Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
26/20.8T8CVL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE MANUEL LOUREIRO
Descritores: REMUNERAÇÃO DO TRABALHADOR
PERÍODO NORMAL DE TRABALHO
TEMPO DE DESLOCAÇÃO DO TRABALHADOR
FÉRIAS
SUBSÍDIO DE FÉRIAS
Data do Acordão: 03/19/2021
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO – JUÍZO DO TRABALHO DA COVILHÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 237º/1, 245º/1 E 264º DO C. TRABALHO/09.
Sumário: I – A situação concreta a atender para efeitos de saber se há ou não tempo de deslocação a exceder os referenciados 40 minutos e a compensar monetariamente o trabalhador é aquela em que o trabalhador se encontra no concreto momento em que é ordenada a sua deslocalização, mesmo que o período normal de trabalho a que o trabalhador estava sujeito nesse exato momento seja inferior ao período normal de trabalho que a entidade empregadora pudesse exigir do trabalhador nesse mesmo momento e ainda que concomitantemente com a decisão de deslocalização o empregador decida exigir do trabalhador um período normal de trabalho superior ao que lhe vinha exigindo.

II - De outra forma possibilitar-se-ia ao empregador alargar até ao máximo permitido o período normal de trabalho a exigir do trabalhador, por forma a englobar nesse período de trabalho alargado, total ou parcialmente, o tempo excedente de deslocação a compensar, de forma a privar o trabalhador, total ou parcialmente, da compensação pelo esforço físico suplementar e riscos agravados que os CCT´s pretendem ver compensados no caso das deslocações que excedam os referidos limites.

III - Tem o autor direito à compensação pecuniária prevista nas cláusulas 18ª/6 dos CCT´s aplicáveis, a significar que nem todo o tempo de deslocação é compensável, sendo-o, apenas, o que exceda os 40 minutos diários.

IV - O trabalhador tem direito a um período de férias retribuídas em cada ano civil que se vence no dia 1 de Janeiro de cada ano civil – art. 237º/1 do CT/09.

V - Cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber a retribuição de férias e respetivo subsídio correspondentes às férias vencidas e não gozadas, bem assim como proporcionais ao tempo de serviço prestado no ano da cessação – art. 245º/1 do CT/09.

Decisão Texto Integral:

Apelação 26/20.8T8CVL.C1

Autor: R...

Ré: P..., S.A.

Relator: Jorge Manuel Loureiro

1ª adjunta: Paula Maria Roberto

2º adjunto: Ramalho Pinto


Acordam na 6.ª secção social do Tribunal da Relação de Coimbra

I – Relatório

O autor propôs contra a ré a presente ação com a forma de processo comum e emergente de contrato de trabalho, deduzindo os pedidos seguidamente transcritos:

Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, deve a presente ação ser julgada procedente, por provada, devendo em consequência:

a) Ser condenada a Ré a reconhecer a nulidade do processo disciplinar instaurado ao Autor pelo qual foi sancionado com cinco dias de suspensão, ou pelo menos ser declarada a caducidade do procedimento disciplinar com todas as legais consequências, nomeadamente o levantamento da sanção aplicada.

b) Ser declarada com justa causa a resolução que o Autor promoveu condenando-se a ora Ré no reconhecimento dessa resolução do contrato de trabalho. Consequentemente,

c) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor a título de indemnização decorrente de justa causa invocada, a calcular nos termos do disposto no artigo 396º do Código do Trabalho, pelo valor máximo, dada a elevada ilicitude do comportamento da Ré, nos termos atrás alegados, ou seja na quantia de 5.923,12 € (cinco mil novecentos e vinte e três doze cêntimos) que o Autor reclama.

d) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor a quantia de 4.184,88 € (quatro mil cento e oitenta e quatro euros e oitenta e oito cêntimos), a título de trabalho suplementar, prestado e não pago pelo período de tempo que decorreu desde o início da exigência pela Ré da ida para Castelo Branco, e até ao último dia em que ali trabalhou – tudo como melhor consta dos cálculos feitos nesta petição.

Ou,

e) Quando se entenda que tal tempo ou acréscimo ao trabalho normal prestado pelo Autor, não é trabalho suplementar, deve, de qualquer modo, ser paga a indemnização decorrente da alteração geográfica do local de trabalho, nos termos alegados nesta petição e nos termos nele calculados, ou seja, no valor de 4.006,80 € (mil setecentos euros e vinte e quatro cêntimos).

f) A pagar a título de Direito vencidos, melhor discriminados no artigo 48º desta petição, o valor global de 3.426,79 (três mil quatrocentos e vinte seis euros e setenta e nove cêntimos)

g) A quantia de 2.000,00 (dois mil euros), a título de danos não patrimoniais alegados no artigo 58º desta petição.

Alegou, como fundamento da sua pretensão, em resumo, que: foi trabalhador subordinado da ré, que lhe moveu um processo disciplinar destituído de fundamento, que culminou na sua suspensão por 5 dias, com perda de retribuição, sanção essa que deve ser anulada; a ré transferiu o local de trabalho do autor do Fundão para Castelo Branco, contra a sua vontade e sem ter sido consultado, com acréscimo de dispêndio de tempo ao serviço da entidade empregadora correspondente ao acréscimo dos tempos de deslocação para e do seu novo local de trabalho determinante da diminuição do tempo para a família e  amigos; a deslocação do posto de trabalho do autor foi feita verbalmente e sem qualquer justificação, não podendo ignorar a ré que tal deslocalização acarretava custos, transtornos e prejuízos para o autor que teriam de ser compensados, o que não aconteceu; não foi pago o trabalho suplementar ou acréscimo por via da mobilidade decorrente dos acréscimos de tempos de deslocação para e do novo local de trabalho; resolveu, com justa causa subjectiva para o efeito, o contrato de trabalho, assistindo-lhe o direito a ser indemnizado pelos danos morais sofridos por causa dos factos invocados como fundamento da justa causa; é titular dos demais direitos de crédito correspondentes aos montantes pecuniários peticionados.

Citada, a ré contestou, pugnando pela improcedência da ação.

Alegou, em resumo, não existir fundamento para anulação da sanção disciplinar, que o autor não é titular dos direitos de crédito a que se arroga, não lhe assistindo a justa causa invocada para fundamentar a resolução, sendo que, em qualquer caso, caducou o direito à resolução invocado pelo autor.

Respondeu o autor para, no essencial, impugnar a versão de facto aduzida na contestação, reafirmar o alegado na petição e concluir como já aí tinha concluído, acrescentando que a ré resolveu unilateralmente deduzir um valor correspondente a uma eventual falta de aviso prévio, o que não lhe era lícito fazer, pois nesta ação não deduziu pedido reconvencional nem peticionou a respetiva compensação correspondentes a tal valor.

O processo prosseguiu os seus regulares termos, acabando por ser proferida sentença de cujo dispositivo consta o seguinte:

Nestes termos, julgando-se parcialmente procedente a ação decide-se:

a) Declarar a ilicitude da sanção disciplinar aplicada ao autor R... pela ré P..., S.A. - cinco dias de suspensão com perda de antiguidade e retribuição-, devendo a mesma ser considerada sem qualquer efeito.

b) Condenar a ré a repor ao autor a retribuição perdida, no valor de €121,50 (cento e vinte e um euros e cinquenta cêntimos) correspondente à suspensão com perda de retribuição e a repor os dias de suspensão para efeito de antiguidade do autor.

c) Condenar a ré pagar ao autor a quantia de €3.918,61, (três mil novecentos e dezoito euros e sessenta e um cêntimos), relativa a créditos laborais não pagos,

d) Sobre tais quantias são devidos juros de mora, contados desde a data do vencimento e até integral e efetivo pagamento, à taxa legal de 4% (artºs. 804.º, 805.º/2/a) e 3, 806.º/1 e 2, todos do C. Civil e Portarias nºs. 263/99, de 12.04 e 291/2003 de 08.04 e AUJ, STJ n.º 4/2002 de 09.05.2002 – DR, IA, de 27.06.2002),

e) No mais se absolve a ré do peticionado.

Custas pelo autor e ré na proporção do decaimento, sem prejuízo da modalidade do apoio judiciário de que beneficia o autor – cfr. o disposto no número 1 do artigo 527º do Novo Código de Processo Civil, ex vi artigo 1.º, n.º 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho.”.

Em 16/11/2020 foi proferido despacho do qual consta, designadamente, o seguinte:

Pelo exposto corrige-se o valor ínsito na alínea c) do dispositivo da sentença para a quantia de €4.319,31, (quatro mil trezentos e dezanove euros e trinta e um cêntimos), relativa a créditos laborais não pagos.

Deverá, igualmente, dar-se como não escrito, o segmento da sentença onde se afirma “cumprindo apenas deduzir o montante já pago pela entidade empregadora a este titulo - €279,20 (duzentos e setenta e nove euros e vinte cêntimos), cfr, artigo 114º da contestação.

O crédito do trabalhador perfaz, assim, €3.147,59 (três mil cento e quarenta e sete euros e cinquenta e nove cêntimos).”.

Não se conformando com o assim decidido, apelou a ré, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

...

O autor também não se conformou com o assim decidido e recorreu subordinadamente, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões.

...

Contra-alegaram o autor e a ré, pugnando pela improcedência das apelações interpostas pela contra-parte.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência dos recursos.

II - Principais questões a decidir

Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 – NCPC – aplicável “ex-vi” do art. 87º/1 do Código de Processo do Trabalho – CPT), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir:

1ª) se a matéria de facto foi incorretamente julgada, devendo ser alterada;

2ª) se o autor não é titular do crédito que lhe foi reconhecido na sentença recorrida relativamente aos acréscimos do tempo de deslocação de ida para e regresso do local de trabalho determinados pela mudança de local da prestação de trabalho do autor;

3ª) se o autor não é titular dos créditos que lhe foram reconhecidos na sentença recorrida relativamente a férias vencidas em 1/1/2019 e não gozadas, e correspondente subsídio;

4ª) se o autor tem direito a remuneração por trabalho suplementar correspondente aos tempos de deslocação de uma hora por dia que passou a efectuar por causa da deslocalização do seu posto de trabalho;

5ª) se ocorrem outros fundamentos para a resolução do contrato de trabalho com justa causa subjectiva para lá daquele que foi reconhecido pela sentença recorrida;

6ª) se caducou o direito do autor resolver o contrato de trabalho com justa causa subjectiva para o efeito que lhe foi reconhecida pela sentença recorrida e radicada na ilícita transferência do posto de trabalho levada a efeito pela ré com base num pedido não escrito efectuado por uma cliente sua no sentido de ser ordenada tal transferência;

7ª) se o autor é credor de uma indemnização por danos não patrimoniais a suportar pela ré.

III – Fundamentação

A) De facto

Factos provados

O tribunal recorrido descreveu como provados os seguintes factos:

1. No dia 06.05.2014, em Lisboa, a Ré celebrou com o Autor um contrato denominado “Contrato de Trabalho a Termo Certo”.

2. O Autor foi admitido com a categoria profissional de vigilante para o exercício das funções previstas no artigo 18º, n.º 2 da Lei 34/2013, de 16 de Maio, ou seja, para vigiar pessoas, bens e locais, controlar entradas e saídas de locais de acesso ao público ou condicionados, prevenir a prática de crimes, tudo isto seguindo orientações recebidas, funções que desempenhou ao longo do tempo em que esteve ao serviço da Ré.

3. O Autor obrigou-se a exercer as suas funções nas instalações do ... na Covilhã, e ... do Fundão, ao abrigo dum contrato de prestação de serviços celebrado ente a Ré e tais sociedades comerciais de vanda ao público de diversos artigos (cláusula III).

4. Mediante a remuneração à data de 641,93 € (seiscentos e quarenta e um euros e noventa e três cêntimos) – cláusula IV, atualmente de 729,11.

5. Tal contrato, que teve o seu início em 05.05.2015, foi-se renovando até à data em que o Autor lhe pôs termo, por carta de 06.11.2019, rececionada pela Ré em 07.11.2019,

6. No inicio do ano de 2019 o vencimento base auferido pelo Autor era de 694,30€ a que acresciam subsídio de refeição, pago através de cartão refeição e horas noturnas tendo sido aumentado para €729,11 em Abril desse ano.

7. O Autor rescindiu o contrato de trabalho que vinha subsistindo com a Ré com efeitos a partir de 07.11.2019,

8. O que fez, nos seguintes termos:

(Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor da carta que constitui o documento nº 5 junto com a petição inicial);

9. O Autor antes da celebração do contrato com a Ré vivia na Covilhã onde fixou residência, acompanhado do seu agregado familiar (mulher e duas filhas menores) na Rua ...

10. Durante os meses de setembro, outubro e novembro de 2018, o A. chegou alguns minutos atrasado ao seu turno de serviço, em dias não concretamente apurados.

11. Durante o seu tempo de trabalho o A. dirigiu-se ao “Café ...” (zona de cafetaria no interior da loja), onde ia beber café com a sua esposa, em dias e número de vezes não concretamente apurados.

12. Em dia que não se consegue precisar, a esposa do A. enviou, através do “Messenger” da rede social “Facebook”, uma mensagem escrita ao Diretor de Loja, pedindo-lhe diretamente explicações acerca da conversa que este manteve com o seu marido.

13. No dia 11.12.2018 a Ré instaurou um processo disciplinar ao Autor, iniciado com o envio duma nota de culpa.

14. Em relatório elaborado e assinado pelo A., datado de 19 de Novembro de 2018, o trabalhador declarou o seguinte: “Fui chamado à atenção pelo senhor diretor ... pelo facto de minha esposa me vir trazer e permanecer junto ao meu posto durante alguns minutos à conversa comigo antes de ir embora ou por vezes entrar e fazer compras. Falei com a minha esposa e expliquei que tal não pode acontecer visto que eu estava de serviço.”

15. No mesmo documento, o A. declarou ainda: “Sobre o chegar atrasado assumo que cheguei algumas vezes atrasado mas geralmente chego em cima da hora ou seja dois minutos antes de abrir a loja.”

16. E declarou: “Sobre o café que tomo com a minha esposa esporadicamente uma ou duas vezes por semana no café do ..., tenho a informar que não o devo fazer visto que já estou em horário de serviço e também sei que não é permitido.” (…)“Assumo toda a responsabilidade da minha parte sobre estas situações comprometendo-me que jamais volta a acontecer em qualquer serviço que preste pela P... Peço desculpa pelo prejuízo causado no serviço.”

17. Da nota de culpa constava:

“De facto, em data e hora que não se consegue precisar, durante os meses de setembro, outubro e novembro de 2018, o A. chegou constantemente atrasado ao seu turno de serviço, tendo inclusivamente chegado atrasado, em algumas ocasiões, cerca de trinta minutos.

Os atrasos no início do turno foram agravados pelo facto de a loja abrir ao público às 09h00, pelo que, quando o A. se atrasava, o espaço comercial ainda não estava devidamente pronto para receber os clientes, para além de estar desprovido de segurança.

(…) ao invés de se apressar para assegurar as suas funções e o normal funcionamento da loja, o A. dirigia-se ao “Café ...” (zona de cafetaria no interior da loja), onde se mantinha a conversar e a beber café com a sua esposa, tal e qual como se fosse um mero cliente daquela loja.

Também por diversas vezes, para além de se manter à conversa no café, a esposa do A. acompanhava-o até à bancada de CCTV, ali permanecendo à conversa com este.

Em consequência de tais episódios, atendendo que tais comportamentos estavam a influenciar, de forma notoriamente negativa, o funcionamento da loja e o cumprimento das funções da segurança, o Diretor de Loja, Sr. ..., falou diretamente com o A., alertando-o para a necessidade de alterar radicalmente o seu comportamento, não podendo repetir tais condutas sob pena de não poder contar com ele enquanto vigilante daquelas instalações.

Dias após essa conversa, em dia que não se consegue precisar, a esposa do A. enviou, através do “Messenger” da rede social “Facebook”, uma mensagem escrita ao Diretor de Loja, pedindo-lhe diretamente explicações acerca da conversa que este manteve com o seu marido.

Mesmo após ter sido alertado pelo Diretor de Loja, o A. em nada alterou os seus comportamentos, continuando a chegar atrasado e a permanecer a beber café e a conversar com a sua esposa em pleno turno de serviço.

De forma reiterada, depois de enviar a mensagem por escrito ao Diretor de Loja, a mulher do A., após permanecer na conversa com este, ficava dentro do espaço comercial a fazer compras e a conversar com as funcionárias do ... acerca do Diretor de Loja, numa autêntica “coscuvilhice” acerca da vida pessoal deste.

O A., sabendo de tal situação, porquanto publicamente notória, nada fazia, sendo totalmente conivente com tal comportamento.

O A., consecutiva e reiteradamente, adotou uma conduta totalmente indisciplinada, irresponsável e altamente censurável, violando dolosamente a disciplina inerente ao contrato de trabalho.

Por chegar atrasado ao seu local de trabalho de forma constante, o A. incumpriu o seu horário de trabalho, devidamente determinado pela R., violando não só as normas internas da empresa, como também o preceituado na alínea b), número 1, do artigo 128º do Código do Trabalho: “comparecer ao serviço com assiduidade e pontualidade”.

Com tal comportamento o A. não cumpria as funções que lhe estavam incumbidas antes da abertura de loja, não garantindo o normal funcionamento da mesma e a própria segurança do local.

Ao permanecer dentro da loja a beber café e a conversar com a sua esposa, sendo uma prática constante, para além de violar dolosamente os mais elementares deveres de qualquer vigilante, o A. ficou completamente alheio a todo e qualquer movimento que se pudesse efetuar na área sujeita à sua vigilância, fazendo perigar não só a segurança das instalações do cliente, como também a sua própria integridade física e a dos demais que prestavam serviço no mesmo local.

Para além de ficar alheio ao serviço prestado, o A. transmitiu uma imagem de completo desleixo, indisciplina e inutilidade junto do público em geral e do cliente, afetando negativamente a imagem da R. junto das pessoas referidas.

O comportamento do A. criou inclusivamente situações bastante constrangedoras para o próprio Diretor do cliente, tendo o mesmo recebido mensagens escritas da esposa daquele, decorrentes única e exclusivamente de assuntos de serviço.

Para além de tal facto, o Diretor viu a sua vida privada ser comentada dentro do seu próprio local de trabalho, proferindo a esposa do arguido vários comentários com as funcionárias privativas do cliente, situação que, naturalmente, influenciou negativamente, já a título pessoal, o normal dia-a-dia do Diretor de Loja, vendo-se confrontado com estes episódios desagradáveis e completamente despropositados,com origem direta no vigilante de serviço naquele local.

O A. desrespeitou a disciplina inerente ao contrato de trabalho celebrado com a empresa, incumprindo de forma dolosa, constante e reiterada as normas em vigor na empresa e os deveres de qualquer trabalhador no exercício das suas funções.”

18. O Autor, deduziu a sua defesa, contestando a factualidade constante da nota de culpa, por resposta, datada de 20.12.2018.

19. Onde, em síntese, referiu que:

(Dá-se aqui por reproduzido o teor da carta que constitui o documento nº 9 junto com a contestação)

20. O Autor não requereu qualquer diligência no âmbito desse processo disciplinar.

21. Em 05.04.2019 a Ré enviou ao Autor a decisão final desse processo, aplicando-lhe como sanção – 5 (cinco) dias de suspensão;

22. O autor cumpriu tal sanção nos dias 4 de Maio de 2019 até 8 desse mesmo mês e nesse mês de Maio de 2019 foram-lhe descontados 5 dias no valor 121,50 €.

23. O Autor não tinha averbado no seu registo cadastral qualquer sanção anterior.

24. O Autor, respondeu à nota de culpa em 20.12.2018, resposta rececionada pela Ré em 21.12.2018 e não requereu diligências probatórias.

25. O Autor, que não requereu diligências de prova, na resposta à nota de culpa.

26. Depois da resposta do trabalhador, a ré procedeu à inquirição de novas testemunhas sobre a factualidade já constante da nota de culpa, e outra complementar, nomeadamente a testemunha ..., inquirido a 15.01.2019;

27. A testemunha ... foi inquirido a 11.01.2019 e a testemunha … a 09.03.2019, e, de seguida, a ré elaborou o relatório, tendo sido proferido a decisão em 05.04.2019.

28. No dia 29 de Dezembro de 2018 um inspetor da Ré transmitiu-lhe que iria passar a exercer as funções no ... de Castelo Branco.

29. Tal decisão foi transmitida verbalmente, por telefone por um inspetor de Ré de nome ...,

30. Em Castelo Branco, o Autor passou a fazer e cumprir o mesmo horário, tendo em conta o respetivo turno, que desempenhava no Fundão, mas acresce-lhe o tempo de viagem, em viatura disponibilizada pela Ré, cerca de meia hora para ida e outra meia hora para a volta.

31. O Autor continuou a apresentar-se no Fundão, onde recolhia a viatura que lhe foi distribuída, assinando a ficha de viagem, onde apunha a hora do respetivo início e a quilometragem da viatura, e deslocava-se para Castelo Branco, onde iniciava as funções de vigilância e

32. Findo o horário de trabalho, em Castelo Branco, conduz a mesma viatura em direção ao Fundão, onde a entregava e registava a hora de chegada e quilometragem que a viatura apresentava, findando o tempo de trabalho ao serviço da empresa, Ré, e regressa, depois à Covilhã.

33. Tais fichas, que tinham a hora da entrada na viatura e a hora de saída, ou fim de viagem, e bem assim a quilometragem percorrida (no início e no fim de cada dia) serviam para controlo do início da deslocação e do seu termo, e eram entregues mensalmente a um supervisor da Ré que se deslocava a Castelo Branco para o efeito.

34. Do Fundão onde o autor recolhe a viatura que conduz ao longo de cerca de 45 quilómetros para Castelo Branco, e no final do trabalho, em Castelo Branco, regressa ao Fundão onde entrega a viatura, terminando o período de trabalho ao dispor da Ré.

35. O autor despendia em cada viagem cerca de 30 minutos

36. O Autor em 27.03.2019 questionou a Ré, por escrito, onde relata esta nova situação, pedindo uma explicação.

37. Tal carta não teve resposta por parte da Ré.

38. Tal situação manteve-se.

39. O Autor trabalhou no ano de 2019 em Castelo Branco, 25 dias do mês de Janeiro, 23 dias no mês de Fevereiro, 26 dias no mês de Março; 11 dias no mês de Abril; 19 dias no mês de Maio; 24 dias no mês de Junho; 24 dias no mês de Julho, 25 dias no mês de Agosto; 20 dias no mês de Setembro; 14 dias no mês de Outubro e 1 dia no mês de Novembro.

40. A R. é associada da AESIRF - Associação Nacional das Empresas de Segurança desde 01 de Janeiro.

41. No Despacho da R. de 05 de Abril de 2019 constava que a “P..., SA, decide aplicar ao arguido R..., a pena de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade pelo período de 05 (CINCO) dias (…)”

42. O autor tinha as funções de prestação de “serviços de vigilância, prevenção e segurança em instalações industriais, comerciais e outras, públicas ou particulares, para as proteger contra incêndios, inundações, roubos e outras anomalias (…) de acordo com as instruções recebidas (…)”.

43. Foi solicitado pelo cliente a substituição imediata do vigilante de serviço no local, com base nos comportamentos do mesmo.

44. A mudança de local de trabalho do A. foi ordenada na sequência de pedido do Cliente ... da Covilhã,

45. Entre o dia 01 de Janeiro de 2019 e o dia 07 de Novembro de 2019, o autor prestou as suas função nas instalações do ... de Castelo Branco.

46. O A. cumpriu uma média de 37,95 horas de trabalho semanal no 1º Semestre de 2019, e

47. Uma média de 27,72 horas de trabalho semanal no 2º Semestre de 2019.

48. Sendo o meio de transporte fornecido pela R. ao A. e as despesas de deslocação integralmente suportadas pela primeira,

49. A R. contratou com a L... – Companhia de Seguros, SA. A celebração de um seguro de acidente de trabalho, pela apólice de acidentes de trabalho nº ..., que abrangia o autor.

50. O Autor esperou que lhe fossem postos à disposição os créditos laborais vencidos, bem como o modelo RP 5044 DGSS, o que a Ré não fez obrigando até à intervenção do ACT, sendo tal entidade que lhe remeteu tal documento.”.

B) De direito

Primeira questão: se a matéria de facto foi incorrectamente julgada, devendo ser alterada.

A divergência recursiva da ré incide sobre o descrito na alínea L) dos factos descritos como não provados, do seguinte teor: “O A. cumpria um horário de trabalho em regime de adaptabilidade por Convenção Coletiva de Trabalho, referente aos meses de Janeiro a Novembro de 2019”.

Da análise dos mapas de horário de trabalho que constituem os documentos nºs 7 a 17 juntos com a contestação consta, expressamente, que se trata de “Escala organizada em regime de adaptabilidade por regulamentação coletiva.”, com indicação de dois períodos de referência: 1 de Janeiro a 30 Junho (documentos 7 a 12) e 1 Julho a 31 Dezembro (documentos 13 a 17).

Por outro lado, do depoimento da testemunha ... resulta que o tempo de trabalho do autor estava organizado segundo um modelo de adaptabilidade.

Finalmente, está decidido pela decisão recorrida, sem impugnação de qualquer das partes, que ao contrato de trabalho celebrado entre o autor e a ré se aplicou o CCT celebrado entre a AES - Associação de Empresas de Segurança e outra, e a FETESE – Federação dos Sindicatos da Indústria e Serviços e outro, publicado no BTE nº 38, de 15 de Outubro de 2017, até 30 de Junho de 2019, e o CCT celebrado entre a Associação Nacional de Empresas de Segurança (AESIRF) e a Associação Sindical de Segurança Privada (ASSP), publicado no BTE n.º 26, de 15 de Julho de 2019, a partir de 1 de Julho de 2019.

Em qualquer desses instrumentos de regulamentação coletiva estava prevista a possibilidade de organização do tempo de trabalho em regime de adaptabilidade (cláusulas 22ª de cada um deles).

Tudo conjugado, afigura-se-nos que assiste razão à apelante na discordância fáctica que manifesta, por consequência do que se elimina a alínea L) dos factos não provados, acrescentando-se aos factos provados um novo número, o 51, com a seguinte redacção: “Nos meses de Janeiro a Novembro de 2019 o autor cumpria um horário de trabalho em regime de adaptabilidade por regulamentação colectiva de trabalho.”.

Segunda questão: se o autor não é titular do crédito que lhe foi reconhecido na sentença recorrida relativamente aos acréscimos do tempo de deslocação de ida para e regresso do local de trabalho determinados pela mudança de local da prestação de trabalho do autor.

Está assente que a ré mudou o local de trabalho do autor nos termos e para os efeitos das cláusulas 18ª/2 dos CCT´s aplicáveis à relação de trabalho entre ambos.

Assim o decidiu o tribunal recorrido, sem divergência manifestada por qualquer das partes, com o consequente trânsito em julgado do assim decidido.

Nos termos do nº 6 dessas cláusulas “O acréscimo de tempo (de ida para e regresso do local de trabalho), superior a 40 minutos, gasto com a deslocação do trabalhador para o novo local de trabalho, será pago tendo em consideração o valor hora determinado nos termos da cláusula 32.ª, ou compensado com igual redução no período normal de trabalho diário.”.

O objetivo prosseguido por esta norma é a de compensar o trabalhador pela circunstância de a sua deslocalização o obrigar, tendo por referência a sua situação à data da deslocalização, a despender mais de 40 minutos com a sua deslocação para e do local de trabalho, com o desgaste físico suplementar e com os riscos de deslocação agravados a tanto associados, por consequência do que, na parte excedente a esses 40 minutos, o tempo despendido com as deslocações deve ser compensado pelo empregador.

Trata-se, assim, de uma compensação pelo tempo de deslocação que exceda um determinado limite, independentemente da qualificação desse tempo como de trabalho ou não; não se trata de remunerar como tempo de trabalho esse excedente de tempo de deslocação, posto que se se tratasse de uma remuneração deste último tipo não faria qualquer sentido que não fosse contabilizado todo o tempo de deslocação mas só a parte do mesmo que excedesse o referido limite.

Só assim se compreende, por exemplo, que: i) não seja compensado todo o tempo de deslocação, mas apenas aquele que exceda um determinado limite; ii) a compensação monetária prevista para o efeito é quantificada, nos termos daquele nº 6, com base no valor hora do trabalho normal a que se alude no nº 3 das cláusulas 32ª, mesmo que a soma desse tempo excedente de deslocação com o demais tempo de trabalho efectivamente prestado exceda o período normal de trabalho máximo que o empregador pode exigir do trabalhador.

Com efeito, se não estivesse uma causa uma compensação pura por tempo de deslocação e antes estivesse em causa uma remuneração de tempo de trabalho: i) todo o tempo de deslocação seria contabilizado para efeitos remuneratórios, não existindo razão válida para se ignorar o tempo de deslocação inferior a 40 minutos; ii) na situação prevista em ii) do antecedente parágrafo, o período que excedesse o período normal de trabalho máximo também aí referido não poderia ser remunerado em singelo, nos termos determinados naquele nº 6, mas sim nos termos previstos para a remuneração de trabalho suplementar.

A significar, conjugadamente, que a situação concreta a atender para efeitos de saber se há ou não tempo de deslocação a exceder os referenciados 40 minutos e a compensar monetariamente é aquela em que o trabalhador se encontra no concreto momento em que é ordenada a sua deslocalização, mesmo que o período normal de trabalho a que o trabalhador estava sujeito nesse exacto momento seja inferior ao período normal de trabalho que a entidade empregadora pudesse exigir do trabalhador nesse mesmo momento e ainda que concomitantemente com a decisão de deslocalização o empregador decida exigir do trabalhador um período normal de trabalho superior ao que lhe vinha exigindo.

De outra forma, possibilitar-se-ia ao empregador alargar até ao máximo permitido o período normal de trabalho a exigir do trabalhador, por forma a englobar nesse período de trabalho alargado, total ou parcialmente, o tempo excedente de deslocação a compensar, de forma a privar o trabalhador, total ou parcialmente, da compensação pelo esforço físico suplementar e riscos agravados que os CCT´s pretendem ver compensados no caso das deslocações que excedam os referidos limites.

Por identidade de razão, a redução do período normal de trabalho diário a que se reportam as referidas cláusulas, como alternativa à compensação pecuniária nelas igualmente previstas, há-de ser aferida tendo por referência a situação concreta do trabalhador no momento em que é ordenada a sua deslocalização e, nesse caso, o período normal de trabalho diário a que o trabalhador estava sujeito à data em que é ordenada a sua deslocalização, mesmo que esse período normal de trabalho concretamente praticado a essa data seja inferior ao período normal de trabalho que a entidade empregadora poderia exigir do trabalhador, sob pena de se proporcionar ao empregador a possibilidade de se furtar, total ou parcialmente, à compensação devida pelo tempo de deslocação excedente a um determinado limite, designadamente por via de um alargamento até ao máximo permitido do período normal de trabalho a exigir do trabalhador, por forma a englobar nesse período de trabalho alargado, total ou parcialmente, o tempo excedente de deslocação a compensar, privando-se o trabalhador, total ou parcialmente, da compensação pelo esforço físico suplementar e riscos agravados que os CCT´s pretendem ver compensados no caso das deslocações que excedam os referidos limites.

Ora, no caso em apreço, temos que o autor foi deslocalizado para Castelo Branco, onde continuou a cumprir o mesmo horário que desempenhava no Fundão, apesar do que passou a despender em tempo de viagem, em viatura disponibilizada pela ré, cerca de meia hora para ida e outra meia hora para a volta que não despendia quando trabalhava no Fundão (ponto 30º dos factos provados).

A significar que tomando por referência a situação concreta do autor à data da deslocalização, o mesmo não beneficiou, ao contrário do pretendido pelos CCT´s aplicáveis, de qualquer compensação horária pelo esforço suplementar e riscos agravados que passou a suportar por causa daqueles tempos de deslocação suplementares, independentemente de saber se esses tempos de deslocação poderiam ou não compreender-se nos limites do período normal máximo de trabalho que a ré poderia exigir do autor, superiores ao período normal de trabalho que a ré vinha exigindo do mesmo.

Pelo contrário, passou a prestar as mesmas horas de trabalho e nenhuma compensação lhe foi proporcionada pelo desgaste físico suplementar e riscos acrescidos dos tempos de deslocação que passou a despender, o que não é consentido pelos referenciados CCT´s.

Tem o autor, assim, direito à compensação pecuniária prevista nas cláusulas 18ª/6 dos CCT´s aplicáveis, a significar que nem todo o tempo de deslocação é compensável, sendo-o, apenas, o que exceda os 40 minutos diários.

O autor fez deslocações durante 212 dias (12.720 minutos) (ponto 39º dos factos provados), sendo que, como decidido pela sentença recorrida, a compensação devida por essas 212 horas seria a de €892,52.

Consequentemente, a compensação devida pelo excesso de 20 minutos em cada um desses 212 dias (4.240 horas), é de €297,50, a tanto se circunscrevendo o crédito do autor em apreço.

Terceira questão: se o autor não é titular dos créditos que lhe foram reconhecidos na sentença recorrida relativamente a férias vencidas em 1/1/2019 e não gozadas, e correspondente subsídio.

O autor trabalhou para a ré desde 5/5/2015 até 7/11/2019pontos 5º) e 7º) dos factos provados.

Nos termos do art. 264º do CT/09, a retribuição do período de férias corresponde à que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efetivo e, para além desta, o trabalhador tem direito a um subsídio de férias cujo montante compreende a retribuição base e as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho.

O trabalhador tem direito a um período de férias retribuídas em cada ano civil que se vence no dia 1 de Janeiro de cada ano civil – art. 237º/1 do CT/09.

 Cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber a retribuição de férias e respetivo subsídio correspondentes às férias vencidas e não gozadas, bem assim como proporcionais ao tempo de serviço prestado no ano da cessação – art. 245º/1 do CT/09.

No dia 1/1/2019 venceu-se o direito a férias do autor formado no ano de 2018.

Era à ré que cumpria o ónus de alegar e provar que concedeu o gozo das férias vencidas em 1/1/2019 e que pagou o correspondente subsídio (art. 342º/2 do CC).

Os factos provados não permitem sustentar que a ré satisfez esse ónus da prova, não encontrando respaldo na decisão fáctica o alegado pela ré no sentido de que “… o trabalhador recebeu, no mês de março e de junho de 2019, juntamente com o vencimento, as quantias de €347,20 a título de subsídio de férias, o que perfaz a quantia total de € 694,39”, e de que  o autor gozou “… férias nos períodos de 16 de abril a 03 de maio e de 21 de outubro a 5 de novembro de 2019…”;  tudo deve passar-se, assim, como se à data da cessação (Novembro de 2019) as férias não tivessem sido concedidas e o subsídio não tivesse sido pago.

Em Novembro de 2019, data em que se tornou exigível a retribuição por férias não gozadas e correspondente subsídio, o salário base do autor era de €729,11 (ponto 6º dos factos provados).

Nenhuma censura merece, assim, a decisão recorrida, no segmento em que reconheceu ao autor o crédito sobre a ré que está em causa no âmbito desta questão.

Quarta questão: se o autor tem direito a remuneração por trabalho suplementar correspondente aos tempos de deslocação de uma hora por dia que passou a efetuar por causa da deslocalização do seu posto de trabalho.

A resposta afirmativa a esta questão passaria, antes de mais, pela possibilidade de qualificar os tempos de deslocação em questão como tempo de trabalho.

Ora, como visto a respeito da questão segunda, são os próprios CCT´s que regulavam a relação de trabalho entre o autor e a ré a denegar a possibilidade de tal qualificação, apenas impondo ao empregador: i) o custeamento das despesas mensais, acrescidas do transporte do trabalhador, decorrentes da deslocalização; ii) uma compensação pecuniária ou em espécie, a primeira quantificada, sempre, com base na remuneração horária normal,  mas circunscrita ao acréscimo de tempo superior  a 40 minutos, gasto com as novas deslocações  do trabalhador.

Como assim, são aqueles CCT´s que, desde logo, excluem a qualificação daquele tempo de deslocação como tempo de trabalho.

Por outro lado, não se vislumbra razão material e jurídica substantivamente atendíveis para diferenciar o autor de qualquer outro trabalhador que tinha um posto de trabalho fixo e que consumia todos os dias uma hora de deslocação entre a sua residência e o seu posto de trabalho, sendo que em relação a este último desconhece-se normativo legal que imponha a contabilização desses tempos de deslocação como tempos de trabalho.

Com efeito, o tempo de trabalho corresponde ao período em que o trabalhador está a trabalhar ou se encontra à disposição da entidade empregadora e no exercício da sua actividade ou das suas funções, bem como determinadas interrupções ou intervalos como tal taxativamente enunciados e dos quais não importa aqui cuidar por nenhum deles estar em equação – art. 197º/1/2 do CT/09.

Ora, não é desse tipo o tempo compreendido entre o início e o fim das viagens do autor entre o Fundão e Castelo Branco para, nesta última cidade, exercer a actividade profissional de vigilante para que foi contratado.

Na verdade, como resulta daquele primeiro normativo, em conformidade, aliás, com a interpretação que vem sendo sustentada pelo TJUE a respeito do art. 2º/1 da Diretiva 2003/88/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Novembro de 2003, só pode ser qualificado como “tempo de trabalho” aquele em que o trabalhador se encontra: i) a trabalhar durante o período considerado; ii) no exercício da sua actividade ou das suas funções; iii) obrigado a estar fisicamente presente no local determinado pela entidade patronal e de aí estar à sua disposição para poder fornecer de imediato as prestações adequadas, em caso de necessidade (acórdãos Jaeger, C‑151/02, EU:C:2003:437, n.o 48, e Dellas e o., C‑14/04, EU:C:2005:728, n.o 42; e despachos Vorel, C‑437/05, EU:C:2007:23, n.o 24, e Grigore, C‑258/10, EU:C:2011:122, n.o 4).

Ora, durante aquelas viagens de deslocação para e do seu novo posto de trabalho, o autor não se encontrava a trabalhar no exercício da sua atividade/funções de vigilante, nem para o efeito estava disponível; o autor apenas desenvolvia uma atividade de deslocação para o seu posto de trabalho para, aí sim, executar a sua atividade.

A circunstância do autor se fazer deslocar em viatura que lhe era proporcionada pela ré, com procedimentos de controlo dos quilómetros percorridos e do tempo despendido em cada uma das viagens não introduz nenhuma alteração nos dados da equação que leve a qualificar aquele tempo de deslocação como tempo de trabalho, uma vez que: i) nada nos factos provados permite sustentar que o autor estava obrigado a fazer tais deslocações na viatura fornecida pela ré, não podendo fazê-lo em outra viatura, a expensas próprias ou da ré, mas em qualquer caso sem sujeição aos referidos procedimentos; ii) aqueles procedimentos de controlo justificam-se por uma multiplicidade de razões que nada têm que ver com a prestação funcional a que o trabalhador estava obrigado e com o controlo pelo empregador dessa prestação funcional (v.g. prevenir utilizações abusivas da viatura cedida pela ré; obter elementos necessários à eventual compensação prevista nas cláusulas 18ª/6 dos CCT´s aplicáveis.).

Resta dizer que não tem aplicação à situação em apreço a doutrina formada pelo TJUE no seu acórdão de 10/9/2015, no sentido de que “O artigo 2.o, ponto 1, da Diretiva 2003/887CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de novembro de 2003, relativa a determinados aspetos da organização do tempo de trabalho, deve ser interpretado no sentido de que, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, em que os trabalhadores não têm local de trabalho fixo ou habitual, constitui «tempo de trabalho», na aceção desta disposição, o tempo de deslocação que esses trabalhadores gastam diariamente entre a sua residência e o domicílio do primeiro e do último cliente designado pela entidade patronal.”.

Na verdade, na situação dos autos, diversa da considerada nesse acórdão, o autor tinha posto de trabalho fixo em Castelo Branco.

Não podendo aqueles tempos de deslocação ser qualificados como tempos de trabalho, não podem os mesmos fundamentar a condenação da ré a pagar, por referência aos mesmos, remuneração de trabalho suplementar.

Quinta questão: se ocorrem outros fundamentos para a resolução do contrato de trabalho com justa causa subjetiva para lá daquele que foi reconhecido pela sentença recorrida.

Considera o autor, em primeiro lugar, que também se verifica o fundamento de justa causa subjetiva de resolução do contrato de trabalho consubstanciado na falta do pagamento pontual da retribuição.

Reporta-se o autor, se bem percebemos a sua argumentação, à compensação pecuniária devida pela ré por causa dos tempos de deslocação de uma hora por dia de trabalho que o autor passou a despender para desempenhar a sua atividade no seu novo posto de trabalho.

Porém, como visto a respeito da questão segunda, não está aí em causa a retribuição por tempo de trabalho, mas sim uma compensação pelo esforço e riscos comportados pela deslocação para e do novo local de trabalho do autor, não integrando tal compensação o conceito de retribuição.

De facto, nos termos do art. 258º do CT/09:

1- Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho.

2- A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.

3- Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.

(…)”.

A retribuição do trabalho é "o conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da atividade por ele desempenhada (ou, mais rigorosamente, da disponibilidade da força de trabalho por ele oferecida)" - cf. Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, Vol. 1º, 10ª ed., pág. 395), integrando a mesma não só a remuneração de base como ainda outras prestações regulares e periódicas, feitas direta ou indiretamente, incluindo as remunerações por trabalho extraordinário, quando as mesmas, sendo de carácter regular e periódico, criem no trabalhador a convicção de que elas constituem um complemento do seu salário - neste sentido, Monteiro Fernandes, ob. cit., pág. 410; Bernardo Lobo Xavier in Curso de Direito do Trabalho, 2ª Ed., pág. 382).

Ora, a compensação ora em apreço traduz-se numa prestação pecuniária cuja causa determinante não é a prestação da atividade pelo trabalhador, ou a sua disponibilidade para o trabalho, tendo uma causa específica e individualizável diversa da remuneração do trabalho ou disponibilidade para este, devendo considerar-se excluída do conceito de retribuição por força do estatuído no art. 260º/1/a do CT/09.

Não ocorre, assim, a situação de falta de pagamento pontual da retribuição pela qual pugna o apelante.

Aliás, a respeito dessa compensação e da omissão da sua satisfação, também se discorreu assim na sentença recorrida: “Considerando os dias em que efetivamente o autor trabalhou em Castelo Branco (cfr. ponto 39 da matéria de facto provada), é-lhe devido, a este titulo pela entidade empregadora, o pagamento da quantia de €892,52 (oitocentos e noventa e dois euros e cinquenta e dois cêntimos).

Este valor, apesar de representativo, tendo em conta o valor da retribuição mensal do trabalhador, não poderá, contudo, considerar-se relevante para os efeitos pretendidos pelo autor, ou seja, o seu não pagamento não poderá, à luz de um critério equitativo e justo, considerar-se como lesivo de interesses patrimoniais sérios, do trabalhador, para efeitos de consubstanciar a justa causa de resolução ínsita na alínea e) do n.º 2 do artigo 394º do Código do Trabalho.

Cremos que o não pagamento deste valor, sem ser insignificante, também não permite concluir que cause, na esfera do trabalhador, efeitos de tal modo graves, em si e nas suas consequências, que se torne inexigível a continuação da prestação da sua atividade.

A conclusão que se impõe é que, esta omissão, em si mesma, não tem densidade e gravidade suficientes para justificar a resolução contratual pelo trabalhador, com base em justa causa.”.

Relativamente ao assim sustentado pelo tribunal recorrido, o apelante não manifestou qualquer divergência recursiva, com o consequente trânsito em julgado do assim sustentado e decidido, sabido que a força do caso julgado material abrange, para além das questões diretamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado – neste sentido, por exemplo, acórdãos do STJ de 20/6/2012, proferido no processo 241/07.0TTLSB.L1.S1, de 12/7/2011, proferido no processo 129/07.4.TBPST.S1, de 8/3/2007, proferido no processo 07B595, de 19/2/2016, proferido no processo 6B4446, e de 15/5/1999, proferido no processo 99A422; acórdãos da Relação de Évora de 23/7/2014, proferido no processo 209/09.1TBVRS.E1, e de 30/6/2016, proferido no processo 1375/06.3TBSTR.E1; acórdãos da Relação de Coimbra de 5/7/2011, proferido no processo 393/09.4TBSEI.C1, e de 15/3/2005, proferido no processo 4128/04; Vaz Serra, R.L.J., ano 110º, pp. 232 e ss; Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, III, 3ª edição, p. 201; Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, p. 579.

Não pode reconhecer-se, assim e ao contrário do sustentado pelo apelante, justa causa subjetiva de resolução do contrato de trabalho radicada em falta de pagamento pontual da retribuição.

Num segundo plano, considera o apelante que constitui fundamento de justa causa subjetiva de resolução do contrato de trabalho a circunstância de a ré lhe ter aplicado uma sanção que foi declarada nula.

É inútil, logo proibida por lei (art. 131º do NCPC) toda a discussão que pretendesse desenvolver-se sobre esta temática, razão pela qual a mesma não se desenvolverá.

Com efeito, a sanção foi aplicada em Abril de 2009 e foi cumprida em Maio desse mesmo ano (pontos 21º e 22º dos factos provados), sendo que a resolução com justa causa remonta a Novembro de 2019 (ponto 7º dos factos provados).

Ou seja, entre o momento de aplicação da sanção que se convoca como fundamento da resolução e aquele em que a resolução foi exercitada ocorreram mais do que os trinta dias cominados no art. 395º/1 do CT/09 e durante os quais o direito à resolução deveria ter sido exercitado, com a consequente caducidade do hipotético direito do autor à resolução que pretendesse radicar-se na aplicação da referida sanção disciplinar.

A ré arguiu a caducidade do direito do autor à resolução do contrato de trabalho com justa causa (art. 103º da contestação), sustentando, na parte conclusiva da contestação, que “Ainda com o douto suprimento de V. Exa. deverá ser considerada procedente a exceção perentória de caducidade de resolução do contrato de trabalho…”.

Como assim, ainda que se verificasse a causa de resolução sustentada pelo autor a mesma não poderia fundar uma decisão deste tribunal no sentido de declarar verificada uma situação de justa causa subjetiva de resolução do contrato de trabalho por parte do autor.

Concordantemente, não se conhece deste fundamento invocado pelo autor para suportar justa causa subjetiva de resolução do contrato de trabalho.

Finalmente, considera o autor que o descrito nos pontos 9º, 28º a 32º, 35º, 37º e 39º dos factos descritos como provados determinaram violação da sua dignidade enquanto trabalhador, verificando-se, por isso, a justa causa subjetiva de resolução do contrato de trabalho a que se alude no art. 394º/2/f do CT/09.

São do seguinte teor aqueles pontos:

9. O Autor antes da celebração do contrato com a Ré vivia na Covilhã onde fixou residência, acompanhado do seu agregado familiar (mulher e duas filhas menores) na Rua ...

28. No dia 29 de Dezembro de 2018 um inspetor da Ré transmitiu-lhe que iria passar a exercer as funções no ... de Castelo Branco.

29. Tal decisão foi transmitida verbalmente, por telefone por um inspetor de Ré de nome ...,

30. Em Castelo Branco, o Autor passou a fazer e cumprir o mesmo horário, tendo em conta o respetivo turno, que desempenhava no Fundão, mas acresce-lhe o tempo de viagem, em viatura disponibilizada pela Ré, cerca de meia hora para ida e outra meia hora para a volta.

31. O Autor continuou a apresentar-se no Fundão, onde recolhia a viatura que lhe foi distribuída, assinando a ficha de viagem, onde apunha a hora do respetivo início e a quilometragem da viatura, e deslocava-se para Castelo Branco, onde iniciava as funções de vigilância e

32. Findo o horário de trabalho, em Castelo Branco, conduz a mesma viatura em direção ao Fundão, onde a entregava e registava a hora de chegada e quilometragem que a viatura apresentava, findando o tempo de trabalho ao serviço da empresa, Ré, e regressa, depois à Covilhã.

(…)

35. O autor despendia em cada viagem cerca de 30 minutos

(…)

37. Tal carta não teve resposta por parte da Ré.

(…)

39. O Autor trabalhou no ano de 2019 em Castelo Branco, 25 dias do mês de Janeiro, 23 dias no mês de Fevereiro, 26 dias no mês de Março; 11 dias no mês de Abril; 19 dias no mês de Maio; 24 dias no mês de Junho; 24 dias no mês de Julho, 25 dias no mês de Agosto; 20 dias no mês de Setembro; 14 dias no mês de Outubro e 1 dia no mês de Novembro.”.

Sobre esta temática discorreu-se assim na sentença recorrida:

A mudança de local de trabalho constitui um incómodo, as mais das vezes, causando alterações e transtornos ao quotidiano do trabalhador, ainda para mais quando tal obrigação implicar o uso de viatura. Mas, daí a afirmar que por via disto são colocados em causa direitos de personalidade como o direito à vida, moral, honra, dignidade é um grande salto.

Não cremos que tal alteração configure, à luz dos factos apurados a violação culposa dos direitos em causa, até porque a entidade empregadora suportava os gastos coma deslocação, fornecendo uma viatura ao autor.

Os riscos inerentes à deslocação rodoviária, fazem, infelizmente, parte da vida quotidiana da generalidade dos cidadãos, e sabemos que os acidentes podem acontecer aleatoriamente, e nem sempre são os que mais vezes se deslocam de veiculo automóvel que os sofrem, não se podendo estabelecer uma relação direta entre o numero de quilómetros percorridos e a possibilidade de sofre acidentes de viação potencialmente mortais, apenas podemos falar de probabilidades de concretização incerta. No caso, não resulta dos autos que a deslocação do trabalhador se faça por uma via particularmente perigosa, antes o trajeto é feito totalmente em auto estrada, além de que os riscos dessa deslocação se encontram cobertos ao abrigo de um contrato de seguros celebrado pela entidade empregadora.

Não vislumbramos que, com tal alteração, a entidade empregadora tenha procedido, de forma culposa a uma violação de condições de segurança e saúde no trabalho ou ofensa à integridade física ou moral, liberdade, honra ou dignidade do trabalhador, apesar dos compreensíveis transtornos que a alteração do local de trabalho possa representar para o autor.”.

Ora, percorridas as alegações do apelante, nelas não se divisa a mínima argumentação, por mais ténue e incipiente que seja, tendente a contrariar a argumentação assim aduzida na sentença recorrida e com a qual, aliás, concordamos no seu essencial, limitando-se o apelante a referir, conclusivamente e sem rebater a argumentação aduzida na sentença, que “Ao impor tal situação – deslocação não paga, apesar de ocorrer fora do horário de trabalho enquanto no exercício das funções de vigilância – com os consequentes reflexos na vida pessoal do Autor (ponto 9 da factualidade provada, conjugados com os pontos 28, 29, 30, 31, 32, 35, 37 e 39), consubstancia uma violação à sua dignidade, enquanto trabalhador.”.

A significar que não pode ter-se por impugnada aquela argumentação aduzida na fundamentação da sentença recorrida, com o consequente trânsito em julgado do decidido no sentido de que não ocorre a causa de resolução ora em apreciação, pois, como já supra enunciado, a força do caso julgado material abrange, para além das questões directamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado.

Sexta questão: se caducou o direito do autor resolver o contrato de trabalho com justa causa subjetiva para o efeito que lhe foi reconhecida pela sentença recorrida e radicada na ilícita transferência do posto de trabalho levada a efeito pela ré com base num pedido não escrito efetuado por uma cliente sua no sentido de ser ordenada tal transferência.

Nos termos do art. 395º/1 do CT/09, a declaração de resolução do trabalhador com invocação de justa causa deverá feita por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento desses factos.

Está decidido pelo tribunal recorrido, com trânsito em julgado, que a justa causa subjetiva para a resolução do contrato de trabalho reconhecida na sentença recorrida consiste na ilícita transferência do posto de trabalho levada a efeito pela ré com base num pedido não escrito efetuado por uma cliente sua no sentido de ser ordenada tal transferência.

Essa transferência ilícita do posto de trabalho do autor constitui, a nosso ver e para efeitos de determinação do termo inicial do prazo de caducidade, um facto instantâneo, no sentido de que está em causa uma conduta única realizada ou executada em dado momento – a transferência do posto de trabalho do autor ocorrida, tanto quanto resulta dos factos provados, no início de Janeiro de 2019; não se trata, ao contrário do pretendido pelo apelante, de um facto continuado em que a situação de violação contratual persiste em razão da continuidade, por ação ou omissão, da prática de actos ilícitos em relação aos quais é possível estabelecer um nexo de continuidade.

Apesar de instantâneo, os efeitos desse facto persistem temporalmente enquanto a transferência do posto de trabalho se mantiver, razão pela qual estamos aqui perante um facto instantâneo com efeitos duradouros.

Ora, como ensina Albino Mendes Baptista relativamente a situações do jaez referido no antecedente parágrafo, “… deve entender-se que o referido prazo de 30 dias se inicia, não com o conhecimento da materialidade dos factos, mas, sim, quando no contexto da relação laboral assumem tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna imediatamente impossível.” - Estudos sobre o Código do Trabalho, Coimbra Editora, 2004, p. 31; no mesmo sentido, Pedro Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, 3ª edição pp. 529 e 530.

Na situação em apreço o apelante ficou a conhecer, em Dezembro de 2018, a decisão da sua transferência de local de trabalho, a qual passou a ser executada a partir de Janeiro de 2019, momento a partir do qual o apelante passou a suportar os efeitos decorrentes para si dessa decisão, designadamente, as deslocações que passou a ter de fazer entre o seu anterior local de trabalho e o novo, o desgaste físico complementar e os riscos acrescidos a tanto inerentes, bem assim como a redução do seu tempo de disponibilidade pessoal em cerca de uma hora por cada dia de trabalho.

Em Janeiro de 2019 o autor ficou a conhecer, portanto, todos os factos atinentes à sua deslocalização e consequências desta resultantes para si.

Por outro lado, não emerge da factualidade provada que se tenha registado qualquer modificação nos termos da execução dessa decisão de deslocalização do posto de trabalho do apelante que tivesse implicado para este um agravamento das consequências para si emergentes de tal deslocalização.

E da mesma também não emerge, a nosso ver, que a decisão de pôr fim ao contrato foi determinada por uma qualquer ponderação feita pelo apelante relativamente aos termos em que prestou efetivamente o seu trabalho depois de decorridos os 30 dias subsequentes ao início de execução da decisão da sua deslocalização.

Assim, logo em Janeiro de 2019 o autor ficou a conhecer todos os elementos que lhe permitiam ajuizar da dimensão da lesão dos seus direitos e exercer o direito de resolução do contrato se considerasse que tal lesão assumia tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se tornava imediatamente impossível.

A significar, tudo conjugado, que logo em Janeiro de 2019 se registou o termo inicial do prazo de trinta dias que está em equação.

Mesmo que assim se não entendesse, importa recordar que em 27/3/2019 o apelante remeteu à ré a carta que constitui o documento nº 12 junto com a petição inicial (ponto 36º dos factos provados), na qual, em resumo, se insurgia contra: i) a decisão da sua deslocalização e a falta de informação dos motivos à mesma subjacentes; ii) a subsistência, após a deslocalização, do tempo de trabalho que vinha cumprindo antes da mesma, apesar dos tempos de deslocação que passou a suportar e que antes não suportava, sem pagamento de qualquer remuneração correspondente aos referidos tempos de deslocação.

Nessa mesma comunicação o apelante também fez saber à ré que não permitiria o protelamento dessa situação e dos seus efeitos e que se os mesmos não fossem revertidos o apelante socorrer-se-ia das providências legais adequadas à tutela dos seus direitos.

A ré não respondeu a tal interpelação ((ponto 36º dos factos provados), nem resulta da factualidade provada que após 27/3/2019 se tivesse registado qualquer alteração nos termos em que o autor vinha prestando o seu trabalho e nas consequências daí resultantes para si.

A significar que pelo menos em Abril de 2019 o autor ficou a conhecer a irreversibilidade da situação em que se encontrava e dos seus efeitos, cujo protelamento anunciou que não permitiria e que determinaria da sua parte um recurso aos mecanismos legais de defesa dos seus direitos.

Como assim, pelo menos em 1/5/2019 o autor estava na posse plena de todos os elementos factuais e cognitivos com base nos quais veio a resolver o contrato de trabalho com justa causa subjetiva para o efeito.

Porém, apenas procedeu a essa resolução em Novembro de 2019 (ponto 7º dos factos provados), muito para lá do termo final do prazo de caducidade de trinta dias em que deveria ter exercido o correspondente direito.

Como assim, nenhuma censura merece a decisão recorrida na parte em que declarou a caducidade do direito do autor resolver o contrato de trabalho com justa causa.

Sétima questão: se o autor é credor de uma indemnização por danos não patrimoniais a suportar pela ré.

Na petição inicial o autor ancorou o pedido de indemnização que ora está em apreciação na “… tristeza, desgosto, renuncias, privações, perda de convívio, descanso com reflexo na sua vida pessoal e familiar …” aludidos no art. 58º da petição inicial.

Analisada a decisão fáctica recorrida, que não foi impugnada pelo apelante, logo se verifica que tal alegação do autor não resultou provada, soçobrando, assim, o fundamento fáctico em que o apelante fez radicar a sua pretensão indemnizatória.

E tanto basta, sem necessidade de outras considerações, para se responder negativamente a esta questão, independentemente de saber se relativamente à mesma a sentença recorrida incorreu ou não em nulidade por omissão de pronúncia.

IV- DECISÃO

Acordam os juízes que integram esta sexta secção social do Tribunal da Relação de Coimbra no sentido de: i) julgar parcialmente procedente a apelação da ré, reduzindo-se para €297,50 o crédito de €892,52 que foi reconhecido ao autor pela sentença recorrida a título de compensação pelo tempo de deslocação de e para o seu novo local de trabalho; ii) julgar improcedente, no mais, a apelação da ré; iii) julgar totalmente improcedente a apelação do autor.

As custas da apelação da ré correspondentes a €297,50 serão suportadas pelo autor, sendo as demais suportadas pela ré.

As custas da apelação do autor serão por ele integralmente suportadas.

Coimbra, 19/3/2021

                                               (Jorge Manuel Loureiro)


               (Paula Maria Roberto)

            (Ramalho Pinto)