Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2393/04.1TBAGD-E.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: CASA DE MORADA DE FAMÍLIA
DIVÓRCIO
PROCESSO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA
COMPENSAÇÃO
Data do Acordão: 02/15/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DO BAIXO VOUGA OLIVEIRA DO BAIRRO
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.199, 1326, 1409, 1413 CPC, 848 CC
Sumário: 1. - Em processo de jurisdição voluntária, para fixação de renda pelo uso da casa de morada de família ( artº 1413 do CPC ), o requerido não pode excepcionar a compensação de créditos, com fundamento em despesas de conservação na referida casa.

2. - Este crédito deve ser invocado em sede de partilha do bem imóvel.

Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇAO DE COIMBRA

1.

J (…) instaurou, nos termos do artº 1413º do CPC,  contra M (…), acção tendente à fixação de renda por atribuição de casa de morada de família na sequência de divórcio decretado entre ambos.

A requerida contestou e, para além do mais, invocou a excepção da compensação, requerendo que seja compensado o seu crédito decorrente de obras que custeou na casa, ou que tal credito seja deduzido no valor da renda a fixar.

2.

Foi proferido despacho no qual se expendeu que tal constituía uma cumulação ilegal de pedidos, por aos mesmos corresponder forma de processo diferente, pois que, o processo destina-se exclusivamente a fixar o valor da renda e ao pedido formulado pela Requerida consubstanciado na verificação da excepção peremptória de direito material de compensação da renda a pagar, com o alegado custo das despesas havidas com a conservação de tal casa, corresponde a acção declarativa de condenação, em processo comum, na forma ordinária.

Concluindo-se assim que: porque tal pedido não cabe na esfera de competência material deste Tribunal, julgo verificada, quanto a tal pedido, a excepção dilatória de incompetência absoluta do Tribunal, conducente à absolvição do Requerente da instância, o que aqui se declara para os devidos e legais efeitos – cfr. arts. 101º, 102º, 105º, 288º, al. a), 494º, al. a), 495º, todos do C. P. Civil”.

3.

Inconformada recorreu a requerida.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1) Estando perante um processo de jurisdição voluntária estipula o art. 1410.º do CPC que “Nas providências a tomar o Tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adoptar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna”, sendo que, claramente se depreende que neste tipo de processos vigoram juízos de equidade.

2) Se o Tribunal a quo se considera competente para apreciar e julgar a questão da fixação de uma renda quanto à utilização da Casa de Morada de Família”, também o deverá ser para se pronunciar sobre a questão suscitada pela ora Recorrente, relativa à excepção de compensação identificada em b) da Contestação relativa a um crédito de despesas feitas e necessárias ao uso da casa de morada de família, que são necessariamente conexas com aquela fixação de renda e cujo conhecimento é necessário para a fixação de renda e por ser o mesmo objecto dos autos dado que tanto a causa de pedir dos autores como da ré tem a ver com a utilização da casa de morada de Família 

3) Todas as questões suscitadas pelas partes relacionam-se com a Casa de Morada de Família, nomeadamente, a fixação de uma renda à ora Recorrente pelo direito uso daquela Casa, pelo que faz todo o sentido que seja o mesmo Tribunal (o Tribunal a quo), o competente para delas se pronunciar, inclusivamente, tendo competência para se pronunciar sobre o peticionado pela Recorrente em b) da sua Contestação.

4) Devem todas as questões suscitadas pelas partes, serem apreciadas e julgadas oportunamente no âmbito do mesmo processo de jurisdição voluntária, uma vez que, o Apenso aqui em causa deve ser tratado com um todo, pelo que a decisão recorrida violou o art. 1410º e 1413º, do CPC e, ainda, o disposto nos arts 81º, al. a), da LOFTJ e art. 114º, al.c) da lei nº 52/08 e pelo art. 24º, nº1, da NLOFTJ, que tem e devem ser interpretados no sentido de que todas as questões relativas a cônjuges e ex-cônjuges relativas á casa de morada  de família devem ser julgadas no mesmo processo.

5) A causa de pedir da excepção deduzida pela aqui Recorrente na sua Contestação não é de natureza creditória cível, mas de natureza similar àquela que se discute nos presentes autos, pois a renda peticionada tem também uma natureza de compensação de morada de familia, tal como todas as despesas relativas à Casa de Morada de Família, para a qual se pede a fixação da referida renda, também terão de ser atendidas, por terem natureza similar, e estarem entre si interligadas.

6) Se o Tribunal a quo se declarou competente para apreciar e julgar a fixação de renda requerida por J (…), que a Recorrente entende ter natureza de compensação da utilização da casa de morada de família, então também o deve ser para apreciar a excepção de compensação deduzida por M (…), já que ambas têm a mesma natureza jurídica. 

7) As obras de manutenção e conservação que a Recorrente teve de efectuar, com todos os custos provenientes, foram obras realizadas na própria Casa de Morada de Família, bem comum a ambas as partes (e não num outro prédio urbano) e, por isso, da responsabilidade de ambos, sendo que essas obras só foram feitas para que a recorrente pudesse exercer o direito de uso da casa de morada de família que lhe foi atribuído pelo Tribunal. 

8) Não podendo a Recorrente conformar-se com o facto de existir a possibilidade de lhe ser fixada uma renda por utilização de um bem comum, quando aquela também já suportou bastantes gastos nas obras que são também da responsabilidade da contra-parte e, sem ter a hipótese de contrapor o seu direito de crédito (seja fazendo-se compensação do crédito com a renda pedida pelo Requerente, seja deduzindo-se o seu crédito no montante da renda a ser fixado).

9) Existe identidade da causa de pedir, já que ambas as pretensões decorrem do mesmo facto jurídico, entenda-se, atribuição e utilização/usufruto da Casa de Morada de Família por parte da ora Recorrente.

10) A ora Recorrente M (…) na sua Contestação tem a possibilidade de se defender, seja por impugnação, seja por excepção, vigorando o princípio da concentração da defesa na contestação, ao abrigo do disposto nos arts. 487.º, 488.º e 489.º, nº 1 todos do CPC, e a Recorrente usou dessa faculdade deduzindo a excepção peremptória de compensação de créditos (atendendo aos gastos por si suportados com obras de conservação da Casa de Morada de Família) com a renda exigida pelo Requerente.

11) Entende a Recorrente que o Tribunal a quo tem competência material para apreciar esta mesma excepção, sob pena de se esvaziar toda a finalidade e o conteúdo das defesas por excepção, em violação do princípio da igualdade (de armas) e o princípio do contraditório.

12) Decidiu o Tribunal a quo que “ao pedido formulado pela Requerida na al. b) da douta contestação, corresponde a acção declarativa de condenação, em processo comum, na forma ordinária” (sublinhado nosso). Ainda que assim fosse, o que a Recorrente não aceita, teria de se atender à ressalva expressa no art. 31.º, nº 2 do CPC, que autoriza a cumulação de pedidos, vigorando nesta norma os princípios do processo elástico, da unidade do processo e da economia processual, pelo que a decisão recorrida violou os referidos princípios processuais aplicáveis ao caso sub Júdice e, ainda, o art. 31º, nº 2, do CPC.

13) Não faz sentido propor uma nova acção, iniciando-se um novo processo totalmente autónomo, desta feita sob a forma ordinária, correspondente a uma acção declarativa de condenação, em processo comum, somente para ser apreciada uma excepção peremptória de compensação, excepção esta directamente ligada com a Casa de Morada de Família, e que em tudo se relaciona com o presente processo de jurisdição voluntária.

14) Há inconveniente grave em não se apreciar a excepção da compensação deduzida pela Recorrente neste processo de jurisdição voluntária, por o Tribunal a quo se ter julgado absolutamente incompetente, seja porque terá de se propor uma nova acção totalmente autónoma com todas as tramitações legais consequentes e as morosidades subsequentes, seja porque só com a apreciação conjunta dos pedidos se poderá obter a justa composição do litígio.

15) Há igualmente interesse relevante na cumulação da fixação de renda e excepção de compensação no mesmo processo (de jurisdição voluntária), já que, a ora Recorrente teve e tem, efectivamente, bastantes gastos com obras de conservação e manutenção da Casa de Morada de Família, obras que são da responsabilidade de ambos os proprietários e não só da Recorrente.

16) E não pode a aqui Recorrente concordar com o facto de lhe ser movida uma acção de fixação judicial de renda, sem se atender também ao seu direito de contrapor os créditos que detém sobre o Requerente J (…),

17) Sendo que a Justiça é tratar por igual o que é igual e, como se referiu supra, ambas as pretensões (fixação de uma renda e consequente compensação por direitos de crédito de obras na casa) assumem igual natureza – natureza de compensação económica decorrente atribuição e utilização da Casa de Morada de Família, pelo que deve ser aplicada por analogia, a este caso, a jurisprudência do Ac. da Relação de Lisboa, datado de 17/03/2005, com o nº de Processo 10814/2004-6, (www.dgsi.pt).

           

Contra-alegou o recorrido, pugnando pela manutenção da decisão

Invocou, para tanto e em síntese que as regras do processo especialíssimo de jurisdição voluntaria, aplicável ao pedido de fixação de renda, não permitem a apreciação do pedido de compensação sujeito ao processo declarativo comum, sendo ainda as suas causas de pedir totalmente diversas e sendo diversos os tribunais competentes em razão da matéria para os apreciar.

4.

Sendo que, por via de regra: artºs 684º e 685º-Aº do CPC - de que o presente caso não constitui excepção - o teor das conclusões define o objecto do recurso, a questão essencial decidenda é  a seguinte:

Cumulação (i)legal de pedidos e (in)competência material do tribunal para a sua apreciação.

5.

Os factos a considerar são os resultantes do relatório supra.

6.

Apreciando.

6.1.

No rigor dos princípios o cerne da questão e da correspondente decisão, não se coloca em sede da figura jurídica da cumulação de pedidos.

Na verdade apenas estamos perante uma cumulação de pedidos quando o autor, ou o réu, em sede de reconvenção, formula o pedido de reconhecimento simultâneo de duas ou mais pretensões de direito material, sendo o requisito da simultaneidade que a distingue tanto dos pedidos alternativos como dos pedidos subsidiários – cfr. Abílio Neto, Breves Notas ao CPC, 2005, p.137.

Ora no caso vertente não se verifica tal situação.

A requerida não opera uma contra-acção relativamente ao autor, através da formulação relativamente a ele, de um pedido, novo e autónomo; o que, jurídico-processualmente, apenas poderia fazer através de reconvenção.

Antes se limitando a operar uma mera defesa perante o pedido contra ela formulado pelo requerente.

 A qual desdobrou em duas vertentes, uma de cariz processual e outra de índole material, a saber: o erro na forma do processo quanto ao pedido do requerido e a excepção peremptória da compensação.

A questão tem, pois, de ser apreciada e dilucidada no âmbito desta defesa por invocação da excepção  peremptória de natureza material que é a compensação.

Ou seja, se esta se apresenta, ou não, admissível, por estarem, ou não, presentes os seus requisitos, quer na vertente processual/adjectiva estrita, quer na optica  da natureza deste processo e do seu objecto definido pelo pedido formulado pelo requerente e do possível e adequado meio de defesa da própria pretensão da requerida.

6.2.

 «A compensação traduz-se fundamentalmente na extinção de duas obrigações, sendo o credor de uma delas devedor na outra, e o credor nesta última devedor na primeira. É, assim, um encontro de contas, que se justifica pela conveniência de evitar pagamentos recíprocos» - Almeida Costa in Direito das Obrigações, Almedina, 3ª ed. p.797

Para que a compensação possa ser invocada é necessário, que estejam presentes os seguintes requisitos:

1º - A existência de dois créditos recíprocos entre duas pessoas;

2º - A exigibilidade do crédito do autor da compensação;

3º- A não procedência, contra ele, de excepção, peremptória ou dilatória, de direito material;

4º- Que as obrigações sejam fungíveis e da mesma espécie e qualidade;

5º - A não exclusão da compensação pela lei;

6º - A declaração da vontade de compensar - artº 848º.

No caso vertente as dúvidas que se podem colocar concernem aos pressupostos 2º e 3º.

6.2.1.

Quanto aquele importa ter presente que «Para que o devedor se possa livrar da obrigação por compensação, é preciso que ele possa impor, nesse momento ao notificado a realização coactiva do crédito que se arroga contra este…diz-se judicialmente exigível a obrigação que, não sendo voluntariamente cumprida, dá direito á acção de cumprimento e à execução do património do devedor…o declarante não pode livrar-se de uma obrigação civil, invocando como compensação um crédito natural sobre o credor ou um crédito (civil) ainda não vencido» - Antunes Varela, Das obrigações em Geral, 2ª ed. 2º Vol.p.168.

Na verdade são requisitos do instituto a exigibilidade, em sentido forte (não mera expectativa, nem resultante de obrigação natural), do contra – crédito – Ac. do STJ de  11.01.2011, dgsi.pt, p. 2226/07 – 7TJVNF.P1.S1

Ou seja, pode não ser exigível que o contra-crédito do compensante esteja já reconhecido por sentença transitada em julgado. Mas também não é suficiente que ele o invoque de ânimo leve e sem uma fundada probabilidade da sua existência e reconhecimento.

No caso vertente a requerida invocou a compensação com discriminação adequada e suficiente das obras efectuadas na casa e dos respectivos custos.

O requerido, notificado da contestação, apenas se pronunciou quanto ao erro na forma do processo.

Assim sendo é de concluir que o credito é exigível, porque reconhecido, para o efeito de admissão da compensação.

6.2.2.

Quanto a este é de notar que as excepções impedientes são as de direito material, ou seja, não as de direito processual mas apenas as perspectiváveis em sede de direito substantivo.

Neste conspecto as excepções peremptórias são aquelas que levam à improcedência definitiva da acção porque o direito não existe nem pode vir a existir. É o caso da prescrição.

As dilatórias impedem que a acção possa ser desde logo julgada, por lhe faltar algum requisito material, podendo, porém, vir a ser julgada mais tarde porque o direito, apesar de não existir ou não ser exercitável no momento, pode vir a ter existência ou exercitabilidade. É o caso da exceptio non adimpleti contractus ou do direito de retenção – cfr. MJ Almeida Costa, Direito das Obrigações, 3ª ed. p.799 e Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, p.132.

No caso vertente nenhuma destas excepções foi invocada, pelo que, também aqui se encontra preenchido este requisito.

6.3.

Todavia, apesar de as excepções de natureza adjectiva ou processual «não impedirem a compensação em si», elas, em certos casos, podem «obstar à sua alegação em juízo» - cfr. MJ Almeida Costa, ob. e loc. cits, nota (3).

Ora de entre estas excepções pode vislumbrar-se, tal como se aduziu na decisão recorrida – mas com outros fundamentos – o erro na forma do processo.

Assim importa apurar se ao pedido de fixação da renda e à invocação da compensação com os motivos para esta invocados pela requerida correspondem processos e tramitações compatíveis.

No que concerne ao pedido de fixação de renda ele subsume-se num processo de jurisdição voluntária em que os princípios do inquisitório sobreleva e em que a decisão pode ser ditada com postergação de critérios de legalidade estrita e com o chamamemto de critérios de oportunidade e conveniência, podendo elas ser alteradas pelo surgimento de circunstancias supervenientes – artºs  1413º e 1409º a 1411º do CPC.

Já quanto ao pedido de compensação alcança-se, desde logo, em tese geral e em princípio, como expendido na decisão sub sursis, a acção declarativa, de condenação, com processo comum.

Mas no caso vertente e porque o contra-credito invocado pela opoente se reporta a um bem imóvel que pertenceu ao casal, que entretanto se divorciou e em que inexistiu ainda partilha - a qual, judicial ou extrajudicialmente, tem de ser efectuada-, a sede e local próprio para invocar tal credito é precisamente esta partilha.

Como, no despacho, a final, e bem, se aventou, posto que apenas a título residual e subsidiário e colocando tal na disponibilidade das partes.

Mas este é precisamente, o quid fulcral da questão, ou seja, a pretensão de compensação tem de ser colocada precisamente em sede de partilha e, em princípio,  necessáriamente, que não facultativamente

Na verdade se a partilha se concretizar extrajudicialmente, ou seja, por acordo dos interessados,  o presente problema do erro na forma do processo nem se coloca.

Mas se, como se indicia, as partes deitarem mão do processo de inventário – a tramitar  ainda  e em princípio, segundo as regras dos artºs 1326º e sgs. do CPC ex vi do artº 1404º nº3  pois que a nova lei que regula sobre esta matéria ainda não entrou em vigor – já se pode concluir pela existência de erro na forma do processo.

Restando aferir se, não obstante, existe similitude e compatibilidade bastantes entre as duas formas de processo que permitam um aproveitamento dos presentes autos, se necessário com a adaptação dos actos processuais nele previstos ou até com a pratica de outros porventura necessários, para a admissão e julgamento da defesa por compensação com os fundamentos aduzidos pela requerida – cfr. artº 199º do CPC.

E a resposta é negativa.

Na verdade estamos perante dois processos totalmente díspares, quer quanto à sua natureza, quer quanto ao seu iter processual.

Assumindo-se cada um deles como um processo especial com as suas especificidades próprias e intrínsecas.

 Um processo de inventário para separação de meações nada, ou muito pouco, tem a ver com um processo de jurisdição voluntária para fixação de renda por uso de casa de morada de família.

Nesta conformidade a questão não passa pela incompetência material do tribunal, como decidido a final, no despacho.

Primeiro porque, na lógica dos seus fundamentos, que se centraram na ilegalidade de cumulação de pedidos, a absolvição da instancia teria de ser decretada com base nesta excepção dilatória  inominada.

Segundo porque, conforme se viu tendo o credito invocado na compensação de ser reclamado em inventario, para este cobra ainda competência o tribunal de família – artº 114º al.d) da lei 52/2008 de 28.08.

6.4.

Nem relevando a posição da recorrente quando afirma que: não faz sentido propor uma nova acção, iniciando-se um novo processo totalmente autónomo, somente para ser apreciada uma excepção peremptória de compensação, excepção esta directamente ligada com a Casa de Morada de Família, e que em tudo se relaciona com o presente processo de jurisdição voluntária.

Em primeiro lugar porque, como se viu, o crédito invocado, ainda que reportado à casa que foi de morada de família, não se relaciona com o presente processo de jurisdição voluntária, mas antes com a partilha do acervo patrimonial do casal.

Não pode, destarte, afirmar-se que entre ele e o pedido do requerente exista uma relação de conexão ou, até, de complementaridade, acessoriedade ou dependência que imponham, ou, até, justifiquem e permitam uma tramitação conjunta.

Em segundo lugar porque o objecto da presente lide é muito definido e singelo: fixação do valor da renda.

Ora como supra se expendeu, não sendo obrigatório a questão da exigibilidade do credito, bem como a sua existência e validade, estejam total e definitivamente definidas,  estas questões «podem ser objecto de controvérsia e de acertamento no quadro de apreciação do próprio pedido» - Remédio Marques in Acção Declarativa à Luz do Código revisto, 2007, p.303.

O que, obviamente iria complexizar e, seguramente, retardar a prolação da decisão final.

 E sendo certo que este prejuízo, versus o defendido pela recorrente, não seria compensado pela  invocada vantagem da apreciação conjunta das duas pretensões

É que elas se alcançam como autónomas e distintas, tanto assim que relativamente às mesmas regem, como se viu, regras processuais e processados específicos e com efeitos diversos.

Improcede o recurso.

6.

Sumariando.

Em processo de jurisdição voluntária, para fixação de renda pelo uso da casa de morada de família - artº 1413º do CPC - não pode ser deduzida, pelo requerido, na oposição, a excepção peremptória da compensação com fundamento em despesas de conservação tidas com tal casa, pois que estas representam um crédito a invocar em sede de partilha de tal bem, ainda não efectivada, existindo assim erro na forma do processo e não podendo nem devendo aquele processo ser aproveitado porque, atenta a especificidade das suas normas, os processos são incompatíveis pelo seu iter, natureza e  efeitos.

7.

Deliberação.

Termos em que se acorda, posto que com fundamentos parcialmente diversos dos plasmados na decisão recorrida, julgar improcedente o recurso e, consequentemente, confirmar o decidido.

Custas pela recorrente.


Carlos Moreira ( Relator )
Moreira do Carmo
Alberto Ruço