Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2493/08.9PCCBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BRÍZIDA MARTINS
Descritores: RECURSO
MATÉRIA DE FACTO
IN DUBIO PRO REO
LEGÍTIMA DEFESA
Data do Acordão: 03/17/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: 32º E143º DO CP, 127º,410º,412º 428º DO CPP
Sumário: 1.No recurso sobre a matéria de facto a motivação deve conter os concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados, com especificação das provas que imponham outra decisão, sendo que tais especificações, quando tiver havido gravação da prova, devem ser feitas por referência ao consignado em acta, indicando as passagens em que se funda a impugnação.

2. O princípio do in dúbio pro reo é uma emanação do princípio da presunção de inocência, surgindo como resposta ao problema da incerteza em processo penal, e impondo a absolvição do acusado quando a produção de prova não permita resolver a dúvida inicial que está na base do processo. Se, a final, persiste uma dúvida razoável e insanável acerca da culpabilidade ou dos concretos contornos da actuação do acusado, esse non liquet na questão da prova tem de ser resolvido a seu favor, sob pena de violação do dito princípio.

3.A dúvida que há-de levar o tribunal a decidir pro reo tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária, ou, por outras palavras, ainda uma dúvida que impeça a convicção do tribunal.

4.A legítima defesa tem por requisitos, como claramente decorre do artigo 32.º do Código Penal, a ocorrência de uma agressão actual, isto é, estar a realizar-se, em desenvolvimento ou iminente; ilícita, ou seja, não ter o agressor direito a infligir ou a praticar a agressão, só evitável ou neutralizável através de uma acção ou acto de defesa, acto que, atenta a sua função deve limitar-se à utilização do meio ou meios, suficientes para evitá-la, consabido que em consequência desse acto ir-se-ão atingir bens ou interesses do agressor.

Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.
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I – Relatório.
1.1. D. já identificado nos autos, foi submetido a julgamento porquanto acusado pelo Ministério Público da prática indiciária de factualidade integradora da autoria material consumada de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143.º, n.º 1.º do Código Penal.
J, também melhor identificado, deduziu pedido de indemnização cível peticionando a condenação do mesmo arguido na quantia de € 758,50, isto para ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais por si próprio sofridos em consequência da assacada conduta delitiva.
Por seu turno, os Hospitais da Universidade de Coimbra formularam pedido de reembolso das despesas mantidas em assistência para com o mencionado demandante, por virtude da actuação em causa, fixando o respectivo valor em € 143,50.
Realizado o contraditório, mostra-se proferida sentença determinando, ao ora relevante:
- Condenar o arguido pela prática do crime imputado, na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros), o que perfaz o valor total de € 960,00 (novecentos e sessenta euros).
- Julgar procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante e, em consequência, condenar o demandado a solver-lhe o montante de € 758,50, sendo que sobre a quantia de 58,50, acrescem juros de mora, à taxa de 4%, contados desde a notificação para contestar o PIC, até efectivo e integral pagamento.
- Julgar procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelos Hospitais da Universidade de Coimbra e, em consequência, condenar o demandado a pagar-lhes o montante de € 143,50 (cento e quarenta e três euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, contados desde a notificação para contestar o PIC até efectivo e integral pagamento.
1.2. Irresignado com o sentenciado, o arguido interpôs recurso, extraindo da respectiva motivação a formulação das conclusões seguintes:
1.2.1. Mostram-se incorrectamente julgados, pois que relativamente a eles não foi feita, em audiência, a produção de qualquer prova válida, os factos considerados como provados na decisão recorrida, sob os n.ºs 2, 3 e 4 (por lapso manifesto escreveu 17, 18 e 19).
1.2.2. Decisão que é consequência de uma construção aparentemente lógico dedutiva completamente desfasada da factualidade apurada.
1.2.3. Pelo que incorreu na violação, entre outros, aos artigos 32.º, n.º 2 da Lei Fundamental; 127.º; 340.º e 374.º, n.º 2, estes todos do Código de Processo Penal.
1.2.4. Padece igualmente a decisão recorrida do vício de insuficiência da decisão da matéria de facto provada, a que alude o artigo 410.º, n.º 2, alínea a), do indicado diploma adjectivo.
1.2.5. A prova produzida nos presentes autos impunha ao Tribunal a quo uma decisão oposta àquela que sufragou, isto atentando-se em que o recorrente não praticou o crime pelo qual vinha acusado e acabou condenado.
1.2.6. O Tribunal a quo apenas valorou a parte que lhe interessava para suportar a condenação do arguido, sendo deste modo irrelevantes os factos que atribuíram à sua conduta o agir em legitima defesa, pois que se encontrava “agarrado” pelo ofendido.
1.2.7. Pelo que devia o Tribunal sindicado tomar uma decisão oposta à que resulta da sentença recorrida, tendo em conta que o recorrente agiu em legítima defesa, ou num contexto que não foi possível determinar em sede de julgamento.
1.2.8. O resultado da acção típica verificado, não foi de modo algum determinado pelo arguido.
1.2.9. Os elementos do tipo legal de crime não se encontram totalmente preenchidos, pelo que o Tribunal a quo fez uma subsunção errada dos factos ao crime de ofensa à integridade física simples.
1.2.10. A condenação do arguido, parte erradamente do pressuposto de que o mesmo desferiu “duas vezes (!)” o copo na cabeça do ofendido, pondo o Tribunal de lado todo o circunstancialismo que levou a que tanto o arguido como o ofendido sofressem lesões recíprocas, por causa da conduta de ambos.
1.2.11. Dúvidas não existem em como estamos perante a violação do princípio in dúbio pro reo, segundo o qual o juiz deve decidir sobre toda a matéria que não seja afectada pela dúvida, e como ficou demonstrado nos autos, pela prova testemunhal, os factos que na sentença foram considerados provados, sofrem irremediavelmente de insuficiência probatória.
1.2.12. Nos presentes autos não ficou só provado que o recorrente não cometeu o crime por que acabou condenado, como foi criada uma claríssima dúvida quanto aos factos pelos quais vinha acusado, impondo-se, assim, a respectiva absolvição.
Terminou pedindo a revogação do decidido.
1.3. Notificado para, querendo, o fazer, respondeu o Ministério Público sustentando a manutenção do sentenciado.
1.4. Admitido o recurso, foram os autos remetidos a esta instância.
1.5. Aqui, a Ex.ma Procuradora-geral Adjunta emitiu parecer conducente a idêntico improvimento da oposição.
Cumpriu-se com o disciplinado pelo artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
No exame preliminar a que alude o n.º 6 do mesmo inciso, consignou-se nada obstar ao conhecimento de meritis.
Não sendo caso de se decidir, por forma sumária; porque não se mostrando requerida a realização de audiência e, por inexistirem quaisquer provas a dever renovadas, determinou-se o prosseguimento do recurso, com recolha dos vistos devidos, o que sucedeu, bem como submissão á presente conferência.
Cabe, então, ponderar e decidir.
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II – Fundamentação de facto.
2.1. A sentença recorrida teve por provados os factos seguintes:
1. No dia 23 de…. de 2008, pelas 16.30 horas, o queixoso e o arguido encontravam-se nas imediações do Café …, na Rua …, área da cidade e comarca de Coimbra, tendo o primeiro advertido o arguido que não podia sair do café com o copo de vidro na mão.
2. O arguido, em reacção ao que lhe foi dito, desferiu uma pancada com o copo que tinha na mão no sobrolho direito de J causando-lhe um corte.
3. Após desferiu outra pancada com o copo no queixoso atingindo-o na nuca, onde lhe provocou outro golpe.
4. O copo utilizado pelo arguido acabou por se partir, provocando ferimentos também no arguido.
5. Com tal conduta, J sofreu um ferimento na região perieto-occipital esquerda, com 8 centímetros de comprimento e um ferimento na região supraciliar e pálpebra superior direitas, medindo 2,5 centímetros de comprimento, que lhe determinaram 10 dias de doença, sem incapacidade para o trabalho.
6. O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, com intenção de agredir fisicamente o queixoso.
7. O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.
8. Por força dos ferimentos referidos em 3., J precisou de receber assistência hospital nos Serviços de Urgência dos Hospitais da Universidade de Coimbra, pela qual pagou € 8,50 de taxa de atendimento.
9. No momento referido em 1. J vestia uma camisa de marca GAS, no valor de € 50,00 que ficou rasgada com os estilhaços do copo.
10. O demandante sentiu frustração e dor por força dos ferimentos que sofreu.
11. Por causa dos ferimentos, J viu-se obrigado a rapar o cabelo que usava comprido.
12. Os encargos da assistência prestada a J em 23 de…. de 2008, pelo Serviço de Urgência dos Hospitais da Universidade de Coimbra, originada pelos ferimentos apresentados em consequência de agressão praticada por D, ascenderam a € 143,50.
13. No certificado de registo criminal do arguido nada consta.
14. O arguido é licenciado em história e estuda turismo e defesa do património.
15. Vive com a mãe, que é empregada doméstica e o sustenta.
16. Vivem em casa própria.
2.2. A mesma peça processual e no que concerne agora a factos não provados, consigna:
Não se provaram outros factos com interesse para a boa decisão da causa, nomeadamente que:
a) O demandante sofreu stress, medo e humilhação.
b) Depois de ter sido advertido pelo queixoso, o arguido colocou-se de costas para o mesmo.
c) O queixoso agarrou violentamente o arguido por trás, nomeadamente o pescoço, forçando-o com uma das mãos a devolver-lhe o copo.
d) Os colegas do arguido tentaram afastar o arguido do ofendido, que se encontrava praticamente imobilizado por este.
e) Com a força que o queixoso fez para retirar o copo da mão do arguido, o vidro partiu-se.
2.3. Por último, é do teor que segue a motivação probatória inserta na mesma sentença recorrida:
A convicção do Tribunal acerca dos factos acima descritos e dados como provados fundou-se no conjunto das provas produzidas em audiência – em concreto nas declarações do arguido e nos depoimentos das testemunhas J. A e G – e na prova documental junta aos autos, designadamente os documentos de fls. 6 a 8, 12 a 14, 40, 49 e 55, analisadas de forma crítica, à luz de critérios de normalidade e de regras de experiência comum, como se passa a analisar.
O arguido reconheceu ter estado com o queixoso na hora e local referidos na acusação e bem assim ter um copo na mão, que se partiu, ter dado com ele na cabeça de J e ter-lhe provocado ferimentos (facto 1.).
O relato que o arguido fez dos acontecimentos, designadamente que J o agarrou por trás e que, ao tentar soltar-se, se partiu o copo, não convenceu o Tribunal, uma vez que nenhuma das testemunhas relatou este contacto físico, nem tão pouco a testemunha G, amigo do arguido e que, segundo relato do arguido, esteve junto a si no momento dos factos.
Acresce que a versão apresentada pelo arguido não consegue explicar as lesões encontradas no queixoso. Com efeito, o arguido alegou que apenas bateu uma vez com o copo na cabeça do queixoso, no entanto, este tinha um corte no sobrolho e um corte na nuca, o que demonstra que foi agredido duas vezes e que o arguido, inequivocamente, faltou à verdade.
As declarações do arguido, no entanto, foram levadas em consideração para dar como provada a sua situação económico-social.
O depoimento do queixoso J foi relevante para o Tribunal dar como provados os factos que constavam na acusação, uma vez que, não obstante ter um interesse directo na causa e ter sido interveniente, relatou de forma convincente e segura o decurso dos factos.
Desde logo identificou o local e a data dos factos.
Depois explicou como começou a troca de palavras, referindo que o arguido trouxe um copo para o exterior do café, não obstante o dono do estabelecimento lhe ter dito para não o fazer, o que foi confirmado pelo arguido.
Referiu ainda ter afastado o arguido com uma mão e, nesse momento, ter levado com um copo no sobrolho direito, copo esse que se partiu com o embate.
Relatou de forma convincente que, acto reflexo, baixou a cabeça e levou com o copo já partido na nuca.
Disse ainda que, por força destes ferimentos, foi aos Hospitais da Universidade de Coimbra, levou 6 pontos na parte da frente e 12 na de trás e ficou doente 10 dias, até tirar os pontos, mas fazendo uma vida normal.
Referiu, também de forma credível, ter sentido dores e frustração, ter tido de rapar os cabelos, que usa compridos, e que usava na altura uma camisa de marca Gas, no valor de cerca de € 50 que ficou inutilizada com dois cortes.
A testemunha Arsénio Silva, dono do estabelecimento à porta do qual ocorreram os factos em questão, prestou um depoimento pouco convincente, na medida em que não foi capaz de explicar em que local concreto do estabelecimento se encontrava e em que medida conseguia ver para o exterior. Ainda assim, contribuiu para o Tribunal reforçar a convicção que já tinha por força dos demais depoimentos.
A testemunha G, amigo do arguido, disse ter estado com ele na data e local dos factos e, ainda que as suas declarações não tenham sido prestadas de forma absolutamente rigorosa, foram relevantes para o Tribunal dar como provado que o arguido desferiu uma pancada com o copo na cabeça de J.
Os factos provados relativos ao elemento intelectual e volitivo do dolo, resultou do conjunto das circunstâncias de facto dadas como provadas, de acordo com as regras da razoabilidade e da experiência comum, já que o dolo e o conhecimento são realidades não directamente apreensíveis, decorrendo antes da materialidade dos factos analisada à luz das regras da experiência comum.
Como é sabido, na formação da sua livre convicção, e em face da frequente impossibilidade de se apoiar nos chamados elementos de prova directa, pode o Tribunal fazer uma apreciação global e correlativa de toda a prova produzida e retirar ilações dos factos provados, socorrendo-se de um raciocínio dedutivo, apoiado nos princípios da lógica e fundamentado nas regras do normal acontecer. Neste raciocínio, pode o Tribunal inferir, a partir dos factos cuja prova resulta de prova directa, outros factos que são sugeridos por um critério de experiência comum ou pela lógica subjacente aos normais acontecimentos da vida.
Ora, no presente caso, foi precisamente com recurso a tal prova que o Tribunal logrou dar como provado que o arguido agiu de forma livre e conscientemente e com intenção de agredir fisicamente o queixoso.
É do senso comum que quem desfere uma pancada com um copo no sobrolho de outrem, ao ponto de partir o copo, e que, depois, bate com o copo partido na nuca dessa mesma pessoa o faz de forma livre e com a consciência e intenção de que está agredir a tal pessoa.
Mais, quanto ao facto provado 7. o Tribunal formou a sua convicção de forma em tudo semelhante, uma vez que o simples facto de o arguido viver em sociedade pressupõe que tenha interiorizado determinadas regras, uma das quais é a de que é proibido bater nos outros e que, fazendo-o, pode sofrer uma punição.
Quanto ao valor da assistência médica, o Tribunal valorou a factura n.º 2009/1768, emitida a 9 de Março de 2009 e junta a fls. 49 e quanto ao valor da taxa de urgência o Tribunal valorou o recibo n.º 1437127/GH06, de fls. 55.
No que respeita à ausência de crimes inscritos no certificado de registo criminal do arguido, o Tribunal teve em consideração o documento de fls. 40.
O facto constante da alínea a) foi dado como não provado por ausência de prova e os demais por se ter provado a versão dos factos trazida pelo queixoso, como acima se explicou.
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III – Fundamentação de Direito.
3.1. Como é consabido, o âmbito do recurso define-se através das conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação (artigo 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal), mas sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios ou das nulidades insanáveis referido/as, respectivamente, nos n.ºs 2 e 3 do artigo 410.º, do mesmo diploma (cfr., ainda, o Ac. do STJ n.º 7/95, em interpretação obrigatória).
No caso presente, não se vislumbrando fundamento que imponha qualquer dessas intervenções oficiosas, resulta constituírem questões decidendas as seguintes:
- A decisão recorrida padece do vício de insuficiência da matéria de facto, tal como prevenida na alínea a) do n.º 2, do encimado artigo 410.º?
- Ademais, a factualidade vertida nos seus pontos 2, 3, e 4 mostra-se incorrectamente avaliada?
- Nesta tarefa de ponderação da prova produzida, o Tribunal a quo preteriu, igualmente, o princípio do in dúbio pro reo?
- Por fim, ainda desconsiderou a emergência de uma causa de exclusão da ilicitude, qual seja da legítima defesa assumida pela conduta do recorrente?
A primeira, segunda e terceira das questões assim colocadas entroncam, sobremaneira, na tarefa de apreciação da prova feita em 1.ª instância, como veremos.
Daí que sejam abordadas em conjunto, não sem que, perfunctóriamente, se teçam parcas considerações genéricas sobre os critérios que nortearão tal apreciação.
Assim:
3.2. A impugnação da matéria de facto pode lograr obter-se por duas formas: através da alegação dos vícios decisórios elencados pelo citado artigo 410.º, n.º 2; ou, por intermédio da invocação de elementos da documentação da prova produzida em julgamento.
Na primeira situação, a argumentação dos vícios só pode fazer-se com arrimo ao texto da decisão recorrida, circunscrevendo-se a apreciação da matéria de facto ao que dele consta, por si só considerado ou em conjugação das regras da experiência comum, sem possibilidade de apelo a outros elementos estranhos ao texto, mesmo que constem do processo.
Os vícios da decisão têm de emergir ou resultar do próprio texto, têm de ser intrínsecos à própria decisão como peça autónoma.
O fundamento a que se alude na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º em causa, é a insuficiência da matéria de facto para a decisão de direito, que se não confunde com a insuficiência da prova para a decisão de facto proferida, coisa bem diferente Cfr. Ac. do STJ, de 13 de Fevereiro de 1991; AJ, n.ºs 15/16,7., referindo-se, por outro lado, o termo “decisão” á decisão justa que devia ter sido proferida, e não á decisão recorrida Cfr. Ac. do STJ, de 13 de Maio de 1998, CJ, Acs. do STJ, VI, tomo 2, 199.
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Já no segundo caso, a apreciação não se restringe ao texto da decisão recorrida, mas à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre a partir de balizas fornecidas pelo recorrente, no estrito cumprimento do ónus imposto pelos n.ºs 3 e 4 do artigo 412.º do Código de Processo Penal.
De acordo com este normativo, a motivação do recurso deve ser um enunciado das questões suscitadas e sobre as quais incida a disputa do recorrente, que deve especificar os fundamentos dessa mesma discordância.
Se estiver em causa a matéria de facto, deve a motivação conter os concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados, com especificação das provas que imponham outra decisão, sendo que tais especificações, quando tiver havido gravação da prova, devem ser feitas por referência ao consignado em acta, indicando as passagens em que se funda a impugnação.
Este ónus de especificação está ainda presente nas conclusões que terminam a motivação e que consistem num resumo dos fundamentos por que se pede o provimento do recurso, tendo como finalidade uma apreensão rápida e fácil das questões postas ao tribunal superior.
Nuclear nesta operação, o estatuído pelo artigo 127.º, do Código de Processo Penal, ao dispor que “Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.”
Ou seja, com excepção da prova vinculada, é, pois, no equilíbrio destas duas vertentes – as regras da experiência e a livre convicção do julgador – que a prova há-de ser apreciada.
Este princípio da livre apreciação da prova é válido em todas as fases processuais, mas é no julgamento que assume particular relevo. Não que se trate de prova arbitrária, no sentido de o juiz decidir conforme assim o desejar, ultrapassando as provas produzidas. A convicção do juiz não deverá ser puramente subjectiva, emocional e portanto imotivável. Tal decorre do artigo 374.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, quando estatui que a sentença deverá conter “uma exposição tanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito, que fundamentaram a decisão, com a indicação e exame crítico das provas que serviram para fundamentar a decisão do tribunal.”
Mas a decisão do juiz há-de ser sempre uma “convicção pessoal” – até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v.g., a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais Cfr. Prof. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Coimbra Editora, Vol. I, ed. 1974, pág. 204..
Por outro lado, a livre apreciação da prova é indissociável do princípio da oralidade.
Como ensinava o Prof. Alberto dos Reis, “a oralidade, entendida como imediação de relações (contacto directo) entre o juiz que há-de julgar e os elementos de que tem de se extrair a sua convicção (pessoas, coisas, lugares), é condição indispensável para a actuação do principio da livre convicção do juiz, em oposição ao sistema de prova legal”. E concluía aquele Professor, citando Chiovenda, que “ao juiz que haja de julgar segundo o princípio da livre apreciação da prova é tão indispensável a oralidade, como o ar é necessário para respirar.”
O indicado artigo 127.º indica-nos um limite à discricionariedade do julgador: as regras da experiência e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica. Assim, a exposição tanto possível completa sobre os critérios lógicos que constituíram o substrato racional da decisão – citado artigo 374.º, n.º 2 – não pode colidir com as regras da experiência.
Se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis segundo as regras da experiência, ela será inatacável, já que foi proferida em obediência à lei que impõe que ele julgue de acordo com a sua livre convicção. Na mencionada obra, a este propósito refere o Prof. Figueiredo Dias Págs. 233/234.: “Por toda a parte se considera hoje a aceitação dos princípios da oralidade e da imediação como um dos progressos mais efectivos e estáveis na história do direito processual penal. Já de há muito, na realidade, que em definitivo se reconheciam os defeitos de processo penal submetido predominantemente ao principio da escrita, desde a sua falta de flexibilidade até à vasta possibilidade de erros que nele se continha, e que derivava sobretudo de com ele se tornar absolutamente impossível avaliar da credibilidade de um depoimento (…). De qualquer modo, desde o momento em que – ­sobretudo por influxo das ideais da prevenção especial – se reconheceu a primacial importância da consideração da personalidade do arguido no processo penal, não mais se podia duvidar da absoluta prevalência a conferir aos princípios da oralidade e da imediação. Só estes princípios, com efeito, permitem o indispensável contacto vivo e imediato com o arguido, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade. Só eles permitem, por outro lado, avaliar o mais correctamente possível da credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais.
De reter também que o princípio do in dúbio pro reo é uma emanação do princípio da presunção de inocência, surgindo como resposta ao problema da incerteza em processo penal, e impondo a absolvição do acusado quando a produção de prova não permita resolver a dúvida inicial que está na base do processo. Se, a final, persiste uma dúvida razoável e insanável acerca da culpabilidade ou dos concretos contornos da actuação do acusado, esse non liquet na questão da prova tem de ser resolvido a seu favor, sob pena de violação do dito princípio.
Em todo o caso convém não olvidar que na aplicação da regra processual da «livre apreciação da prova» (ut apontado artigo 127.º, não haverá que lançar mão, limitando-a, deste princípio (do in dúbio pro reo), se a prova produzida [ainda que «indirecta»], depois de avaliada segundo as regras da experiência e a liberdade de apreciação da prova, não conduzir à subsistência no espírito do tribunal de uma dúvida positiva e invencível sobre a existência ou inexistência do facto.
Isto porquanto e com efeito, o in dúbio pro reoparte da dúvida, supõe a dúvida e destina-se a permitir uma decisão judicial que veja ameaçada a concretização por carência de uma firme certeza do julgador. Cfr. Cristina Líbano Monteiro, In Dúbio Pro Reo, Coimbra, 1997.

A prova, mais do que uma demonstração racional, é um esforço de razoabilidade. Nessa tarefa, o juiz lança-se à procura do «realmente acontecido» conhecendo, por um lado, os limites que o próprio objecto impõe à sua tentativa de o «agarrar». E, por isso, é que, nos casos em que as regras da experiência, a razoabilidade e a liberdade de apreciação da prova convencerem da verdade da acusação (Suscitando, a propósito, “uma firme certeza do julgador”, sem que concomitantemente “subsista no espírito do tribunal uma dúvida positiva e invencível sobre a existência ou inexistência do facto”.), não há lugar à intervenção da contra face (de que a «face» é a «livre convicção») da intenção de imprimir à prova a marca da razoabilidade ou da racionalidade objectiva que é o in dúbio pro reo (cuja pertinência «partiria da dúvida, suporia a dúvida e se destinaria a permitir uma decisão judicial que visse ameaçada a sua concretização por carência de uma firme certeza do julgador»).
A prova, o processo probatório traduz-se em verificar cada um dos enunciados factuais pertinentes para a apreciação e decisão da causa. Para o prosseguir, o tribunal está munido de uma racionalidade própria, em parte comum só a ela e que pode apelidar-se de razoável. A prova, mais do que uma demonstração racional, é um esforço de razoabilidade: no trabalho de verificação dos enunciados factuais, a posição do investigador-juíz pode, de algum modo, assimilar-se à do historiador: tanto um como o outro, irremediavelmente situados num qualquer presente, procuram reconstituir algo que se passou antes e que não é reprodutível. Donde que não seja qualquer dúvida sobre os factos que autoriza sem mais uma solução favorável ao arguido, mas apenas a chamada dúvida razoável (“a doubt for which reasons can be given”)». Isto porque nos actos humanos nunca se dá uma certeza contra a qual não militem alguns motivos de dúvida. Assim, pedir uma certeza absoluta para orientar a actuação seria, por conseguinte, o mesmo que exigir o impossível e, em termos práticos, paralisar as decisões morais. A dúvida que há-de levar o tribunal a decidir pro reo tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária, ou, por outras palavras ainda, uma dúvida que impeça a convicção do tribunal.
Também que como o primeiro vício invocado, há-de resultar do texto da decisão recorrida, integrando, una voce, o vício de erro notório Cfr. por todos o Ac. do STJ, de 15 de Abril de 1998, in BMJ, 476,82..
3.3. Na consideração exacta do acabamos de tecer, centremo-nos no caso sub judice.
E, constatação manifesta, a de que no afã em questionar a factualidade tida por provada, concretamente o haver agredido por duas vezes o ofendido, o recorrente faz uma amálgama de ambas as formas de impugnação indicadas e invoca, a despropósito, o proclamado princípio do in dúbio pro reo.
Na verdade:
Incorre, desde logo, em deficiente estruturação na alegação apresentada relativamente ao assacado vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
Tudo porquanto o que almeja é controverter a citada materialidade, pretextando a míngua de prova para a decisão tomada, quando, vimos, se atém o vício tão-somente a tal insuficiência para a decisão de direito.
Ora, além do elemento objectivo que se surpreende nos itens questionados, contem a sentença da 1.ª instância os necessários à configuração dos pressupostos exigíveis ao emergir da responsabilidade penal tal como decretada.
No que concerne á segunda das formas de impugnação utilizadas, constata-se, em rectas contas, o incumprimento pelo recorrente aos normativos disciplinadores que agora se lhe impunham. Referimo-nos à não menção na motivação e consequente transporte adequado para as conclusões dos ónus impostos nos n.ºs 3 e 4, do citado artigo 412.º.
O Tribunal Constitucional e o Supremo Tribunal de Justiça têm decidido pela inconstitucionalidade do entendimento que neste caso imporia a rejeição imediata do recurso quanto à matéria de facto sem previamente convidar o recorrente a suprir as deficiências e obscuridades das conclusões do mesmo A propósito, o aresto do primeiro desses Tribunais, com o n.º 529/2003, de 31 de Outubro, publicado no Diário da República [DR], II.ª Série, de 17 de Outubro de 2003, e, o prolatado pela segunda dessas instâncias, em 30 de Outubro de 2002, in Processo n.º 2535/02-3.ª, SASTJ, n.º 64, pág. 90. .
Compreende-se: são casos em que o recorrente expôs de forma válida e consistente as razões concretas da sua discordância, mas depois, por lapso, não as assinalou devidamente nas conclusões. Isto em nome de uma proibição de excesso, do princípio da proporcionalidade (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República), de compressão ao mínimo dos direitos, essencialmente do arguido, na filosofia marcada ao direito processual, que, enquanto instrumental, serve o direito material, substantivo.
Também sufragamos este entendimento.
Distinta a situação acaso o incumprimento se verifique na motivação, pois que seria facultar-se ao recorrente um novo prazo de recurso Vide artigo 417.º, n.º 4, do Código de Processo Penal..
Em todo o caso, pese embora tais anomalias, entendemos que na presente situação se não configura fundamento irrestrito para a rejeição que urgiria fazer-se desse segmento do recurso, nem, sequer, se justifica um prévio convite ao recorrente para que aperfeiçoasse as conclusões de acordo com os normativos aplicáveis.
Na realidade, a impugnação mostra-se perfeitamente delimitada: uma sua irresignação relativamente à consideração como provada da factualidade que acabou por determinar a sua condenação enquanto agente do crime de ofensas à integridade física e meios de prova que a alicerçaram.
Todavia, ouvindo-se as declarações e depoimentos prestados no decurso da audiência, a conclusão apenas pode ser a de que deve manter-se o juízo conclusivo da 1.ª instância.
Isto porquanto, sopesando-os com o exame crítico constante da “motivação probatória” da peça sindicada, o que se nos depara é que o juízo conclusivo formado o foi de acordo com um processo lógico-dedutivo fácilmente apreensível, porque conforme às regras da experiência comum.
Aliás, só por tal forma acatamos o entendimento de consistir o recurso um mero remédio jurídico, que não a sobreposição indiscriminada de uma convicção a uma outra que beneficiou inclusive da imediação e oralidade.
Seja, insubsistente este fundamento do recurso para controverter a factualidade provada.
Igual conclusão a decorrente do apelo feito a pretensa violação ao princípio do in dúbio pro reo.
É que, lendo-se a decisão recorrida, e só ela, em ponto algum se descortina que à M.ma Juiz a quo se houvesse suscitado um qualquer estado de dúvida e perante ele, o tivesse feito reverter em desfavor do arguido. Antes a sua convicção se mostrou segura.
Convicção alicerçada em provas admissíveis todas elas (cfr. artigo 125.º, do Código de Processo Penal), ademais valoradas de forma racional, lógica, objectiva, e de harmonia com as regras da experiência comum, donde que sem censura que se lhe haja de apontar.
Afirmação que traduz a inverificação de qualquer dos reclamados pressupostos de modificabilidade da decisão.
3.4. Tempo agora de ponderarmos da eventual emergência da alegada causa de exclusão da ilicitude, qual seja da legítima defesa.
No parecer que juntou aos autos, a Ex.ma Procuradora-geral Adjunta aduz algumas considerações genéricas sobre os pressupostos indispensáveis à sua configuração. Porque precisos, segui-los-emos.
A legítima defesa tem por requisitos, como claramente decorre do artigo 32.º do Código Penal [Constitui legítima defesa o facto praticado como meio necessário para repelir a agressão actual e ilícita de interesses jurídicamente protegidos do agente ou de terceiro], a ocorrência de uma agressão (sendo agressão, genericamente, toda a lesão ou perigo de lesão de um interesse próprio ou de outra pessoa protegido pelo ordenamento jurídico H. Jescheck, in Tratado de Derecho Penal Parte General, 4.ª edição, 1993, pág. 303.), devendo esta ser actual, isto é, estar a realizar-se, em desenvolvimento ou iminente (aferindo-se a iminência da agressão, habitualmente, pela ocorrência de situação perigosa, a qual se caracteriza pela prática de actos que, segundo a experiência comum e salvo circunstâncias imprevisíveis, forem de natureza a fazer esperar que se lhes siga o acto agressivo, isto é, a agressão), ilícita, ou seja, não ter o agressor direito a infligir ou a praticar a agressão, independentemente do facto de aquele se comportar dolosamente, com mera culpa ou se tratar de um inimputável, só evitável ou neutralizável através de uma acção ou acto de defesa, acto que, atenta a sua função, qual seja a de impedir ou repelir a agressão, deve limitar-se à utilização do meio ou meios, suficientes para evitá-la, consabido que em consequência desse acto ir-se-ão atingir bens ou interesses do agressor.
Assim, meios adequados para impedir ou repelir a agressão, mas mais danosos (para o agressor) do que aqueles que, sem deixarem de ser adequados (suficientes, eficazes), causariam menores lesões ou prejuízos ao agressor, serão considerados desnecessários e, como tal, excluirão a justificação do facto praticado pelo agredido (igualmente devem ser considerados inadequados os meios que, apesar de pouco danosos para o agressor, não dispõem de quaisquer possibilidades de impedir a agressão ou de dissuadir o agressor).
A significar que o defendente deve utilizar o meio adequado menos gravoso para o agressor Cfr. Taipa de Carvalho, A Legitima Defesa, ed. 1995, pág. 317..
Certo é que por meio utilizado deve entender-se, não só o instrumento ou arma, mas também o tipo de defesa. Deste modo, o juízo sobre a adequação do meio de defesa não pode deixar de ter em consideração as circunstâncias concretas de cada caso: o bem ou interesse agredidos, o tipo e a intensidade da agressão, a perigosidade do agressor e o seu modo de actuar, a capacidade físico-atlética do agressor e do agredido, bem como os meios de defesa disponíveis e as demais circunstâncias relevantes ocorrentes Cfr. Taipa de Carvalho, ibidem, pág. 318 e H. Jescheck, ibidem, pág. 308. .
Trata-se, pois, de um juízo objectivo e ex ante, pelo que o julgador se terá de colocar na posição que assumiria uma pessoa prudente perante as circunstâncias concretas ocorrentes, sem esquecer que a exigência de utilização do meio menos gravoso para o agressor não pode levar a fazer recair sobre o agredido riscos para a sua vida ou integridade física, a significar que o defendente não está obrigado a recorrer a meios ou medidas cuja eficácia para a sua defesa é duvidosa ou incerta Cfr. Fuchs, Notwer, ed. 1986, págs. 125/6 e Jakobs, Strafrecht, ed. 1991, pág. 393, citados por Taipa de Carvalho, ibidem, pág. 319, nota 554..
Quanto ao elemento subjectivo, conquanto parte significativa da nossa jurisprudência e certo sector da doutrina continuem a exigir a ocorrência de animus defendendi, isto é, a vontade de defesa, muito embora com essa vontade possam concorrer outros motivos, tais como indignação, vingança e ódio Cfr. Eduardo Correia, Figueiredo Dias, Direito Penal, ed. 1975, pág. 188; Leal Henriques/Simas Santos, Código Penal Anotado, ed. 1995, I volume, pág. 337. , a verdade é que se entende, na esteira da doutrina considerada Cfr. Taipa de Carvalho, ibidem, págs. 375/387; Fernanda Palma, A Justificação por Legítima Defesa como Problema de Delimitação de Direitos, ed. 1990, págs. 611/58 e 693., que o elemento subjectivo da acção de legítima defesa se restringe à consciência da «situação de legítima defesa», isto é, ao conhecimento e querer dos pressupostos objectivos daquela concreta situação, o que se justifica e fundamenta no facto de a legítima defesa ser a afirmação de um direito e na circunstância do sentido e a função das causas de justificação residirem na afirmação do interesse jurídico (em conflito) considerado objectivamente como o mais valioso, a significar que em face de uma agressão actual e ilícita se deve ter por excluída a ilicitude da conduta daquele que, independentemente da sua motivação, pratica os actos que, objectivamente, se mostrem necessários para a sua defesa.
A exigência do animus defendendi revela-se, aliás, desprovida de sentido, uma vez que se ocorrem os requisitos da «situação de legítima defesa» – agressão actual e ilícita, verificando-se que o defendente não teve outro remédio que defender-se (necessidade de defesa).
Revertendo ao caso presente o que se nos depara é que da matéria de facto não resulta qualquer facto provado que refira que o ofendido agrediu o arguido, que essa agressão foi actual ou simultânea e ilícita, que o ofendido molestou o arguido fisicamente, com intenção de o atingir no corpo e na saúde.
Antes, mostra-se assente que o arguido agiu consciente e livremente com o propósito conseguido de molestar fisicamente o ofendido, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Ou seja, não confluem os requisitos mencionados para que possa funcionar a invocada cláusula de exclusão da ilicitude.
O que tudo redundará na manutenção da condenação decretada.
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IV – Decisão.
São termos pelos quais se nega provimento ao recurso interposto.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça devida em 5 UCs.
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Coimbra, 17 de Março de 2010