Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
7034/15.9T8VIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: INEPTIDÃO
PETIÇÃO INICIAL
FALTA DE CAUSA DE PEDIR
FACTOS ESSENCIAIS
INSUFICIÊNCIA
Data do Acordão: 11/14/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU - VISEU - JC CÍVEL - JUIZ 3
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.5, 6, 186, 278, 522 Nº1 D), 590 CPC
Sumário: 1. A causa de pedir é o acto ou facto jurídico concreto donde emerge o direito que o autor invoca e pretende fazer valer (legalmente idóneo para o condicionar ou produzir).

2. A petição inicial será inepta quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir (art.º 186º, n.º 2, alínea a) do CPC).

3. A figura da ineptidão da petição inicial (que implica que, por ausência absoluta de alegação dos factos que integram o núcleo essencial da causa de pedir, o processo careça, em bom rigor, de um objecto inteligível) distingue-se e contrapõe-se à mera insuficiência na densificação ou concretização adequada de algum aspecto ou vertente dos factos essenciais em que se estriba a pretensão deduzida.

4. Apenas nesta segunda situação a parte poderá/deverá ser convidada a completar o articulado, podendo ainda tal insuficiência ou incompletude vir a ser suprida em consequência da aquisição processual de tais factos concretizadores, se revelados no decurso da instrução - art.ºs 5º, n.º 2, alínea b) e 590º, n.º 4 do CPC.

5. Perante a completa falta de alegação de factos susceptíveis de integrar a causa de pedir, fica inviabilizado o conhecimento do mérito da causa e nenhum relevo poderá ser dado a posterior articulado que o autor decida apresentar visando “sanar” aquele vício.

Decisão Texto Integral:          







  

            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
           

            I. J (…) e M (…) intentaram, na Comarca de Viseu (Instância Local – Secção Cível), a presente acção declarativa comum contra A (…)Lda. (1ª Ré) e L (…)  e mulher C (…) (2ºs Réus), pedindo, além do mais, a declaração do respectivo direito de propriedade sobre as fracções autónomas e o prédio urbano mencionados nos art.ºs 1º e 2º da petição inicial (p. i.), bem como a condenação dos Réus na sua restituição.

            Alegaram, em síntese:

            - Os prédios urbanos em causa, registados em nome dos Réus, não são propriedade destes, porquanto os deveriam ter transmitido há vários anos para os AA., que são os seus legítimos proprietários.

            - Um dos prédios (inscrito na matriz sob o artigo 2160) embora formalmente inscrito em nome de (…) e esposa, (…)  era pertença exclusiva dos AA..

            - Apenas por razões que de momento não relevam, não poderiam estar os ditos prédios registados em nome dos Réus.

            - Os referidos (…)  outorgaram uma procuração a favor do A., com a qual este vendeu à 1ª Ré o referido prédio urbano, o que fez, formalmente, em representação dos mandantes, embora na verdade o fizesse em nome próprio.                       - Tal negócio foi simulado, não tendo havido o pagamento de qualquer preço, e a ele esteve subjacente uma permuta, reduzida a escrito como “contrato-promessa de compra e venda”.

            - O referido prédio terá sido objecto de loteamento e, posteriormente, foi assinada uma “declaração conjunta” onde a 1ª Ré reconhece que apenas é proprietária dos “lotes 1 e 2”.

            - Nos termos do aludido contrato-promessa, os AA. têm direito às “fracções A, D e E” e a 1ª Ré recusa o cumprimento de tal contrato, dispondo das referidas fracções que, na realidade, pertencem aos AA.. 

            Os 2ºs Réus contestaram, invocando a ilegitimidade dos AA. para a presente demanda, porquanto alheios aos imóveis reivindicados, bem como aos prédios que lhes deram origem; defenderam-se ainda por impugnação. Concluíram pela respectiva absolvição da instância ou, caso assim não se entenda, do pedido, por improcedência da acção. Pediram a condenação dos AA. como litigantes de má fé.

            A 1ª Ré também contestou, deduzido incidente de valor da acção e apresentando defesa por impugnação (tendo afirmado, nomeadamente, que jamais negociou com o A., a título pessoal deste), vindo a concluir pela improcedência da acção. Subsidiariamente, para a hipótese de se entender que os AA. intervieram nos negócios havidos com a 1ª Ré, pediu que deverá ser-lhe reconhecido o direito de não transmitir a propriedade das fracções em questão aos AA. enquanto estes não liquidarem o montante de € 252 782,78 correspondente ao valor das infra-estruturas por ela executadas nas ditas fracções. Pediu ainda a condenação dos AA. como litigantes de má fé.

            Fixado o valor da causa e remetidos os autos à Instância Central, os AA. e os Réus foram convidados a pronunciarem-se, querendo, sobre o vício da “falta de causa de pedir” suscitado oficiosamente pela Mm.ª Juíza a quo, por considerar que os AA. não alegaram factos concretizadores do direito de propriedade de que se arrogam (fls. 211).

            Os AA. vieram dizer que “Efectivamente ocorre absoluta insuficiência da matéria factual[1] que permita a prossecução da procedência do Pedido. Os factos da posse estão negligentemente esquecidos.” E decidiram apresentar o arrazoado de fls. 214, com a justificação de que “é Direito processual dos AA. corrigir a Petição inicial” e, assim, “exercer o Direito de Completar a sua Petição Inicial, sanando a deficiência manifesta”. 

            Nenhum dos Réus se pronunciou nem sobre a excepção oficiosamente suscitada, nem sobre aquele requerimento dos AA..

            Seguidamente, por decisão de 21.3.2017, a Mm.ª Juíza a quo “indeferindo a correcção da petição inicial” operada pelo dito requerimento, julgouprocedente a excepção dilatória de ineptidão oficiosamente suscitada, por falta de causa de pedir, declarando nulo todo o processo e absolvendo da instância os réus – cf. artigos 186º, n.ºs 1 e 2, alínea a), 200º, n.º 2, 577º, b, 576º, n.º 2, 578º, 595º, n.º 1, a), CPC.”

Inconformados, os AA. interpuseram a presente apelação, formulando as seguintes conclusões:

            1ª - O poder conferido pelo art.º 6º, n.º 2 do CPC é um verdadeiro dever de convite às partes para corrigirem os vícios que podem redundar em ineptidão.

            2ª - Por maioria de razão deverá ser aceite a correcção voluntariamente formulada pelos AA. no exercício do Direito de contraditório.

            3ª - A Omissão do Convite ao suprimento das irregularidades previsto no art.º 590, n.º 3 do CPC configura nulidade que vicia a decisão que absolva os RR. da Instância.

            Pretende-se, assim, que foram violadas as normas previstas nos art.ºs 6º, 590º, n.º 3, 195º, 197º, 199º, 200º, n.º 3 e 201º do CPC.

            Rematam pugnando pelo prosseguimento dos autos.

            Não houve resposta.

            Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa assim reapreciar se existe ineptidão da p. i. por falta de causa pedir, com os efeitos assinalados na decisão sob censura.


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            II. 1. Para a decisão do recurso releva a factualidade (e a tramitação) do antecedente ponto I.

            2. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

               Às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas (art.º 5º, n.º 1 do Código de Processo Civil/CPC)[2]. Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz: a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; c) Os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções (n.º 2).

            O juiz providencia oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação, determinando a realização dos actos necessários à regularização da instância ou, quando a sanação dependa de acto que deva ser praticado pelas partes, convidando estas a praticá-lo (art.º 6º, n.º 2).

            É nulo todo o processo quando for inepta a petição inicial (art.º 186º, n.º 1). Diz-se inepta a petição: a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir (n.º 2, alínea a)). Se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial (n.º 3).

            A ineptidão da petição inicial determina a nulidade de todo o processo, excepção dilatória, de conhecimento oficioso, que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância (art.ºs 186º, 278º, n.º 1, alínea b); 576º, n.ºs 1 e 2; 577º, alínea b) e 578º).

            Na petição, com que propõe a acção, deve o autor expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à acção (art.º 552º, n.º 1, alínea d)).

            Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico. Nas acções reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido (art.º 581º, n.º 4).

            Nos casos em que, por determinação legal ou do juiz, seja apresentada a despacho liminar, a petição é indeferida quando o pedido seja manifestamente improcedente ou ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente, aplicando-se o disposto no artigo 560º (art.º 590º, n.º 1). Findos os articulados, o juiz profere, sendo caso disso, despacho pré-saneador destinado a: Providenciar pelo suprimento de excepções dilatórias, nos termos do n.º 2 do artigo 6º; Providenciar pelo aperfeiçoamento dos articulados, nos termos dos números seguintes (n.º 2, alíneas a) e b)). Incumbe ainda ao juiz convidar as partes ao suprimento das insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada, fixando prazo para a apresentação de articulado em que se complete ou corrija o inicialmente produzido (n.º 4).

            3. Na petição inicial o A. propõe a acção, deduzindo certa pretensão de tutela jurisdicional, com a menção do direito a tutelar e dos fundamentos respectivos.

O pedido é a pretensão do autor (art.º 552º, n.º 1, alínea e)); o direito para que ele solicita ou requer a tutela judicial/e o modo por que intenta obter essa tutela; o efeito jurídico pretendido pelo autor (art.º 581º, n.º 3).

            A causa de pedir é o acto ou facto jurídico concreto donde emerge o direito que o autor invoca e pretende fazer valer, direito que não pode ter existência (e por vezes nem pode identificar-se) sem um acto ou facto jurídico que seja legalmente idóneo para o condicionar ou produziro acto ou facto jurídico concreto em que o autor se baseia para formular o seu pedido, de que emerge o direito que se propõe fazer declarar.[3]

Nas acções reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real em causa (art.º 581º, n.º 4).

             4. A figura da ineptidão da petição inicial (que implica que, por ausência absoluta de alegação dos factos que integram o núcleo essencial da causa de pedir, o processo careça, em bom rigor, de um objecto inteligível) distingue-se e contrapõe-se à mera insuficiência na densificação ou concretização adequada de algum aspecto ou vertente dos factos essenciais em que se estriba a pretensão deduzida (implicando que a petição, caracterizando, em termos minimamente satisfatórios, o núcleo factual essencial integrador da causa petendi, omita a densificação de algum aspecto caracterizador ou concretizador de tal factualidade essencial).

            E é só nesta segunda situação, de mera insuficiência de concretização factual relevante (de factualidade de que depende a procedência da pretensão do A.), que a parte poderá/deverá ser convidada a completar o articulado, podendo ainda tal insuficiência ou incompletude vir a ser suprida em consequência da aquisição processual de tais factos concretizadores, se revelados no decurso da instrução (art.º 5º, n.º 2, alínea b)), sendo que, persistindo mesmo assim a dita insuficiência concretizadora, a consequência de tal insuficiência da matéria de facto processualmente adquirida não será a anulação de todo o processo, mas antes a improcedência, em termos de juízo de mérito, da própria acção, por o A. não ter logrado, afinal, apesar das amplas possibilidades processuais de que beneficiou, alegar e provar cabalmente todos os elementos factuais constitutivos de que dependia o reconhecimento do direito por ele invocado…[4]

            5. A Mm.ª Juíza a quo considerou que os AA. formulam um pedido de declaração do respectivo direito de propriedade sobre três fracções urbanas mas não alegaram factos que permitam concluir pela existência do referido direito de propriedade nas respectivas esferas jurídicas, sendo que teriam de alegar e provar o facto jurídico do qual deriva o direito de propriedade de que se arrogam, podendo fazê-lo mediante a invocação, quer de uma forma de aquisição originária de tal direito, quer de uma forma derivada de aquisição do mesmo. Nesta última hipótese, porém, terão ainda de alegar e provar que o transmitente era o titular do direito transmitido à data da transmissão.

            Diz ainda o Tribunal recorrido que tal alegação não foi efectuada, em desarmonia com o respectivo ónus, pois que é às partes que cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas (art.ºs 5º, n.º 1 e 552º, n.º 1, d)); da alegação dos autores não é possível concluir que sejam proprietários das fracções em questão, pois não foram alegados factos que constituam causa de pedir adequada para tal direito; e apesar de os autores aludirem a um contrato-promessa, daí não retiram qualquer efeito jurídico, não requerendo, designadamente, o seu cumprimento, alegando, ao invés, que são proprietários das fracções.

            Concluiu, depois, que a petição inicial, não definiu factualmente o núcleo essencial da causa de pedir invocada, pelo que padece de falta de causa de pedir, vício que gera a sua ineptidão e que, sendo de conhecimento oficioso, cumpre declarar.

            Tal vício, sendo insanável, determina que não possa ser equacionado qualquer convite com vista à sua supressão e que se rejeite a “correcção” operada a fls. 214, por tal, em rigor, corresponder à apresentação de uma nova petição inicial, suportada numa causa de pedir inexistente no momento da instauração da acção, sendo que o convite ao aperfeiçoamento da petição inicial apenas pode ser equacionado para as hipóteses em que a causa de pedir padece de simples deficiências que, no momento da decisão, possam vir a determinar a improcedência da acção, e não para as hipóteses de falta de causa de pedir como a presente.

            6. O expendido pela Mm.ª Juíza a quo é inteiramente correcto.

            Na situação em análise, a Mm.ª Juíza a quo não proferiu, nem tinha que proferir, despacho convidando ao suprimento de deficiência ou insuficiência de articulado (art.º 590º, n.º 4 - normativo que só se aplica aos casos em que a causa de pedir esteja insuficientemente concretizada, e não às situações em que falte de todo a formulação da ´causa petendi`).

            Estamos perante uma p. i. em que falta a causa de pedir (falta, de todo, a indicação da causa de pedir – maxime, os factos concretos que suportassem a aquisição originária e/ou derivada do direito de propriedade pelos AA.), e não perante p. i. deficiente ou incompleta, no que concerne à descrição dos factos constitutivos do direito nela invocado.

            Os AA. não indicaram o facto genético ou matricial, a causa geradora do núcleo essencial do direito ou da pretensão deduzida em juízo[5]; a p. i. é omissa quanto à fonte do direito invocado (causa de pedir).

            7. Perante a completa falta de alegação de factos susceptíveis de integrar a causa de pedir, inviabilizou-se o conhecimento do mérito da causa (art.ºs 186º, 278º, n.º 1, alínea b); 576º, n.ºs 1 e 2; 577º, alínea b) e 578º), nenhum relevo podendo ser dado ao arrazoado de fls. 214, onde, de resto, vemos também admitida a total ausência, na p. i., de factos idóneos a produzir o pretendido efeito jurídico…

            Ao julgar inepta a petição por omissão de causa de pedir, decidiu-se, pois, em conformidade com o descrito regime jurídico e o entendimento unânime da doutrina e da jurisprudência.[6]

            8. Independentemente de qual seja a melhor interpretação/aplicação a dar ao preceituado no art.º 186º, n.º 3[7], dúvidas não restam de que, nas contestações apresentadas nos autos, os demandados em nada corroboraram ou acolheram (expressa ou implicitamente) a perspectiva apresentada na p. i., não se antolhando inequívoco que a tenham interpretado convenientemente.

            De resto, acabaram por “reprovar” a actuação processual dos autores…

            9. Em derradeira análise, na p. i., os AA. não indicaram o “caso concreto da vida” que pretendiam ver dilucidado.

            Apenas lhes seria lícito corrigir qualquer incompletude ou imprecisão das alegações ou dos pedidos.

            O Tribunal só poderia/deveria usar do poder de convidar as partes (no caso, os AA.) a completarem alegações de facto deficientes.[8]

            Estava arredada a possibilidade de apresentar o (novo) articulado de fls. 214 visando “sanar” a ineptidão da p. i., independentemente da questão de saber se, aí (e então), veio a ser indicada causa de pedir adequada ou conducente à pretensão deduzida em juízo.

            10. Soçobram, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso.


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            III. Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.  

            Custas pelos AA./apelantes, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhes foi concedido (fls. 52).


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14.11.2017

Fonte Ramos ( Relator )

Maria João Areias

Alberto Ruço



[1] Sublinhado nosso, como o demais a incluir no texto.
[2] Diploma a que pertencem as disposições doravante citadas sem menção da origem.
[3] Vide, entre outros, J. Alberto dos Reis, Comentário ao CPC, Vol. 2º, Coimbra Editora, 1945, pág. 369 e 374 e seguinte; Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, págs. 110 e seguinte; Antunes Varela, e Outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, págs. 232 e seguintes e J. Lebre de Freitas, CPC Anotado, Vol. 1º, Coimbra Editora, 1999, págs. 321 e seguinte.
[4] Cf. o acórdão do STJ de 26.3.2015-processo 6500/07.4TBBRG.G2,S2 [assim sumariado: “1. A ineptidão da petição inicial supõe que o A. não haja definido factualmente o núcleo essencial da causa de pedir invocada como base da pretensão que formula, obstando tal deficiência a que a acção tenha um objecto inteligível. 2. A mera insuficiência na densificação ou concretização adequada de algum aspecto ou vertente dos factos essenciais em que se estriba a pretensão deduzida (implicando que a petição, caracterizando, em termos minimamente satisfatórios, o núcleo factual essencial integrador da ´causa petendi`, omite a densificação, ao nível tido por adequado à fisionomia do litígio, de algum aspecto caracterizador ou concretizador de tal factualidade essencial) não gera o vício de ineptidão, apenas podendo implicar a improcedência, no plano do mérito, se o A. não tiver aproveitado as oportunidade de que beneficia para fazer adquirir processualmente os factos substantivamente relevantes, complementares ou concretizadores dos alegados, que originariamente não curou de densificar em termos bastantes.”]

   Em idêntico ou igual sentido, cf., de entre vários, os acórdãos da RP de 12.01.2009-processo 0857643 [com o seguinte sumário: «O convite ao aperfeiçoamento a que se refere o n.º 3 do art.º 508º do CPC só se aplica aos casos em que a causa de pedir esteja insuficientemente concretizada e não aos casos em que falte de todo a formulação da mesma.»] e 16.6.2009-processo 4541/06.8TBVNG.P1, RG de 31.01.2013-processo 500/08.4TBMNC.G1, da RC de 27.9.2016-processo 220/15.3T8SEI.C1 [constando do respectivo sumário: «1. A petição inicial apenas é inepta, por falta de causa de pedir, quando o autor não indica o núcleo essencial do direito invocado, tornando ininteligível e insindicável a sua pretensão. 2. Se tal não se verifica a petição é, quando muito, deficiente, devendo o juiz proferir despacho de aperfeiçoamento – art.ºs 6º e 590º, n.º 4 do CPC.»] e 14.3.2017-processo 10327/15.1T8CBR.C1 [onde se conclui: «Perante uma petição inicial deficiente, incompleta, no que concerne à descrição dos factos constitutivos do direito a que se arroga o autor, em que não falta nem é ininteligível a causa de pedir, deve o juiz formular o convite de aperfeiçoamento previsto no artigo 590º, n.º 4, do CPC.»] e da RE de 08.10.2015-processo 855/12.6TBSLV.E1, bem como a decisão sumária da RC de 18.10.2016-processo 203848/14.2YIPRT.C1 [onde se referiu, nomeadamente: “se o julgador entende que existe ineptidão não tem de a mandar aperfeiçoar mas sim julgá-la e com esse julgamento determinar a absolvição da instância porque, se a petição inicial é inepta não pode ser salva com qualquer aperfeiçoamento, que só está previsto para as deficiências e não para as ineptidões”], publicados no “site” da dgsi.

   Na doutrina, vide, nomeadamente, J. Lebre de Freitas, e Outros, CPC Anotado, Vol. 2º, Coimbra Editora, 2001, pág. 354; Carlos Lopes do Rego, Comentários ao CPC, Vol. I, 2ª edição, 2004, Almedina, pág. 431 [designadamente, quando afirma a inadmissibilidade de suprimento de uma petição inepta, ou a convolação para uma “causa petendi” diferente da invocada pelo autor como suporte da petição] e Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, 1º Volume, 2ª edição, Almedina, págs. 65 e seguinte [mormente, quando refere: “A formulação legal (então, do art.º 508º, n.º 3 do CPC de 1961, na redacção conferida pelo DL n.º 180/96, de 25.9, e, hoje, do art.º 590º, n.º 4 do CPC de 2013) implica, pois, a manutenção (…) da insanabilidade da ineptidão da petição inicial caracterizada por falta absoluta de causa de pedir” pois que “tanto a complementaridade como a concretização que delimitam os poderes de ampliação da matéria de facto implicam necessariamente a prévia alegação de factos, pelo autor na petição inicial, como fundamento da sua pretensão.”].
[5] Cf. o citado acórdão da RC de 27.9.2016-processo 220/15.3T8SEI.C1.
[6] Cf. a “nota 4”, supra.

[7] Veja-se, por exemplo, a dita decisão sumária da RC de 18.10.2016-processo 203848/14.2YIPRT.C1, onde se expende: «A locução normativa segundo a qual “se o réu contestar apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, não se julgará procedente a arguição quando ouvido o autor se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial” (art.º 186º, n.º 3 do CPC) - não significa, pois, que a ausência de arguição de nulidade por parte do réu torne boa a petição quando a esta falte a causa de pedir ou esta seja ininteligível
[8] Vide, ainda, Miguel Mesquita, A flexibilização do princípio do pedido à luz do moderno Processo Civil, RLJ, 143º, principalmente, págs. 145, 146 e 150.