Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | MANUEL CAPELO | ||
Descritores: | ACÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE PROVA PERICIAL EXAME SANGUÍNEO REQUERIMENTO RÉU | ||
Data do Acordão: | 11/09/2010 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | MEDA | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Legislação Nacional: | ARTºS 517º E 522º DO CPC. | ||
Sumário: | I – O relatório da perícia médica realizada no âmbito da acção de averiguação oficiosa da paternidade não retira pertinência à perícia, com a mesma finalidade, que seja requerida na acção judicial de investigação da paternidade, na medida em que aquela foi produzida em processo sem o contraditório do demandado, previsto no artº 517º do CPC. II – O artº 522º do CPC exige que a parte contra quem a prova é invocada tenha sido também parte no primeiro processo e nele tenha sido respeitado o princípio da “audiência contraditória”, nos termos caracterizados pelo artº 517º do CPC. III – Não se verificando os dois referidos pressupostos, a eficácia extraprocessual da prova está excluída. IV - Assim sendo, é inequívoco que assiste a qualquer das partes da acção de investigação da paternidade o direito a requerer o exame hematológico, mesmo que semelhante exame já tenha sido realizado em antecedente acção de investigação oficiosa da paternidade, nomeadamente quando nesta interveio, como parte, o pretenso pai. V – Assistindo a qualquer das partes da acção de investigação da paternidade o direito a requerer o exame hematológico, não pode esse direito ser coarctado ao réu, com o fundamento de idêntico exame ter tido lugar na acção de averiguação oficiosa da paternidade, nomeadamente quando nesta não interveio, como parte, o pretenso pai. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra
Relatório No Tribunal Judicial da Meda em acção de investigação da paternidade que o Ministério Público move contra A..., residente em .... – ...., o réu, ora recorrente, notificado nos termos e para os feitos do disposto no art. 512 do CPC apresentou rol de testemunhas e requereu “a realização de perícia de investigação da paternidade a realizar pelo organismo considerado competente”. O Tribunal, através de despacho de fls. 56 decidiu então indeferir a realização dessa perícia afirmando que “ Veio o réu requerer uma perícia a versar sobre a matéria constante dos artigos e factos constantes da base instrutória, a saber de aferir da paternidade em causa. num organismo competente. Ora, a determinação da pertinência de uma diligência probatória deve partir dos factos que se pretendem ou podem provar com a sua realização. que têm de ser colhidos na base instrutória, sob pena de ser reputada de impertinente (artigo 578.°, nº 1, do Código do Processo Civil). Acontece, porém, que se encontra junto aos autos um relatório pericial de fls. 13 a 15 realizado pelo Instituto de Medicina Legal, Gabinete Médico-Legal da Guarda, sendo este o organismo competente. Com efeito, ponderando a necessidade da sua realização, existindo tal relatório nos autos constata-se que apenas não é viável a sua prossecução, apenas se contribuindo para protelar o normal andamento do processo, assim desvirtuando a sua própria natureza urgente tendo pois a realização da perícia perdido a sua actualidade e efeito útil, considerando-se a mesma desnecessária ao apuramento da verdade (artigo 578°, nº 2, in fine, do Código de Processo Civil).” Inconformado com esta decisão dela interpôs recurso o réu concluindo que: […] Nestes termos e nos mais de direito que Vossas Excelências. Venerandos Senhores Juízes Desembargadores doutamente suprirão, deve o presente recurso, depois de ser admitido, ser considerado procedente e em consequência, ser revogado o despacho recorrido, sendo admitida a realização de perícia de investigação da paternidade.” O Ministério Publico contra alegou sustentando a decisão recorrida. Colhidos os vistosa cumpre decidir. … … Fundamentação Os factos que servem a decisão são os constantes do relatório e o objecto do recurso, delimitado pelas conclusões do recorrente, é o de saber se a realização da perícia médica realizada no âmbito da averiguação oficiosa da paternidade impede a realização de perícia com a mesma finalidade na acção judicial de investigação da paternidade quando o recorrente se limite a requerê-la sem alegar quaisquer razões para o fazer. Mesmo que atribuindo valor meramente documental ao relatório da perícia realizada, “a avaliar livremente pelo tribunal, ou até mesmo de “princípio de prova” (parte final do n.º 1, do citado art. 522)” como se sustentou no ac. da RP de 6-1-2005 no proc. 0436221, in dgsi.pt, tal entendimento em nada altera aquele outro que defende a admissibilidade do exame pericial na acção de estado mesmo que realizado um outro no processo tutelar, porquanto do que se trata decidir é da admissibilidade desse exame e não do valor probatório do relatório de um outro, junto aos autos. Decidida a primeira questão colocada no recurso no sentido de não se considerar a perícia médica realizada no processo tutelar cível como fazendo parte da acção de estado subsequente, não sendo por isso argumentável que o exame médico solicitado nesta acção possa ser indeferido com fundamento na sua desnecessidade ou inutilidade por uma outra perícia semelhante/igual ter sido realizada na averiguação oficiosa, importa abordar a segunda questão que é a de saber se, solicitada a perícia médica na acção judicial, esta pode/deve ser rejeitada por o requerente não ter indicado o seu objecto, maxime, não ter indicado a que matéria de facto quesitada tal exame visa responder. Estabelece o art. 577 nº1 do CPC que “ao requerer a perícia a parte indicará logo, sob pena de rejeição, o respectivo objecto enunciando as questões de facto que pretende ver esclarecidas através da diligência”. Numa interpretação meramente literal poderíamos considerar que a circunstância de a parte requerer o exame médico no seu requerimento de prova sem indicar a matéria a que ele se destina determinaria de imediato a sua rejeição. Porém, cremos que tudo aconselha que a leitura deste preceito tenha presente por um lado os poderes de concedidos ao juiz, nomeadamente de direcção do processo a que alude o art. 265 nº1 e 3 e que lhe atribui, sem prejuízo do ónus especialmente imposto ás partes, a faculdade de providenciar pelo andamento regular e célere do processo, promovendo oficiosamente asa diligências necessárias ao normal prosseguimento da acção, nomeadamente realizando ou ordenando todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litigio quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer. Sabendo-se então que o juiz na acção de estado de investigação da paternidade pode ordenar oficiosamente o exame respectivo, e que esse exame é uma prova determinante no contexto do pedido que aí se formula, somos conduzidos a considerar que este interesse na descoberta da verdade e o facto inequívoco de a especificidade do exame tornar evidente a matéria de facto que se destina provar, mesmo que não tenha sido expressamente indicada, quase que obriga o juiz a determinar o exame oficiosamente ou, quando muito, a convidar o requerente a indicar qual a matéria que o exame visa provar, sem prejuízo de entendermos que esse convite é desnecessário porquanto se sabe que a perícia pedida tem aquela limitada e indiscutível finalidade de saber qual o grau de probabilidade de o requerente ser o pai daquele relativamente ao qual se reclama essa paternidade. Dizer-se que o requerente da perícia deve desde logo indicar a matéria de facto objecto da mesma sob pena de rejeição não significa, em nosso entender, porque a lei o não diz, que a rejeição seja imediata e automática devendo articular-se essa obrigação imposta à parte com o os poderes de direcção do processo por parte do juiz e o tipo de exame solicitado, sendo que se este for daqueles que pela sua especificidade se destina a uma matéria limitada e inequívoca, que não precisa de esclarecimento algum para se compreender, cremos que deve ser ordenado sem sequer recorrer ao convite à parte a que esclareça esse objecto sob pena de rejeição. Assim, pelo exposto, procede o recurso interposto, devendo o exame solicitado ser mandado realizar. … … Decisão Pelo exposto, acorda-se em julgar procedente a Apelação e, em consequência, revogando a decisão recorrida, determina-se que seja ordenada a realização do exame requerido e que o tribunal a quo rejeitou. Custas pelo vencido a final.
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