Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
59/13.0TAGVA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ELISA SALES
Descritores: DIFAMAÇÃO ATRAVÉS DA IMPRENSA
CRIME AGRAVADO
MEMBRO
ÓRGÃO DE SOBERANIA
TIPICIDADE
ACÇÃO
Data do Acordão: 02/25/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GUARDA (GOUVEIA INST. LOCAL DE GOUVEIA – SEC. COMP. GEN. – J1)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS. 180.º, 183.º, N.º 2, 184.º, E 132.º, N.º 2, AL. L), DO CP
Sumário: I - Nos termos e para os efeitos da previsão típica do artigo 180.º, n.º 1, do CP, a luta política apenas poderá relevar, como critério de justificação, em casos limite, situando-se, todavia, a potencial ofensa da honra e consideração numa relação directa com esse cenário participativo.

II - Não estando em causa o debate político próprio de cidadãos livres exprimindo, embora com desassombro, as suas ideias, mas sim a ofensa pela ofensa, sem nenhuma relação com a dignidade e verticalidade que devem ser apanágio desse debate, inexiste crítica pública legítima, verificando-se antes atentado à honra e consideração pessoal do visado.

Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, na secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra

I - RELATÓRIO

A..., assistente nos autos, veio interpor recurso da decisão proferida pela Mmª Juiz de Instrução de não pronúncia do arguido B... pela prática de um crime de difamação agravada p. e p. pelos artigos 180º, n.º 1, 183º, n.º 2 e 184º, com referência ao artigo 132º, al. l), todos do Código Penal.

E, da respectiva motivação extraiu as seguintes as conclusões:

1) As expressões transcritas na motivação que antecede e que o arguido escreveu no seu artigo denominado "Carta aberta a um deputado do PSD", publicada na edição de 21 de Maio de 2013 do Jornal (...), são objectivamente insultuosas e susceptíveis de abalar a honra e a consideração pessoal, política e familiar do assistente.

2) Um "leitor médio", ao ser confrontado com tais expressões, retira claramente do seu conteúdo um significado de apoucamento, de rebaixamento, de ataque gratuito e de menorização do bom nome e da reputação pessoal, social e política do assistente.

3) A tutela civil e criminal do direito à honra, ao bom nome e consideração é assegurada pelos artigos 70º do Cód. Civil, 182º do Cód. Penal, e pelo art. 26º da CRP impõe um dever geral de respeito e de abstenção a ofensas ou ameaças de ofensas à honra de cada pessoa.

4) Esse direito à honra do assistente foi flagrante e agressivamente afectado pelo escrito do arguido, certeza que se apura ainda mais pelo facto deste não ter feito qualquer alusão ao tema - declínio demográfico - focado no artigo do assistente, de ter exibido divergências e ressabiamentos politico partidários para com o assistente (ao escrever que na época de colheita eleitoral o PSD pode contar com ele para a "poda"), de não ter mostrado o menor arrependimento ou retaliação no seu requerimento de abertura de instrução, de ter mandado publicar o seu texto somente quatro meses depois do do assistente (amadurecendo e descontextualizando a sua reacção), de ter escolhido cirurgicamente o jornal da terra do assistente (assim dando mais impacto e maior grau à sua ofensa) e de ter denominado tal escrito como "carta aberta" (assim lhe conferindo maior publicidade e dimensão claramente bombástica).

5) O escrito do arguido extravasou largamente o seu direito à livre crítica, ainda que mordaz, feroz, contundente ou combativa e vilipendiou de forma muito directa e manifesta os direitos de personalidade do assistente, que pelo facto de exercer funções políticas num órgão de soberania (deputado na Assembleia da República), não deve ser apoucado e, ao invés, até goza de uma protecção legal reforçada, como prova a agravante dos art.ºs 183º e 184º e 132º, n.º 2 al. l) do C. Penal.

6) Não foi, todavia, nessa qualidade de deputado que escreveu o seu artigo no jornal "i", mas apenas enquanto cidadão preocupado com as questões de ­demografia e do envelhecimento populacional.

7) Assim, não faz nenhum sentido que a decisão instrutória enquadre a reacção do arguido no debate e no confronto político, assim procurando justificar o “grano salis” com que o público em geral olha e interpreta o léxico político.

8) Seja como for, mesmo no âmbito de discussão política, os termos e expressões usados pelo arguido, que aqui se reproduzem, são susceptíveis de atingir, como atingiram, e com um grau muito intenso e elevado, a honorabilidade pessoal do assistente.

9) A decisão recorrida, ao qualificar a linguagem utilizada pelo arguido na sua "carta aberta" como colorida, apelativa e apenas de gosto e educação eventualmente duvidosa, faz tábua rasa do princípio constitucional ao bom nome (art. 26º da C.R.P.) e expressa uma visão muito deformada do direito à liberdade de expressão numa democracia liberta e plural, em que a honra e o respeito pelos concidadãos jamais soçobram perante o direito à critica e de expressão de cada um.

10) A decisão recorrida terá, pois, de ser revogada, por ter violado o art. 70º do C. Civil, 180º e 182º n.º 1 do C. Penal e 26º da C.R.P., que interpretou com um grau de exigência zero para políticos, se bem que o assistente tivesse agido sempre como cidadão e como pessoa e não como político (ainda que o arguido o tenha atacado como pessoa e como político).

Assim, será feita a habitual JUSTIÇA, sujeitando-se o arguido a julgamento.

 

*

O arguido respondeu, defendendo que deve ser negado provimento ao recurso e mantida a decisão recorrida, por considerar que:

- As expressões utilizadas pelo recorrido para manifestar a sua opinião sobre o artigo publicado pelo assistente, sendo contundentes, ácidas agressivas e até acintosas, não são, atenta a sua contextualização, atentatórias da sua honra e consideração, não têm outro conteúdo e sentido que não seja o de criticar a opinião exposta por este num jornal de tiragem nacional.

- O denominado "leitor médio" não fica com a impressão de que existe um ataque pessoal ao assistente, mas antes, uma crítica à posição deste relativamente aos reformados, o que se constata pela ironia com que termina o seu texto, desejando que o assistente não chegue a ser contaminado pelo vírus da peste grisalha.

- Não foi por qualquer motivo político partidário que o recorrente escreveu o seu texto, mais, até é simpatizante e muitas vezes eleitor do partido ao qual pertence o assistente, o "leitor médio" de Gouveia seguramente apercebeu-se do facto, pois sendo um meio pequeno, nunca ouviu falar do arguido, nem que este esteja envolvido na disputa partidária de Gouveia.

- Sendo uma crítica feroz à opinião exibida pelo recorrente, utilizando por vezes vocábulos que roçam o acintoso, não constituem um atentado à honra e dignidade do assistente, antes são o livre exercício do direito de cidadania no contexto do debate público e quotidiano democrático, relativo a pessoas que devido aos cargos públicos que ocupam, transportam consigo uma maior visibilidade pelos combates que travam no espaço público.

- Não foi em consequência, violado o bom-nome, a honra e a consideração do recorrente; tendo apenas exercido o seu direito de resposta à posição política do assistente no contexto do debate público, não pode o previsto legal no art. 180° n.º 1, 183.° n.º 2, 184.° e 132.° n.º 2, al. l), todos do Código Penal, de que vinha acusado o arguido, servirem de um hodierno "lápis azul" à discussão pública, sobretudo quando um dos intervenientes é detentor de um cargo público num órgão de soberania.

A Magistrada do Ministério Público junto do tribunal a quo defendeu a procedência do recurso, tendo rematado a sua resposta nos seguintes termos:

1. As expressões que o arguido escreveu no artigo denominado "Carta aberta a um deputado do PSD" publicada na edição de 21.05.2013 do Jornal de (...), são ofensivas da honra e da consideração social do assistente.
2. Não satisfaz qualquer interesse informativo relevante, nem do exercício de funções do assistente.
3. Pois que e ainda que tal texto se enquadre no debate e confronto político, as expressões são susceptíveis de atingir a honorabilidade pessoal do assistente.
4. Mesmo que a insinuação se cubra de ironia isso não a toma imune ao preenchimento do tipo legal do crime.
5. Um leitor médio, ao ler tal publicação/texto, retira claramente o seu conteúdo
6. A captação do significado e do sentido prático da linguagem falada no domínio do direito e das situações da vida real sujeitas ao escrutínio do direito penal, não se compadece com construções desencarnadas do sentido prático e comum;
7. Dentro do contexto de utilização de tal linguagem, com os significados e o valor descritivo e valorativo que as palavras têm dentro de tal uso corrente e do respectivo contexto.
8. O arguido, ainda com o seu direito de liberdade de expressão, e direito à livre crítica, tem os seus limites.
9. O arguido menosprezou os direitos de personalidade do assistente (honorabilidade pessoal do assistente), não sendo no seu contexto, ainda que considerado confronto político, justificação.
10. O arguido praticou o crime de difamação, através da comunicação social, não sendo necessários especificar quais as afirmações, as expressões ou os impropérios neles vertidos que consubstanciam ofensa à honra ou consideração da assistente.
11. O texto publicado, deve ser lido como um todo, até porque o carácter difamatório ou não de um texto é influenciado pelas circunstâncias de tempo e lugar em que o mesmo é escrito e pelas particularidades das pessoas em causa.
12. Retirando muitas vezes partes do texto, "despe-se" o seu contexto, dando azo até a que determinada expressão dentro do contexto não seja ofensa e vice-versa, apurando-se a eventual justificação.
13. No contexto global em que foram utilizadas, revestem cariz difamatório, são objectivamente ofensivas, o que se repercute ao nível do elemento subjectivo.
14. O arguido sabia do carácter ofensivo das expressões que usou, estão perfectibilizados todos os elementos constitutivos do crime por que foi acusado.
15. Nestes termos entendemos que há fundamento para revogar a decisão proferida e recorrida, devendo ser substituída por despacho de pronúncia do arguido.

Nesta instância também o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, por concluir que existem indícios suficientes da prática do crime de difamação agravada, sendo mais provável a condenação que a absolvição do arguido em julgamento, porquanto:

“Nesse artigo, da autoria do arguido, são utilizadas expressões que ultrapassam claramente a aceitável retórica de divergência de ideias ou de luta política, entrando na ofensa pessoal e familiar completamente desnecessária e desproporcional à exposição de ideias divergentes sobre o tema, que por isso não pode deixar de ser censurado como ilícito penal contra a honra do visado.

Na verdade o arguido utiliza expressões que, de forma gratuita, intitula e classifica o assistente de imbecil e parvo, de pouca educação e civismo, com um oco canudo, "grande" e falhado "artista", e levantando a suspeita que conheça aqueles que deram origem à sua existência, que numa resposta a um artigo da autoria do assistente não podem ter o beneplácito da permissividade da contextualização genérica da luta política, ou no entendimento errado que a condição de deputado lhe retire o direito à honra, ao bom nome e à consideração devida enquanto cidadão, com iguais direitos e deveres como os outros cidadãos.”

Cumprido o disposto no n.º 2 do artigo 417º do CPP, o arguido não respondeu.

Os autos tiveram os vistos legais.

***

II – FUNDAMENTAÇÃO

Vejamos como a Mmª Juiz a quo fundamentou a sua decisão de não pronúncia (após ter julgado improcedente a invocada nulidade da acusação pública):

 “ (…)

Declarada aberta a instrução, foram tomadas declarações ao arguido nos termos do artigo 292º, n.º 2, do Código de Processo Penal (cfr. ata de 05 de Maio de 2014).

Realizou-se debate instrutório, (…).

*

Cumpre proferir decisão instrutória.

(…)

O arguido B..., no seu requerimento de abertura de instrução, não põe em causa a factualidade constante da acusação, qual seja a publicação, no dia 21 de Maio de 2013, de um texto escrito, da sua autoria, e por ele assinado, no Jornal “ (...)”, intitulado “Por tardio não peca”. Portanto, e em conformidade com as premissas supra enunciadas, não caberá, no âmbito da presente instrução, verificar a existência (ou não) de indícios suficientes da ocorrência dos factos relatados na acusação.

A questão que se coloca é a de saber se tal factualidade consubstancia a prática, pelo arguido B..., de qualquer ilícito criminal, designadamente, e no entendimento da acusação, um crime de difamação agravada, previsto e punido pelos artigos 180º, n.º 1, 183º, n.º 2, 184º e 132º, n.º 2, al. l), todos do Código Penal.

Nos termos do disposto no artigo 180º, n.º1, do Código Penal, comete um crime de difamação “Quem, dirigindo-se a terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra, ou reproduzir uma tal imputação ou juízo”.

Prevê o artigo 183º, do Código Penal:

1. Se, no caso dos crimes previstos nos artigos 180º e 181º:

a) a ofensa for praticada através de meios ou em circunstâncias que facilitem a sua divulgação; ou

b) tratando-se da imputação de factos, se averiguar que o agente conhecia a falsidade da imputação;

as penas da difamação e da injúria são elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo.

2. Se o crime for cometido através de meio de comunicação social o agente é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa não inferior a 120 dias”.

Por sua vez, estabelece o artigo 184º, do Código Penal que: “As penas previstas nos artigos 180º, 181º e 183º são elevadas de metade nos seus limites mínimo e máximo se a vítima for uma das pessoas referidas na alínea l) do nº 2 do artigo 132º, no exercício das suas funções ou por causa delas, ou se o agente for funcionário e praticar o facto com grave abuso de autoridade”.

O bem jurídico protegido por este tipo legal de crime é a honra.

À luz da nossa lei, “a honra é vista como um bem jurídico complexo que inclui, quer o valor pessoal ou interior de cada indivíduo, radicado na sua dignidade, quer a própria reputação ou consideração exterior” (cfr. José de Faria Costa, Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, Coimbra Editora, pág. 607). Não tem, assim, entre nós, aceitação a restrição da honra ao conjunto de qualidades relativas à personalidade moral, ficando de fora a valoração social dessa mesma personalidade.

Ensina o Prof. Beleza dos Santos, a propósito, que a honra é aquele mínimo de condições, especialmente de natureza moral, que são razoavelmente consideradas essenciais para que um indivíduo possa com legitimidade ter estima por si, pelo que é e vale, e que a consideração é aquele conjunto de requisitos que razoavelmente se deve julgar necessário a qualquer pessoa, de tal forma que a falta de algum desses requisitos possa expor essa pessoa ao desprezo público (R.L.J., ano 92º, pág. 164).

Vejamos os elementos do tipo objetivo de ilícito, que, segundo o Prof. José de Faria Costa (Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, Coimbra Editora, pág. 609), se estruturam em dois grandes segmentos.

Um, o segmento da ofensa propriamente dita, que pode ser concretizada por quem quer que seja, através:

a) da imputação de um facto ofensivo da honra de outrem (entendendo-se o “facto” como um juízo de afirmação sobre a realidade exterior, como juízo de existência);

b) da formulação de um juízo de igual modo lesivo da honra de uma pessoa (entendendo-se o “juízo”, não como apreciação relativa à existência de uma ideia ou de uma coisa mas ao seu valor); ou

c) da reprodução daquela imputação ou juízo.

Note-se que a proposição “mesmo sob a forma de suspeita”, ligada a todos os referidos elementos do tipo não é um verdadeiro e próprio elemento do tipo, mas antes um alargamento modal à imputação dos factos ou juízos desonrosos. Isto é: a imputação de factos ou a formulação de juízos desonrosos podem ser inequívocas ou podem estar cobertas pelo manto perverso e acutilante da suspeita.

O outro segmento prende-se com o rodeio ou enviesamento, que exige que as condutas anteriormente descritas se não façam diretamente ao ofendido mas se levem a cabo dirigindo-se a terceiros – critério que serve para estabelecer a diferenciação essencial entre a difamação e a injúria, tipo legal de crime previsto no artigo 181º do Código Penal que se preenche se a imputação for levada a cabo de forma direta.

O crime de difamação tem natureza dolosa, o que significa que só estão arredadas do seu âmbito subjetivo as condutas negligentes, sendo por isso a imputação baseada em qualquer das modalidades de dolo definidas no artigo 14º do Código Penal.

O dolo, entendido como elemento subjetivo geral, deve referir-se a todos os elementos objetivos do tipo de ilícito correspondente, assegurando a congruência tipo objetivo – tipo subjetivo.

Consubstancia-se, assim, o dolo na consciência do agente de que a imputação do facto ou o juízo formulado são ofensivos da honra ou da consideração do visado tal como a reprodução da imputação ou do juízo e na vontade de imputar o facto ou formular o juízo, ou de reproduzir a imputação ou juízo, sabendo que a sua conduta é proibida por lei.

Cumpre assinalar que a difamação não é punível se se verificarem, cumulativamente, as condições previstas nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 180º, atento o preceituado nos n.ºs 3 e 4 do mesmo artigo – nesse caso, estaremos perante uma verdadeira causa de justificação.

Vejamos, então, a situação em apreço.

É evidente que, no texto da sua autoria, o arguido dirige juízos de valor negativos ao deputado da Assembleia da República, eleito pelo PSD, que publicou um texto onde, no entendimento do arguido, apelida os reformados e os velhos em geral de “peste grisalha”: o assistente A.... Ao iniciar com uma citação de Oscar Wilde (“Os loucos por vezes curam-se, os imbecis nunca”), o arguido, ainda que indiretamente, apelida-o de “imbecil”; ao afirmar que “a dimensão do nome que o titula como cidadão (com seis nomes) deve ser inversamente proporcional à sua inteligência – se ela existe”, desvaloriza a sua inteligência, equiparando a sua escrita aos excrementos que são expelidos pelo ânus de cada um (“Vou fazer o possível para não atingir o cúmulo da parvoíce que foi suplantado por si … quando ao defecar que a nossa pátria foi contaminada com a já conhecida peste grisalha, se esqueceu do papel higiénico para limpar a estoma e de dois dedos de testa para aferir a sua inteligência”); põe em causa os seus valores familiares (“… a figura triste que faz, cuja imbecilidade latente … deve ter ciliciado bem as partes mais sensíveis de muitos portugueses, inclusivamente aqueles que deram origem à sua existência – se é que os conhece”); desvaloriza as suas habilitações académicas (“já me apraz pensar que também haja granjeado um oco canudo, segundo os cânones do método bolonhês”); equipara-o a um camelo (“os intelectuais que o escolheram deviam andar atrapalhados no meio do deserto onde o sol torra, a sede aperta, a miragem engana e até um dromedário parece ser gente”); equipara as suas palavras ao som produzido por animais (“sabe, Sr. A..., quando uma pessoa que se preze está em lugar cimeira, deve pensar, medir e pesar muito bem a massa específica dos grunhidos que vai bolçar cá para fora”) ou a vomitado (“milhares de pessoas de apurados sentidos não apreciam o cheiro pestilento do vomitado como o sr. também sente um asco sem sentido e doentio à peste grisalha”); refere-o como “maçã podre”.

Contudo, entendemos que o texto em causa, designadamente as aludidas expressões, não podem considerar-se atentatórias da honra e consideração pessoal do assistente, atenta a sua contextualização, que não pode deixar de ser feita (lê-se, a propósito, no Acórdão da Relação de Lisboa de 19.04.2006, processo n.º 11862/2006 – 3, disponível em www.dgsi.pt:

“O carácter injurioso ou difamatório de determinada expressão ou atitude é muito relativo, estando fortemente dependente do lugar ou ambiente em que ocorre, das pessoas entre quem ocorre e do modo como ocorre”).

Com efeito, trata-se de uma crítica acintosa, indelicada e até feroz – eventualmente desproporcional –, mas não passa de uma crítica à atuação do assistente, enquanto deputado da Assembleia da República, ao publicar um artigo no qual, segundo o entendimento do arguido, apelida os reformados e os velhos em geral de “peste grisalha”. Não se trata de um ataque à pessoa em si, mas àquilo que escreveu, enquanto deputado da Assembleia da República, portanto a uma posição política, independentemente de a expressão ser, ou não, da sua autoria.

É certo que são feitas apreciações pessoais, é certo que são formulados juízos de valor pessoais negativos; contudo, tanto aquelas como estes são a extrapolação de uma atuação política do assistente – tanto assim é que o arguido nem sequer o conhecia, apenas teve conhecimento do texto que escreveu, conforme afirmou, ouvido em declarações em sede de instrução.

O que instigou aquelas palavras foi a crítica a uma posição política, sendo que os qualificativos utilizados qualificam, na verdade, a própria posição política: ao apelidar o assistente de “imbecil”, “pouco inteligente” ou “camelo”, o arguido está a reagir contra aquela posição política, dizendo, no fundo, que a mesma é digna de um “imbecil”, de uma “pessoa pouco inteligente”, de um “camelo” – tanto é assim que as apreciações pessoais e juízos de valor formulados se fundamentam única e exclusivamente no facto de o assistente ter alegadamente apelidado os reformados e os velhos em geral de “peste grisalha”, expressão que no texto em análise surge salientada, em negrito. Corolário deste entendimento é a forma como o texto termina, dizendo “para que o Sr. não venha a sofrer dessa moléstia, é meu desejo que não chegue a ser contaminado pelo vírus da peste grisalha e vá andando antes de atingir esse limite” – o que, a nosso ver, não constitui uma manifestação do desejo da morte do assistente (como este entende) mas uma redução ao absurdo da sua posição sobre os reformados e os velhos em geral, pela inevitabilidade natural de o assistente chegar a tal situação.

Resulta assim claro do texto em análise que a intenção do arguido foi deitar por terra aquela posição política. Para o efeito, utilizou uma linguagem colorida, forte, porventura mesmo excessiva, de gosto e educação eventualmente duvidosos, mas sem dúvida, e seguramente por isso, apelativa.

Mesmo que as expressões em causa sejam, objetivamente, insultuosas, in casu, têm outro conteúdo que não a ofensa à honra e a consideração pessoal do assistente, qual seja a crítica a uma opinião política do assistente expressa num texto anteriormente escrito. Assim, é no âmbito do debate político que os juízos e expressões aqui em causa têm de ser encarados.

Numa sociedade democrática, aqueles que exercem um cargo público – como é o caso de assistente, que é deputado da Assembleia da República - estão sujeitos a um controlo das pessoas que compõem a respetiva comunidade, no qual aqueles exercem as suas funções.

Além disso, como o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem teve a oportunidade de reconhecer e recordar no seu acórdão “Roseiro Bento contra Portugal”, datado de 18/04/2006, a qualidade de homem político aporta como consequência para o tipo de infrações que aqui temos presentes, “que os limites da crítica admissível são mais vastos em relação a um político agindo na sua qualidade de personagem pública, do que a do simples particular”; em sentido idêntico, pode ler-se no Acórdão da Relação do Porto de 23.06.2010, proc. 3475/07.3TDPTT.P1, disponível em www.dgsi.pt que: “para as "pessoas da história do seu tempo", ou seja, para aqueles que ocupam a boca de cena no palco da vida política, cultural, desportiva, etc., a tutela dos bens pessoais em questão é mais reduzida e fragmentada do que no caso do cidadão comum”; ou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.10.03, onde se escreve: “Como é sabido e geralmente aceite, os cidadãos que exercem cargos públicos, nomeadamente políticos (…) estão sujeitos à crítica, quer das colectividades pela satisfação de cujos interesses devem pautar o exercício das respectivas funções, quer dos titulares de entidades que tutelem interesses conflituantes, do ponto de vista da sua própria perspectiva de satisfação do bem comum (…)as pessoas que ocupam lugares de relevância política ou altos cargos na administração pública estão sujeitas a figurar como alvos de mais e de mais intensas críticas que os demais cidadãos, provenham elas de seus pares ou não. Em democracia, a tutela da honra pessoal e reputação dos políticos é, por isso, também menos intensa que a dos cidadãos em geral”.

O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem reteve como lícitas, no âmbito da luta política, uma expressão como imbecil, (1.7.1997, DDP, 1997, 10, 1209); lobbista, experiente em urbanizações selvagens, comissário de negócios sujos, são outros exemplos mencionados na ob. cit. , a fls. 213. “Nas apontadas asserções poderá deparar-se com algum tipo de censura, ao nível ético, de deselegância, de injusto possivelmente – mas no fundamental trata-se de debate público corriqueiro e do quotidiano da democracia, relativo a pessoas que transportam consigo mais visibilidade, pelos desafios e combates que resolvem travar” (neste sentido, o Acórdão da Relação do Porto de 28.06.2006, proc. 0612206, disponível em www.dgsi.pt).

Atualmente, vem sendo entendido pela maioria da jurisprudência, que em casos como o que nos ocupa, não existe responsabilidade penal, como se pode ver, e a título exemplificativo, nos Acórdãos do STJ de 07.03.2007; da Relação de Lisboa de 21.10.2007 e de 20.03.2006; da Relação de Coimbra de 23.04.1998, de 24.09.2003 e de 24.03.2004; da Relação de Guimarães de 30.10.2006, e da Relação do Porto de 28.06.2006 e de 31.10.2007 – todos disponíveis em www.dgsi.pt e citados pelo Acórdão da Relação do Porto de 14.07.2008, processo n.º 0841633.

A proteção penal dada à honra e consideração e a punição dos factos que atentem contra esses bens jurídicos, só se justifica em situações em que objetivamente as palavras proferidas não têm outro conteúdo ou sentido que não a ofensa, ou em situações em que, uma vez ultrapassada a mera suscetibilidade pessoal, as palavras dirigidas à pessoa a quem o foram, são, indubitavelmente, lesivas da honra e da consideração do lesado (vide Ac. da RL de 20.03.2006, já citado).

Como se lê no sumário do Acórdão do STJ de 07.03.2007, com citação de doutrina acerca deste assunto, e cujo entendimento perfilhamos, “I – No conflito entre o direito à honra e a liberdade de expressão, tem vindo a verificar-se um ponto de viragem, tendo por base e fundamento o relevo, a dignidade e a dimensão da liberdade de expressão considerada numa dupla dimensão, concretamente como direito fundamental individual e como princípio conformador e essencial à manutenção e aprofundamento do Estado de Direito democrático, reconhecendo-se que o exercício do direito de expressão, designadamente enquanto direito de informar, de opinião e de crítica, constitui o próprio fundamento do sistema democrático, o que justifica a assunção de uma nova perspectiva na resolução do conflito. II – Neste contexto, temos vindo a defender, na esteira da orientação assumida por Costa Andrade, deverem considerar-se atípicos os juízos de apreciação e de valoração crítica vertidos sobre realizações científicas, académicas, artísticas, profissionais, etc. (…) quando não se ultrapassa o âmbito da crítica objectiva, isto é, enquanto a valoração e censura críticas se atêm exclusivamente às obras, às realizações ou prestações em si, não se dirigindo directamente à pessoa dos seus autores ou criadores, posto que não atingem a honra pessoal do cientista, do artista, do desportista, do profissional em geral, nem atingem a honra com a dignidade penal e a carência de tutela penal que definem e balizam a pertinente área de tutela típica. III – Mais entende aquele insigne Mestre que a atipicidade da crítica objectiva pode e deve estender-se a outras áreas, aqui se incluindo as instâncias públicas (…). IV – Por outro lado, segundo ele, a atipicidade da crítica objectiva não depende do acerto, da adequação material ou da “verdade” das apreciações subscritas, as quais persistirão como actos atípicos seja qual for o seu bem fundado ou justeza material, para além do correlativo direito de crítica, com este sentido e alcance, não conhece limites quanto ao teor, à carga depreceativa e mesmo à violência das expressões utilizadas, isto é, não exige do crítico, para tornar claro o seu ponto de vista, o meio menos gravoso, nem o cumprimento das exigências da proporcionalidade e da necessidade objectiva. V – Costa Andrade defende mesmo que se devem considerar atípicos os juízos que, como reflexo necessário da crítica objectiva, acabam por atingir a honra do visado, desde que a valoração crítica seja adequada aos pertinentes dados de facto, esclarecendo, no entanto, que se deve excluir a atipicidade relativamente às críticas caluniosas, bem como a outros juízos exclusivamente motivados pelo propósito de rebaixar e humilhar e, bem assim, em todas as situações em que os juízos negativos sobre o visado não têm nenhuma conexão com a matéria em discussão, consignando expressamente que uma coisa é criticar a obra, outra muito distinta é agredir pessoalmente o autor, dar expressão a uma consideração dirigida à sua pessoa. VI – Parte da jurisprudência dos nossos tribunais superiores vem sufragando tal orientação, sendo que, de acordo com a mesma, entendemos que o direito de expressão, na sua vertente de direito de opinião e de crítica, quando se exerça e recaia nas concretas áreas atrás referidas e com o conteúdo e âmbito mencionados, caso redunde em ofensa à honra, se pode e deve ter por atípico, desde que o agente não incorra na crítica caluniosa ou na formulação de juízos de valor aos quais subjaz o exclusivo propósito de rebaixar e de humilhar. (…)”.

Na sequência do que vimos de expor, entendemos que as expressões proferidas pelo arguido se inserem no âmbito do debate e da crítica de uma posição política por parte de um cidadão revoltado. Reporta-se ao assistente, de uma forma negativa e até acintosa, mas não se reconduz a uma vontade de agressão gratuita e de confronto com a pessoa em causa ou ao propósito de a rebaixar ou humilhar, ou seja, de atingir a sua honra e dignidade pessoal. Antes exprimindo uma reação, reveladora de uma evidente indignação, a uma posição política do assistente. E, portanto, apresentando um evidente interesse público-social imediato, que o arguido visou acautelar.

Resultando esse propósito - de reação a uma posição política - evidente da leitura do texto em análise, entendemos que o “leitor médio” não fica a achar que o visado tem as características ou qualificativos que lhe são atribuídos, precisamente por não ver nele uma referência pura às características pessoais do visado mas uma imputação de características como reflexo direto das suas opiniões políticas. Além de que entendemos que, por regra, o observador médio do debate político numa democracia livre olha com “grano salis” para expressões que noutro contexto olharia com maior gravidade, designadamente por a linguagem ser naturalmente combativa.

Tal não significa que a linguagem utilizada pelo arguido seja eticamente irrepreensível, nem que deva ser encorajada tão pouca contenção no debate de interesse público. Todavia o interesse público-social da questão exige que se ponha a tónica na liberdade de expressão. É pertinente a referência, neste contexto, ao Acórdão do TEDH de 28.09.00 que condenou o Estado Português a indemnizar quem se viu condenado pelos tribunais portugueses por crime contra a honra em situação que o TEDH considerou ilegítima.

Não é demais recordar o que ali pode ler-se: “A liberdade de expressão é um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e uma das principais condições para o seu progresso e para o desenvolvimento de cada indivíduo (…)”.

Fica-nos, portanto, a convicção de que o arguido agiu no exercício de um direito de crítica pública.

Pelo exposto, entendemos que a conduta do arguido não acarreta qualquer atentado à honra e consideração pessoal do assistente, devendo, portanto, ser considerada atípica. Aliás, como se escreveu no Acórdão da Relação do Porto de 12.06.2002, Recurso 332 /02, de que foi relator o Desembargador Dr. Manuel Braz: “o direito não pode intervir sempre que a linguagem utilizada incomoda ou fere susceptibilidades do visado. Só o pode fazer quando é atingido o núcleo essencial de qualidades morais que devem existir para que a pessoa tenha apreço por si própria e não se sinta desprezada pelos outros. Se assim não fosse a vida em sociedade seria impossível. E o direito seria fonte de conflitos, em vez de garantir a paz social, que é a sua função”.

Assim sendo, e atenta a noção de indícios suficientes que deixámos expendida, concluímos que os mesmos não se verificam no caso em apreço.

Pelo que deverá ser proferido despacho de não pronúncia relativamente ao arguido.

*

Face a todo o exposto, decide-se não pronunciar o arguido B... pela prática de um crime de difamação agravada, previsto e punido pelos artigos 180º, n.º 1, 183º, n.º 2 e 132º, n.º 2, al. l), todos do Código Penal.

(…).

***

APRECIANDO

Tendo em conta as conclusões da motivação do recurso e que estas limitam o seu objecto, a questão suscitada e a decidir, consiste em saber se nos autos existem indícios suficientes que justifiquem a pronúncia do arguido B... pela prática de um crime de difamação agravada p. e p. pelos artigos 180º, n.º 1, 183º, n.º 2 e 184º, com referência ao 132º, al. l), todos do Código Penal.

O arguido, discordando das acusações pública e particular deduzidas, requereu a abertura de instrução (fls. 96/100, 113/123 e 177/183).

A instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento (art. 286º do CPP).

E, tal como resulta dos artigos 277º, n.º 2 e 308º, n.º 1, ambos do CPP, um dos fundamentos do arquivamento do inquérito pelo MP e do despacho de não pronúncia proferido pelo Juiz de Instrução é a insuficiência dos indícios da verificação do crime ou de quem foram os seus agentes.

Com efeito, estabelece este último preceito que “Se, até ao encerramento da instrução, tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, o juiz, por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respectivos; caso contrário, profere despacho de não pronúncia.

Contrariamente ao que acontecia na vigência do CPP de 1929, fornece-nos agora a lei o conceito de indícios suficientes.

Assim, preceitua o artigo 283º, n.º 2 do CPP ([1]) que “Consideram-se suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança”.

Aliás, este era também o sentido dado por Luís Osório ([2]) quando afirmava que “devem considerar-se indícios suficientes aqueles que fazem nascer em quem os aprecia a convicção de que o réu poderá vir a ser condenado”. 

Por sua vez, refere o Prof. Figueiredo Dias ([3]) que “os indícios só serão suficientes, e a prova bastante, quando, já em face deles, seja de considerar altamente provável a futura condenação do acusado ou quando esta seja mais provável do que a absolvição”. Mais acrescenta que “tem razão Castanheira Neves quando ensina que na suficiência dos indícios está contida a mesma exigência de verdade requerida pelo julgamento final, só que a instrução preparatória (e até a contraditória) não mobiliza os mesmos elementos probatórios e de esclarecimento e, portanto, de convicção, que estarão ao dispor do juiz na fase de julgamento, e por isso, mas só por isso, o que seria insuficiente para a sentença, pode ser bastante ou suficiente para a acusação”.

Com este grau de exigência, ou seja, “ao exigir-se a possibilidade razoável de condenação e não uma possibilidade remota, visa-se, por um lado, não sujeitar o arguido a vexames e incómodos inúteis e, por outro lado, não sobrecarregar a máquina judiciária com tramitações inúteis, em obediência, aliás, ao traçado nas alíneas 1 e 2 da Lei n.º 43/86, de 30 de Setembro (a Lei de autorização legislativa ao abrigo da qual foi publicado o DL n.º 78/87, de 17 de Fevereiro, que aprovou o Código de Processo Penal)”([4]). 

Também a jurisprudência tem entendido que “nas fases preliminares do processo, não se visa alcançar a demonstração da realidade dos factos, antes tão só indícios, sinais, de que um crime foi cometido por determinado arguido, constituindo as provas reunidas nessa fase pressuposto, não da decisão de mérito, mas da decisão processual da prossecução dos autos para julgamento” – entre outros o Ac. da RP de 20-10-93, proc. 679/93-3ª.

Pretende o recorrente a pronúncia do arguido relativamente ao crime de difamação.

Na origem dos presentes autos está um texto escrito e assinado pelo arguido B..., publicado na edição do Jornal " (...)" de 21 de Maio de 2013, denominado A peste grisalha - (Carta aberta a um deputado do PSD) ([5]) - constando da acusação pública todo o texto, vai o mesmo transcrito, colocando-se a negrito as frases e expressões que foram destacadas pelo assistente, ora recorrente, quer na participação, quer na motivação do recurso.

Por sua vez, esta Carta Aberta do arguido vem na sequência de um artigo de opinião – Um Portugal de cabelos brancos - escrito pelo assistente e publicado no Jornal “i”, no dia 10 de Janeiro de 2013 ([6]). A referir que nos autos apenas consta a publicação on line.

O envelhecimento da população em Portugal é um a realidade, estando o mesmo intimamente ligado, por um lado, ao desenvolvimento da sociedade decorrente de condições que propiciaram o aumento da longevidade e, por outro, a factores que conduziram à diminuição da natalidade.

Porém, o envelhecimento demográfico obriga a que sejam tomadas medidas, designadamente a nível da saúde e da protecção social, para além da preocupação que se deve ter em aproveitar o capital humano, o saber e a experiência daqueles que após a vida activa, com idade mais avançada (e, por isso, alguns deles já com cabelos grisalhos), muito ainda poderão contribuir para as gerações mais jovens.

Aliás, convirá não esquecer que, entre nós, nos últimos tempos, muitos têm sido os idosos, os reformados, que são o amparo das suas famílias.

Mas, se tal envelhecimento constitui uma preocupação para a sociedade, ele não é um mal, em si, e daí que o termo “peste grisalha” não é apropriado e poderá mesmo ser ofensivo. Afigura-se-nos que tal termo não deveria ser repetido.

Ora, como reacção a esta expressão mencionada no artigo de opinião do assistente/recorrente, veio o arguido a escrever a aludida Carta aberta que deu origem aos presentes autos.

No referido artigo, a que deu o título de “Um Portugal de cabelos brancos”, o assistente escreveu, quase no início e por uma vez “A nossa Pátria foi contaminada com a já conhecida peste grisalha”.

Neste texto o assistente faz uma reflexão sobre o envelhecimento da população em Portugal, aflorando quais as consequências desse envelhecimento para o país e as medidas que devem ser tomadas. E conclui “Tenho para mim que o verdadeiro problema da nossa envelhecida sociedade não está no envelhecimento da sua população. Está no que os sucessivos governos não mudaram desde que a sociedade começou a envelhecer.

Precisamos, todos, de mudar a nossa mentalidade, de a renovar, de apostar no incremento da natalidade. Se assim não for, envelhecemos e apodrecemos com o país.

Por via da polémica suscitada refere o assistente na participação e na motivação do recurso que com o termo utilizado “peste grisalha” não quis atingir quem quer que fosse, termo que não é da sua autoria, sendo utilizado em publicações várias por estudiosos e académicos dos temas da demografia e do envelhecimento (tendo indicado duas publicações).

Recorde-se que o artigo de opinião do assistente foi publicado no Jornal “i” em 10 de Janeiro de 2013.

Efectivamente, no Ensaio n.º 26 da Fundação Francisco Manuel dos Santos, edição de Maio de 2012, que versa sobre “O Envelhecimento da Sociedade Portuguesa” escreveu a sua autora Maria João Valente Rosa, a págs. 13, “Inicialmente, ninguém dava importância ao envelhecimento demográfico. Hoje, em contrapartida, ele é acusado de estar na origem de parte substancial dos males sociais, políticos, financeiros e mesmo culturais que estão a abalar as sociedades da actualidade. Surge-nos como um processo que é urgente banir, uma «peste grisalha», como é por vezes referido, porventura mais grave para a sobrevivência das sociedades do que as outras pestes que devastaram populações no passado. Sempre discordei desta perspectiva (…)”. (sublinhado nosso)

E, continua a págs. 27 “embora o processo de envelhecimento demográfico tenha adquirido uma dimensão mundial, manifesta-se de modo particularmente notório na Europa (região que, aliás, também é conhecida por «continente grisalho»), (…) ”. (sublinhado nosso)

Acontece que, na Carta aberta a um deputado do PSD, que identificou, o arguido, pese embora a aludida expressão o tivesse profundamente indignado, e independentemente de possíveis divergências político-partidárias (ainda que não se conhecessem, mas sendo certo que a mesma foi remetida para publicação no Jornal “ (...)”, terra natal e de residência do assistente), não teceu quaisquer comentários ao texto do assistente, nomeadamente questionando as medidas que este propôs ou pondo em causa as consequências do envelhecimento demográfico para o país, tal como foram consideradas pelo assistente.

Todavia, com as expressões que utilizou, como bem sublinha o Exmº PGA no seu Parecer, “entrou na ofensa pessoal e familiar completamente desnecessária e desproporcional à exposição de ideias divergentes sobre o tema”.

O artigo 26º da Constituição atribui a todos os cidadãos o direito ao bom nome e reputação. Por seu turno o artigo 37º do mesmo diploma fundamental vem consignar os direitos constitucionais de expressão e de informação.

Consiste o primeiro daqueles direitos no direito a não ser ofendido ou lesado na sua honra, dignidade ou consideração social mediante imputação feita por outrem, bem como no direito a defender‑se dessa ofensa. Por seu turno, o direito à expressão consubstancia‑se na liberdade de exprimir e divulgar livremente o pensamento; direito de resposta e de rectificação (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição Anotada, pág. 180).

E, comete o crime de difamação quem, dirigindo-se a terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração, ou reproduzir uma tal imputação ou juízo.

Sendo agravado o crime se for cometido através de meio de comunicação social.

Encontra-se a matéria de direito tratada, de forma suficientemente desenvolvida, no despacho recorrido.

Alega o arguido, na resposta ao recurso, que “a motivação para escrever o artigo que enviou para o Jornal “ (...)”, encontra-se, não num ataque pessoal ao recorrente, mas antes, na crítica à opinião manifestada naquele artigo pelo assistente em que apelida de peste grisalha os reformados (…) é o de destruir a opinião do recorrente sobre os reformados”; e, quanto “aos vocábulos que utilizou, que por vezes roçam o acintoso, sendo uma crítica feroz à opinião exibida pelo recorrente, não constituem um atentado à honra e dignidade do assistente, antes são o livre exercício do direito de cidadania no contexto do debate público e quotidiano democrático, relativo a pessoas que devido aos cargos públicos que ocupam, transportam consigo uma maior visibilidade pelos combates que travam no espaço público”.

Ao não pronunciar o arguido, considerou o despacho recorrido que « o arguido agiu no exercício de um direito de crítica pública. Mesmo que as expressões em causa sejam, objetivamente, insultuosas, in casu, têm outro conteúdo que não a ofensa à honra e a consideração pessoal do assistente, qual seja a crítica a uma opinião política do assistente expressa num texto anteriormente escrito. Assim, é no âmbito do debate político que os juízos e expressões aqui em causa têm de ser encarados.»

Não se ignora a orientação daqueles que atribuem à luta política um efeito diluente da ofensa da honra e consideração. Porém, o conceito de honra não depende da qualidade do político, de quem faz da injúria uma arma de propaganda, ou de quem, pelo facto de pertencer a determinado grupo/partido está sujeito a vexames insuportáveis para o cidadão comum.

Vale isto por dizer que, se existe uma ofensa da honra, esta existirá ainda que o autor ou o ofendido sejam os políticos mais ou menos qualificados. A luta política apenas poderá relevar como critério de justificação, naqueles casos que se situam em zonas limites, e ainda, na medida em que a potencial ofensa da honra e consideração se situe numa relação directa com tal luta.

Na situação dos autos, mesmo o direito à livre crítica no contexto do debate público tem os seus limites.

Ora, no texto redigido pelo arguido, face às expressões utilizadas, independentemente da indignação deste e da contundência do exercício do direito de crítica pública, existem referências à pessoa do assistente que são objectivamente atentatórias da sua honra e consideração, bem conhecendo o arguido o carácter ofensivo das várias expressões utilizadas ao longo do texto (v.g. A dimensão do nome que o titula como cidadão deve ser inversamente proporcional à inteligência - se ela existe -; vou fazer o possível para não atingir o cume da parvoíce que foi suplantada por si, como deputado do PSD e afeto à governação, Sr. A..., quando ao defecar que "a nossa pátria foi contaminada com a já conhecida peste grisalha", se esqueceu do papel higiénico para limpar o estoma e de dois dedos de testa para aferir a sua inteligência.; A figura triste que fez, cuja imbecilidade latente (…) deve ter ciliciado bem as partes mais sensíveis de muitos portugueses, inclusivamente aqueles que deram origem à sua existência - se é que os conhece.; Já me apraz pensar, que também haja granjeado, um oco canudo, segundo os cânones do método bolonhês.; Os "intelectuais" que o escolheram deviam andar atrapalhados no meio do deserto onde o sol torra, a sede aperta a miragem engana e até um dromedário parece gente.; Sabe Sr. A..., quando uma pessoa que se preze está em posição cimeira, deve pensar, medir e pesar muito bem a massa especifica dos grunhidos, que vai bolçar cá para fora.; milhares de pessoas de apurados sentidos não apreciam o cheiro pestilento do vomitado, como o Sr. também sente um asco sem sentido e doentio, à peste grisalha.; para que o Sr. não venha a sofrer dessa moléstia, é meu desejo que não chegue a ser contaminado pelo vírus da peste grisalha e vá andando antes de atingir esse limite; quando num cesto de maçãs uma está podre, essa deve ser banida, quando não infecta as restantes).

Contrariamente ao que foi entendido no despacho recorrido, não está em causa o debate político próprio de cidadãos livres exprimindo com desassombro as suas ideias, mas sim a ofensa pela ofensa, sem relação com a dignidade e verticalidade que devem ser atributos de tais debates.

Deste modo, compulsando‑se a matéria constante da acusação (pública e particular), consideramos que, das afirmações produzidas pelo arguido e supra referidas, se pode extrair a conclusão no sentido de que as mesmas são ofensivas da honra e consideração do assistente, ou seja, susceptíveis de lançarem o descrédito sobre o assistente.

Foi o arguido acusado da prática de um crime de difamação agravada, nos termos do artigo 184º do Código Penal, segundo o qual «As penas previstas nos artigos 180º, 181º e 183º são elevadas de metade nos seus limites mínimo e máximo se a vítima for uma das pessoas referidas na alínea l) do nº 2 do artigo 132º, no exercício das suas funções ou por causa delas, ou se o agente for funcionário e praticar o facto com grave abuso de autoridade».

In casu, tal agravação não se verifica, porquanto ainda que no final do artigo de opinião do assistente se faça referência a que é advogado e deputado do PSD, o mesmo foi escrito na qualidade de cidadão e não na qualidade de deputado.

 

*
III- DECISÃO

Face ao exposto, acordam os juízes da secção criminal deste Tribunal da Relação em:

- Revogar a decisão de não pronúncia e determinar que o arguido B... seja pronunciado tendo em atenção o supra referido.

Sem tributação

*****

Coimbra, 25 de Fevereiro de 2015

(Elisa Sales - relatora)

(Paulo Valério - adjunto)


[1] - Alteração da Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto.
[2] - In Comentário ao Código de Processo Penal Português, Vol. IV, pág. 411.
[3] - In Direito Processual Penal, Vol. I, págs. 133 e 155.
[4] - António Tolda Pinto, in a Tramitação Processual Penal, 2ª edição, pág. 701.

[5] - Texto publicado em 21 de Maio de 2013:

A peste grisalha

(Carta aberta a um deputado do PSD)
Os loucos por vezes curam-se, os imbecis nunca
(Óscar Wild)

"Exmo. Sr. A...:

Por tardio não peca.

Eu sou um trazedor da peste grisalha cuja endemia o seu partido se tem empenhado em expurgar, através do Ministério da Saúde e outros "valorosos" meios ao seu alcance, todavia algo tenho para lhe dizer.

A dimensão do nome que o titula como cidadão deve ser inversamente proporcional à inteligência - se ela existe - que o faz blaterar descarada e ostensivamente, composições sonoras que irritam os tímpanos do mais recatado português.

Face às clavas da revolta que me flagela, era motivo para isso, no entanto, vou fazer o possível para não atingir o cume da parvoíce que foi suplantada por si, como deputado do PSD e afeto à governação, Sr. A..., quando ao defecar que "a nossa pátria foi  contaminada com a já conhecida peste grisalha", se esqueceu do papel higiénico para limpar o estoma e de dois dedos de testa para aferir a sua inteligência.

A figura triste que fez, cuja imbecilidade latente o forçou à encenação de uma triste figura, certamente que para além de pouca educação e civismo que demonstrou, deve ter ciliciado bem as partes mais sensíveis de muitos portugueses, inclusivamente aqueles que deram origem à sua existência - se é que os conhece. Já me apraz pensar, caro sr., que também haja granjeado, porém à custa da peste grisalha, um oco canudo, segundo os cânones do método bolonhês. Só pode ter sido isso.

Ainda estou para saber como é que um homolitus de tão refinado calibre conseguiu entrar no círculo governativo. Os "intelectuais" que o escolheram deviam andar atrapalhados no meio do deserto onde o sol torra, a sede aperta a miragem engana e até um dromedário parece gente.

É por isso que este país anda em crónica claudicação e por este andar, não tarda muito, ficará entrevado.

Sabe sr. A..., quando uma pessoa que se preze está em posição cimeira, deve pensar, medir e pesar muito bem a massa especifica das "sentenças", ou dos grunhidos, - segundo a capacidade genética e intelectual de cada um - que vai bolçar cá para fora. É que, milhares de pessoas de apurados sentidos não apreciam o cheiro pestilento do vomitado, como o sr. também sente um asco sem sentido e doentio, à peste grisalha. Pode ser errado, mas está no seu direito ... ainda que torto.

Pela parte que me toca, essa maleita não o deve molestar muito, porque já sou portador de uma tonsura bastante avantajada, no entanto, para que o sr. não venha a sofrer dessa moléstia, é meu desejo que não chegue a ser contaminado pelo vírus da peste grisalha e vá andando antes de atingir esse limite e ficar sujeito a ouvir bacoradas iguais ou de carácter mais acintoso do que aquelas que preteritamente narrou como um "grande", porém falhado, "artista".

E mais devo dizer-lhe: quando num cesto de maçãs uma está podre, essa deve ser banida, quando não infecta as restantes; se isso não suceder, creio que o partido de que faz parte, o PSD, irá por certo sofrer graves consequências decorrentes da peste grisalha na época da colheita eleitoral. Pode contar comigo para a poda.

Atentamente."

[6] - Artigo publicado em 10 de Janeiro de 2013:

“Um Portugal de cabelos brancos

Os portugueses estão a desaparecer. O envelhecimento da população portuguesa é uma evidência incontornável.

Portugal é o país da União Europeia que mais sofre com esta tragédia social.

Segundo estimativa do INE, em 2050 cerca de 80% da população do país apresentar-se-á envelhecida e dependente e a idade média pode situar-se perto dos 50 anos. A nossa pátria foi contaminada com a já conhecida peste grisalha.

Pela primeira vez na nossa história a fasquia dos 100 mil nascimentos ano não foi este ano atingida. Ficámo-nos pelos 90 206, o que representa um decréscimo alarmante.

Além de ser o pior da Europa, Portugal é um dos três ou quatro países piores do mundo em taxa de natalidade (1,2 filhos por mulher, sendo a taxa de reposição geracional de 2,1). O último ano em que houve substituição de gerações foi em 1982 (já lá vão 20 anos).

A este cenário dantesco deve agora acrescentar-se a onda de emigração, que nos últimos e nos próximos anos vai fazer-se sentir no nosso território.

O resultado só pode ser assustador. Assustador porque desafia a nacionalidade portuguesa. Assustador porque estamos a uma distância mais curta do que se julga de uma desertificação galopante (já quase irremediável no interior do país), que só é possível combater com fluxos migratórios e com a ocupação do nosso país por parte de imigrantes que tenderão a substituir as populações autóctones.

Assustador porque o envelhecimento dos portugueses e o incremento do seu índice de dependência provocam um aumento penoso dos encargos sociais com reformas, pensões e assistência médica.

Assustador porque se torna quase impossível que esses encargos sejam suportados pelo cada vez menor número de contribuintes activos.

Assustador porque já temos enormíssimas dificuldades em manter a sustentabilidade do sistema de segurança social, do Serviço Nacional de Saúde ou a educação tendencialmente gratuita, de defesa e de segurança interna.

Engane-se quem pensa que a nossa sobrevivência enquanto país soberano depende prioritária e exclusivamente do crescimento económico.

Não há crescimento económico que vença o envelhecimento populacional.

Pode suavizá-lo ou adiá-lo, mas o país caminhará sempre para uma espécie de eutanásia preanunciada.

Em anos de fogosidade e crescimento, o défice da Segurança Social não parou de aumentar, tornando-a já insustentável, porque as contribuições não chegam para pagar as pensões.

Em apenas 20 anos (de 1990 a 2010), a despesa da Segurança Social quase duplicou, passando de 9,7% do PIB para 18%.  

Se bem que devido a um factor extraordinário (integração do fundo de pensões da banca no regime da Segurança Social), o ano de 2012 foi o primeiro dos últimos dez em que a Segurança Social registou um défice ou saldo negativo, com 384 milhões de euros a mais de despesa do que de receita.

Já todos sabemos que não é viável admitir mais agravamentos de impostos e de contribuições que permitam combater ou inverter a situação, mas todos os responsáveis políticos têm o dever patriótico e geracional de pensar responsavelmente em medidas de choque para o país.

O governo esteve envolvido em muitas tarefas urgentes. Esteve a discutir em Bruxelas o défice deste ano, esteve a discutir na AR o Orçamento e ainda está a tentar convencer os mercados de que a nossa dívida pode chegar a níveis sustentáveis depois de 2014.

Mas como a guerra contra o envelhecimento é assunto pouco dado a protocolos e como os problemas estão todos ligados, o governo está também a pensar uma reforma do Estado que já há muito tempo se impunha.

O facto de estarmos resgatados não nos deve inibir de reflectir e decidir sobre outros problemas sérios do país.

É por isso que se deve convocar toda a esquerda a abandonar a populista e até agora eternamente irresponsável tese de que tudo se resolve com aumento de pensões e dos salários dos funcionários públicos e com a manutenção dos direitos adquiridos e dos privilégios instalados. O dinheiro não é elástico e não aparece de todo o lado.

Ao maior partido da oposição, como alternativa tendencial de poder, não basta manifestar uma qualquer birra por não ter sido chamado à discussão sobre a reforma das funções do Estado antes de outros.

Um partido com ideias e com preocupações governativas não deve andar a reboque nem escudar-se em questões de forma ou de provincianismo político.

O PS deve ter iniciativa e dizer agora o que não disse nos últimos anos. Deve explicar, como explicará o governo, qual o Estado que quer e pode manter para as gerações seguintes.

Os portugueses não podem esperar que a oposição finja que está tudo bem, que proclame que a peçonha vem da troika e que o que está em jogo ou não teve importância ou se resolve com mezinhas ou com tacticismo político-partidários.

O país não aprecia que quem teve e pode vir a ter responsabilidades governativas se deleite ou se regale com a deterioração geracional de Portugal.

Antes de disputarem eleições para governar o país os partidos têm de querer ter país para governar.

É por isso vital que ninguém se demita de procurar novas políticas de apoio à natalidade e novas formas de encarar o papel de um Estado que já quase não consegue desempenhar as missões fundamentais que esta vetusta Constituição lhe confere.

Tenho para mim que o verdadeiro problema da nossa envelhecida sociedade não está no envelhecimento da sua população. Está no que os sucessivos governos não mudaram desde que a sociedade começou a envelhecer.

Precisamos, todos, de mudar a nossa mentalidade, de a renovar, de apostar no incremento da natalidade. Se assim não for, envelhecemos e apodrecemos com o país.

Advogado e deputado do PSD