Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
947/12.1T2OBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MOREIRA DO CARMO
Descritores: ALIMENTOS
FILHO
MAIORIDADE
FACTO NOTÓRIO
Data do Acordão: 12/10/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: CBV OLIVEIRA DO BAIRRO JFM
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTS. 1880, 2003, 2004 CC, 514 CPC
Sumário: 1.- No pedido de prestação de alimentos, ao abrigo do art. 1880º do CC, o filho maior não tem de demonstrar que está impossibilitado de obter rendimentos para a sua subsistência, uma vez que se trata duma situação que é o prolongamento da situação de menoridade, em que a lei pressupõe que o peticionante estuda, não que trabalha ou pode trabalhar.

2.- Não podem ser fixados alimentos em montante desproporcionado aos meios de quem se obriga, mesmo que desse modo se não consiga eliminar por completo a situação de carência da pessoa a quem a prestação é devida.

3.- Facto notório é aquele que não carece de prova nem de alegação, devendo considerar-se como tal o facto que é do conhecimento geral do cidadão comum.

4.- É de fixar em 115 € mensais a prestação de alimentos de um pai a favor da sua filha, para términus por esta da sua formação profissional, se o pai aufere 1.087 € mensais, tem encargos líquidos de cerca de 841 € mensais e outros encargos mensais, não concretamente quantificados, relacionados com vestuário e calçado, despesas de higiene e de saúde, revisões do veículo que conduz, respectivo seguro, imposto de circulação, e combustível nas 2 viagens, de ida e volta, que faz uma vez por semana, onde percorre 160 km, e uma ou outra portagem, despesas cujo custo médio mensal não são inferiores a 125 € mensais.

Decisão Texto Integral: I – Relatório

1. A (…), maior, residente em Águeda, intentou acção de alimentos contra o seu progenitor L (…), com residência em Anadia, pedindo que:
a) seja fixado a favor da requerente a prestação de alimentos a cargo do requerido, na quantia mensal de 250 €, a pagar até ao dia 8 de cada mês, por meio de cheque a remeter para a requerente, actualizada anualmente;
b) a pagar todas as pensões de alimentos devidas desde a data da citação, acrescido de juros legais.
Alegou, em síntese, ser filha do requerido e de M (…), ter nascido em 8.9.1993 e ter atingido a maioridade em 8.9.2011. Após o divórcio dos seus pais em Dezembro de 1996, ficou a residir com a sua mãe na casa da sua avó materna. Enquanto a requerente foi menor beneficiava de uma pensão de alimentos do seu pai no montante de 125 € mensais, mas assim que atingiu a maioridade este deixou de comparticipar em qualquer despesa de educação e alimentação da requerente. A requerente é estudante universitária, está matriculada no curso de biologia e geologia da Universidade de Aveiro, onde frequentou no ano lectivo de 2011/2012, o 1º ano do referido curso. É vontade da requerente concluir a sua licenciatura no curso de biologia e geologia, não tem emprego, e não tem bens ou rendimentos que lhe permitam prover à sua subsistência e custear a sua educação e sustento. Tem sido a mãe da requerente que com o seu esforço e recorrendo a avó materna que tem vindo a suportar as despesas inerentes à vida, sustento e educação da requerente. A mãe da requerente além das despesas normais com alimentação, transporte, vestuário e consumos de água, luz, gás e telefone suporta ainda 125 € mensais de renda de um imóvel para a requerente em Aveiro, 101,20 € referente a refeições que a requerente toma na universidade, 84,14 € mês (1.009,71 € ao ano), das propinas, 60 € de despesas mensais de água, luz, internet do imóvel arrendado e 34,82 € com livros, fotocópias e material escolar que a requerente necessita. Assim, a requerente tem despesas mensais em média de 500 €. Pelo que, para que a requerente continue a estudar é urgente que o seu pai contribua para o seu sustento com pelo menos 250 €, nos termos do art. 1880º do CC.
O requerido respondeu alegando que não se verifica o pressuposto da legitimidade, pois à luz do art. 1880º do Código Civil a acção devia ter sido intentada também contra ambos os progenitores. Mais alegou, em síntese, que a filha não o “conhece”, não tem rendimentos que lhe permitam prestar uma pensão de alimentos à requerente, pois só tem um rendimento mensal liquido de 927 €, do seu ordenado, e tem despesas fixas mensais que não lhe permitem dispor de um montante para pagar uma pensão à requerente, já que tem encargos com empréstimo bancário destinado a aquisição da habitação e inerentes seguros, tem despesas de água, luz, telefone e condomínio, como trabalha em Viseu tem de deslocar-se de automóvel desde casa até ao trabalho, gastando dinheiro em combustível e portagens, gasta dinheiro com a sua alimentação, vestuário, saúde, e higiene, paga impostos, revisões da viatura que conduz e respectivos seguros, já a mãe da requerente auferindo um bom rendimento e sem despesas de habitação, pois vive em casa da avó da requerente, certo que esta não se imiscui de ter um automóvel e mesmo assim foi residir para Aveiro, quando da casa onde reside com a mãe e avó são 25 km para Aveiro, para onde se poderia deslocar de comboio ou autocarro.
Concluiu, pugnando pela improcedência da pretensão da requerente.  
*
A final foi proferida sentença que julgou improcedente a referida excepção de ilegitimidade, e julgou a acção procedente e condenou o requerido a pagar a título de alimentos à requerente, a quantia de 140 € mensais, até ao dia 8 de cada mês, por meio de cheque a remeter para a residência da requerente, valor actualizável, todos os anos, com início em 2014, pelo índice da taxa de inflação publicado pelo INEM; o requerido foi, ainda, condenado a pagar à requerente a quantia de 140 € mensais desde o dia 8 de Outubro de 2012, por meio de cheque a remeter para a residência da requerente.
*
2. O requerido interpôs recurso, tendo apresentado as seguintes conclusões:
(…)
3. A requerente contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:
(…)

II – Factos Provados

1- A requerente, nasceu a 08/09/1993 e é filha do requerido R (…)
e de M (…)
2- A requerente atingiu a maioridade em 08/09/2011.
3- Após o divórcio dos seus pais em 05/12/1996, a requerente ficou a residir com a sua mãe na casa da sua avó paterna.
4- Enquanto foi menor, a requerente beneficiava de uma pensão de alimentos do seu pai no montante de 125,00 mensais.
5- A requerente atingiu a maioridade e o requerido nunca mais comparticipou com quaisquer quantias ou bens para o sustento, educação e alimentação da requerente.
6- A requerente é estudante universitária e esteve matriculada no curso de Biologia e Geologia da Universidade de Aveiro, onde frequentou no ano de 2011/2012 o 1º ano do referido curso.
7- É vontade e intenção da requerente concluir a sua licenciatura no curso Biologia e Geologia.
8- A requerente não tem emprego, nem bens, nem rendimentos que lhe permitam prover à sua subsistência e custear as despesas inerentes à sua educação e sustento.
9- Tem sido a mãe da requerente que com esforço e a ajuda da avó materna que tem vindo a suportar todas as despesas inerentes à vida, sustento e educação da requerente.
10-A mãe da requerente além das despesas normais com alimentação, transportes, vestuário e consumos de água, luz, gás e telefone, suporta ainda:
- 125,00 mensais de renda da requerente, actualmente em 130,00, por um quarto arrendado em Aveiro;
- 101,20 mensais, referentes a refeições que a requerente toma na cantina da universidade ( 2,30 x2 refeições x 22 dias),
-1.009,71 ao ano referente a propinas pela inscrição da requerente na Universidade de Aveiro;
- cerca de 45,00 de despesas mensais em água, luz, gás e internet do imóvel arrendado.
- despesas com livros, fotocópias e material escolar de que a requerente necessita para frequentar o seu curso que rondou no ano de 2011/2012 a quantia de 34,82.
11- A requerente em produtos de higiene, roupa e calçado gasta cerca de 50,00 mensais.
12-A requerente no ano de 2012/2013 encontra-se matriculada na Universidade de Aveiro e por mudança de curso, ingressou na licenciatura de Biologia, inscrita em unidades curriculares do 2º ano.
13-A requerente no ano lectivo de 2011/2012 recebeu uma bolsa de estudos mensal, no valor de 120,90 e no ano de 2012/2013 está a receber uma bolsa de estudos mensal no valor de 103,80.
14-O requerido trabalha no Intermarché de Viseu como pasteleiro, auferindo um salário mensal ilíquido de 1.362,56 (mil trezentos e sessenta e dois euros e cinquenta e seis cêntimos - onde se inclui o subsídio de alimentação e um subsídio de férias pago em duodécimos) e líquido de 1.017,57 (mil e dezassete euros e cinquenta e sete cêntimos), mais, pelo menos, 70 € mensais correspondentes à proporção do subsídio de natal. 
15- Esse vencimento é o único rendimento que o requerido tem e é com ele que faz face as suas despesas mensais.
16-O requerido paga uma prestação mensal ao banco, a título de empréstimo bancário contraído para aquisição de habitação no valor de 262,65 (duzentos e sessenta e dois euros e sessenta e cinco cêntimos), ao qual acresce o PPR mensal de 25,00 (vinte e cinco euros), seguro multirriscos habitação no montante de 2,53 (dois euros e cinquenta e três cêntimos), seguro vida habitação no valor de 4,17 (quatro euros e dezassete cêntimos) e o seguro de vida no valor de 55,07 (cinquenta e cinco euros e sete cêntimos).
17- O requerido de despesas de água, luz, telefone e condomínio, despende a quantia de cerca de 152,00 (cento e cinquenta e dois euros).
18- O requerido reside em Recardães e trabalha em Viseu, deslocando-se pelo menos uma vez por semana a Recardães de automóvel e fazendo nova viagem de volta a Viseu.
19- Em alimentação o requerido gasta cerca de 7,00 por dia, o almoço é pago pela sua entidade patronal.
20-O requerido tem um quarto alugado em Viseu, pagando por mês a renda de 130,00.
21- O requerido tem ainda de se vestir, calçar, pagar as revisões do veículo que conduz, combustível do mesmo, respectivos seguros, impostos, produtos de higiene e despesas com saúde.
22-A requerente reside com a mãe em Mouriscas do Vouga a 25 Km de Aveiro, existindo comboio de ida e volta de Mouriscas para Aveiro.

III - Do Direito

1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas (arts. 684º, nº 3, e 685º-A, do CPC).
Nesta conformidade as questões a decidir são as seguintes.
- Alteração da matéria de facto.
- Prestação de alimentos.

2.1. Está provado em 18- que “O requerido reside em Recardães e trabalha em Viseu, deslocando-se pelo menos uma vez por semana a Recardães”.
Pretende o recorrente que se acrescente no facto provado 18. que o mesmo depois de ir a Recardães volta a Viseu para trabalhar pelo que faz não uma mas duas viagens por semana. E, ainda, relacionado com tal ponto que se dê por provado - vide conclusões F) e G) –, considerando que a distância entre as duas localidades, por estrada, segundo o guia Michelin (www.viamichelin.pt), é de cerca de 80 km, além dos 20 Km diários que faz desde o quarto que tem arrendado em Viseu até ao seu local de trabalho, que o custo médio de cada um dos trajectos – combustível e portagens –, atendendo a um veículo ligeiro de passageiros com uma cilindrada de 2000 cc e a gasóleo, é no valor de 13,13 €, o que importa um valor mensal de gasóleo, de 105,04 € ao que há a acrescer as portagens no valor de 8.20 € por cada viagem.
Quanto à viagem de ida e volta de Viseu - Recardães – Viseu a lógica assim o impõe.
No demais, não faz sentido apelar ao regime legal dos factos notórios, previsto no art. 514º, nº 1, do CPC, onde se dispõe que “não carecem de prova nem de alegação os factos notórios, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral”. Esquece, porventura, o apelante que a prova testemunhal produzida não foi gravada, apenas vindo referido resumidamente o que as testemunhas disseram na motivação de facto exarada pela julgadora (vide fls. 147/149). Além dela, só existe prova documental nos autos. Ora, não há nem prova testemunhal nem prova documental que aponte no sentido concreto pretendido pelo recorrente. Não sendo possível com recurso, em alternativa, à notoriedade dos factos ir no sentido propugnado pelo recorrente - despesas mensais certas e precisas de gasóleo e portagens - pois faltam-lhe pressupostos base. Efectivamente, desconhece este tribunal por completo se o apelante faz 20 Km diários desde o quarto que tem arrendado em Viseu até ao seu local de trabalho, ou se tem um veículo ligeiro de passageiros com uma cilindrada de 2000 cc a gasóleo, e qual o caminho que toma entre Viseu e Recardães, designadamente se passa em estrada com portagem ou não e, em caso afirmativo, qual o valor por cada viagem. O apelante tinha meios probatórios fáceis e simples de comprovar esses pressupostos base para poder extrair a conclusão a que agora chega. Podia e devia tê-lo feito. Não pode é agora com recurso ao regime simples dos factos notórios ultrapassar essa sua omissão e obter a prova de tal factualidade por meio de adivinhação deste tribunal de recurso.   
Sendo assim, há apenas que acrescentar ao facto 18. a viagem adicional de regresso a Viseu, ficando tal facto com a redacção, a negrito, que agora inserimos no elenco dos factos provados.
2.2. Está provado em 19- que “Em alimentação o requerido gasta cerca de 7,00 por dia, o almoço é pago pela sua entidade patronal”.
Pretende o recorrente que se dê como provado que tal quantia é de 13 € diários – vide conclusões I) e J) – partindo do facto notório que um individuo toma pequeno almoço, almoço, lanche e jantar, pelo que considerando uma refeição low cost de 8 € e um pequeno almoço e lanche de 2,5 € cada se atinge o valor indicado.
Na motivação de facto a julgadora exarou sobre este ponto provado que ““No facto nº 19, foi o próprio requerido que admitiu no seu articulado que o almoço é pago pela sua entidade patronal e a testemunha M (...) referiu que este pagava o almoço e gastaria cerca de dez euros por dia em refeições, por isso atendendo as declarações desta testemunha e como o almoço é pago pela entidade patronal, fica apenas o pequeno almoço e o jantar a cargo do requerido, por isso, este gastará à volta de 7 euros por dia nas refeições, nos dias de folga como vem a Recardães, pode confeccionar a sua comida em casa, por isso não lhe vai implicar um aumento do custo das refeições”.
Em primeiro lugar diremos que se é facto notório que há pessoas que tomam lanche também é verdade que há pessoas que não o tomam.
Quanto aos preços low cost de almoços e pequenos-almoços parece-nos ser de considerar, pelo conhecimento geral e experiência de todos nós, na aquisição de tais refeições em diversos estabelecimentos comerciais, presunção ad hominem, que se pode encontrar em regime de low cost um jantar a 6 € e um pequeno almoço frugal a 2 €.
Acrescente-se, todavia que não se percebe muito bem porque indica o recorrente tais valores. Acaso o mesmo toma todos os dias o pequeno-almoço e jantar fora de casa !? Se sim, não tem de o fazer, pois o que é facto notório, aqui sim, é que a normalidade das pessoas, grande parte delas, toma o pequeno-almoço e jantar em casa. Ora, se excluirmos que o recorrente não toma o pequeno-almoço no seu local de trabalho - como é pasteleiro e entra cedo não tomará tal refeição ali !? -, na perspectiva que nos parece mais adequada e normal tomará quer o dito pequeno-almoço quer o jantar em casa, e, assim sendo, a quantia apurada de 7 € diários para a sua alimentação é seguramente suficiente.
Não há, por isso, razão para alterar o indicado facto provado.
2.3. Está provado em 21- que “O requerido tem ainda de se vestir, calçar pagar as revisões do veículo que conduz, respectivos seguros, impostos, produtos de higiene e despesas com saúde”.
O recorrente pretende que se dê como provado que despende ainda dinheiro em combustível, revisões, impostos, seguro da viatura, e que em vestuário, calçado higiene e saúde gastará 75 €, até porque foi dado como provado que a sua filha gasta 50 € por mês em tais gastos, sem qualquer prova documental – vide conclusões K) e L).
Quanto ao gasto de dinheiro em combustível, mais uma vez, a lógica assim o impõe, pois sabemos que o recorrente tem uma qualquer viatura automóvel e se desloca nela para ir a sua casa e regressar a Viseu, pelo que necessariamente consome combustível e terá de o pagar. Quanto a suportar revisões do veículo, respectivos seguros e impostos não se compreende a impugnação porquanto tal factualidade foi dada por provada.     
Quanto ao demais, também não se compreende a relação de equivalência que estabelece entre os gastos da sua filha e os seus, pois, como é obvio, os gastos em vestuário, higiene e saúde variam de pessoa para pessoa. Dir-se-á também que o gasto atinente à sua filha não foi comprovado por documento mas foi-o por prova testemunhal, como consta expressamente da motivação da julgadora de facto ao ponto 11. (vide fls. 147/148). O recorrente é que não logrou provar os montantes que despende. Veja-se a motivação de facto exarada pela julgadora “Em relação aos factos não provados, nenhuma prova foi produzida, ou a que foi não logrou convencer o tribunal, nomeadamente as testemunhas não souberam concretizar o valor que o requerido despendia em roupa, calçado, seguros e revisões do carro, nem o requerido juntou aos autos nenhum documento comprovativo dessas despesas.
As testemunhas limitaram-se a referir valores segundo o que achavam que seria normal, sem se referirem a nenhum facto concreto que sustentasse o que referiam.
(…)
Em relação à roupa e calçado a testemunha (…) ainda disse que o requerido gastava cerca de 150,00 mensais, mas não conseguiu concretizar o motivo de ter indicado este valor, por isso o seu depoimento nesta parte não mereceu nenhuma credibilidade.
Em síntese nestes aspectos a prova produzida, não logrou convencer o tribunal”.
Por outro lado, é patente que não se pode recorrer ao regime legal dos factos notórios para alcançar as despesas suportadas pelo apelante neste campo.
Desta maneira, há apenas que acrescentar ao dito facto provado o gasto de dinheiro pelo recorrente com combustível da viatura que usa, ficando tal facto com a redacção, a negrito, que agora inserimos no elenco dos factos provados.
2.4. Finalmente, entende o apelante – vide conclusão M) – que o tribunal deveria ter dado como provado que a apelada pode deslocar-se da sua residência para a Universidade através de comboio não necessitando de arrendar um quarto, uma vez que está provada a existência de tal meio de transporte, pelo que se poderia ter obtido o horário dos comboios, tanto mais que tal informação é publicitada na página web da CP, para consulta pública. Para evitar dúvidas juntou um horário daquela empresa e para aquela linha ferroviária.
Acerca deste tema, a decisão não ficou indiferente ao mesmo. Repare-se que na sentença, que abaixo em 3. vai transcrita parcialmente, se disse num determinado passo que “Ficou provado que a requerente vive a 25 Km de Aveiro e que existe comboio da Mouriscas, local onde a requerente vive com a mãe, para Aveiro.
No entanto, não ficou provado que os horários dos comboios são compatíveis com o horário das aulas da requerente. Portanto o Tribunal entende que não resultou provado que a requerente podia evitar a despesa do arrendamento do quarto em Aveiro”.
Juntou agora, em alegações, o apelante o comprovativo do horário dos comboios para aquela linha (doc. admitido pelo relator). Consultado tal horário (vide fls. 189/190), conclui-se que desde a Mourisca do Vouga para Aveiro, a frequência de comboios é mais ou menos de hora a hora, partindo o primeiro às 6 da manhã de Águeda e da Mourisca por volta das 6,40h da manhã e o último por volta das 7 da noite, e de Aveiro para a Mourisca o último comboio parte às 18,51h, havendo um que parte às 8h da noite e vai só até Águeda, não até à Mourisca.
Nas suas contra-alegações, a apelada ripostou, juntando os horários da mesma na Universidade (docs. admitidos pelo relator). Consultados tais horários (vide fls. 210/213), conclui-se que embora existindo comboio de ida e volta de Mourisca do Vouga para Aveiro, nem sempre os horários do respectivo transporte permitiam à apelada utilizá-lo. Isto porque, no 1º ano da sua licenciatura (2011-2012), a mesma tinha aulas que: no 1º semestre terminavam às 19h à segunda e terça-feira e às 20h à quinta-feira; e no 2º semestre terminavam às 20h à segunda e terça-feira, e às 19h à quinta-feira, sendo que o último comboio partia de Aveiro para a Mourisca do Vouga, onde a apelada reside, às 18,51h. Quer dizer que a recorrida para apanhar este comboio, teria que faltar às últimas aulas, o que não é de todo possível e aceitável. No 2º ano da sua licenciatura (2012-2013), a mesma tinha, também, aulas que: no 1º semestre terminavam às 19h à terça-feira e quinta-feira; e no 2º semestre terminavam às 19h à segunda-feira e à quinta, e às 21h à sexta-feira, hora a que, também, já não existia comboio de Aveiro para a Mourisca do Vouga.
Deste modo, uma vez que, os horários das aulas eram incompatíveis com as deslocações de comboio de Aveiro para a Mourisca do Vouga, não se vê alternativa séria ao arrendamento de um quarto em Aveiro, por parte da recorrida, para aí pernoitar e levar a cabo os seus estudos.
Não há, por isso, razão para dar como provado o facto indicado pelo recorrente.
2.5. Facto notório, nos termos da previsão legal acima transcrita, agora sim, é a existência do subsídio de natal e o seu recebimento pelo recorrente como trabalhador do Intermarché. Na verdade, com o DL 88/96, de 3.7, o subsídio de Natal passou a ser devido à generalidade dos trabalhadores. Este diploma foi revogado pela Lei 99/2003, de 27.8 [art. 21º, nº 1, s)], que aprovou o Código do Trabalho de 2003 (art. 1º); neste Código o subsídio de natal estava previsto no art. 347º. Actualmente, preceitua o art. 263º, nº 1, do Código do Trabalho (aprovado pela Lei 7/2009, de 12.2) que o trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano, sendo que, nos termos do art. 258º, nº 2, do mesmo Código, a retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.
Compulsando o recibo de vencimento do recorrente de Janeiro de 2013 (a fls. 123, e que serviu para o tribunal dar como provado o facto 14.) vê-se que o vencimento base do mesmo é de 927 €, a que acresce a compensação por isenção de horário de trabalho de cerca de 232 €, total de 1.159 €, que é o valor correspondente ao subsídio de natal. Devendo incidir sobre o mesmo os descontos aí referidos no recibo da taxa social única (de 11%) de IRS (cerca de 15%) e sobretaxa em sede de IRS de 13 €. Operando o cálculo dá 127 € de desconto por efeito da TSU, mais 174 € de desconto de IRS, o que somado à dita sobretaxa ascende, no total a 314 €. Abatendo nos referidos 1.159 € alcançamos o resultado de 845 €, que é o montante mínimo que o recorrente receberá pelo subsídio de natal.
Dividindo tal montante por 12 meses, o que dá cerca de 70 € mensais, temos que o recorrente recebe ainda tal valor, correspondente à proporção do subsídio de natal, além do indicado no apontado facto 14.
Consequentemente, aditar-se-á, a negrito, a tal facto, esta parte do rendimento mensal auferido pelo recorrente.      
3. Na sentença recorrida escreveu-se que:
A noção legal de alimentos consta do artigo 2003º do Código Civil, que estabelece: 1-Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação, vestuário. 2- Os alimentos compreendem também a instrução e educação do alimentado no caso de este ser menor.
Dispõe, por sua vez, o nº1 do artigo 2004º do mesmo diploma legal: os alimentos serão proporcionados aos meios daqueles que houver de prestá-los e às necessidades daquele que houver de recebê-los, estabelecendo o seu nº2: na fixação dos alimentos atender-se-á, outrossim, à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência.
(…)
A prestação alimentar concreta há-de determinar-se a partir do confronto da necessidade do alimentando com as possibilidades económicas do devedor de alimentos, tendo em conta os critérios postos pelo artigo 2004º do C. Civil, dos quais resulta que na apreciação das possibilidades do obrigado, deve o juiz atender às receitas e despesas daquele, isto é, à parte disponível dos seus rendimentos normais, tendo em atenção as obrigações do devedor para com outras pessoa, não esquecendo que a possibilidade de prestar alimentos não resulta apenas dos rendimentos dos bens do obrigado, resultando igualmente de outros proventos do mesmo, designadamente os provenientes do seu trabalho, e ainda os seus rendimentos de carácter eventual - vide Vaz Serra, R.L.J., pág. 98.
Vale dizer, a medida da prestação alimentar destina-se pelo binómio:
possibilidades do devedor e necessidade do credor, devendo aquelas possibilidades e outras necessidade serem actuais
Acerca do pressuposto das possibilidades do obrigado, determina a lei que os alimentos serão proporcionais aos meios daquele que houver de prestá-los:
isto significa, além do mais, que não podem ser fixados em montante desproporcionado aos meios de quem se obriga, mesmo que desse modo não seja possível eliminar completamente a situação de carência do alimentado. Por outro lado, na apreciação o juiz deve atender à parte disponível dos rendimentos normais, tendo em atenção as obrigações do devedor para com outras pessoas -Acórdão da Relação de Coimbra, 26.01.2010, processo nº 882/08.8TBTNV.C1, www.dgsi.pt.
Ou seja, para a avaliação das possibilidades do obrigado à prestação de alimentos, deve, por um lado, atender-se ao volume dos seus rendimentos, contrapondo-o, todavia, com o montante dos seus encargos regulares.
No que diz respeito à primeira daquelas componentes, ela deve abarcar o acervo de todos os rendimentos, qualquer que seja a sua fonte lícita, de modo a abranger não só os rendimentos do trabalho, salários ou pensões, com todos os seus elementos, fixos e variáveis, como ainda os ganhos de natureza eventual.
(…)
Como defendeu o Acórdão do STJ, de 20/11/2003, in www.dgsi.pt, para se aquilatar da maior ou menor capacidade do devedor de alimentos terá de se tomar em linha de conta não só com os seus meios de rendimento como também com os encargos a que se encontre adstrito, para além daqueles que possam decorrer da própria prestação alimentícia a determinar. Mas tais encargos, obviamente, que carecem de ser hierarquizados de modo a que só sejam tomados em consideração os que se mostrem justificados pelas necessidades de uma condigna subsistência do prestador de alimentos, excluindo-se todos aqueles que promanem de uma obrigação que não possa, ou não deva, prevalecer sobre a obrigação alimentar. É que se assim não fosse, bastaria ao devedor de alimentos assumir os encargos voluptuários e desnecessários que lhe aprouvesse para ficar desobrigado de prestar alimentos, o que a ética e o direito não aceitam (sublinhado nosso).
Dir-se-á então que são pressupostos do direito a alimentos a verificação cumulativa dos seguintes elementos: que o alimentando não disponha de meios suficientes de subsistência; que o alimentando esteja impossibilitado de os obter; que haja possibilidade de os mesmos serem prestados por parte de quem estiver legalmente adstrito a essa obrigação.
Importa, assim, indagar da existência em concreto dos aludidos requisitos de que depende a obrigação de prestação de alimentos:
Das necessidades da Requerente:
Da actividade probatória realizada, resultou demonstrado:
-que a requerente tem despesas de 125,00 mensais de renda, actualmente em 130,00, por um quarto arrendado em Aveiro;
- 101,20 mensais, referentes a refeições que a requerente toma na cantina da universidade ( 2,30 x2 refeições x 22 dias),
-1.009,71 ao ano referente a propinas pela inscrição da requerente na Universidade de Aveiro;
- cerca de 45,00 de despesas mensais em água, luz, gás e internet do imóvel arrendado.
- despesas com livros, fotocópias e material escolar de que a requerente necessita para frequentar o seu curso que rondou no ano de 2011/2012 a quantia de 34,82.
- em produtos de higiene, roupa e calçado gasta cerca de 50,00 mensais.
Ficou ainda provado que a requerente no ano lectivo de 2011/2012 recebeu uma bolsa de estudos mensal, no valor de 120,90 e no ano de 2012/2013 está a receber uma bolsa de estudos mensal no valor de 103,80.
*
A carência de alimentos da requerente e a medida das suas necessidades acham-se, pois, bem espelhada neste quadro fáctico descrito, pois não trabalha, nem tem nenhum rendimento.
(…)
*
Das possibilidades do Requerido:
Quanto à situação económica deste, mostra-se comprovado:
-O requerido trabalha no Intermarché de Viseu como pasteleiro, auferindo um salário mensal ilíquido de 1.362, 56 (mil trezentos e sessenta e dois euros e cinquenta e seis cêntimos) e líquido de 1.017,57 (mil e dezassete euros e cinquenta e sete cêntimos).
- Esse vencimento é o único rendimento que o requerido tem e é com ele que faz face as suas despesas mensais.
-O requerido paga uma prestação mensal ao banco, a título de empréstimo bancário contraído para aquisição de habitação no valor de 262, 65 (duzentos e sessenta e dois euros e sessenta e cinco cêntimos), ao qual acresce o PPR mensal de 25,00 (vinte e cinco euros), seguro multirriscos habitação no montante de 2, 53 (dois euros e cinquenta e três cêntimos), seguro vida habitação no valor de 4, 17 (quatro euros e dezassete cêntimos) e o seguro de vida no valor de 55, 07 (cinquenta e cinco euros e sete cêntimos).
- O requerido de despesas de água, luz, telefone e condomínio, o requerido despende a quantia de cerca de 152, 00 (cento e cinquenta e dois euros).
- Em alimentação o requerido gasta cerca de 7,00 por dia, o almoço é pago pela sua entidade patronal.
-O requerido tem um quarto alugado em Viseu, pagando por mês a renda de 130,00.
Portanto o requerido tem despesas mensais fixas que ascendem a cerca de 800,00.
Tem rendimentos mensais de cerca de 1.017,57 (retribuição base + subsídio de refeição e duodécimos de subsídios de férias)
Não se configura, assim, a impossibilidade de prestar alimentos que o mesmo invoca, antes se constatando que, apesar de ser pouco desafogada a sua situação económica, a mesma permite satisfazer, sem comprometer a sua própria subsistência, a prestação de alimentos a favor da filha no valor de 140,00.
O requerido tem de perceber que a prestação de alimentos à sua filha é um encargo superior, em relação a outro tipo de despesas que tem. Cabe aos pais lutarem e sacrificarem-se pelo sustento dos seus filhos, até estes completarem a sua formação.
Aliás, antes da requerente atingir a maioridade, o requerido contribuía com uma prestação de alimentos no valor de 125,00 por mês e a sua subsistência não foi colocada em causa” – fim de transcrição.
O recorrente ergue ao sentenciado três objecções.
A primeira - vide as conclusões R) e S) - é que a apelada não logrou provar, como lhe incumbia, o segundo dos requisitos do direito a alimentos, elencados na sentença recorrida, ou seja, que esteja impossibilitada de obter rendimentos para a sua subsistência. Segundo o mesmo a apelada não provou que não pudesse obter um emprego, ainda que em part time, e assim obter rendimentos para custear as suas despesas, tanto mais quanto hoje em dia há muitos jovens estudantes que, dadas as dificuldades das suas famílias, para poderem estudar e custear as suas despesas procuram um trabalho.
É muito louvável a atitude dos jovens estudantes de busca de um emprego em part time, para obter rendimentos suplementares ou adicionais aos prestados pelos pais, mas o que é certo é que nem sempre isso é possível de concretizar. Ou porque não se consegue obter esse emprego em part time; ou porque é mal remunerado em relação ao trabalho proporcionado; ou porque entra em colisão com os horários universitários; ou porque fora desses horários é gerador de cansaço prejudicial à concentração e estudo universitário; ou porque é normalmente incompatível com o esforço e responsabilidade exigível num curso universitário, etc., havendo, assim, uma panóplia de razões invocáveis.
Não cremos, no entanto, que no caso concreto isso fosse possível, dado o horário escolar da recorrida (aulas de manhã e à tarde, conforme resulta dos horários escolares que se mostram juntos aos autos), além de, como deixámos implicado, todo o empenho e dedicação que uma licenciatura exige, colocando-se em causa a boa prossecução dos seus estudos.
Não vemos, assim, que se mostre desrespeitado tal requisito e violado o normativo de onde ele emerge, o citado e transcrito art. 2004º, nº 2, do CC.
Mais importante, porém, que esta constatação, é o obstáculo legal que o art. 1880º do CC levanta a tal interpretação, preceito que estabelece que os pais são obrigados a manter o sustento, segurança, saúde e educação dos filhos, mesmo após a maioridade se tal for necessário e razoável para os filhos acabarem a sua formação profissional.
Aquele 2004, nº 2, e este 1880º não são coadunáveis, pois como se explana no Ac. do STJ de 7.12.2005 (Proc.05B3336, em www.dgsi.pt) o art. 1880º prevê uma situação em que se pressupõe que o alimentando não trabalha, no sentido em que não angaria os meios de subsistência, mas em que estuda. É essa, aliás, a razão para existirem os alimentos. Pelo que, nesta hipótese, a capacidade de obter meios para subsistir, não é, ao contrário de outras situações de alimentos, um pressuposto do direito. Note-se, até, que este direito é o prolongamento, dentro dos limites da razoabilidade, como refere o preceito, da situação de menoridade, sendo certo que ao menor não se exige a capacidade de angariar meios de subsistência. Aliás, um exemplo perfeito desta asserção é o caso dos autos, pois a requerente atingiu a maioridade em Setembro de 2011 e nessa altura começou a cursar o seu ensino universitário.
A segunda objecção – vide a conclusão AA) - reporta-se ao facto de na parte final da sentença recorrida se referir que o apelante, antes da recorrida atingir a maioridade, contribuía com uma prestação de alimentos no valor de 125 € sem a sua subsistência ter sido posta em causa; e ainda por ter sido amplamente demonstrado mas não referido na sentença que nesse período o apelante não tinha o encargo com o empréstimo à habitação, uma vez que só depois é que adquiriu tal imóvel.
Concordamos que a primeira parte referida pelo apelante não é relevante, pois uma situação concreta de vida, hoje, pode rápida e facilmente transformar-se noutra bem diferente, com outros condicionalismos e pressupostos. Em abstracto, pouco importa, pois, que o apelante prestasse alimentos no valor de 125 €, visto que em concreto a situação de vida do mesmo pode ter-se alterado substancialmente. Certo é que eventual alteração nos seus encargos não vem demonstrada, porque o recorrente não alegou nunca na 1ª instância (em algum articulado ou requerimento) que nesse período não tivesse encargo com o empréstimo à habitação, uma vez que só depois é que ele nasceu. Só agora, em recurso, vem alegar tal facto, tarde de mais obviamente. E se isso foi amplamente demonstrado não vemos onde, nos autos não foi, a não ser que tal tenha sido referido em julgamento pelas testemunhas, hipótese que não deixa margem de manobra nenhuma a esta Relação, pois o julgamento não foi gravado (nem, aliás, a julgadora de facto mencionou tal tema na sua motivação de facto). De todo o modo, essa situação não é determinante, pois não é pelo facto de o apelante ter prestado, no passado, alimentos à filha de 125 € que implicou agora ser condenado a prestar 140 €, como resulta da leitura da sentença, já que em tal sentença se equacionou o binómio legal - necessidades do alimentando versus possibilidades do obrigado aos alimentos.
Por fim, a última objecção e a mais relevante respeita exactamente à ponderação desse referido binómio legal. Vejamos então as possibilidades do obrigado a alimentos, o apelante, certo que a recorrida, a alimentanda necessita dos mesmos (quantitativamente de 341,22 € mensais, atento os factos provados 10. a 13.).
Neste aspecto verifica-se que auferindo mensalmente o apelante 1.017,57 €, e tendo como encargos totais líquidos mensais o montante de 841,42 € (é a soma resultante das quantias resultantes dos factos provados 16., 17., 19. – 7 € x 30 dias – e 20.), lhe remanesce a quantia mensal de 176,15 €. Mais os 70 € mensais correspondentes à proporção do subsídio de natal. Ou seja, um total remanescente de 246,15 €.
Mas apurou-se que o mesmo, embora não se tenha logrado quantificar, tem ainda de se vestir, e calçar; tem despesas de higiene e de saúde; tem de pagar as revisões do veículo que conduz, os respectivos seguros e impostos, designadamente o de circulação (facto 21.). Igualmente se apurou que despende dinheiro em combustível nas 2 viagens, de ida e volta, que faz uma vez por semana desde Recardães a Viseu e vice-versa (factos 18. e 21.). Daquela localidade até esta cidade distam cerca de 80 Km como o recorrente bem assinala, com recurso ao guia Michelin (www.viamichelin.pt), considerando o percurso a tomar, designadamente a A25 e o IP 25, o que quer dizer que o mesmo semanalmente percorre 160 km. Desconhecemos qual é a viatura automóvel do recorrente, a sua cilindrada e antiguidade. Mas considerando um carro a gasóleo, o litro do mesmo a cerca de 1,40 €, e um consumo médio de 6 litros aos 100 km, teremos um resultado aproximado por viagem na casa dos 13 € (9 litros e pouco dos 160 km vezes 1.40 €). Ou seja, mensalmente pelo menos 52 €. Desconhecemos se paga IMI, dado ser proprietário de imóvel ou se por enquanto está isento.
Balanceando, tendo em conta os referidos 52 € mensais de combustível, e as despesas em vestuário e calçado, em despesas de higiene e de saúde, em revisões ou reparações mecânicas do veículo, no respectivo seguro de responsabilidade civil automóvel, e em imposto de circulação, e uma ou outra portagem, não cremos que o total de tais despesas tenham um custo médio mensal inferior a 125 €. Todos os encargos do recorrente não são manifestamente voluptuários.
É, agora, hora de lembrar o ensinamento de A. Varela, expresso no seu CC Anotado, Vol. V, nota 3. ao artigo 2004º do CC, pág. 581, o de que os alimentos “Não podem, por conseguinte, ser fixados em montante desproporcionado com os meios de quem se obriga, mesmo que desse modo se não consiga eliminar por completo a situação de carência da pessoa a quem a prestação é creditada”.   
Ponderando, então o remanescente líquido apurado, acima referido de 246 €, e os encargos do recorrente não liquidados, mas não inferiores aquela indicada quantia de 125 €, ou seja uma disponibilidade mensal do recorrente de 121 €, e o aludido quantitativo das necessidades da recorrida, temos por ajustado e proporcional (vide a mesma expressão legal usada no citado artigo 2004º, nº 1, do CC) fixar em 115 € a importância devida pelo recorrente a título de alimentos.
4. Sumariando (art. 713º, nº 7, do CPC):
i) Facto notório é aquele que não carece de prova nem de alegação, devendo considerar-se como tal o facto que é do conhecimento geral do cidadão comum;
ii) No pedido de prestação de alimentos, ao abrigo do art. 1880º do CC, o filho maior não tem de demonstrar que está impossibilitado de obter rendimentos para a sua subsistência, uma vez que se trata duma situação que é o prolongamento da situação de menoridade, em que a lei pressupõe que o peticionante estuda, não que trabalha ou pode trabalhar;
iii) Não podem ser fixados alimentos em montante desproporcionado aos meios de quem se obriga, mesmo que desse modo se não consiga eliminar por completo a situação de carência da pessoa a quem a prestação é devida;
iv) É de fixar em 115 € mensais a prestação de alimentos de um pai a favor da sua filha, para términus por esta da sua formação profissional, se o pai aufere 1.087 € mensais, tem encargos líquidos de cerca de 841 € mensais e outros encargos mensais, não concretamente quantificados, relacionados com vestuário e calçado, despesas de higiene e de saúde, revisões do veículo que conduz, respectivo seguro, imposto de circulação, e combustível nas 2 viagens, de ida e volta, que faz uma vez por semana, onde percorre 160 km, e uma ou outra portagem, despesas cujo custo médio mensal não são inferiores a 125 € mensais.


IV – Decisão


Pelo exposto, julga-se o recurso procedente, parcialmente, e em consequência, revogando-se nesta parte a sentença recorrida, fixa-se os alimentos devidos pelo recorrente R (…) a sua filha A (…) o montante de 115 € mensais, no demais se mantendo a sentença recorrida (notando-se que a condenação imposta na sentença de o recorrente pagar à recorrida desde 8.10.2012, será pela quantia ora fixada de 115 €).
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Custas (do recurso e da acção) pelo recorrente e recorrida na proporção do vencimento/decaimento.
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  Coimbra, 10.12.2013

Moreira do Carmo ( Relator )
Fonte Ramos
Inês Moura