Teoria Geral do Direito Civil), 423-457. 2006, Portugal, 2006. pág. 431.
[3] Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, Almedina, Coimbra, 2008, 5^ edição, pág. 506, e Ac. do STJ de 07.05.2013, www.dgsi.pt. O reconhecimento de uma dívida é uma declaração de ciência (confissão) e, aí, a causa que se presume não é a causa do acto, mas a da obrigação, se esta for de natureza negocial, envolvendo uma causa (que se presume conjuntamente com outros elementos do negócio): João de Castro Mendes, Teoria Geral do Direito Civil, Volume II, AAFDL, Lisboa, 1995, pág. 277, nota 468. Cfr., Vaz Serra, Direito das Obrigações, BMJ n.° 101, 1960, pág. 59.
[4] Assim, por exemplo, José Lebre de Freitas - A confissão no Direito Probatório, Coimbra Editora, Coimbra, pág. 390: sendo que a inversão do ónus da prova não dispensa do ónus de alegação, e que o autor tem de alegar, na petição inicial, a causa de pedir, o credor que, tendo embora em seu poder, um documento em que o devedor reconhece a dívida ou promete cumpri-la, sem indicar o facto que a constituiu, contra ele propuser uma acção, deverá alegar o facto constitutivo do direito de crédito - o que é confirmado pela exigência de forma do art.° 458.° n.° 2 do CC, que pressupõe o conhecimento da relação fundamental- e daí que a prova da inexistência da relação causa válida, a cargo do devedor/demandado se tenha de fazer apenas relativamente à causa que tiver sido invocada pelo credor, e não a qualquer possível causa constitutiva do direito unilateralmente reconhecida pelo devedor. Assim, também, no tocante ao processo executivo, Lebre de Freitas/Ribeiro Mendes/Isabel Alexandre, CPC Anotado, Vol. 3.°, 3.^ ed. Almedina, Coimbra, 2022, pág. 429, e Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Pires de Sousa, CPC Anotado, Almedina, Coimbra, 2022, pág. 69 e o Ac. do STJ de 16.02.2023 (30218/15.5T8LSB-A.L1.S1).
[5] António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, Contratos, Negócios Unilaterais, Almedina, 2018, pág. 693, e Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, cit. pág. 447. Objecto de controvérsia é, no entanto, a questão saber se o art.° 458.° do Código Civil prevê negócios de acertamento. Em sentido afirmativo, Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, ops. locs. cit. e Ac. do STJ de 07.07.2010 (337/08.7TBOAZ.AP1.S1), contra João de Oliveira Geraldes, Sobre os negócios de acertamento e o artigo 458.° do Código Civil, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Ano LXII, 2021, n.° 2, págs. 277 e ss.
[6]   Razão a que se soma, com argumento adjuvante, a circunstância de a indemnização prevista na pena convencional não resultar directamente do contrato, mas de um facto patológico: a mora ou o incumprimento definitivo das obrigações dele emergentes ou a sua resolução. Quanto às cláusulas penais estritamente compulsórias, i.e., convencionadas como um plus, como algo que acresce à execução específica da prestação ou á indemnização pelo não cumprimento a questão é controversa: no sentido da sua admissibilidade, com o argumento de que se está perante uma sanção aplicável sempre que se verifique um facto contratualmente previsto, Salvador da Costa, A Injunção e as Conexas Acção e Execução, cit. págs. 43 e 44, e Carlos Pereira Gil, “Algumas Notas sobre os Decretos-Leis n.°s 269/98 e 274/97”, cit., pág. 3.
[7] António Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, Almedina, Coimbra, 1990, pág. 602, e Nuno Manuel Pinto de Oliveira, Cláusulas Acessórias ao Contrato, Cláusulas de Exclusão e de Limitação do Dever de Indemnizar e Cláusulas Penais, 3^ edição, Almedina, Coimbra, 2008, págs. 73 a 78; Acs. do STJ de 18.11.97, BMJ n° 471, pág. 380 e 09.02.99, CJ, STJ, VII, I, pág. 97.
[8]  Assim, v.g., os Acs. da RP de 27.09.22 (418/22.8T8VLG-A.P1) e de 07.06.2021 (2495/19.0T8VLG.A.P1) e Salvador da Costa, A Injunção e as Conexas Acção e Execução, cit., pág. 41, Paulo Duarte Teixeira, Os Pressupostos Objectivos e Subjectivos do Procedimento de Injunção, Revista Themis, VII, n.° 13, pág. 184 e Rui Pinto, A Acção Executiva, AAFDL, 2020, pág. 215.
[9]   Ac. da RC de 20.05.2014 (30092/13.6YIPRT.C1) e Tiago Manuel Garcia Pires, A Flexibilização Processual no âmbito do Procedimento de Injunção e da AECOP, Dissertação de Mestrado, UC, 2020, pág. 63, nota 250.
[10] Assim, v.g. os Acs. do STJ de 14.12.2012 (319937/10.3YIPRT.L1.S1) da RL de 28.04.2022 (28046/21.8YPRT.L1-8) e de 23.11.2021 (88236/19.0YPRT.L1) e da RC de 20.05.2014 (30092/13.6YPRT.C1). Diferentemente, Miguel Teixeira de Sousa, blogippc.blogspot.com, Jurisprudência 2022 (112) entrada de 1 de Fevereiro de 2023.
[11] Acs. da RC de 20.05.2014, cit., e da RP de 18.12.2013 (32895/12.0YIPRT.P1).
[12]  João Redinha, Contrato de Mútuo, Direito das Obrigações, 3° volume, sob a coordenação de Menezes
Cordeiro, AAFDL, 1991, págs. 187 a 190.