Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
606/10.0T4AVR-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE MANUEL LOUREIRO
Descritores: UNIÃO DE FACTO
PERDA DE DIREITO
PENSÃO
Data do Acordão: 06/27/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DO BAIXO VOUGA – JUÍZO DO TRABALHO DE AVEIRO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 20º/3 DA LAT/97; 2020º CC; 1º/2 DA LEI 7/01, DE 11/05.
Sumário: I – Nos termos do artº 20º/3 da LAT/97, as pessoas beneficiárias de pensão por acidente de trabalho do seu ex-cônjuge perdem o direito a essa pensão no caso de contraírem união de facto, dispondo o artº 49º/2 do RLAT que são consideradas uniões de facto as que preencham os requisitos do artº 2020º do C. Civil.

II – Face ao estatuído no artº 2020º do CC, na redacção que lhe foi conferida pela Lei 23/10, de 30/08, deve considerar-se que se encontra numa situação de união de facto relevante para os efeitos referidos aquele que, no momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens, vivia com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges – artº 1º/2 da Lei 7/01, de 11/05.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

I - Relatório

A requerente peticionou a caducidade do direito à pensão atribuída à requerida, por apenso aos autos de acidente de trabalho em que por morte do sinistrado foi reconhecido à requerida o direito à mencionada pensão, alegando como fundamento da sua pretensão a circunstância de a requerida viver em situação de união de facto com um terceiro pelo menos desde Junho de 2006.
Juntou cópias de certidão do assento de nascimento da beneficiária, do assento de nascimento de um filho da beneficiária e do terceiro, certidão de matrícula da sociedade C..., Lda., cujos sócios são a requerida e o terceiro, bem como comprovativos dos pagamentos das pensões que a requerente fez à requerida desde Junho de 2006 a Outubro de 2013.
Notificada a beneficiária para se poder pronunciar, nada alegou.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido de entender estarem reunidos os pressupostos para ser declarada a caducidade do direito à pensão da beneficiária.
[…]
Foi solicitada informação à Segurança Social sobre as moradas da requerida e do terceiro, as quais se encontram juntas a fls. 106 e 107.
[…]
A requerida respondeu a esse articulado (referência Citius 15861007), impugnando os factos aduzidos pela requerente naquele articulado superveniente e pugnando pela improcedência da pretensão deduzida pela mesma.
Foram inquiridas as testemunhas indicadas pela requerente.
Logo após, foi proferida decisão de cujo dispositivo consta o seguinte:
Pelo exposto, declara-se a caducidade da pensão nos autos apensos atribuída à requerida/beneficiária B..., a cargo da requerente “ A..., SA” e, consequentemente, extinta a responsabilidade desta reportada a 30.04.2010.”.
Dessa decisão interpôs recurso a requerida, apresentando as seguintes conclusões:
[…]
A requerida contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto apôs o seu visto.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II – Questões a resolver

Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso, as questões a abordar e a decidir são as seguintes:
1ª) se a matéria de facto foi incorrectamente julgada;
2ª) se a matéria de facto permite a declaração de caducidade do direito à pensão da requerida e, na afirmativa, se a caducidade deve ser declarada apenas com efeitos reportados a 20/2/2014.
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III) – Fundamentação

A) De facto

A.1) A impugnação da decisão sobre a matéria de facto

Primeira questão: se a matéria de facto foi incorrectamente julgada.

[…]
*
A.2) Os factos provados

A primeira instância deu como provados, sem censura deste tribunal, os factos a seguir transcritos:

[…]
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B) De Direito


Segunda questão: se a matéria de facto permite a declaração de caducidade do direito à pensão da requerente e, na afirmativa, se a caducidade deve ser declarada apenas com efeitos reportados a 20/2/2014.

A sentença recorrida fixou os efeitos da declaração de caducidade em 30/4/2010, último dia do mês em que se iniciou a união de facto que constitui fundamento da caducidade do direito à pensão.
A recorrente considera, em via principal, que não existe factualidade que permita fixar o início da alegada união de facto e que, por isso, não pode ser decretada a caducidade requerida pela recorrida.
Subsidiariamente, considera que a declaração de caducidade só deve produzir os seus efeitos em 20/2/2014, data da decisão sob censura.
A procedência de qualquer das pretensões deduzidas pela recorrente em sede de impugnação em matéria de direito, seja em via principal, seja em via subsidiária, dependia da procedência da pretensão recursiva da mesma recorrente deduzida em sede de impugnação da matéria de facto, no sentido da eliminação da matéria constante dos pontos 7 e 8 dos factos provados.
Tendo improcedido esta última pretensão, necessariamente que aquelas também têm de improceder.
De resto, importa considerar que nos termos do art. 20º/3 da LAT/97 – em vigor à data do acidente a que os autos se reportam (8/10/2000) –  as pessoas beneficiárias perdem o direito à pensão no caso de contraírem união de facto, dispondo do art. 49º/2 do RLAT que “São consideradas uniões de facto as que preencham os requisitos do artigo 2020.º do Código Civil.”.
Face ao estatuído nesse art. 2020.º do CC, na redacção que lhe foi conferida pela Lei 23/10, de 30/8, devem considerar-se que se encontra numa situação de união de facto relevante para os efeitos em análise aquele que, no momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens, vivia com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges – cfr., também, o art. 1º/2 da Lei 7/01, de 11/5, na redacção da Lei 23/10, de 30 de Agosto, nos termos do qual “A união de facto é a situação jurídica de duas pessoas que, independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos.”.
Importa referir, ainda, que embora não automática e sujeita a declaração judicial que a declare (acórdão da Relação de Coimbra de 29/3/12, proferido no âmbito da apelação 73/1996.1.C1, de que foi relator o aqui segundo adjunto), a caducidade produz os seus efeitos por referência à data em que se verificou o evento que a determina legalmente (v.g. maioridade, no caso de pensão temporária atribuída a um filho do sinistrado, morte  segundas núpcias ou união de facto do beneficiário …) - acórdãos da Relação do Porto de 11/1/1994 (JTRP00030754), de 20/6/05 (JTRP00038226), de 12/6/2006 (JTRP00039302), acórdão da Relação de Lisboa de 11/4/1991 (JTRL00004068), todos disponíveis na base da dados da DGSI, acórdão da Relação de Coimbra de 29/3/12, proferido no âmbito da apelação 73/1996.1.C1, de que foi relator o aqui segundo adjunto.
Assim sendo, fixada factualmente em Abril de 2010 a data de início da união de facto entre a recorrente e o seu companheiro, daí se extrai uma dupla consequência, a saber: 1ª) não é possível sustentar, como o faz a recorrente, que os factos provados não permitem fixar o momento do início da situação de facto, pois esta iniciou-se em Abril de 2010; 2ª) não é possível considerar-se que a caducidade apenas opera com a decisão que a declara, datada de 20/2/2014, posto que a situação determinante da caducidade assim declarada se iniciou em Abril de 2010.
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IV - Decisão

Deliberam os juízes que integram esta secção social do Tribunal da Relação de Coimbra no sentido de julgar a apelação improcedente e, assim, confirmar a decisão impugnada.
Custas pela recorrente.
Coimbra, 27/6/2014.
 (Jorge Manuel Loureiro - Relator)
 (Ramalho Pinto)
 (Azevedo Mendes)