Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2783/03.7TBCTB.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARVALHO MARTINS
Descritores: SEGURO DE VIDA
SEGURO DE GRUPO
CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS
CONTRATO DE ADESÃO
DEVER DE INFORMAR
COMUNICAÇÃO
ÓNUS DA PROVA
DANOS
Data do Acordão: 03/27/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: CASTELO BRANCO 2º J
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional:
ARTS.227, 334, 762, 806 CC, 427 C COM, DL Nº176/95 DE 26/7, DL Nº 446/85 DE 22/10, DL Nº 72/2008 DE 16/4, DL Nº 222/2009 DE 11/9
Sumário: 1. Estando perante uma situação de seguro de grupo em que é invocada a existência de uma cláusula contratual geral e a sua não comunicação prévia e respectiva explicação do teor a um aderente, o ónus da prova relativamente a tal facto impende sobre o tomador do seguro, de acordo com a repartição do ónus da prova - artigo 4.° do Decreto-Lei 176/95, de 26.Julho - artigo 78.° do DL 72/2008, de 16 de Abril (com o mesmo âmbito do anterior) e pelo artigo 342.° do Código Civil.

2. O contrato de seguro de grupo que tenha um clausulado elaborado apenas pela Ré Seguradora, e em que o Banco tomador apenas assume o papel de intermediário, no caso, para a aceitação deste contrato pelos aderentes ao Seguro de Grupo, e em que os aderentes nada possam opor e/ou modificar nesse clausulado, deve qualificar-se como um contrato de adesão, sendo regido pelo conjunto de normas que se aplicam a este tipo de contratos, entre os quais, o Decreto-Lei 446/85, de 25 de Outubro (com as alterações entretanto introduzidas pelos Decretos-Leis 220/95, de 31 de Agosto e 249/99, de 07 de Julho).

3. Apesar de impender sobre o Banco, enquanto tomador do seguro, a obrigação geral de comunicação e explicação das cláusulas do contrato, essa obrigação não desonera a Seguradora de cumprir a sua obrigação de comunicar e explicar as condições gerais do contrato de seguro de grupo ao aderente, uma vez que ela é a responsável primeira por essa comunicação no âmbito dos contratos de adesão, conforme decorre do artigo 5.° do DL 446/85, acima citado.

4. Celebrado um contrato de seguro de grupo contributivo (seguro de vida, associado a um crédito à habitação, sendo mutuário uma pessoa singular), com recurso ao uso de cláusulas contratuais gerais, às quais o segurado se limitou a aderir, pode convocar-se para a resolução do litígio o regime jurídico instituído pelo Dec. Lei 446/85, de 25/10, com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei 220/95, de 31/08 e Dec. Lei 249/99 de 07/07.

5. O art. 4º do Dec. Lei 176/95 de 26/07 (com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei 60/2004 de 22 de Março) tem especialmente como destinatários a instituição bancária e a seguradora, definindo a cargo de quem — entre o tomador de seguro e a seguradora — fica o dever de informação sobre as coberturas abrangidas, as cláusulas de exclusão etc; A ratio do preceito foi dirimir eventuais conflitos entre estas duas entidades, estabelecendo uma norma delimitadora susceptível de derrogação por aquelas partes (n°4 do preceito), sendo o segurado alheio a esta equação, relevando ainda o preceito porquanto dele se infere, por um raciocínio de exclusão, que não é ao segurado que incumbe o ónus de alegação e prova da ausência de comunicação.

6. Não se provando a comunicação de uma cláusula do contrato de seguro, alusiva ao âmbito da cobertura, não pode a seguradora prevalecer-se daquele normativo (art 4º do Dcc. Lei 176/95) para, perante o segurado, se ilibar ao pagamento do capital seguro — o que não impede que o possa fazer perante a entidade bancária, beneficiária da prestação.

7. O devedor está obrigado não só ao que expressamente se estipulou mas também ao que decorra do convencionado segundo a regras da boa fé (art. 762.°, n.° 2, Código Civil), designadamente, aos deveres secundários destinados a salvaguardar o direito do credor, como deveres de guarda, de vigilância, comunicação e correspondência, etc. com a finalidade de assegurar o cumprimento integral da prestação principal.

8. Os danos contratuais patrimoniais são reparáveis quando a parte adimplente suportou uma verdadeira e grave lesão no seu próprio património, como também aconteceria se os juros peticionados e devidos, em causa, não respeitassem abrangente e integralmente ao que o Banco recebeu dos mutuários depois do óbito, reportados a um tempo em que, por força das circunstâncias, se tornou devedor.

9. Nas obrigações pecuniárias, a presunção de danos causados pela mora é uma presunção juris et de jure, não tendo o credor de provar nem a existência de danos, nem o nexo causal entre os danos indemnizáveis e o facto ilícito da mora.

Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A Causa:

Autores (AA.)

H (…)

N (…)

L (…)

Rés (RR.)

A (…) – Banco (…), S.A.», hoje «M (…)

(…), S.A.»,

«B (…) – Seguros de Vida, S.A.», hoje, «O (…)– Companhia de

Seguros de Vida, S.A.»

«Banco (…), S.A.»

«A (…)– Cuidados Médicos, Ldª»

*

Relatório:

H (…) e seus filhos, N (…) e L (…), propuseram a presente acção, com processo ordinário, contra “A (…)– Banco (…), SA”, “O (…) Companhia de Seguros Vida, SA – Grupo Banco (…)”, e “A (…)– Cuidados Médicos, Ldª”, pedindo que, na sua procedência, sejam condenados, o primeiro e o segundo réus, a reconhecer a efectivação do contrato de seguro de vida celebrado com a autora H (…) e o seu falecido marido, e, em consequência, o segundo réu a liquidar o capital segurado, no valor de 86.541,43€, sendo que, deste montante, o segundo réu deve liquidar, perante a primeira autora, o capital em dívida relativo ao contrato de mútuo com hipoteca, à data do falecimento do marido desta, no montante de 75.071,79€, e o remanescente, no quantitativo de 11.469,64€, aos ora autores, acrescido de juros, desde 4 de Julho de 2002, à taxa legal, até integral e efectivo pagamento, condenando-se ainda o primeiro réu a restituir todos os montantes entregues pelos autores, a titulo de prestações e respectivos juros de mora, para pagamento dos empréstimos aludidos na acção, desde Agosto de 2003, acrescidos de juros, à taxa legal, até integral e efectivo pagamento, e, subsidiariamente, se assim se não entender, que a R. « A (...) » seja considerada única responsável pela não realização do contrato de seguro de vida em causa, e, por via de tal facto, condenada a pagar as quantias acima referidas, invocando, para o efeito, e, em síntese, a existência de um contrato de seguro de vida celebrado entre o falecido marido da autora, C (…) e “B (…) Seguros de Vida, SA”, que, depois, veio dar origem à ré "O(…) Companhia de Seguros Vida, SA - Grupo (…)", na sequência da fusão entre “O (…)Vida, SA” e “B (…)- Seguros de Vida, SA”.

Não se conformando com a decisão de absolvição das RR. instituições de crédito e seguradora, dela recorreram os AA. de apelação para a Relação de Coimbra, tendo-se aí, por acórdão de 13-5-2008, julgado improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida.

Irresignados com este acórdão, dele recorreram os AA. para o Supremo Tribunal de Justiça, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo.

Decidiu-se nesta última instância anular o julgamento sobre a matéria de facto, devendo os autos regressar à Relação para aí se determinar o que se considerasse útil, no sentido de ser apurado se o electrocardiograma com prova de esforço foi remetido à R. Seguradora e, no caso afirmativo, se ela não notificou o proponente da recusa ou da necessidade de recolher outros esclarecimentos essenciais à avaliação do risco.

A Relação de Coimbra determinou que os autos regressassem à primeira instância, para julgamento, mediante o aditamento de novos factos à base instrutória.

Baixados os autos, teve lugar a reformulação do despacho saneador e a realização da audiência de discussão e julgamento.

Decidida a matéria de facto, não lhe sobrevieram reclamações.

*

Oportunamente, foi proferida decisão onde se consagrou que

“(…) Pelo exposto, decide-se julgar parcialmente procedente a presente acção e, em conformidade, condena-se a R. Seguradora a liquidar à R. «M (…)- Banco (…) S.A.» o montante de €75 071, 79.

Quanto ao remanescente eventualmente pago pelos AA. à R. «M (…) Banco (…) S.A.», determina-se a cessação do seu pagamento e ordena-se a sua restituição àqueles, acrescido de juros à taxa legal (não comercial), remetendo-se para liquidação posterior o respectivo apuramento, nos termos do art. 661º, n.º 2 do C.P.Civil.

*

Custas provisoriamente a cargo das RR. instituições de crédito («M (…) S.A.» e «Banco (…), S.A.») e seguradora («O (…) – Companhia de Seguros de Vida,

S.A.»), a concretizar no incidente de liquidação”.

O Banco (…), S.A., nos autos de acção ordinária à margem referenciados em que litiga contra H (…), notificado da sentença de fls..., não se conformando com a mesma na parte em que o condena na restituição com juros das quantias que recebeu a coberto do mútuo acima do valor em dívida à data do óbito do mutuário, dela veio interpor recurso de apelação, alegando e concluindo que:

1 Enquanto a Seguradora O (…) não aceitou, pelas razões que sustentou no processo, assumir o sinistro do óbito de um dos mutuários do Banco, o empréstimo a que os autos se reportam continuou em vigor entre as partes, com a consequente obrigação, por banda dos Recorridos, de efectuarem o pontual pagamento das prestações do mútuo;

2 O que os Recorridos foram pagando ao Banco desde a data do óbito do mutuário marido, correspondeu, assim, ao pontual pagamento de prestações que tinham a seu cargo satisfazer no âmbito do contrato de mútuo celebrado e não é por a Seguradora ter recusado o sinistro que o que o Banco recebeu no calendário próprio das prestações contratualmente acordadas foi indevidamente recebido pelo Banco;

3 O que o Banco recebeu dos mutuários depois do óbito, recebeu-o legitimamente ao abrigo do contrato que lhe conferia o correspondente crédito: a obrigação de restituição apenas nasce com a sentença que condenou a Seguradora à existência do Seguro e, consequentemente, à liquidação do mútuo ao Banco por referência ao capital que estava em dívida à data do óbito.

4 Se a obrigação só nasce com a sentença, não pode condenar-se o Banco no pagamento de juros reportados a um tempo em que não era devedor, porque ainda não existia a obrigação de restituição.

5 Decidindo como decidiu a sentença recorrida, violou, entre outros, o disposto nos art°s 762° e 806° do Cód. Civil.

**

O (…) Companhia Portuguesa de Seguros de Vida, S. A. R. nos Autos à margem referenciados, tendo sido notificada da Sentença de fls... e não se conformando com a mesma, veio interpor recurso de Apelação, alegando e concluindo que:

1. O contrato de seguro subjacente aos presentes Autos é um contrato de seguro de grupo.

II. No qual figura como tomador de seguro o Banco (…) S.A.

III. Resulta expressamente do artigo 17.° do Decreto — Lei n.° 176/95, de 26 de Julho, que só «No caso de seguros individuais em que o tomador seja uma pessoa física (...) considera-se que, decorridos 15 dias após a recepção da proposta de seguro sem que a seguradora tenha notificado o proponente da aceitação, da recusa ou da necessidade de recolher esclarecimentos (...) o contrato considera-se celebrado nos termos propostos.».

IV. O contrato de seguro dos Autos não é um seguro individual, mas sim um seguro de grupo.

V. O tomador do seguro do contrato de seguro dos Autos não é uma pessoa física, mas sim uma pessoa colectiva.

VI. O artigo 17.° do Decreto — Lei n.° 176/95, de 26 de Julho não é aplicável ao caso dos Autos.

VII. Pelo que, a aceitação tácita da proposta de seguro subscrita pelo marido da Apelada não é aplicável ao caso dos Autos.

VIII. É esta a posição correspondente à letra da lei e a que tem vindo a ser tomada pela jurisprudência nacional.

IX. A Sentença recorrida violou, por isso, o disposto nos artigos 426.° do Código Comercial e 17.° do Decreto-Lei n.° 176/85, de 26 de Julho.

Por outro lado,

X. Dos factos Assentes dos Autos, sob a alínea Y) constava o seguinte facto: «A Ré O (...)em 03-07-1998, solicitou o envio do exame médico, correspondente a um E. C. G. com prova de esforço.».

XI. Como tal, não ocorreu qualquer aceitação [ ou expressa] da proposta de seguro dos Autos, na sequência do segundo electrocardiograma remetido à Apelante.

XII. «(...) em 1998, em Castelo Branco, não dispunham os centros de diagnóstico clínico de passadeiras motorizadas para aferição da prova de esforço, limitando-se o exame à subida e descida de escadas.»

XIII. «(...) o electrocardiograma datado de 26.06.1998 o foi com prova de esforço, mas não nos termos em que a companhia de seguros pretendia.».

XIV. Como tal, porque a proposta de seguro não dispensa a aprovação ou aceitação da seguradora, sob pena de não equivaler à respectiva apólice, no caso dos Autos, em que não houve aceitação da proposta subjacente aos mesmos, terá de se concluir pela inexistência de contrato de seguro no qual o marido da Apelada H (...) figurasse como pessoa segura.

XV. Inexiste, por isso, qualquer Certificado de Seguro em que o marido da Apelada figure como pessoa segura — como existe no caso da Apelada H (...) - ou, tão-pouco, o pagamento por parte deste dos respectivos prémios de seguro.

XVI. Pelo que, também neste ponto, o Tribunal “a quo” violou o disposto nas disposições legais já acima referidas.

H (…) e outros, notificados das alegações dos recorrentes, Recorrente O (…) — Companhia Portuguesa de Seguros de Vida, S.A., vieram apresentar as suas contra-alegações, que pugnaram pela improcedência do recurso interposto.

II. Os Fundamentos:

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

São ocorrências materiais com interesse para a decisão da causa que:

A)

A co-A. H (…) é viúva, tendo contraído casamento em 26 de Setembro de 1976, com C (…)

B)

Dessa união, nasceram dois filhos, os outros dois co-AA..

C)

Os AA. são os únicos herdeiros de C (…).

D)

Em 18 de Agosto de 1998, foi celebrado o contrato de mútuo com hipoteca entre C (…) e mulher, primeira co-A, e o «Banco (...), S.A.».

E)

Tal contrato foi celebrado para efeitos de beneficiação do imóvel sito na Quinta (...), na freguesia da (...), concelho de Castelo Branco.

F)

Tal empréstimo foi no valor de 10 milhões de escudos.

G)

Simultaneamente, foram concedidos à co-A. H (...) e ao seu marido dois empréstimos no montante de 5 400 000$00 e outro no valor de 1 950 000$00, que se destinavam ao pagamento do crédito existente noutra instituição bancária.

H)

Em 4 de Julho de 2002, faleceu o marido da A. H (…).

I)

Para a celebração dos contratos mencionados de D) a G), da matéria assente, foi exigido à ora A. H (…) e seu marido o respectivo seguro de vida, garantisse o pagamento dos mesmos no caso de morte de qualquer dos mutuários.

J)

Para aceitação do referido contrato de seguro de vida, foi-lhes solicitado pela «B (…)-Seguros de Vida, S.A.» a realização de vários exames médicos.

K)

Após a realização desses exames, foi requerido apenas ao marido da A. H (…) a realização de um outro exame.

L)

A «A (…) – (...), S.A.» indicou a «B (…) – Seguros de Vida, S.A.» para celebração do seguro de vida aludido em I).

M)

Em Outubro de 2000, a « B (...) – Seguros de Vida, S.A.» fundiu-se com a «O (…)Vida, S.A.».

N)

Por carta enviada pela B (…) Seguros Vida, S.A., datada de 12 de Outubro de 2000, foi comunicada ao marido da ora A. H (…), bem como a esta, a fusão entre a «O (…) Vida, S.A.» e a «B (…) Seguros de Vida, S.A.».

O)

Na qual informou os seus clientes, titulares de Seguros de Vida, o seguinte: “Estando o Instituto de Seguros de Portugal neste momento a proceder à consulta de todos os nossos segurados, com base nos elementos de identificação de V. Exª, que lhe fornecemos, parece-nos justificado fazer a presente comunicação, para lhe transmitir directamente o contexto de tal operação.”

P)

Também, por carta dirigida, apenas, ao marido a ora A. H (…), pelo Instituto de Seguros de Portugal, foi-lhe comunicada essa mesma fusão.

Q)

Informando-o de que se poderia opor-se a tal transferência de carteira de seguros, “onde se inclui o contrato celebrado com V.Ex.ª”

R)

Afirmando “por se tratar de uma transferência de carteira de seguros do Ramo Vida, o Instituto de Seguros de Portugal deve proceder à consulta aos

segurados”.

S)

Em 02 de Junho de 1998, pela A. H (…) e pelo seu marido foi subscrita uma proposta de um seguro do ramo vida associado a um crédito imobiliário, o que foi recepcionado nas instalações da R. «O (…)», tendo o seu departamento clínico procedido Iogo à analise da situação clínica dos proponentes.

T)

O assente na alínea P) dos factos assentes foi-o por o marido e pai dos AA. já haver contratado com a «B (…) – Seguros de Vida, S.A.» um seguro associado a um crédito pessoal a que correspondeu a apólice n.º 09485244.

U)

Depois de analisada a situação clínica da A., H (..), e do seu marido, e dos exames médicos enviados pelos proponentes, a Ré Seguradora concluiu pela aceitação da proposta de seguro relativamente à segunda proponente, a aqui A..

V)

O electrocardiograma em repouso e as análises, tudo realizado pelo marido da A., em 26 de Maio de 1998 e 25 de Maio de 1998, respectivamente, a solicitação da R. «B (…)– Seguros de Vida, S.A.», foram encaminhados para esta, pela «A (…)– Cuidados Médicos, Lda.», que os facturou.

W)

Por carta datada de 22 de Junho de 1998, a Ré Seguradora informou o marido da A. que a sua proposta de seguro continuava em análise, pois eram necessários esclarecimentos adicionais para avaliar o risco que seria assumido.

X)

O exame médico complementar que os serviços clínicos da ora Ré necessitavam para avaliar do risco que eventualmente seria assumido relativamente ao 1 ° proponente, marido e pai dos AA., era um E.C.G. com prova de esforço.

Y) (1)

Foi a R. «A (…) – (...), S.A.» quem indicou à A. e seu marido o «Centro Médico de Castelo Branco», para ali realizarem os exames aludidos em J).

EE)

O referido electrocardiograma com prova de esforço foi facturado à «B(..) Seguros de Vida, S.A.».

FF)

O electrocardiograma com prova de esforço realizado pelo marido da A. em 26.06.1998, foi recebido pela «B(…) – Seguros de Vida, S.A.».

GG)

Após a realização do referido electrocardiograma com prova de esforço, os resultados foram enviados para «B (…)-Seguros de Vida, S.A.», que os recebeu.

HH)

A Ré «O(…)l», em 03 de Julho de 1998, solicitou o envio do exame médico, correspondente a um E.C.G. com prova de esforço.

II)

A Ré «O(…)», em 08 de Julho de 1998, informou a Ré «A (…) – (...), S.A.» nos seguintes termos:

“Informamos a aceitação do seguro de vida crédito a habitação de 1º Titular: C (…)

2º Titular: H (…) Conta DO n.º (...) Prop n.º (...)Capital 17 350 000, 00 PTE Aceite a 98.07.08 apenas para a Sra. D. (…)”.

JJ)

O certificado individual de seguro n.º (...) , respeitante à apólice do ramo vida n.º 00000310, sendo o capital seguro de 17 350 000, 00 PTE, foi emitido em nome da A. (…).

KK)

A capear o referido Certificado Individual, a Ré «O (…) enviou uma carta dirigida apenas à A. H (…), com o seguinte teor: “Vimos pela presente remeter a V. Exa. o Certificado Individual n.º (...) com as respectivas Condições Gerais, referente ao seguro do Ramo Vida associado ao CRÉDITO HABITAÇÃO (…)”.

LL)

Em carta datada de 24 de Janeiro de 2003, a R. « O (...)l» remeteu à A. carta com o seguinte teor: “Ass.: Seguro Vida – Crédito Imobiliário Proposta (...)1º Titular: C (…) 2º Titular: H (…)

Exma. Senhora,

Temos presente a solicitação de V. Exa. a qual mereceu a nossa melhor atenção.

Nesse sentido, informamos que o seguro de vida associado ao crédito imobiliário, apenas foi aceite em nome de V. Exa., dado que, relativamente ao 1º titular, os exames médicos apresentados não foram considerados suficientes pela nossa Direcção Clínica, tendo sido solicitado novo ECG com prova de esforço, em 03.07.1998, que nunca foi enviado.

Mais informamos que foi oportunamente transmitido ao Banco (...) que a apólice n.º (...) seria emitida apenas em

nome de V. Exa. (…)”.

MM)

À data da morte do marido e pai dos AA., eram devidos à «B (…) Seguros de Vida, S.A.» €75 071, 79.

NN)

Em 11 de Outubro de 2002, a A. escreveu ao «A (…) – (...), S.A.» para lhe solicitar informações e esclarecimentos relativos ao dito seguro de vida.

OO)

Tendo sido comunicado pela R. «A(…) », por carta datada de 14 de  Outubro de 2002, que foi solicitada ao marido da A. H (…) a realização

de electrocardiograma com prova de esforço.

PP)

E que este nunca o tinha apresentado.

QQ)

E que, como consequência de tal facto, o seguro de vida do marido da A. H (…) não tinha sido aceite.

Nos termos do art. 684°, n°3, e 690°,n°1, do CPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n°2, do art. 660°, do mesmo Código.

*

As questões suscitadas consistem em apreciar (no recurso da O (...)— Companhia Portuguesa de Seguros de Vida, S. A. R.), no seu referencial de matriz, se:

I. O contrato de seguro subjacente aos presentes Autos é um contrato de seguro de grupo.

II. No qual figura como tomador de seguro o P (...) S.A.

III. Resulta expressamente do artigo 17.° do Decreto — Lei n.° 176/95, de 26 de Julho, que só «No caso de seguros individuais em que o tomador seja uma pessoa física (...) considera-se que, decorridos 15 dias após a recepção da proposta de seguro sem que a seguradora tenha notificado o proponente da aceitação, da recusa ou da necessidade de recolher esclarecimentos (...) o contrato considera-se celebrado nos termos propostos.».

IV. O contrato de seguro dos Autos não é um seguro individual, mas sim um seguro de grupo.

V. O tomador do seguro do contrato de seguro dos Autos não é uma pessoa física, mas sim uma pessoa colectiva.

VI. O artigo 17.° do Decreto — Lei n.° 176/95, de 26 de Julho não é aplicável ao caso dos Autos.

VII. Pelo que, a aceitação tácita da proposta de seguro subscrita pelo marido da Apelada não é aplicável ao caso dos Autos.

VIII. É esta a posição correspondente à letra da lei e a que tem vindo a ser tomada pela jurisprudência nacional.

IX. A Sentença recorrida violou, por isso, o disposto nos artigos 426.° do Código Comercial e 17.° do Decreto-Lei n.° 176/85, de 26 de Julho.

Por outro lado,

X. Dos factos Assentes dos Autos, sob a alínea Y) constava o seguinte facto: «A Ré O (...) em 03-07-1998, solicitou o envio do exame médico, correspondente a um E. C. G. com prova de esforço.».

XI. Como tal, não ocorreu qualquer aceitação [ ou expressa] da proposta de seguro dos Autos, na sequência do segundo electrocardiograma remetido à Apelante.

XII. «(...) em 1998, em Castelo Branco, não dispunham os centros de diagnóstico clínico de passadeiras motorizadas para aferição da prova de esforço, limitando-se o exame à subida e descida de escadas.»

XIII. «(...) o electrocardiograma datado de 26.06.1998 o foi com prova de esforço, mas não nos termos em que a companhia de seguros pretendia.».

XIV. Como tal, porque a proposta de seguro não dispensa a aprovação ou aceitação da seguradora, sob pena de não equivaler à respectiva apólice, no caso dos Autos, em que não houve aceitação da proposta subjacente aos mesmos, terá de se concluir pela inexistência de contrato de seguro no qual o marido da Apelada H (…) figurasse como pessoa segura.

XV. Inexiste, por isso, qualquer Certificado de Seguro em que o marido da Apelada figure como pessoa segura — como existe no caso da Apelada H (...) - ou, tão-pouco, o pagamento por parte deste dos respectivos prémios de seguro.

XVI. Pelo que, também neste ponto, o Tribunal “a quo” violou o disposto nas disposições legais já acima referidas.

Apreciando, diga-se - liminarmente, e mais uma vez - que a questão(ões) que aqui ganha(m) perfil se encontra(m) largamente tratadas em jurisprudência firmada, em termos, também, de dominância decisória. A tal respeito, haverá de convocar-se o perfil dela(s) constituído. Fazendo-o, consigne-se, pressuponentemente (tal como, em essência, feito no Ac. da Relação do Porto, de 12.04.2010, em www.dgsi.pt), que:

 «sendo o seguro de grupo um contrato de seguro deve ser-lhe aplicável, em primeira linha, a legislação relativa a seguros. Na verdade, o seguro de grupo não tinha regulamentação autónoma no nosso quadro legal estando apenas definido no artigo 1 aI. g), do Dec. Lei n.° 176/95, de 26 de Julho, diploma este no qual eram estabelecidas algumas regras específicas (cfr. artigo 4º do mesmo diploma).

Deste modo ao seguro de grupo aplicam-se as regras específicas do ramo que estiver em causa e, como se trata de um contrato, aplicam-se as regras gerais dos contratos.

No entanto, verifica-se a «necessidade de tomar em linha de conta as especificidades do seguro de grupo e, quer por via da interpretação que permita encontrar soluções razoáveis, quer por via da exclusão de aplicação de normas que não sejam compatíveis com a figura do seguro de grupo, terá de se encontrar o seu regime jurídico» [De sublinhar, ainda, que, segundo o artigo 427° do Código Comercial, o contrato de seguro regula-se pelas disposições da respectiva apólice não proibidas por lei e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições desse Código, sendo certo que a apólice é o documento que titula o contrato celebrado entre o tomador do seguro e a seguradora e é integrado pelas condições gerais, especiais e particulares acordadas. Além disso, estando em causa um contrato de seguro enquanto contrato de adesão, é inequívoco que teremos que atender também ao Regime Geral das Cláusulas Contratuais Gerais.

Considerando que os contratos de seguro, sendo contratos de natureza formal, são inequivocamente contratos de adesão, estão como tal sujeitos ao regime instituído pelo Dec. Lei 446/85, de 22 de Outubro. Lembre-se que, mesmo após as alterações introduzidas nesse Decreto-Lei em 1995, em 1997 e em 2001, nunca o legislador incluiu nas excepções previstas no artigo 3° a aplicação do regime das cláusulas contratuais gerais aos contratos de seguro. Nem se diga, como já se pretendeu, designadamente as seguradoras, que as cláusulas inseridas nas apólices se encontram abrangidas pela alínea a) do artigo 3° desse Diploma.

Na verdade, o facto de haver controle «prévio por parte do Instituto de Seguros de Portugal do clausulado dos seguros obrigatórios não subtrai, actualmente, esses contratos ao regime do DL n.° 446/85, de 25-10» Em nossa opinião, tais cláusulas não constituem uma cláusula típica aprovada pelo legislador e, como tal, afastada do âmbito de aplicação do Dec. Lei 446/85 (cfr. o seu artigo 3°, aI. a). As apólices, que não são em si mesmas o contrato de seguro apenas o traduzindo, apesar de aprovadas pelo Instituto de Seguros de Portugal, não são, nem constituem cláusula típica aprovada pelo legislador. Este, se pretendesse afastar do âmbito de aplicação do Dec. Lei 446/85 os contratos de seguro, certamente o teria dito de forma expressa e inequívoca.

Assim, entendemos que o regime de tal Decreto-Lei é aplicável claramente aos contratos de seguro.

Ora, dispõe o artigo 1°, no seu n.° 1 do DL 446/85, (com as alterações que lhe foram introduzidas pelo DL 220/95, de 31.8, e pelo DL 249/99, de 7.7) que são cláusulas contratuais gerais aquelas que são elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem a, respectivamente, subscrever ou aceitar. E no seu n.° 2 prescreve que o presente diploma aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar, acrescentando o seu n.° 3 que, incumbe àquele que pretende prevalecer-se do seu conteúdo, provar que aquela resultou de negociação prévia entre as partes.

Nos termos do art.° 5° n.° 1 do mesmo diploma, as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las, comunicação esta que deve ser realizada de modo adequado para que se torne possível o seu conhecimento por quem use de comum diligência, (n.° 2 do mesmo preceito). Acrescenta o n.° 3 desse artigo 5° que o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas gerais.

Por outro lado, para além de tal comunicação, deve o contraente que a estas cláusulas recorra, informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos, (art.° 6° do diploma em causa). Resulta, ainda, da alínea a) do art.° 8° do diploma referido, que são excluídas dos contratos singulares, as cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do artigo 5°, tal como são excluídas, de acordo com a sua alínea b), as cláusulas comunicadas com violação do dever de informação, de molde a que não seja de esperar o seu conhecimento efectivo.

No que respeita à interpretação e integração das cláusulas contratuais gerais deveremos atender ao disposto no artigo 10.° do diploma em análise, nos termos do qual “as cláusulas contratuais gerais são interpretadas e integradas de harmonia com as regras relativas à interpretação e integração dos negócios jurídicos, mas sempre dentro do contexto de cada contrato singular em que se incluam”.

Por vezes, as cláusulas constantes de um determinado contrato não são claras e precisas pelo que, relativamente às cláusulas ambíguas, o artigo 11.° do diploma em análise, estatui que:

«1- As cláusulas contratuais gerais ambíguas têm o sentido que lhes daria o contratante indeterminado normal que se limitasse a subscrevê-las ou a aceitá-las, quando colocado na posição de aderente real.

2 - Na dúvida, prevalece o sentido mais favorável ao aderente».

Sucede até que, muitas vezes, o tomador do seguro não é uma pessoa individual, um consumidor, mas sim uma pessoa colectiva, designadamente uma sociedade. Ora, em ambas as situações, o tomador do seguro, ainda assim, pode prevalecer-se do regime das cláusulas contratuais gerais porquanto o Decreto-Lei 446/85 não restringe o seu campo de aplicação» (Ac. da Relação do Porto, de 12.04.2010, em www.dgsi.pt.

Em sentido sequencial e convergente, convoque-se, igualmente, o dito no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 27/03/2008, disponível in www.dasi.pt, por sua vez a enunciar, no que, aqui se adequa:

«Aqui chegados, há que tomar em atenção que, de acordo com o n.° 2 do art. 1° do DL 176/95 citado, o ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo e que, nos termos do n.° 2 do art. 5º, o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais.

O que, circunstancialmente, haverá de apreciar-se, uma vez que tal ónus impendia sobre a Seguradora. Não se desconhece a norma inserta no art.° 4°, n°1, do DL 176/95, segundo a qual nos seguros de grupo, cabe ao tomador do seguro prestar aos segurados as coberturas e exclusões contratadas, as obrigações e direitos em caso de sinistro.

Porém, cremos que a falta de cumprimento dessa obrigação por parte do Banco Réu (inequivocamente aqui provada) não é oponível aos autores que para ela não contribuíram nem foram consultados na celebração do dito contrato de seguro de grupo, nos termos agora revelados.

Tratando-se, assim, a nosso ver, de questão a resolver, sempre, no domínio das relações entre as duas RR. recorrentes.

Perante os autores, não tendo a ré seguradora cumprido o aludido dever, acarreta que se considerem excluídas do contrato as referidas cláusulas gerais (art.° 8°).

De resto, quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa-fé — art.° 227° do Código Civil — sendo ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites por ela impostos, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito — art.° 334° do mesmo diploma.

Com o mesmo propósito, cite-se Joaquim de Sousa Ribeiro (“O Problema do Contrato”, pag.550 e seguintes) acerca da aplicabilidade deste princípio da boa-fé em matéria de cláusulas contratuais gerais:

“De norma basicamente comportamental que, a partir da posição originariamente assumida pelas partes, e tendo em conta o evoluir do contexto negocial, orienta a sua conduta com vista à plena realização dos fins relacionais, transforma-se aqui numa norma valorativa daquela posição, fixando os seus limites de validade. Em vez de actuar no interior de uma relação já constituída, modelando integrativa e restritivamente os procedimentos que as partes devem adoptar, na fase da sua execução, a boa-fé incide directamente, neste campo, sobre as estipulações que se propõem determinar o conteúdo contratual. Em posição frontalmente antagónica à autonomia privada, ela constitui-se aqui como uma heteronomia inevitável, pois, independentemente da concreta conduta do utilizador, traça, em abstracto, limites objectivos que ele tem imperativamente que observar como condição de eficácia das cláusulas por si introduzidas no contrato” (sublinhado nosso).

E mais à frente: «Nesta linha, se o que está em causa é avaliar a eficácia de conformações que, respeitando embora os limites gerais da liberdade contratual, se apresentam tipicamente como desvantajosas, em excesso, para uma das partes, surge como natural utilizar como parâmetro de valoração o modelo de uma justa composição de interesses, inferível das normas legais dispositivas, ou construído, na sua falta, “dentro do espírito do sistema” (v., entre nós, o art.° 10°, n°3, do Código Civil), pela entidade judicante. Dispondo desse seguro padrão de referência, ao intérprete caberia ajuizar, com a conveniente margem de liberdade apreciativa, se o afastamento, formalmente pactuado, mas unilateralmente predisposto, desse modelo, desfruta de uma justificação razoável, do ponto de vista dos interesses do beneficiado, não prejudicando, para além disso, de forma desproporcionada, os interesses da contraparte”.

E, citando uma decisão de 04.11.64 do Bundesgerichtshof: “Quem põe em vigor condições gerais dos contratos reivindica para si em exclusivo, no que respeita à conformação do conteúdo, a liberdade contratual. Está por isso obrigado, segundo a boa-fé, já na redacção das condições, a considerar devidamente os interesses dos seus futuros parceiros contratuais. Se fizer valer apenas os seus próprios interesses, abusa da liberdade contratual”.

“O pensamento material que liga, desta forma, a boa fé às CCG repousa no atendimento das peculiaridades deste modo de contratar. Com ele institui-se uma relação de poder, em que o utilizador de CCG se coloca numa posição de supremacia em face de cada um dos seus parceiros contratuais, privando-os da capacidade de comparticipação na modelação do conteúdo” (pag.554).

Este princípio da boa-fé, há-de, assim, orientar o julgador na apreciação da validade da cláusula em concreto invocada, por forma a que, no final, sempre esteja reposto o equilíbrio necessário e juridicamente exigido em qualquer relação contratual.

Para além disso, há que não esquecer que actualmente (como ocorreu no caso concreto), os Bancos beneficiários desses seguros, “agindo como intermediário das seguradoras, no âmbito do fenómeno que designou de “bancassurance” e que definiu como «ligação e colaboração entre Bancos e Companhias de Seguros, para desenvolver sinergias e economias de sistema, já sentidas, ictu oculi, na produção-comercialização de “produtos” concorrentes (seguros de vida, que vencem juros e capitalizam, e depósitos a prazo), “produtos” complementares (seguros de vida para garantia de empréstimos bancários, incluindo o crédito bancário concedido para financiar o prémio único do contrato de seguro de vida ...) ou mesmo “produtos” diversificados (...), asseguram a fonte altamente lucrativa desse vantajoso negócio, a repartir entre ambos (tem sido tornado público que os seguros do ramo vida são os mais rentáveis) e ao nível dos direitos como que esmagam a pessoa individual entre dois “elefantes” (no sentido de que se tratam de duas entidades empresariais de grande poder económico-financeiro). Deste modo, dúvidas não nos restam em como as Rés Seguradora respondem perante a Autora (se tal se vier a demonstrar) pela falta de informação e comunicação, por parte do Banco Tomador.

Mas quais são as consequências da violação deste dever?

Apesar das divergências que têm surgido quanto às consequências da falta de comunicação, temos considerado que a omissão do dever de comunicação não gera a nulidade da cláusula mas sim a sua inexistência. Na verdade, acompanhando o Ac. do STJ de 11.4.2000, podemos afirmar que tanto «a omissão desse dever (quando alegada tenha sido)» como «a não satisfação desse ónus não tornam nula a cláusula mas inexistente» na medida em que se «deve considerar como excluída daquele concreto contrato (art. 8 a) e b) do Dec. Lei 446/85; se a lei não determinasse a sua exclusão do respectivo contrato singular a sanção seria a da sua inoponibilidade ao segurado e não a da nulidade)».

Na mesma senda, deverá consignar-se que, neste quadro,

«as garantias clássicas da liberdade contratual mostram-se actuantes apenas em casos extremos: o postulado da igualdade formal dos contratantes não raro dificulta, ou até impede, uma verdadeira ponderação judicial do conteúdo do contrato, em ordem a restabelecer, sendo caso disso, a sua justiça e a sua idoneidade. A prática revela que a transposição da igualdade formal para a material unicamente se realiza quando se forneçam ao julgador referências exactas, que ele possa concretizar”. O que passa pela concreta verificação dos requisitos de integralidade, adequação e tempestividade, supra enunciados. Trata-se de desenvolver uma actividade razoável, que permita ao consumidor mediano, em circunstâncias normais, abstractamente, ter a percepção dos termos do contrato e das obrigações que vai contrair, ou seja, de todos os elementos constitutivos do negócio. “O dever de comunicação é uma obrigação de meios: não se trata de fazer com que o aderente conheça efectivamente as cláusulas, mas apenas de desenvolver, para tanto, uma actividade razoável. Nessa linha, o n°2, esclarece que o dever de comunicação varia, no modo da sua realização e na sua antecedência, consoante a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas. Como bitola, refere-se a lei à possibilidade do conhecimento completo e efectivo das cláusulas por quem use de diligência comum. Encontra-se aqui uma afloração do critério geral de apreciação das condutas em abstracto e não em concreto” Almeida Costa e Meneses Cordeiro, Cláusulas Contratuais Gerais, Almedina, 1990, p. 25. Sobre a tutela da formação da vontade do aderente e a necessidade de estabelecer meios de controlo adequados no âmbito do processo de formação do contrato de adesão, vide Pinto Monteiro, Cláusulas Limitativas e de Exclusão de Responsabilidade, 1985, Suplemento ao Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, separata do vol. XXVIII, p. 347-361. A este propósito vide ainda Almeida Costa, Direito das Obrigações, 11ª edição, Almedina, p. 266, aludindo ao controlo da inclusão das CCG nos contratos singulares.

Em suma, com as exigências alusivas à “comunicação” o legislador pretendeu salvaguardar, em primeira linha, uma correcta e eficiente transmissão dos termos do contrato, sendo a obrigação de informação dirigida à percepção do seu conteúdo, por parte do aderente. A violação destes deveres pelo proponente (resultando provadas) determina a exclusão das respectivas cláusulas do contrato, nos termos do art. 8° alíneas a) e b), vigorando na parte afectada as normas supletivas aplicáveis, com recurso, se necessário, às regras de integração dos negócios jurídicos, nos termos do art.9°,n°1.

Com tal tessitura institucional de protecção, retornando ao caso, deu-se - e dá-se - destaque à circunstância de resultar provado que

“(…) no caso dos autos, o referido electrocardiograma com prova de esforço não só foi realizado pelo proponente C (…), como os respectivos resultados, acompanhando o exame, foram remetidos para a R. « B (...)-Seguros de vida, S.A.».

Não se provou que, após, a mesma R. tenha notificado o proponente da recusa ou da necessidade de recolher outros esclarecimentos essenciais à avaliação do risco, o que consubstancia ónus de prova dessa R.

Nem se sustente o contrário com base no assente em HH) — que a R. Seguradora, a 3 de Julho de 1998, solicitou o envio do exame médico correspondente a ECG com prova de esforço -, porquanto se desconhece a quem foi tal exame solicitado, sendo que apenas relevaria se o tivesse sido a C (…) (cfr. o art. 342°, n.° 2, do C.Civil).

Ora, o que resulta inequívoco da prova produzida em audiência é que C (…) efectuou o referido ECG com prova de esforço (cfr. Z), AA) e CC), o que foi igualmente recebido pela R. Seguradora (cfr. EE) a GG)).

Por conseguinte, deverá ter-se a proposta, nos termos do dito art. 17º, como tacitamente aceite e, consequentemente, o contrato deverá considerar-se celebrado nos termos propostos (…)”.

 A solução assim enunciada é, em nosso entender, a que melhor salvaguarda os interesses em jogo, ponderando, fundamentalmente, a necessidade de protecção do segurado aderente e é a mais consentânea com os ditames da boa fé [no sentido que propugnamos vejam-se os acs. da R.G. de 27/03/2008, proc. no 369/08.1 (Relatora: Raquel Rego) e de 06/04/2010, processo 646/05.OTBAMR.G1 (Relator: Costa Fernandes), da R.P. de 11/09/2008, proc. no 0834361(Relator: Fernando Baptista), de 01/02/2010, proc. n° 3405/06.0TBVC Anabela Luna de Carvalho), de 12/04/2010, proc. n°1443/04.6TBGbM.P1 (Relator: Sousa Lameira), da R.C. de 11/03/2008, proc. n° 434/04.1 TBVNO.C1 (Relatora:Graça Santos Silva). A nível do STJ vão neste sentido os acs. de 29/04/2010, proc. no 5477/8TVLSB.L1.51 (Relator: Azevedo Ramos) e de 27/05/2010, proc. 976/06.4TBOAZ.P1.51 (Relator: Oliveira Vasconcelos).

Aliás, da necessidade de protecção do consumidor na celebração de contratos de seguro de vida associados ao crédito à habitação deu conta o Dec. Lei 222/2009 de 11/09, não podendo deixar de salientar-se o estipulado no seu art. 9, que, sob a epígrafe “incumprimento”, estabelece:

“1 - O incumprimento dos deveres de informação e de esclarecimento da instituição de crédito estabelecidos no presente decreto-lei faz incorrer a instituição em responsabilidade civil, nos termos gerais.

2 - O incumprimento do dever de propor o seguro de vida com o conteúdo mínimo estabelecido no presente decreto-lei torna inoponíveis ao mutuário, pela instituição de crédito ou pela empresa de seguros com quem aquele haja contratado o seguro de vida associado ao crédito à habitação, quaisquer cláusulas contratuais incompatíveis com aquele conteúdo mínimo.

3 - O incumprimento do dever de fazer reflectir no cálculo dos prémios todas as actualizações ao capital seguro, com efeitos reportados à data de cada uma das actualizações do capital seguro, por motivo imputável à empresa de seguros, faz incorrer esta empresa em responsabilidade civil, nos termos gerais, e confere ao mutuário os direitos de, a qualquer momento, exigir a sua correcção e de resolver o contrato de seguro, caso se trate de seguro individual, ou do vínculo resultante da sua adesão a um contrato de seguro de grupo.

4 - Quando o incumprimento previsto no número anterior for imputável à instituição de crédito é aplicável o previsto no n° 1. 5 - O disposto nos números anteriores não prejudica a aplicação dos regimes sancionatórios aplicáveis às empresas de seguros, nessa qualidade, e às instituições de crédito, nessa qualidade e na de mediador de seguros”. ».

De novo, por recorrência - Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 03.05.2011, www.dgsi.pt - a impor destacar que

“(..) Face a este quadro desde logo somos levados a concluir que o ónus da prova relativamente ao cumprimento de tais obrigações impende sobre o tomador do seguro, de acordo com a repartição do ónus da prova prevista pelo artigo 4.° do Decreto-Lei 176/95, de 26.Julho (artigo 78.° do DL 72/2008, de 16 de Abril, com o mesmo âmbito do anterior) e pelo artigo 342.° do Código Civil.

No presente caso, determinante é termos de analisar não só apenas a obrigação que incidia sobre o tomador do seguro no sentido de explicar os termos das cláusulas insertas no contrato de seguro ao segurado aderente, mas também a obrigação que impende sobre a Seguradora de enviar a apólice de seguro ao segurado, por forma a que este pudesse analisar o seguro, sendo-lhe também imposta a obrigação de explicar correctamente o conteúdo das cláusulas contratuais desse mesmo seguro de grupo tanto mais que estamos perante um contrato de adesão.

Esta obrigação de explicação das cláusulas insertas no contrato espelha o princípio da boa fé contratual que deve reger a celebração dos contratos, no sentido de dar transparência a toda a actuação dos intervenientes, mormente daquele que está numa situação de desprotecção informativa até porque, não redigiu as normas constantes do contrato e, assim, não teve tempo de sobre as mesmas realizar qualquer reflexão, para além de não ter poder de negociação para as alterar. Acresce que, havendo, como é o caso, um conjunto de disposições limitativas das coberturas de seguro, incluídas no contrato como exclusões contratadas, sempre se imporia o cumprimento de tais obrigações para que o aderente de tais seguros pudesse ter a exacta percepção daquilo que está a contratar. Esta explicação das cláusulas deveria, mesmo, ser acompanhada do envio aos aderentes da respectiva Apólice de seguro.

Independentemente deste tipo de considerações, a verdade é que, no que à análise jurídica dos factos importa, o contrato de seguro de grupo em causa sempre teria de ser qualificado como um contrato de adesão, sendo regido pelo conjunto de normas que se aplicam a este tipo de contratos, entre os quais, o Decreto-Lei 446/85, de 25 de Outubro (com as alterações entretanto introduzidas pelos Decretos-Leis 220/95, de 31 de Agosto e 249/99, de 07 de Julho).

Na verdade, estamos perante um clausulado de seguro elaborado pela Ré Seguradora, tendo o Banco apenas assumido o papel de intermediário, no caso, para a aceitação deste contrato pelos aderentes ao Seguro de Grupo e figurando nesse mesmo contrato com a posição de tomador. Esta intervenção do Banco não implicou, porém, qualquer intervenção activa na elaboração das cláusulas que regem este tipo de contratos e, nessa medida, afastada está a sua responsabilidade única pela comunicação de tais cláusulas.

Conforme acima já deixamos expresso, impende sobre o Banco, enquanto tomador do seguro, a obrigação geral de comunicação e explicação das cláusulas do contrato, mas essa obrigação não desonera a Seguradora de cumprir a sua obrigação, essa sim, principal, de comunicar as condições gerais do contrato ao aderente, obrigação essa inserta no artigo 5.° do DL 446/85, acima citado. Estamos perante obrigações distintas, que decorrem de preceitos legais também eles distintos, como não poderia deixar de ser.

O primeiro destes contratos, é o celebrado entre a Seguradora e o Banco, pelo qual aquela institui este último como intermediário para a celebração dos contratos de seguro de grupo, cujo clausulado é totalmente elaborado pela primeira; um segundo contrato, em que intervém o Banco, já na qualidade de tomador desse seguro de grupo, que tem por finalidade a angariação de aderentes que irão subscrever esse mesmo seguro.

A existência destes dois momentos negociais irá determinar obrigações autónomas para cada uma das partes subscritoras deste seguro de grupo, em face aos respectivos aderentes, conforme acima já frisamos».

Nesta conformidade - voltando a referenciar que esta questão está largamente debatida na jurisprudência podendo ser consultados, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Março de 2010 (JusNet 1186/2010) e os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 12 de Novembro de 2009 (JusNet 6912/2009) e de 01 de Fevereiro de 2010 (JusNet 565/2010) e respectiva doutrina ali abundantemente citada - não há como contrariar, tornando-se, por isso, inevitável, tudo visto, concluir - perante os elementos conformados nos Autos -  que:

 “a responsabilidade de comunicação ou não do respectivo clausulado negocial ao aderente é matéria apenas a ser discutida nas relações internas entre a Seguradora e o próprio Banco, em sede autónoma, nunca podendo ser oposta pela seguradora ao aderente”.

O que atribui resposta negativa às questões (todas as questões) consideradas.

*

As questões suscitadas consistem em apreciar, agora (no recurso do B (…), S.A.), no seu referencial de matriz, se:

1 Enquanto a Seguradora O (…) não aceitou, pelas razões que sustentou no processo, assumir o sinistro do óbito de um dos mutuários do Banco, o empréstimo a que os autos se reportam continuou em vigor entre as partes, com a consequente obrigação, por banda dos Recorridos, de efectuarem o pontual pagamento das prestações do mútuo;

2 O que os Recorridos foram pagando ao Banco desde a data do óbito do mutuário marido, correspondeu, assim, ao pontual pagamento de prestações que tinham a seu cargo satisfazer no âmbito do contrato de mútuo celebrado e não é por a Seguradora ter recusado o sinistro que o que o Banco recebeu no calendário próprio das prestações contratualmente acordadas foi indevidamente recebido pelo Banco;

3 O que o Banco recebeu dos mutuários depois do óbito, recebeu-o legitimamente ao abrigo do contrato que lhe conferia o correspondente crédito: a obrigação de restituição apenas nasce com a sentença que condenou a Seguradora à existência do Seguro e, consequentemente, à liquidação do mútuo ao Banco por referência ao capital que estava em dívida à data do óbito.

4 Se a obrigação só nasce com a sentença, não pode condenar-se o Banco no pagamento de juros reportados a um tempo em que não era devedor, porque ainda não existia a obrigação de restituição.

5 Decidindo como decidiu a sentença recorrida, violou, entre outros, o disposto nos art°s 762° e 806° do Cód. Civil.

Apreciando, diga-se, neste específico particular, decorrer da matéria considerada provada nos Autos e consignada no segmento decisório, que

“(…) Pedem os AA., como segundo e consequencial pedido: Deve a R. sequradora liquidar o capital segurado, no valor de 86.541,43 €, sendo que, deste montante, a R. Seguradora deverá liquidar, perante a R. « (...)», o capital em dívida relativo ao Contrato Mútuo com Hipoteca, à data do falecimento, sendo esse montante de 75.071,79 €, e o o remanescente (11.469,64€) entregue aos ora AA, acrescido de juros, desde 4 de Julho de 2002, à taxa legal até integral e efectivo pagamento.

Em consequência da procedência do pedido que antecede, também este merece o mesmo destino processual, desde logo, quanto ao valor de 75.071,79 €, ou seja, aquele que se encontrava em dívida à instituição de crédito « B (...)», em 4 de Julho de 2002 — data do falecimento de C (…).

Logo, condena-se a R. Seguradora a liquidar perante a R. instituição de crédito « B (...)» o referido montante.

Quanto ao remanescente de €11 469, 64, desconhecendo o tribunal quanto e se vêm sendo liquidadas prestações dos empréstimos assentes em F) e G), ainda assim, determina-se a sua cessação, remete-se para liquidação posterior o respectivo apuramento, nos termos do art. 661°, n.° 2 do C.P.Civil (11), e ordena-se a sua restituição aos AA., acrescido de juros à taxa legal (não comercial):

Tal liquidação deverá ocorrer no incidente a implementar no próprio processo da acção declarativa (artigos 378°, n° 2 e 661°, n° 2, do CPC).

Por conseguinte, relativamente ao dito remanescente, face ao valor em dívida de €75 071, 79, condena-se a R. Seguradora no que se liquidar no incidente a implementar no próprio processo da acção declarativa (artigos 378°, no 2 e 661°, n° 2, do CPC), acrescido de juros à taxa legal (não comercial), até integral e efectivo pagamento”.

Tal, na diegese dos Autos, e de acordo, também, com os elementos anteriormente apreciados, revela-se perfeitamente consentâneo. Com efeito, desde logo, na vinculação do disposto no invocado art. 762° Código Civil  (cumprimento e não cumprimento das obrigações - princípio geral), os contratos de seguro, enquanto contratos de adesão, estão sujeitos a controlo judicial, quer a nível da tutela da vontade do aceitante, quer no tocante à fiscalização do seu conteúdo. Em sede de tutela da vontade do segurado, há que considerar os critérios interpretativos constantes dos arts. 236.° e 237.° do Cód. Civil, na perspectiva do sentido atribuído ao contrato pelo segurado. Nesta conformidade, as condutas através das quais se houver dado execução ao contrato de seguro devem ser tomadas em conta para interpretação desse negócio. No âmbito da fiscalização do conteúdo das condições gerais do contrato de seguro deve-se atender tanto às normas de ordem pública (art. 280° do Cód. Civil), como às regras gerais da boa fé (arts. 227.º e 762.°,n.°2, do mesmo diploma). A violação do dever de esclarecimento por parte da seguradora constitui violação positiva do contrato. A invocação de exclusão de responsabilidade por parte da seguradora que haja violado o dever de esclarecimento traduz abuso de direito (Ac.STJ, 28-3-1995: BMJ, 445 .°-519).

 Não é por isso legítimo a uma seguradora eximir-se a correspondência contratual, necessariamente abrangente de qualquer tipo de prejuízos causados por decorrência; o mesmo valendo, em termos apreciativos para a entidade bancária, tendo em conta a articulação e conexão contratual consagrada em probatório, com o alcance supra desenvolvido.

Tanto assim que o devedor está obrigado não só ao que expressamente se estipulou mas também ao que decorra do convencionado segundo a regras da boa fé (art. 762.°, n.° 2). Sobre o devedor podem assim ficar recaindo, deveres secundários ou decorrentes destinados a salvaguardar o direito do credor, como deveres de guarda, de vigilância, comunicação e correspondência, etc. Mesmo não se tratando de deveres autónomos, sendo seu fim apenas assegurar o cumprimento integral da prestação principal (Cf. Galvão Telles, Obrigações, 3°, 24). Com efeito, o dever de prestar da ré condicionado só fica a qualquer dever jurídico de cooperação por parte do(s) outro(s) outorgante(s) no contrato, quando ditado pela lei (art. 762°, n.° 2, do Cód. Civil) ou pela lex contractus. É que os danos contratuais patrimoniais são reparáveis quando a parte adimplente suportou uma verdadeira e grave lesão no seu próprio património (Cf. Ac. STJ, 10-11 -1993: BMJ, 431 .°- 433), como também aconteceria se os juros peticionados e devidos, em causa, não respeitassem abrangente e integralmente ao que o Banco recebeu dos mutuários depois do óbito, reportados a um tempo em que, por força das circunstâncias, se tornou devedor.

Emergência que se configura, igualmente, como decorrente do alcance do disposto no art. 806.° (obrigações pecuniárias) Código Civil, ao consagrar (nº1) que na obrigação pecuniária a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora. Isto porque, fenomenologicamente, os juros atribuídos para o lapso de tempo anterior à data da sentença designam-se por juros compensatórios; enquanto, os juros moratórios visam cobrir quantias certas líquidas exigíveis e só ocorrem após decisão judicial (Ac. RE, 27-11-1986: BTE, 2.ª série, n.°s 7-8-9/89-607). Em todo o caso, a presunção de danos causados pela mora nas obrigações pecuniárias é juris et de jure, não tendo o credor de provar nem a existência de danos, nem o nexo causal entre os danos indemnizáveis e o facto ilícito da mora, nem havendo, pois, aqui que distinguir entre juros compensatórios e juros moratórios (A. Varela, Obrigações, 2.°-116, e RLJ, 102.°-89); também como aplicação do princípio do abuso do direito (P. Coelho, Obrigações, 233).

O que responde negativamente, também, às questões, todas as questões, configuradas.

*

Podendo concluir-se, sumariando, aqui também, que:

1.

Estando perante uma situação de seguro de grupo em que é invocada a existência de uma cláusula contratual geral e a sua não comunicação prévia e respectiva explicação do teor a um aderente, o ónus da prova relativamente a tal facto impende sobre o tomador do seguro, de acordo com a repartição do ónus da prova - artigo 4.° do Decreto-Lei 176/95, de 26.Julho - artigo 78.° do DL 72/2008, de 16 de Abril (com o mesmo âmbito do anterior) e pelo artigo 342.° do Código Civil.

2.

O contrato de seguro de grupo que tenha um clausulado elaborado apenas pela Ré Seguradora, e em que o Banco tomador apenas assume o papel de intermediário, no caso, para a aceitação deste contrato pelos aderentes ao Seguro de Grupo, e em que os aderentes nada possam opor e/ou modificar nesse clausulado, deve qualificar-se como um contrato de adesão, sendo regido pelo conjunto de normas que se aplicam a este tipo de contratos, entre os quais, o Decreto-Lei 446/85, de 25 de Outubro (com as alterações entretanto introduzidas pelos Decretos-Leis 220/95, de 31 de Agosto e 249/99, de 07 de Julho).

3.

Apesar de impender sobre o Banco, enquanto tomador do seguro, a obrigação geral de comunicação e explicação das cláusulas do contrato, essa obrigação não desonera a Seguradora de cumprir a sua obrigação de comunicar e explicar as condições gerais do contrato de seguro de grupo ao aderente, uma vez que ela é a responsável primeira por essa comunicação no âmbito dos contratos de adesão, conforme decorre do artigo 5.° do DL 446/85, acima citado.

4.

Celebrado um contrato de seguro de grupo contributivo (seguro de vida, associado a um crédito à habitação, sendo mutuário uma pessoa singular), com recurso ao uso de cláusulas contratuais gerais, às quais o segurado se limitou a aderir, pode convocar-se para a resolução do litígio o regime jurídico instituído pelo Dec. Lei 446/85, de 25/10, com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei 220/95, de 31/08 e Dec. Lei 249/99 de 07/07.

5.

 O art. 4º do Dec. Lei 176/95 de 26/07 (com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei 60/2004 de 22 de Março) tem especialmente como destinatários a instituição bancária e a seguradora, definindo a cargo de quem — entre o tomador de seguro e a seguradora — fica o dever de informação sobre as coberturas abrangidas, as cláusulas de exclusão etc; A ratio do preceito foi dirimir eventuais conflitos entre estas duas entidades, estabelecendo uma norma delimitadora susceptível de derrogação por aquelas partes (n°4 do preceito), sendo o segurado alheio a esta equação, relevando ainda o preceito porquanto dele se infere, por um raciocínio de exclusão, que não é ao segurado que incumbe o ónus de alegação e prova da ausência de comunicação.

6.

Não se provando a comunicação de uma cláusula do contrato de seguro, alusiva ao âmbito da cobertura, não pode a seguradora prevalecer-se daquele normativo (art 4º do Dcc. Lei 176/95) para, perante o segurado, se ilibar ao pagamento do capital seguro — o que não impede que o possa fazer perante a entidade bancária, beneficiária da prestação.

7.

O devedor está obrigado não só ao que expressamente se estipulou mas também ao que decorra do convencionado segundo a regras da boa fé (art. 762.°, n.° 2, Código Civil). Sobre o devedor podem assim ficar recaindo, deveres secundários ou decorrentes destinados a salvaguardar o direito do credor, como deveres de guarda, de vigilância, comunicação e correspondência, etc. Mesmo não se tratando de deveres autónomos, sendo seu fim apenas assegurar o cumprimento integral da prestação principal.

8.

Os danos contratuais patrimoniais são reparáveis quando a parte adimplente suportou uma verdadeira e grave lesão no seu próprio património), como também aconteceria se os juros peticionados e devidos, em causa, não respeitassem abrangente e integralmente ao que o Banco recebeu dos mutuários depois do óbito, reportados a um tempo em que, por força das circunstâncias, se tornou devedor.

9.

Decorrência, também, do disposto no art. 806.° (obrigações pecuniárias) Código Civil, ao consagrar (nº1) que na obrigação pecuniária a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora;

10.

E de, em todo o caso, a presunção de danos causados pela mora nas obrigações pecuniárias ser juris et de jure, não tendo o credor de provar nem a existência de danos, nem o nexo causal entre os danos indemnizáveis e o facto ilícito da mora, nem havendo, pois, aqui que distinguir entre juros compensatórios e juros moratórios; igualmente como aplicação do princípio do abuso do direito.

III. A Decisão:

Pelas razões expostas, nega-se provimento aos recursos interpostos, mantendo-se a decisão recorrida.

 Custas pelas entidades recorrentes, fixando-se para cada uma delas, singularmente, a taxa de justiça de 6 UC.

António Carvalho Martins ( Relator)

Carlos Moreira

Moreira do Carmo