Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
276/03.1GBOBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BRÍZIDA MARTINS
Descritores: INDEMNIZAÇÃO
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 02/03/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DO BAIXO VOUGA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ATIGO 129º DO CP, 494ºE 496º,563
Sumário: 1. Danos não patrimoniais são os que afectam bens não patrimoniais (bens da personalidade), insusceptíveis de avaliação pecuniária ou medida monetária, porque atingem bens, como a vida, a saúde, a integridade física, a perfeição física, a liberdade, a honra, o bom nome, a reputação, a beleza, de que resultam o inerente sofrimento físico e psíquico, o desgosto pela perda, a angústia por ter de viver com uma deformidade ou deficiência, os vexames, a perda de prestígio ou reputação, tudo constituindo prejuízos que não se integram no património do lesado, apenas podendo ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo mais uma satisfação do que uma indemnização, assumindo o seu ressarcimento uma função essencialmente compensatória, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória ou de pena privada.
2. Assim, atentando-se igualmente nos arestos citados pela decisão recorrida, que comportam situações de vida e sequelas próximas á presente, tendemos a considerar o valor aí arbitrado como aquele que deve subsistir enquanto correspectivo tendente a indemnizar os danos em causa.
3. No que diz respeito o quantitativo arbitrado para ressarcimento dos danos futuros sobrevindos ao lesado deve dizer-se que a capitalização dessa indemnização em dinheiro correspondente ao dano futuro previsível deve abranger tão só a vida activa da vítima, pois é durante a vida activa que a vítima perde a força do seu trabalho, agora diminuída: é a força de trabalho que se perde no caso da incapacidade permanente para o trabalho, sendo esse valor que se substitui pelo equivalente em dinheiro.
4.Actualmente, na sociedade discute-se o alargamento da idade da reforma, tendencialmente até aos 70 anos; em face disso, caso a caso, deve a indemnização capitalizar-se até essa idade, o que a lei nos permite, fazendo uso do princípio da equidade (artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil) que serve precisamente para fazer a justiça do caso concreto, porque previsivelmente a idade da reforma vai sofrer um alongamento.
Decisão Texto Integral: 23

I – Relatório.
1.1. Nos presentes autos, o Ministério Público deduziu acusação contra FX já neles melhor identificado, imputando-lhe, nomeadamente, a prática de um crime de ofensa à integridade física negligente, agravada pelo resultado, previsto e punido pelo artigo 148.º, n.ºs 1 e 3 do Código Penal.
LA, também já mais identificado, vítima deste ilícito, foi oportunamente admitido a intervir nos autos, na qualidade de assistente, e, simultâneamente, deduziu pedido de indemnização contra o dito arguido e sua seguradora, B…. S.A., pretendendo ver-se assim ressarcido pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sobrevindos em virtude da assacada conduta delitiva, computando-os em € 511.620,46 [= € 16.875,00 de perda de salários - € 5.969,43 já recebidos + € 330.750,00 de perda de capacidade de ganho + € 1.672,16 de perdas materiais + € 125.000,00 de danos não patrimoniais + actualizações devidas à inf1ação], acrescidos de juros vincendos desde a notificação.
X… S.A., deduziu pedido de reembolso contra a B… S.A., a título de sub-rogação, pelos € 38,432,21 [= a € 21.366,31 como pensão anual convertida em capital + € 5.969, 43 de indemnizações salariais por incapacidades temporárias durante todo o período em que o assistente esteve de baixa + € 7.496,52 com despesas médicas, medicamentosas e hospitalares, incluindo cirúrgicas + € 2.010,45 com despesas de transportes + € 1.589, 50 com despesas judiciais obrigatórias e outras que pagou a título de indemnização pelo acidente dos autos que também teria sido um acidente de trabalho].
Na subsequente e normal tramitação processual, aberta a audiência de julgamento, as duas seguradoras lograram pôr termo ao litígio, por meio de transacção obtida e logo homologada por sentença, entretanto transitada em julgado, em cujos termos essenciais, a demandada B. S.A., aceitou pagar à demandante X… S.A., a indicada quantia de € 38,432,21, no prazo de 30 dias, e esta lhe deu quitação por tal montante, logo que efectivamente recebido (fls. 1.346).
Findo o contraditório, por Acórdão prolatado, foi decidido, apenas ao que ora releva e no atinente ao pedido cível em causa:
- Atenta a respectiva ilegitimidade, absolver da instância o arguido e demandado FX.
- Julgá-lo parcialmente procedente contra a demandada B…. S.A. que, por consequência, se viu condenada a pagar ao demandante L.:
- € 125.000,00, por danos não patrimoniais sofridos, acrescendo a tal quantia os juros de mora, vincendos a partir da sentença, à taxa legal anual de 4%, até integral pagamento.
- € 198.448,75, por danos patrimoniais sobrevindos, acrescendo a este montante os juros de mora vencidos desde 5 de Fevereiro de 2007, bem como os vincendos, à mesma taxa legal anual, até integral pagamento.
- Mais o valor que se apurar em liquidação de execução dessa sentença, respeitante ao valor da camisa, das calças, dos ténis e dos óculos (referidos em 57 e 58 dos factos provados), até ao máximo de € 280,00, valor actualizado de 15 de Maio de 2003 até 5 de Fevereiro de 2007, de acordo com a taxa de inflação durante esse período, e com juros vencidos desde a última data e vincendos até integral pagamento, à taxa legal anual de 4%.
1.2. Desavinda tão-somente com o segmento da decisão que arbitrou os danos respeitantes à perda da capacidade aquisitiva do lesado, bem como os danos não patrimoniais também sofridos pelo mesmo, a seguradora B… S.A., interpôs recurso, extraindo da motivação apresentada as seguintes conclusões:
1.2.1. Na determinação do valor da indemnização pela perda da capacidade aquisitiva ou de ganho, a utilização de coeficientes constantes de tabelas financeiras ou o recurso a fórmulas complementares deverão sempre assumir um mero carácter auxiliar, e não deverão nunca sobrepor-se a uma ponderação judicial com base na equidade (artigo 566.º, n.º 3 do Código Civil), sob pena da determinação da indemnização por tal dano se reduzir a uma mera questão técnico-contabilística, que dispensaria a intervenção dos Tribunais.
1.2.2. Conforme vem sendo entendido de forma pacífica quer pela Doutrina quer pela Jurisprudência, em síntese, a respectiva indemnização deve equivaler a um capital capaz de gerar o rendimento que, no caso de IPP, “compense” a diferença entre a situação anterior ao acidente e a que dele emerge em termos de incapacidade, capital esse que se deverá extinguir no final do período de vida activa expectável para o lesado, devendo merecer ponderação o facto da indemnização ser paga ao lesado antecipadamente e de uma só vez, sob a forma de um único capital, o que, além do mais, lhe permite retirar o benefício e a vantagem da sua rendibilidade em termos financeiros. Assim, justificar-se-á que se opere uma dedução de 1/3 relativamente ao capital apurado, evitando-se um qualquer enriquecimento ilegítimo do lesado.
1.2.3. No cálculo a efectuar deverá ter-se em conta a idade correspondente ao limite de vida activa do lesado – e não a esperança média de vida, relevante apenas para consideração do dano não patrimonial – considerando-se assim os anos, idade a partir da qual o lesado atingirá o direito à reforma, ficando dispensado de trabalhar, passando então a auferir a respectiva pensão ­evitando-se assim também aqui uma duplicação entre o valor da indemnização e o valor de reforma, que redundaria num enriquecimento ilegítimo do ofendido.
1.2.4. No caso concreto do recorrido, atendendo à sua idade à data do final do período de baixa – pois que é integralmente ressarcido de todas as perdas salariais até tal data – teremos de considerar um período expectável de 35 anos de vida activa; o seu salário anual, no valor de € 8.872,50 e, a IPP de 40 % de que ficou a padecer, a qual, embora impeditiva do exercício da actividade profissional habitual, já o não é do exercício de outras profissões da área da sua preparação técnico profissional.
1.2.5. Assim, tudo conjugado e com recurso à equidade, impunha-se fixar o valor da indemnização decorrente da perda da capacidade aquisitiva ou de ganho do demandante em quantia não superior a € 100.000,00.
1.2.6. Quantia esta abatida, tal como se fez no Acórdão impugnado, do montante entretanto já recebido pelo recorrido da X.., S.A., a título de capital de remição – € 21.366,31 – e resultante da conversão da pensão anual que lhe fora conferida em sede laboral (acidente simultâneamente de viação e de trabalho).
1.2.7. E, logo, significaria que o valor final devido a tal título, fosse de € 80.000,00.
1.2.8. No que concerne ao valor da indemnização a atribuir ao recorrido a título de danos não patrimoniais, além dos factos dados como provados, a propósito [designadamente, o facto ter 29 anos à data do acidente; ter ficado afectado de uma IPP de 40%, impeditiva do exercício da actividade profissional habitual mas não de outras profissões; a sua preparação técnico profissional; o longo período de doença a que esteve sujeito, parte em regime comatoso; o tipo e a extensão das lesões e sequelas emergentes], não deveria o aresto sindicado ter olvidado os factos também aí tidos por não provados, fixando-o em quantia não superior a € 50.000,00, acrescida do valor dos juros vencidos e vincendos, contados a partir da data da sentença e calculados à taxa legal em vigor [4% anuais].
1.2.9. Decidindo nos moldes em que o fez, o Acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 483.º; 496.º, n.º 3; 564.º, n.º 2 e 566.º, n.º 3, todos do Código Civil.
Terminou pedindo a revogação parcial da sentença proferida nos termos invocados.
1.3. Admitido o recurso e notificado o sujeito processual visado ao efeito, nenhuma resposta se mostra oferecida.
1.4. Remetidos os autos a esta instância, o Ex.mo Procurador-geral Adjunto limitou-se a apor visto, atenta a circunstância de o recurso se mostrar restrito à vertente cível do decidido e o lesado se encontrar devidamente patrocinado através de mandatário judicial.
1.5. No exame preliminar a que alude o n.º 6 do artigo 417.º do Código de Processo Penal, consignámos nada obstar ao conhecimento de meritis.
Como assim, determinou-se o prosseguimento do recurso, com recolha dos vistos devidos, e submissão dos autos à presente conferência.
Urge agora ponderar e decidir.
*
II – Fundamentação de facto.
O Acórdão sob censura teve por provada a factualidade seguinte:
1. No dia … de… de 2003, cerca das …. horas, L. conduzia o veiculo ligeiro de passageiros, Peugeot ….., matrícula 24-…, propriedade da sua mãe, pela Estrada Nacional n.º 333, no sentido Águeda => Oiã, e a seu lado, no lugar do passageiro, seguia P..
2. À sua retaguarda seguia um outro veículo (Audi) e, atrás deste, o veículo ligeiro de passageiros, de matrícula 42--- conduzido pelo seu dono, arguido FX, indo a seu lado, no lugar do passageiro, B
3. Em sentido contrário, circulava o veículo ligeiro de mercadorias, de matrícula 8… conduzido por V.
4. A faixa de rodagem tem uma largura de 6,95 metros, metade para cada um dos sentidos, sendo dividida por um traço longitudinal, descontínuo, para quem vem de Águeda até ao km 17,800, e a partir daí contínuo, e, no local, é formada por uma recta com mais de 700 metros de visibilidade a partir do local de embate em direcção a Águeda. O tempo estava bom.
5. O condutor do Audi e o arguido ao aproximarem-se do km 17,800 decidiram efectuar a manobra de ultrapassagem ao veículo conduzido pelo L. para o que imprimiram maior velocidade aos seus veículos e passaram a circular na outra metade da faixa de rodagem.
6. O arguido fê-lo sem se certificar se existia perigo de colisão com outros veículos que circulassem em sentido contrário.
7. Quando se encontrava já ao lado da viatura conduzida pelo arguido L, dado que o Audi logrou terminar a manobra de ultrapassagem, deixando desocupado o seu campo de visão, apercebeu-se do veículo conduzido pelo V. pelo que, para tentar evitar o embate neste, desviou-se para a berma do seu lado esquerdo.
S. No entanto, não conseguiu evitar o embate da parte frontal direita daquele veículo no meio do lado direito do seu veículo.
9. Em virtude da força do embate, o veículo conduzido pelo V., tombou, capotando, e a sua traseira foi projectada para a hemi-faixa do lado contrário, indo cair em cima do veículo conduzido pelo L., enquanto a viatura conduzida pelo arguido era projectada para trás, indo embater no veículo de matrícula 73….. que estava estacionado perto daquele km 17,800, na berma esquerda atento o sentido de marcha do arguido, imobilizando-se de seguida.
10. Em consequência directa e necessária dos embates descritos:
(…)
- L. sofreu traumatismo crânio-encefálico e facial com focos de contusão cerebrais: lenticular direito, frontal esquerdo, fronto-basal direito e temporal esquerdo; hemorragia sub-dural da foice do cérebro à direita; fractura da parede posterior do seio maxilar direito; pequena fractura da apófise transversa de C6; fractura do nariz e fractura da mandíbula direita, lesões estas que foram causa necessária e suficiente de uma incapacidade temporária geral total até 4 de Julho de 2003 e parcial até 21 de Fevereiro de 2005, sendo que os primeiros 550 dias foram de incapacidade total para o trabalho e os restantes 99 de incapacidade parcial e de uma incapacidade permanente geral de 40% (nos termos concretizados abaixo).
(…)
15. L ficou com cortes na região frontal esquerda e nos membros superiores.
16. Permaneceu ventilado e em estado de coma durante 8 dias e temeu-se a sua morte.
17.Quando lhe foi alta hospitalar, em 4 de Julho de 2003, apresentava um discurso quase imperceptível, limitado a ocasionais monossílabos, com hipofonia e compreensão mantida. A escrita era perceptível com agramatismo, palavras incompletas e desorganização espacial. Do ponto de vista funcional apresentava hemi-parésia espástica esquerda (F.M. grau 4); era possível a marcha com apoio bilateral mas com instabilidade e desequilíbrio sem lado preferencial.
18. Apresentava também assimetria facial e problemas de acuidade visual; acreditou, durante 2 meses, pertencer ao exército; e necessitava, durante um mês, do acompanhamento de terceira pessoa 24 horas por dia.
19. Em 25 de Julho de 2003, depois de três observações – a 15, 17 e 24 de Julho –, ­concluiu-se que tinha alterações importantes no seu funcionamento cognitivo e emocional, verificando-se défices cognitivos múltiplos, nomeadamente ao nível: da memória (diminuição muito acentuada na capacidade para aprender nova informação verbal, assim como recordar informação verbal e não verbal previamente aprendida); do raciocínio; da capacidade visuo-perceptiva; desorientação temporal e espacial; lentificação psicomotora; bem como ausência de juízo crítico da realidade e apraxia do discurso (que era quase imperceptível e limitado a escassos monossílabos).
20. Para além disso, estava com um humor de carácter ansioso e evidenciou ausência de compreensão psicológica do seu comportamento, dificuldades em perceber correctamente o real, agressividade, baixa tolerância à frustração, ausência de respostas emocionais profundas e predisposição paranóide.
21. No inicio de Setembro de 2003, a sua namorada decidiu pôr fim ao relacionamento que mantinha com ele e que durava havia já 9 anos.
22. Em 11 de Setembro de 2003 apresentava diminuição do rendimento de trabalho «p5) e do índice de dispersão «p5) na prova de atenção sustida por longos períodos de tempo; marcada diminuição da capacidade da atenção interferida por tarefas dissociativas «p5); perturbação da flexibilidade mental «p5); ligeira perturbação da conceptualização verbal; perturbação da capacidade de orientação visuo-espacial (p5); alteração da memória verbal episódica (após latência); diminuição da capacidade de aprendizagem e memória verbal associativa; perda de informação após 30 m de latência na memória visual; e ligeira perturbação da memória remota.
23. Foi sujeito a um programa de reabilitação, quer funcional, quer cognitiva, frequentando sessões de terapia da fala, de terapia ocupacional e fazendo tratamentos de reabilitação motora no Hospital Garcia de Horta, bem como na Fisiosol – Centro de Serviços Médicos e de Fisioterapia, Lda.
24. Em 4 de Novembro de 2003, atendendo à deficiente consolidação da fractura sofrida no maxilar, teve de se submeter a uma cirurgia maxilo-facial no Hospital S. Luís, para implantação de uma placa e 5 parafusos de titânio na mandíbula.
25. Entre 11 de Setembro de 2003 e 27 de Abril de 2004, frequentou algumas consultas de psicologia nomeadamente por apresentar alguma sintomatologia depressiva, “relacionada quer com as limitações físicas [resultantes] do acidente quer com as mudanças em termos de relacionamento social e objectivos de vida implicadas por este.”
26. Em 27 de Abril de 2004 apresentava diminuição do rendimento de trabalho «p5); diminuição da capacidade da atenção interferida por tarefas dissociativas «p5); ligeira perturbação da conceptualização verbal; alteração da memória verbal associativa e visual.
27. Em 14 de Dezembro de 2005 apresentava alteração da conceptualização verbal e discreta perseveração na iniciativa grato-motora, alteração da memória verbal episódica e visual e capacidade de aprendizagem com o reconhecimento.
28. Em 21 de Novembro de 2006, estava com alterações irreversíveis da fala, da memória, da atenção e da orientação, o que tudo prefigura uma síndrome post – traumático encefálico em grau severo, com clara diminuição da sua eficiência pessoal e, necessariamente, profissional, ficando com uma incapacidade permanente geral de 40%.
29. Estas sequelas impedem-no do exercício da actividade profissional habitual mas não de outras profissões da área da sua preparação técnico profissional.
30. Ficou ainda com uma diminuição bilateral do olfacto.
31. E com uma cicatriz na região frontal esquerda, arciforme de convexidade interior, medindo cerca de 2,5 cm de comprimento, e com várias cicatrizes nas faces antero-externas dos cotovelo e terço superior do antebraço direito, diversamente orientadas, lineares, medindo entre 2,5 m e 0,5 cm
32. Tem irritabilidade fácil.
33. Tem graves limitações na prática da condução, natação, pára-quedismo, artes marciais, rapel e canoagem, devido às sequelas referidas, o que corresponde a um prejuízo de afirmação pessoal fixável em 3 numa escala de cinco graus de gravidade crescente.
34. L. a 26 de…. de 1974.
35. Praticava artes marciais desde pequeno: era praticante de Karaté shotokai.
Inscreveu-se na FP de Aikido Aikikai em 5 de Maio de 1994 e era membro da Associação Lusitana Taekwondo.
36. Tinha o curso de nadador-salvador ministrado pelo Instituto de Socorros a Náufragos.
37. Fez mergulho de apneia com equipamento próprio para o efeito, bem como caça submarina.
38. Frequentou, com aproveitamento, um curso de pára-quedismo ministrado pela Skysport, Escola de Pára-quedismo Desportivo, Lda., tendo efectuado o seu primeiro salto em 9 de Junho de 1996.
39. Fez BTT, canoagem e rapel.
40. Concluiu em 21 de Julho de 1999, o Bacharelato em Engenharia Civil - Ramo Topografia, na Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Beja, com a classificação final de 14 valores.
41. Frequentava o 3.º ano do curso de Engenharia Geográfica na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, com 5 cadeiras aprovadas em 2000, 5 em 2001, 1 em 2002 e 2 em Janeiro de 2003, com sete equivalências dadas em 2000/2001, 2 reprovações em 2002 e 2 em Fevereiro de 2003.
42. Foi autor de um trabalho publicado em CD num livro – Manual do Engenheiro Topógrafo – dos seus professores, Tenente-Coronel J. e P. –, cujo lançamento ocorreu poucos meses após o acidente e no qual consta uma página a fazer essa referência, bem como ao acidente de viação que “infelizmente precocemente o afastou.”
43. Foi Ranger, tendo prestado serviço militar no Grupo de Operações Especiais baseado em Lamego.
44. Vivia num ambiente familiar estável, saudável e harmonioso.
45. Era uma pessoa saudável, inteligente, responsável, perspicaz e trabalhadora, independente, auto confiante, alegre e interessado, augurando-se-lhe um prometedor futuro no campo profissional, tendo-se tomado apático, desinteressado e deprimido.
46. Privilegiava o convívio com a sua família, namorada e amigos, viajando com eles fosse para o estrangeiro ou no interior do território nacional.
47. Após 21 de Fevereiro de 2005, reiniciou a frequência do curso de Engenharia Geográfica na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, tendo reprovado a uma cadeira.
48. Não possui memória desde 3 anos antes do acidente de viação de que foi vítima, não se prevendo que algum dia a venha recuperar.
49. O que o deixa frequentemente confuso face aos episódios da sua vida que lhe são relatados e dos quais não se recorda.
50. Na data do acidente, era, desde Dezembro de 2002, técnico da empresa M…. , S.A., com um vencimento mensal líquido de € 300,00.
51. Em 15 de Novembro de 2002, constituiu com JC e PR, a B…– Engenharia e Topografia, Lda., cujo objecto social consistia na prestação de serviços em levantamentos geodésicos, cartografia, engenharia e topografia.
52. Era gerente dessa sociedade e, simultaneamente, efectuava serviços que a empresa se disponibilizava a prestar aos seus clientes, sendo o único trabalhador remunerado, auferindo mensalmente, em Fevereiro de 2003, a quantia de € 375,00 ilíquidos.
53. Na data do acidente, tinha-se deslocado a Águeda ao serviço da BFB.
54. Fazia-se acompanhar de um tripé de madeira gst120-9, um bastão gls111 com nível esférico, um prisma reflector com chapa de alvo gpr111 e uma estação total de topografia tcr705 com teclado s/n 649592, que são instrumentos sensíveis.
55. O prisma reflector e o tripé de madeira gst120-9 ficaram com pernas partidas, sem qualquer aproveitamento para a actividade topográfica ou outra.
56. A estação total de topografia teve que ser rectificada e calibrada, serviço prestado pela GPSER – Venda e Aluguer de Material Topográfico em 04/06/2003, no montante de € 267,16, facturado à BFB – Engenharia e Topografia.
57. No dia do acidente, L. vestia calças e camisa e calçava um par de ténis que ficaram irremediavelmente danificados.
58. Os seus óculos Ray Ban ficaram com uma lente rachada e a armação torcida, o que impossibilitava a sua utilização.
59. O arguido tinha transferido para a B---SA a eventual responsabilidade civil decorrente da circulação do seu veículo conforme contrato titulado pela apólice AU…., até ao montante de 240.000.000$.
(…).
*
III – Fundamentação de Direito.
3.1. Como decorre do disposto no artigo 428.º do Código de Processo Penal, mostra-se facultado a esta instância conhecer, em recurso, de facto e de direito.
Por outro lado, e nos termos do artigo 412.º, n.º 1 do mesmo diploma adjectivo, o âmbito do recurso é definido através das conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, mas isto sem prejuízo do conhecimento oficioso de certos vícios ou nulidades, ainda que não invocados ou arguidas pelos sujeitos processuais (cfr. artigo 410.º, n.ºs 2 e 3, do citado diploma e jurisprudência fixada pelo Ac. do STJ n.º 7/95, de 19 de Outubro, in D.R., I.ª Série A, de 28 de Dezembro de 1995).
Acresce, por fim, atento o carácter disponível que assume o direito ao recurso, e o estatuído no artigo 403.º, n.º 1 do dito texto normativo, ser admissível aos sujeitos processuais limitarem o recurso “a uma parte da decisão quando a parte recorrida puder ser separada da parte não recorrida, por forma a tornar possível uma apreciação e uma decisão autónomas.”
Sendo certo que, in casu, não intercede algum de tais vícios ou nulidades, atentando-se nas conclusões da recorrente resulta, então, que, porque não controverte a matéria de facto fixada na 1.ª instância, nem problematiza a sua constituição na obrigação de indemnizar o demandante Luís Miguel Oliveira Ferreira, o thema decidendum se restringe únicamente ao montante em que a indemnização devida tem de fixar-se no que concerne, concretamente, aos danos não patrimoniais devidos, bem como aos patrimoniais futuros (estes decorrentes da perda da capacidade aquisitiva do lesado).
Vejamos:
3.2. De acordo com o artigo 129.º do Código Penal a indemnização de perdas e danos emergentes de um crime é regulada pela lei civil.
Desde cedo a jurisprudência entendeu que tal norma só determina que a indemnização seja regulada “quantitativamente e nos seus pressupostos” pela lei civil, remetendo para os critérios da lei civil relativos à determinação concreta da indemnização, não tratando de questões processuais, que são reguladas pela lei adjectiva penal.
À responsabilidade por ofensas à personalidade física ou moral ou ao direito à vida são aplicáveis os artigos 483.º e seguintes do Código Civil.
De acordo com o princípio geral plasmado no seu n.º 1, «Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação
Estabelece o subsequente artigo 496.º, n.º 1, do Código Civil, que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.”
Por último, estatui o n.º 3, 1.ª parte do mesmo preceito legal, que “o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º.”
Danos não patrimoniais são os que afectam bens não patrimoniais (bens da personalidade), insusceptíveis de avaliação pecuniária ou medida monetária, porque atingem bens, como a vida, a saúde, a integridade física, a perfeição física, a liberdade, a honra, o bom nome, a reputação, a beleza, de que resultam o inerente sofrimento físico e psíquico, o desgosto pela perda, a angústia por ter de viver com uma deformidade ou deficiência, os vexames, a perda de prestígio ou reputação, tudo constituindo prejuízos que não se integram no património do lesado, apenas podendo ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo mais uma satisfação do que uma indemnização, assumindo o seu ressarcimento uma função essencialmente compensatória, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória ou de pena privada.
Ou, noutras palavras, dano moral em sentido rigoroso é somente o que atinge bens imateriais e que, portanto, não pode ser apreendido pelos sentidos; mas é preferível tomar aquela expressão num alcance mais amplo, considerando dano moral todo aquele que não for avaliável em dinheiro, ou seja, todo aquele que não for patrimonial, porque os problemas que se levantam acerca do dano moral em sentido estrito suscitam-se de igual modo a respeito de todos os danos insusceptíveis de apreciação pecuniária.
Na definição de Vaz Serra, in BMJ, n.º 83, pág. 69, «dano não patrimonial é o que tem por objecto um interesse não patrimonial, isto é, um interesse não avaliável em dinheiro
E para Dario Martins de Almeida, in Manual de Acidentes de Viação, Almedina, 1980, 2.ª edição, pág. 267, «dano não patrimonial é todo aquele que afecta a personalidade moral, nos seus valores específicos
E acrescentava, a seguir: “Caprichosamente, a vida empenha-se em fornecer muitos exemplos desta figura jurídica – além da dor física, da humilhação, da angústia de ver um filho entre a vida e a morte, vem a dor moral relacionada com uma alteração estética tanto na mulher como no homem, com a perda da potência sexual, com a diminuição do prestígio, com o forçado e prolongado internamento num hospital
Como expendia Figueiredo Dias, in Sobre a reparação de perdas e danos arbitrada em Processo Penal, Almedina, 1972, em publicação autónoma e reimpressão de trabalho publicado, pela primeira vez, como contribuição do Autor para os Estudos in memoriam do Prof. Beleza dos Santos que, em 1963, formaram o volume XVI do Suplemento ao Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, a págs. 38/39, “quanto aos chamados danos morais costuma acentuar-se que eles não comportam, por sua natureza, uma indemnização verdadeira e própria, mas tão só uma satisfação, daí provindo a inaplicabilidade, quanto a eles, dos critérios propostos pela teoria de diferença. Todavia, quando não se queira ver aquela satisfação como um corpo estranho ao instituto da responsabilidade civil, no qual se incrusta, há que atribuir-lhe, também a ela, a única função de colocar, quanto possível, o lesado na situação anterior ao facto lesivo; pelo que o critério de avaliação há-de ser o de procurar rigorosamente determinar uma quantia capaz de possibilitar ao lesado prazeres e alegrias que compensem os danos morais causados. Em suma, pois, quer se trate de danos patrimoniais quer morais a obrigação civil de indemnizar tem como critério determinante da sua extensão, fundamentalmente, – para não dizermos unicamente – o critério do dano.”
Já como assinalava o Prof. Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, pág. 502 «A indemnização reveste, no caso dos danos não patrimoniais, uma natureza acentuadamente mista: por um lado, visa compensar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente
A dificuldade de «quantificar» os danos não patrimoniais não pode servir de entrave à fixação de uma indemnização que procura ser justa, correndo o risco, embora de ser algo aleatória, tanto mais que, neste campo, repete-se, assume particular relevância a vertente equidade.
Na verdade, aqui, mais do que nunca, encontramo-nos na incerteza inerente a um imprescindível juízo de equidade. Nos danos não patrimoniais, a «grandeza do dano» é insusceptível de medida exacta. Só pode ser alvo de «determinação indiciária fundada em critérios de normalidade», uma vez que o seu padrão é «constituído por algo de qualitativo diverso como é o dinheiro, meio da sua compensação» (Leite Campos, in A indemnização do Dano da Morte, pág. 12).
Mais do que o reconhecimento dos direitos aludidos, impera aqui, assim, a dificuldade no cálculo da indemnização a arbitrar, em concreto.
E, o apelo à equidade, só encontra justificação pela busca da solução justa no caso a decidir; a equidade estará, então, limitada sempre pelos imperativos de justiça real (a justiça adequada às circunstâncias), em oposição à justiça meramente formal.
A mais recente Jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores tem vindo a lembrar a necessidade de nestas hipóteses serem abandonadas as indemnizações miserabilistas, devendo antes assumir um alcance significativo e não meramente simbólico (Acórdão do STJ, de 25 de Março de 2004, in CJ, Acs. STJ, Ano XII, Tomo I, págs. 140/5).
Também que o montante dos danos deve ser quantificado tendo por contraponto situações já apreciadas o mais similares possíveis, para que se não potenciem situações de justiça relativa.
Na posse destes considerando, revertamos ao caso concreto.
A decisão recorrida (fls. 28/30) precisou os factos concretos susceptíveis de reparação nesta sede, ou seja, aqueles capazes de serem considerados enquanto danos não patrimoniais merecedores da tutela do direito, de acordo com as considerações que supra começámos por fazer.
Aliás, e em rigor da lealdade da argumentação processual utilizada, diga-se que a própria recorrente também os não controverte.
Antes, fundamentando o dissídio, aduz que a primitiva alegação do demandante tendente a justificar a quantia reclamada a tal título, continha a invocação de múltiplos factos que acabaram por ser tidos por não provados no Tribunal a quo, donde que não possa/não deva o quantum final arbitrado ser equivalente ao inicialmente peticionado.
Seriam eles, nomeadamente, os seguintes:
- Que o demandante esteja hoje totalmente dependente de terceiros.
- Que o seu corpo apresentava cortes profundos nas mãos e pernas.
- Que na data da alta andasse em cadeiras de rodas e usasse fraldas.
- Que na data da alta a sua capacidade de visão estivesse gravemente afectada.
- Que fácilmente se esqueça dos locais em que se encontra.
- Que não seja capaz de lidar com actividades que impliquem organizações e método e que exijam coordenação psicomotora.
- Que jamais poderá algum dia voltar a conduzir.
- Que a natação nunca mais poderá por ele ser desenvolvida.
- Que nunca mais poderá praticar mergulho e caça submarina.
- Que nunca mais poderá viajar de avião ou fazer pára-quedismo.
- Que esteja proibido de andar de bicicleta ou de mota, bem como de praticar rapel e canoagem.
- Que esteja dependente de todos para se deslocar onde quer que seja.
- Que nunca mais poderá acompanhar a família ou os amigos, quando decidirem passar férias num qualquer destino turístico que implique viagem de avião.
- Que sofre permanente angustia e desespero em saber que jamais poderá voltar a exercer a sua profissão.
- Que foge ao convívio com outras pessoas por se sentir complexado e diminuído.
- Que se tornou triste, revoltado e por regra agressivo.
- Que abdicou do sonho de ser pai, pela consciência que tem da própria incapacidade em assumir cabalmente tamanha responsabilidade.
A argumentação da recorrente, prima facie e num estrito rigor formal, deveria aqui proceder. Na verdade, se a causa de pedir, ou seja os factos jurídicos concretos que fundamentam o pedido apresentado, era integrada por todos os que foram tidos uns enquanto provados e outros como não provados, era razoável considerar-se que o minus probatório logrado haveria de determinar uma correspectiva redução da quantia a arbitrar.
Sucede, contudo, que o Tribunal se não encontra vinculado aos montantes parcelares pedidos, antes apenas ao montante total reclamado.
E, por outro lado, o que importa reter aqui e agora é apenas o quadro global provado.
Ora, este sem que aqui se reproduza de novo, porque de mera redundância se trataria, é o de um jovem profundamente afectado na sequência do acidente para o qual não contribuiu com culpa alguma.
Nesta perspectiva, cumpre não olvidar a qualidade de vida que o ser humano almeja e que bastas vezes sequer qualquer valor pecuniário consegue substituir.
Assim, atentando-se igualmente nos arestos citados pela decisão recorrida, que comportam situações de vida e sequelas próximas á presente, tendemos a considerar o valor aí arbitrado como aquele que deve subsistir enquanto correspectivo tendente a indemnizar os danos em causa.

3.3. Segundo segmento de dissídio da recorrente o que se prende com o quantitativo arbitrado para ressarcimento dos danos futuros sobrevindos ao lesado.
A decisão recorrida fixou a indemnização, a esse título, em € 200.000 (a que abateu a quantia de € 21.366,31 recebida da seguradora do trabalho, entretanto ressarcida pela ora recorrente, conforme transacção mencionada).
A recorrente pretende que o seu quantitativo seja arbitrado em quantia não superior a € 100.000,00.
Vem demonstrado que o recorrido ganhava, à data do acidente, e anualmente € 8.872,50.
Tinha, à data do mesmo, 29 anos de idade.
Ficou a padecer duma incapacidade permanente parcial para o trabalho de 40%.
Com base nestes dados, mostra-se excessivo o dano patrimonial futuro arbitrado?
A nossa lei manda, por princípio, proceder à restituição natural, só sendo arbitrada indemnização em dinheiro quando aquela não for possível.
Na verdade, nos termos do artigo 562.º, do Código Civil, o lesante “deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.”
Sabemos que a força de trabalho é um bem patrimonial importante, implicando, por isso, a sua diminuição ou a sua perda total um dano patrimonial.
Assim, no caso de IPP, a força de trabalho diminuída deve ser indemnizada, por a restauração natural não ser possível.
E a capitalização dessa indemnização em dinheiro correspondente ao dano futuro previsível deve abranger tão só a vida activa da vítima, pois é durante a vida activa que a vítima perde a força do seu trabalho, agora diminuída: é a força de trabalho que se perde no caso da incapacidade permanente para o trabalho, sendo esse valor que se substitui pelo equivalente em dinheiro.
É, pois, a força de trabalho diminuída que se deve ter em conta e não a previsibilidade da esperança de vida.
E qual o período da vida activa a considerar?
A nossa jurisprudência tem-na limitado nos 65 anos, por ser essa a idade normal da reforma no nosso País.
Contudo, actualmente, na sociedade discute-se o alargamento da idade da reforma, tendencialmente até aos 70 anos; em face disso, caso a caso, deve a indemnização capitalizar-se até essa idade, o que a lei nos permite, fazendo uso do princípio da equidade (artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil) que serve precisamente para fazer a justiça do caso concreto, porque previsivelmente a idade da reforma vai sofrer um alongamento.
Com efeito, assim ensinava A. Varela, escrevendo in Das Obrigações em Geral, Vol. I, 9.ª Ed., pág. 942 que “quando sejam determinados os danos a indemnizar, mas não seja possível a fixação do seu valor exacto (...) designadamente por ser impreciso algum dos elementos que influem no cálculo, manda o n.º 3 do art. 566º que o tribunal julgue segundo critérios de equidade, dentro dos limites provados (se os houver).”
Mas equidade não equivale a arbitrariedade, donde que modelo seguido jurisprudencialmente para a minorar, seja o recurso a tabelas matemáticas que procuram encontrar o capital produtor do rendimento que a vítima irá perder e que se extinguirá no final do período provável da sua vida activa, tal como se fez na decisão impugnada.
Claro que o seu uso apenas deve servir para nos auxiliar a calcular da indemnização, sem lhe obedecermos cegamente, porque, como se disse, o princípio a ter em conta é o da equidade.
A decisão recorrida referiu-se-lhes remetendo para os arestos do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Maio de 1994 e desta Relação de Coimbra de 4 de Abril de 1995. Operando, encontrou o valor de € 129.462,05.
Depois, todavia, considerando estar meramente perante um ponto de partida, e embora o lesado se encontrar apenas parcialmente privado da capacidade de exercício da sua profissão, certo ser que, em concreto, não vem provado o seu exercício de outra profissão, exponenciou o capital devido para os ditos € 200.000,00.
O raciocínio seguido e o montante encontrado mostram-se ajustados.
Concedendo-se, mesmo para raciocínio a possibilidade que poderá ter o lesado de se reconverter profissionalmente, sempre o facto será mais penoso para quem se encontra diminuído e sempre um ónus que lhe foi imposto, que não uma opção livre assumida sem que para tanto haja contribuído.
Também não colhe o argumento da recorrente no sentido de se contabilizar o montante em dívida como se ele tivesse 30 anos á data do acidente, pois que ao capital encontrado, subtraiu a decisão recorrida o que já havia recebido.
Tudo para concluirmos, reafirma-se, que igualmente neste aspecto não merece censura o sentenciado.
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IV – Decisão.
São termos pelos quais se nega provimento ao recurso interposto.
Custas pela recorrente.
Notifique.
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Coimbra, 3 de Fevereiro de 2010