Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1873/18.6T8VIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: CÚMULO JURÍDICO DAS CONTRAORDENAÇÕES
GARANTIAS DO TRABALHADOR
SUA OCUPAÇÃO EFETIVA
Data do Acordão: 03/15/2019
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU – JUÍZO DO TRABALHO DE VISEU – JUIZ 1
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE CONTRAORDENAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 19º E 32º DO RGCC; 60º DA LEI Nº 100/2009, DE 14/09. 129º DO C.TRABALHO
Sumário: I – Face ao disposto nos artigos 19.º e 32.º do RGCC (aplicável por força do disposto no artigo 60.º da Lei n.º 100/2009, de 14/09), tal regime não prevê o concurso superveniente de contraordenações, pelo que inexistindo qualquer omissão não há que recorrer, a título subsidiário, ao regime do concurso superveniente previsto no artigo 78.º do CP.

II - O artº 129º do C.T. estabelece as garantias do trabalhador consubstanciadas em proibições impostas ao empregador.

III - Nos termos do nº 1, al. b) de tal normativo é proibido ao empregador “Obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho.”

IV - Tal normativo impõe o dever de ocupação efectiva do trabalhador e como refere Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 12ª edição p. 281 “O seu reconhecimento pressupõe a ideia de que pode ser exigido a uma entidade empregadora que, sem ou mesmo contra a sua vontade, utilize efectivamente os serviços de um trabalhador na organização de que é titular”.

Decisão Texto Integral:





Recurso n.º 1873/18.6T8VIS.C1

Acordam[1] na Secção Social (6ª secção) do Tribunal da Relação de Coimbra:

  I – Relatório

  A arguida M. – ..., SA, com sede em ..., veio impugnar a decisão administrativa que lhe aplicou uma coima de €36.000,00 e a sanção acessória de publicidade pela prática de três contraordenações p. e p. pelos artigos 129.º, n.º 1, b, e n.º 2, 554.º, n.º 4, alínea e) e 561.º, todos do C.T.

  Recebido o recurso, procedeu-se a audiência de julgamento.

  De seguida, foi proferida a sentença de fls. 398 e segs. que julgou “o presente recurso improcedente por não provado, mantendo-se integralmente a decisão proferida pela autoridade administrativa, incluindo a coima, sanção acessória de publicidade e custas em que a arguida M..., S.A foi condenada.”

  A arguida, notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte:

...

O Ministério Público contra alegou nos seguintes termos:

...

O Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações, assistente nos autos, também veio apresentar resposta, concluindo que:

...                

O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o parecer de fls. 456, acompanhando integralmente a posição do Ministério Público vertida na resposta ao recurso.

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

II – Saneamento

A instância mantém inteira regularidade por nada ter entretanto sobrevindo que a invalidasse.

III – Questões a decidir

A arguida suscita as seguintes questões:

1ª – Nulidade da decisão administrativa por não ter procedido ao cúmulo jurídico de todas as coimas aplicadas à arguida.

2ª – Se não se encontra preenchido o elemento subjetivo do tipo legal imputado à arguida

3ª – Se a coima aplicada à arguida é desproporcionada.

4ª – Se devia ter sido aplicada a dispensa da sanção acessória de publicidade da condenação.

IV – Fundamentação

a) Matéria de facto provada:

...

b) - Discussão

1ª questão

Nulidade da decisão administrativa por não ter procedido ao cúmulo jurídico de todas as coimas aplicadas a arguida.

Alega a recorrente que a autoridade administrativa teria de verificar a existência de outros processos em todo o território nacional, com vista à aplicação de uma coima única, o que não sucedeu e, assim, a decisão administrativa é nula.

A este propósito consta da decisão recorrida o seguinte:

Refere a arguida que a ACT deveria ter averiguado da existência de outros processos de contra-ordenação nas várias delegações da ACT que deveriam ser cumulados e ter uma decisão única a nível nacional, sem contudo identificar qualquer processo.

Conforme é referido na decisão administrativa aquela Unidade Local de Viseu da ACT apenas dispõe do RNI da arguida, do qual constam as infracções praticadas, as datas em que foram cometidas, as coimas e as sanções acessórias aplicadas, e bem assim as datas das decisões condenatórias, sendo um registo de processos que não se encontram pendentes em tramitação, mas já concluídos.

Ora, do Registo Nacional de Infractora da arguida junto aos autos constam várias condenações por ela sofridas, as quais são definitivas, pois caso contrário, não se mostrariam inseridas no RNI da arguida.

Desconhece-se, pois a existência de quaisquer outros processos pendentes contra a arguida, que esta não identifica.

Assim, há que apurar se deveria ter sido efectuado cúmulo jurídico de coimas em tal decisão administrativa para além do cúmulo efectuado com as coimas aplicadas a cada um dos processos a que dizem respeito os presentes autos.

Ora, a Lei nº 107/2009, de 14/09, aplicável aos presentes autos não regula expressamente a questão do concurso de contra-ordenações laborais, pelo que haverá que recorrer ao direito subsidiário aplicável previsto no artº 60º de tal Lei, ou seja ao regime geral das contra-ordenações.

O Regime Geral das Contra-ordenações e Coimas (doravante RGCC) encontra-se previsto no DL nº 433/82, de 27/10, com a redacção introduzida pela Lei 109/2001, de 24/12.

As regras do concurso de contra-ordenações, encontram-se previstas no artº 19º do aludido RGCC, o qual estabelece que:

“1- Quem tiver praticado várias contra-ordenações é punido com uma coima cujo limite máximo resulta da soma das coimas concretamente aplicadas às infracções em concurso.

2- A coima aplicável não pode exceder o dobro do limite máximo mais elevado das contra-ordenações em concurso.

3- A coima a aplicar não pode ser inferior à mais elevada das coimas concretamente aplicadas às várias contra-ordenações."

No que concerne à competência estabelece o artº 36º, nº 1 do RGCC que "Em caso de concurso de contra-ordenações, será competente a autoridade a quem, segundo os preceitos anteriores, incumba processar qualquer das contra-ordenações."

Por sua vez o artº 37º, 1 do mesmo diploma legal dispõe que "Se das disposições anteriores, resultar a competência cumulativa de várias autoridades, o conflito é resolvido a favor da autoridade que por ordem de prioridades:

a) Tiver primeiro ouvido o arguido pela prática da contra-ordenação;

b) Tiver primeiro requerido a sua audição pelas autoridades policiais;

c) Tiver primeiro recebido das autoridades policiais os autos de que conste a audição do arguido".

Ainda por remissão do artº 32º do citado RGCO, aplicar-se-á ao concurso de contra-ordenações, o art. 77º do C.Penal, o qual estabelece que: "Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente."

No que concerne ao conhecimento superveniente do concurso, estipula o art. 78º, 1 do C.Penal: "Se depois de uma condenação transitada em julgado, se mostrar que o agente praticou anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, são aplicáveis as regras do artigo anterior, sendo a pena que já tiver sido cumprida, descontada no cumprimento da pena única aplicável ao concurso."

Contudo, entendemos que em sede contra-ordenacional, o art. 78º do C.Penal não tem aplicação, uma vez que prevendo o RGCC o regime do concurso de contra-ordenações, tal regime não prevê o concurso superveniente.

Na verdade, no que concerne ao cúmulo jurídico das coimas a sua possibilidade legal mostra-se prevista no RGCC, no seu artigo 19º, prevendo a aplicação de uma coima única em caso da prática de várias contra-ordenações, à semelhança do regime previsto no artº 77º do Cód. Penal para o caso de concurso de crimes.

No entanto, no regime contra-ordenacional não se mostra previsto a possibilidade de realização de cúmulo jurídico de coimas em caso de conhecimento superveniente de concurso, como ocorre no regime penal, em que tal possibilidade se encontra prevista no artº 78º do Cód. Penal.

Assim, e uma vez que as regras do concurso de contra-ordenações se encontram expressamente previstas no RGCC, não existindo qualquer omissão legal, não poderá recorrer-se a título subsidiário ao regime previsto no Código Penal, fazendo uso do disposto no artº 32º do RGCO.

Efectivamente a aplicação do Código Penal, a título subsidiário, nos termos previstos no aludido artº 32º, só ocorrerá quando no RGCC houver uma omissão. Para haver omissão é necessário que determinado instituto não esteja previsto e não que, estando previsto, não o seja de modo igual ao que se estabelece no Código Penal (cfr. neste sentido António Beça Pereira, in Regime Geral das Contra-ordenações e Coimas. 2ª ed. 1996, pág. 70).

No caso em apreço o instituto de concurso de contra-ordenações encontra-se expressamente previsto no aludido RGCC, embora não prevendo a possibilidade de ser efectuado o cúmulo jurídico das coimas, em caso de conhecimento superveniente do concurso, pelo que não há que recorrer subsidiariamente ao regime previsto no Cód. Penal, por não estarmos perante uma omissão.

Com efeito, como também refere Paulo Pinto de Albuquerque, in "Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações", p. 90, "O conhecimento superveniente do concurso de contra-ordenações rege-se por uma regra distinta da vigente no C.P., por força de disposição expressa do RGCO. A aplicação do artigo 78º do C.P. no âmbito do processo contra-ordenacional implicaria a reabertura do processo em qualquer momento ulterior para reapreciação do facto como contra-ordenação, o que a lei veda expressamente nos artigos 54º, nº 2 e 79º, nº 1 do RGCO (...) Portanto, há concurso entre contra-ordenações que ocorram antes da definitividade da decisão administrativa de qualquer uma delas, mas não há concurso entre contra-ordenações que sejam conhecidas depois da definitividade de uma delas." No mesmo sentido - inaplicabilidade do art. 78º do C.Penal no âmbito das contra-ordenações, vide António Beça Pereira, "Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas", 2ª edição, 1996, p. 70, Ac. RP de 09/05/1990, Proc. 310176, citado por Simas Santos e Lopes de Sousa, "Contra-Ordenações - Anotações ao Regime Geral" - 2ª edição - 2002 - Dezembro, Vislis Editores, p. 182, e Ac. do STJ de 12/04/1989, in www.dgsi.pt, nº de Documento SJ98904120397133.

Assim, concluindo-se que não há lugar a cúmulo jurídico no caso de concurso superveniente de contra-ordenações, não há que ponderar e apreciar a realização do cúmulo jurídico entre a coima aplicada nos presentes autos e as coimas aplicadas por decisões que já se tornaram definitivas.

E, também relativamente a processos de contra-ordenação que alegadamente se encontrem em fase de instrução em Unidades Locais da ACT, que a arguida não identifica nem sequer se sabe se no seu âmbito irá ser proferida decisão de condenação da arguida, pelo que não deverão ser tidos em conta para efeitos de cúmulo jurídico com a coima cominada nos presentes autos.

Resulta, pois de tudo o que ficou exposto que não ocorre no caso em apreço a nulidade da decisão administrativa, por falta de realização de cúmulo jurídico, não se impondo que a ACT realize cúmulo jurídico com outras coimas em que a arguida foi já condenada por decisão transitada em julgado, sendo certo que na decisão proferida foi respeitado o disposto no artº 19º do RGCC, quanto às contra-ordenações e coimas que se encontravam em concurso.

Assim sendo terá que se julgar também improcedente a invocada nulidade da decisão administrativa por omissão de realização do cúmulo jurídico. – fim de transcrição.

Acompanhamos a decisão recorrida, pouco mais se impondo dizer.

Na verdade, face ao disposto nos artigos 19.º e 32.º do RGCC (aplicável por força do disposto no artigo 60.º da Lei n.º 100/2009, de 14/09), tal regime não prevê o concurso superveniente de contraordenações, pelo que, inexistindo qualquer omissão não há que recorrer, a título subsidiário, ao regime do concurso superveniente previsto no artigo 78.º do CP.

Acresce que, como se decidiu no Ac. desta Relação e secção de 10/07/2018, disponível em www.dgsi.pt:

“Sem prejuízo da apreciação que a 1ª instância fez sobre o tema, em complemento, apraz-nos ainda dizer que, quer o RPCL (aprovado pela Lei 107/2009 de 14/09), quer o subsidiariamente Artº 60º da L. 107/09. aplicável RGCO (aprovado pelo DL 433/82 de 27/10, com as alterações que subsequentemente lhe foram introduzidas), não prevêem regras sobre o regime das nulidades dos actos e, particularmente, sobre a decisão proferida pela autoridade administrativa.

Assim, haverá que atender, com as necessárias adaptações, ao regime consignado no CPP (artº 41º nº 1 do RGCO).

A lei processual penal diz-nos que a sentença é nula quando não contiver as menções a que alude no al. do nº 1 do artº 379º do CPP, no caso das contraordenações, as menções referidas no artº 25º (“decisão condenatória”) da Lei 107/09.

Ora, a decisão administrativa deu integral cumprimento ao preceituado neste último normativo.

Mas a decisão será ainda nula quando a entidade administrativa deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar – al. c) do nº 1 do artº 379º do CPP.

A propósito desta nulidade, comummente designada como omissão de pronúncia lê-se na Obra “Contra Ordenações, Anotações ao Regime Geral” de Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, 3ª edição, p. 389 que “esta nulidade (…) ocorre apenas quando se verifica violação do dever processual que o tribunal (…) a autoridade administrativa tem em relação às partes, de se pronunciar sobre as questões por elas suscitadas. (…)>>.

Ora, compulsados os autos, mais concretamente a defesa da arguida e a decisão administrativa, constatamos que nesta foi conhecida a questão do cúmulo jurídico das sanções suscitada por aquela, concluindo-se que “o artigo 78.º do Código Penal (conhecimento superveniente do concurso) não é aplicável ao concurso de contraordenações por não conter regras gerais aplicáveis a qualquer concurso de infracções, mas apenas a concurso de crimes”.

Assim sendo, mesmo que fosse outro o nosso entendimento, que não é, a decisão administrativa não padeceria do vício de nulidade “por violar as regras atinentes ao cúmulo jurídico da pena a aplicar à Recorrente”, invocado pela recorrente.

Pelo exposto, inexiste a invocada nulidade da decisão administrativa.

2ª questão

Se não se encontra preenchido o elemento subjetivo do tipo legal imputado à arguida

A arguida recorrente alega que a situação de inatividade dos trabalhadores não lhe pode ser imputada nem sequer a título de negligência, tendo ficado provado que sofreu uma reestruturação empresarial (no âmbito do seu direito constitucional de liberdade de iniciativa económica das empresas) e que não existem funções para os trabalhadores em causa na área geográfica de Viseu, pelo que não se pode imputar à recorrente qualquer obstaculização dos trabalhadores em apreço em desenvolverem as suas atividades; não têm surgido oportunidades de colocação dos trabalhadores em apreço e os mesmos foram dispensados do dever de assiduidade; inexiste qualquer evidência de que o comportamento da recorrente tenha representado uma violação grave e grosseira dos direitos dos trabalhadores e/ou que tenha implicado algum prejuízo para os mesmos, nem da existência de conduta consubstanciadora de má fé do empregador, pelo contrário, a boa fé da recorrente ficou devidamente assinalada nos factos provados em uuuu) a cccc) e, ainda, que perante os factos provados deveria ter-se considerado inexistir violação do disposto na alínea b) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 129.º do CT, porquanto ficou provado que a recorrente nunca obstou a que os trabalhadores prestassem a sua atividade profissional, pelo contrário, encetou esforços contínuos de procura de atividade compatível, o que se tem demonstrado difícil face à localização geográfica daqueles trabalhadores.

Na sentença recorrida decidiu-se:

“(…) Por sua vez, o artº 129º do CT estabelece as garantias do trabalhador consubstanciadas em proibições impostas ao empregador.

Assim, e nos termos do nº 1, al. b) de tal normativo é proibido ao empregador “ Obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho.”

Tal normativo impõe o dever de ocupação efectiva do trabalhador e como refere Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 12ª edição p. 281 “O seu reconhecimento pressupõe a ideia de que pode ser exigido a uma entidade empregadora que, sem ou mesmo contra a sua vontade, utilize efectivamente os serviços de um trabalhador na organização de que é titular”. Adiantando o mesmo Autor a fls. 285 que não merecem “… protecção as motivações (como a de combater a concorrência ou, até, obstar directamente ao desenvolvimento profissional do trabalhador) que levem o empregador a manter o trabalhador inactivo podendo objectivamente ocupá-lo. A questão vem, assim, a colocar-se no plano da exigibilidade: não se pode deixar de reconhecer como atendíveis as situações em que o empregador esteja objectivamente impedido de oferecer ocupação ao trabalhador, assim como aquelas em que se esteja em presença de interesses legítimos do mesmo empregador na colocação do trabalhador em estado de inactividade ( por razões económicas, disciplinares ou outras).

Assim, e como se refere no Ac. da RP de 09/03/2009, no proc. 0847390, in www.dgsi.pt , tal dever tem subjacente, o princípio da igualdade dos trabalhadores da mesma empresa, a tutela da profissionalidade e a valorização e realização profissional e pessoal do trabalhador através da prestação de trabalho, impondo-o também o princípio geral da boa fé que deverá presidir à execução contratual.

Efectivamente, o artº 119º do CT, nº 1 do CT estabelece como princípio geral que o empregador e trabalhador, no cumprimento das respectivas obrigações, assim como no exercício dos correspondentes direitos, devem proceder de boa fé.

Assim, e como se refere no Acórdão da RP, supra citado, “Da garantia em apreço decorre assim que à entidade empregadora assiste não apenas o direito de, naturalmente, exigir do trabalhador a actividade a que este se obrigou por via do contrato de trabalho, mas também o dever de lhe proporcionar a possibilidade do seu exercício, a menos que existam razões que, de forma justificada, impeçam esse exercício, impedimento que, naturalmente, deverá ser determinado por razões objectivas e independentes de actuação culposamente imputável à entidade empregadora.”

Ora, como se refere no Ac. da RC de 10-07-2018, no proc. 8300/17.4T8CBR.C1, in www.dgsi.pt, a colaboração creditória assume particular relevo na contratação laboral tornando-se mister que o empregador disponibilize as condições materiais e organizativas bastantes para que o trabalhador exercite, em termos adequados, a sua prestação laboral. Mais se referindo que “Uma prestação eficaz não reverte apenas em benefício da entidade patronal: ao trabalhador também assiste o direito de implementar a sua realização pessoal e a sua formação profissional. A actual visão do “trabalho” já ultrapassou, há muito, os paradigmas da “fonte de rendimento” e dos “meios de subsistência”, para ser reconhecido como uma forma de dignificação social do trabalhador. Deste modo, facilmente se percebe que os obstáculos, propositadamente criados ao exercício da prestação laboral, sejam havidos como factores de inaceitável perturbação daqueles princípios. O direito do trabalhador à ocupação efectiva é tão relevante que a lei confere ao seu titular a faculdade de exigir do empregador a atribuição das tarefas contratadas – ou de outras equivalentes, para as quais tenha a necessária aptidão – recorrendo, para isso, à figura da sanção pecuniária compulsória (art.º 829ºA do Código Civil). A par disso, também lhe confere o direito a ser ressarcido dos prejuízos decorrentes da inactividade e, bem assim, de resolver o contrato com justa causa, por violação de uma das suas garantias legais – art.º 394º nº2 al. b) do Código do Trabalho.”

Desta forma, e como se trata de um conceito indeterminado, importa apurar, caso a caso, “se a não atribuição ao trabalhador de uma ocupação efectiva é ou não, à luz da boa-fé, justificável”. (cfr. Pedro Romano Martinez e Outros, Código do Trabalho, Anotado, 3.ª ed., pág. 263).

Ora, no caso em apreço a arguida não atribuiu qualquer tarefa ou função profissional aos trabalhadores ..., desde respectivamente 22-11-2016, 20-02-2017 e 22-11-2016, mantendo-os de forma reiterada e injustificada, numa situação de completa inactividade laboral, retirando-lhes desde essa altura a totalidade das funções que desempenhavam até então, não lhes atribuindo quaisquer outras, ou seja, esvaziando por completo o acervo funcional de competências técnicas correspondentes e inerentes às categorias e respectivas qualificações profissionais, não lhes permitindo o desempenho de qualquer actividade durante todo o tempo em que se mantêm afectos a tal departamento, assim como, também, não lhes proporcionou formação com vista a eventual requalificação.

Situação que, aliás, ainda se mantém relativamente aos trabalhadores ..., pese embora este esteja actualmente a gozar da dispensa de assiduidade, não ocorrendo tal situação relativamente ao trabalhador ..., por este ter chegado a acordo com a arguida relativamente à rescisão do contrato por mútuo acordo com efeitos a partir de Setembro de 2017.

Defende a arguida que tal situação se encontra justificada pela reestruturação interna que se encontra a implementar e por todos os circunstancialismos relativos aos próprios trabalhadores, existindo fortes constrangimentos geográficos (ausência de necessidades na região de Viseu) para recolocar os trabalhadores em funções compatíveis, apesar dos esforços que tem feito nesse sentido, sendo a situação de inactividade dos mesmos meramente temporária e uma situação excepcional.

Ora, dos factos provados, pese embora resulte que a arguida se encontre em processo de reestruturação interna, terá que se concluir que a inactividade reiterada dos trabalhadores não se pode considerar justificada.

Na verdade, não resultou comprovado que a arguida tivesse feito qualquer diligência para ocupar tais trabalhadores desde que os colocou na Unidade de Suporte que criou exclusivamente para os trabalhadores a quem deixou de atribuir quaisquer tarefas ou funções profissionais, isto apesar de as funções exercidas pelos mesmos continuarem a existir e a ser praticadas por outros trabalhadores, embora os serviços tenham sido reestruturados.

Na verdade, como bem se refere na decisão administrativa a arguida, a arguida nunca disponibilizou informação quanto a eventuais estudos e/ou propostas de reafectação dos referidos trabalhadores e eventuais planos de formação para requalificação profissional, situação que também não demonstrou em audiência de julgamento.

Antes resultou provado que a arguida nunca deu qualquer formação aos aludidos trabalhadores com vista à sua eventual requalificação, nem lhe atribuiu funções noutros locais diversos daqueles onde anteriormente exerciam funções, sendo certo que também não pretendeu recorrer a outros meios legais ao seu dispor no caso de na sequência de tal reorganização interna não ter quaisquer funções para lhes atribuir, nem outros locais de trabalho onde reafectar tais trabalhadores.

Efectivamente, resultou apenas que a arguida colocou aos trabalhadores como alternativa à sua colocação na Unidade de Suporte, sem atribuição de quaisquer funções, a rescisão dos contratos por mútuo acordo e dado que os mesmos pelo menos até à data do levantamento dos autos de notícia não aceitaram tal rescisão, afectou-os efectivamente àquela unidade de suporte sem atribuição de quaisquer funções e sem lhe apresentar outras alternativas reafectando-os a outros postos de trabalho ou dando-lhe a formação necessária para esse efeito.

E à data das visitas inspectivas a situação de inactividade já se mantinha há mais de seis meses relativamente aos trabalhadores ... e há mais de 4 meses relativamente ao trabalhador ..., não existindo previsão para que tal situação se altere, sendo certo que relativamente ao ... o contrato cessou por rescisão por mútuo acordo já depois das visitas inspectivas, no entanto relativamente ao restantes dois trabalhadores a situação de inactividade mantém-se, apesar de relativamente ao trabalhador ... este actualmente beneficiar da dispensa de assiduidade.

Por outro lado, também não resulta dos factos provados que a situação de inactividade esteja justificada por factos relativos aos trabalhadores, designadamente de competências funcionais, porquanto resultou provado que todos os trabalhadores tinham avaliações positivas e nos exames médicos foram considerados aptos para o trabalho.

Pelo exposto, e conforme referido na decisão administrativa terá que se concluir que se mostra preenchido o elemento objectivo das contra-ordenações que vêm imputadas à arguida, não se mostrando a sua conduta justificada, atentos o princípio da boa-fé inerente às relações laborais celebradas com os aludidos trabalhadores.

E, dos factos provados resulta também que se encontra preenchido o elemento subjectivo de tais contra-ordenações.

Na verdade, como decorre do disposto no artº 548º do CT, “constitui contra-ordenação laboral o facto típico, ilícito e censurável que consubstancie a violação de uma norma que consagre direitos ou imponha deveres a qualquer sujeito no âmbito de relação laboral e que seja punível com coima.”

Assim, nas contra-ordenações laborais e também nas contra-ordenações em geral, como decorre do artº 1º do Regime Geral da Contra-ordenações e Coimas (RGCC) aprovado pelo DL nº 433/82 de 27/10, para que haja responsabilidade por uma contra-ordenação é necessária a prática pelo agente de um facto ilícito, típico e culposo, não existindo neste caso qualquer responsabilidade objectiva ou responsabilidade a título de “culpa in vigilando”.

Efectivamente, conforme estabelece o artº 8º, nº 1 do RGCC que “Só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência.

Daqui resulta expressamente que não existe responsabilidade objectiva ou sem culpa, contudo, e de acordo com o disposto no artº 550º do CT a negligência nas contra-ordenações laborais é sempre punível.

No caso em apreço, ao contrário do referido pela arguida nas suas conclusões do recurso de impugnação, na decisão administrativa não se imputa à mesma um comportamento doloso, mas sim negligente.

Ora, preceitua o artigo 15º do Código Penal que: “Age com negligência quem, por não proceder com o cuidado a que, segundo as circunstâncias, está obrigado e de que é capaz:

a) representar como possível a realização de um facto que preenche um tipo de crime mas actuar sem se conformar com essa realização”. (negligência consciente)

b) Não chegar sequer a representar a possibilidade de representação de um facto.” (negligência inconsciente)

Assim, dos factos dados como provados pode-se concluir pela existência de negligência, por parte da arguida, por não ter agido com o cuidado necessário que as circunstâncias exigiam, porquanto a arguida agiu violando aquelas disposições legais, não tomando no caso concreto o cuidado que podia e devia ter perante as circunstâncias concretas, pois que lhe era exigível outro comportamento atribuindo tarefas aos aludidos trabalhadores ou pelo menos dando-lhe formação para poder reafectá-los a outros serviços, agindo por isso de forma negligente.

Assim sendo, verifica-se que se encontram preenchidos os elementos objectivo e subjectivo das contra-ordenações imputadas à arguida, e como tal terá a mesmo que ser sancionada.” – fim de transcrição.

Vejamos:

Conforme resulta do artigo 129.º, n.º 1, b), do CT, é proibido ao empregador obstar injustificadamente à prestação efetiva do trabalho.

O nosso ordenamento jurídico consagra um dever de ocupação efetiva a cargo do empregador.

Pois bem, tendo em conta a matéria de facto provada, não podemos deixar de acompanhar a decisão recorrida.

Na verdade, resulta da matéria de facto provada que a arguida mantinha os trabalhadores em causa nas instalações sem quaisquer funções atribuídas, em situação de total inocupação embora cumprindo um horário de trabalho; a arguida não afetou estes trabalhadores a outros sectores ou postos de trabalho, não os fazendo transitar para outros serviços com as mesmas funções e nunca lhes proporcionou formação com vista a eventual requalificação; a DOI e respectivas OBBs onde os trabalhadores em causa exerciam funções até à sua afectação à USP, mantêm atualmente a sua estrutura básica e atribuições funcionais e a arguida não atribuiu aos trabalhadores ..., desde as datas da sua afetação à USP, respetivamente em 22.11.2016, 20.2.2017 e 22.11.2016, o exercício de quaisquer tarefas ou funções profissionais, mantendo-os, de forma reiterada e injustificada, numa situação de completa inatividade laboral, retirando-lhes desde essa altura a totalidade das funções que desempenhavam até então, não lhes atribuindo quaisquer outras, ou seja, esvaziando por completo o acervo funcional de competências técnicas correspondentes e inerentes às categorias e respetivas qualificações profissionais, não lhes permitindo o desempenho de qualquer atividade durante todo o tempo em que se mantêm afetos a tal departamento, assim como, também, não lhes proporcionou formação com vista a eventual requalificação. 

Assim, ao contrário do alegado pela recorrente encontram-se preenchidos os elementos objetivo e subjetivo do tipo legal de contraordenação imputado à arguida.

Como ressalta da matéria de facto apurada a arguida não agiu com o cuidado a que estava obrigada e de que era capaz no sentido de proporcionar aos trabalhadores em causa uma efetiva prestação do seu trabalho.

Certo é que também se apurou que o local/sala onde os trabalhadores se encontravam foi especificamente criado pela arguida para a colocação dos trabalhadores afetos à USP (Unidade de Suporte), ou seja, uma unidade alegadamente destinada a agregar trabalhadores que, no âmbito de processo de reestruturação da empresa ficassem temporariamente sem funções atribuídas, “em situação de mobilidade ou alteração funcional” e que a DOI mantém as mesmas funções dentro da empresa arguida, tendo contudo sido objeto de reestruturação, no entanto, tais factos não beliscam em nada o que ficou dito.

Ao contrário do alegado pela recorrente o facto de se ter apurado que a empresa foi alvo de um processo de reestruturação; que a arguida propôs aos trabalhadores a revogação dos contratos por mútuo acordo e a dispensa do dever de assiduidade não permitem concluir, sem mais, que a atuação da arguida se encontra justificada face ao princípio da boa fé e que a mesma nunca obstou a que os trabalhadores prestassem a sua atividade profissional, tendo encetado esforços contínuos de procura de atividade compatível (facto não provado).

Ao invés, apurou-se que a arguida não atribuiu aos trabalhadores o exercício de quaisquer tarefas ou funções profissionais, mantendo-os, de forma reiterada e injustificada, numa situação de completa inatividade laboral, retirando-lhes desde essa altura a totalidade das funções que desempenhavam até então, não lhes atribuindo quaisquer outras, ou seja, esvaziando por completo o acervo funcional de competências técnicas correspondentes e inerentes às categorias e respetivas qualificações profissionais, não lhes permitindo o desempenho de qualquer atividade durante todo o tempo em que se mantêm afetos a tal departamento, assim como, também não lhes proporcionou formação com vista a eventual requalificação.

Como se refere na decisão recorrida, a inatividade reiterada dos trabalhadores não se pode considerar justificada visto que não resultou provado que a arguida tivesse diligenciado no sentido da ocupação daqueles desde que os colocou na Unidade de Suporte, apesar de as funções exercidas pelos mesmos continuarem a existir e a ser praticadas.

Aliás, apurou-se que a arguida não afetou os trabalhadores em causa a outros setores ou postos de trabalho e também nunca lhes proporcionou formação com vista a eventual requalificação.

Resta dizer que mesmo analisando o direito à ocupação efetiva não apenas no plano da realização pessoal do trabalhador (artigo 59.º, n.º 1, b) da CRP) mas também à luz do princípio da liberdade da iniciativa económica das empresas (artigo 61.º, n.º 1, da CRP), chegamos a idêntica conclusão, uma vez que, como já referimos, não se apurou qualquer facto capaz de justificar o comportamento da arguida.

Pelo exposto, além do elemento objetivo, encontra-se também preenchido o elemento subjetivo do tipo legal de contraordenação imputado à arguida e, consequentemente, a arguida encontra-se incursa na prática da mesma.

3ª questão:

Se a coima aplicada à arguida é desproporcionada.

Alega a recorrente que foi condenada a título de negligência, sendo a moldura contraordenacional entre 120 UC (12.240,00€) a 400 UC (40.800,00 €); afigura-se manifestamente desproporcionada a aplicação à Recorrente de uma coima de € 36.000,00, coima de valor próximo do máximo legal, desproporção acentuada por todo o circunstancialismo fáctico supra alegado e que comprova a atuação de boa-fé da Recorrente, pelo que, sempre será de decidir pela aplicação de coima pelo seu valor mínimo, atenta a moldura contraordenacional aplicável.

A este propósito consta da sentença recorrida que:

Acresce que, tendo ficado provado que a arguida, por decisão irrecorrível em 29-10-2017, foi condenada pela prática, por negligência, de uma contra-ordenação muito grave por violação do disposto no artº 129º, nº 1, al. b) do Código do Trabalho, na coima de € 10.200,00, por factos praticados 09-01-2013, pelo que terá a mesma que ser sancionada como reincidente, como foi efectuado na decisão administrativa.

Na verdade, no que concerne à reincidência no âmbito das contra-ordenações laborais, estabelece o artº 561º do CT que “1- É sancionado como reincidente quem comete uma contra-ordenação grave praticada com dolo ou uma contra-ordenação muito grave, depois de ter sido condenado por outra contra-ordenação grave praticada com dolo ou contra-ordenação muito grave, se entre as duas infracções tiver decorrido um prazo não superior ao da prescrição da primeira.

2- Em caso de reincidência, os limites mínimo e máximo da coima são elevados em um terço do respectivo valor, não podendo esta ser inferior ao valor da coima aplicada pela contra-ordenação anterior desde que os limites mínimo e máximo desta não sejam superiores aos daquela.”

Assim sendo, no caso em apreço, tendo a arguida praticado anteriormente às contra-ordenações muito graves ora em apreciação, uma contra-ordenação muito grave por violação do mesmo tipo de ilícito contra-ordenacional, sem que tivesse decorrido ainda o prazo de prescrição da mesma, dúvidas não restam que a arguida terá que ser sancionada como reincidente, como foi feito na decisão administrativa.

Desta forma, como também é referido na decisão administrativa as contra-ordenações em apreço são classificadas como muito graves, sendo cada uma punida, verificando-se a reincidência da arguida, com coima de € 12.240,00 a 40.800,00, atento o volume de negócios apresentado pela arguida, em conformidade com o disposto no artº 554, nº 4º, al. e) do CT.

No que diz respeito à determinação da medida da coima, há que atender ao disposto no n° 1 do art.º 72°-A do Dec. Lei n°433/82, de 27 de Outubro, na redacção introduzida pelo Dec. Lei nº 244/95, de 14 de Setembro, que proíbe a reformatio in pejus nos casos em que a decisão da autoridade administrativa é impugnada somente pelo arguido ou no seu exclusivo interesse, pelo que não pode o tribunal aplicar coima superior ao que lhe foi aplicado pela autoridade administrativa.

Quanto à medida concreta da coima, nos termos do artº 18º, nº 1 do referido Dec. Lei nº 433/82, de 27/10 “A determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contra-ordenação.”

No caso dos autos, a aplicação das coimas concretas pela autoridade administrativa foi efectuada com observância do disposto em tal normativo, inexistindo qualquer motivo para proceder à sua alteração, mostrando-se correctamente doseadas as coimas concretas aplicadas pela autoridade administrativa.

Também no que concerne à medida da coima única aplicada, entendemos que em face do número de contra-ordenações praticadas e a culpa da arguida, que a mesma se encontra correctamente doseada, tendo sido observadas correctamente as regras para determinação da coima única previstas no artº 19º do RGCC em caso de concurso de contra-ordenações.

Na verdade, na determinação da coima única foram observados os critérios previstos no artº 19º do aludido Dec. Lei n°433/82, de 27 de Outubro, inexistindo qualquer motivo para proceder à sua alteração, pelo que deve ser mantida a coima única aplicada.”

Vejamos:

Conforme resulta do artigo 18.º do RGCC:

<<A determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contra-ordenação>>.

Da matéria de facto apurada não consta qualquer facto relativo à situação económica da arguida e não se apurou que esta tenha retirado um benefício económico concreto da prática das contraordenações.

Assim, tendo em conta tudo o que ficou dito, e na ausência de outros elementos, ponderando que as contraordenações em análise já se encontram classificadas como muito graves, o facto de a arguida ter agido com negligência e, ainda, de não se ter apurado que retirou um benefício económico concreto da prática das mesmas, entendemos que se mostra justa e adequada a coima concreta de 16.000,00, situada num ponto algo superior ao mínimo da moldura abstrata reincidente de 120 UC a 400 UC (12.240,00 a € 40.800,00) para cada uma das contraordenações e, consequentemente, a coima única de €36.000,00, sendo certo que a moldura abstrata do concurso é de €16.000,00 a €48.000,00 (artigo 19.º do RGCC), ou seja, uma coima situada num ponto pouco superior ao meio da moldura abstrata e não próxima do máximo legal conforme alega a recorrente, inexistindo qualquer fundamento legal para que a mesma coima seja aplicada pelo seu valor mínimo.

Na verdade, <<a coima tem um fim de prevenção especial negativa, isto é, visa evitar que o agente repita a conduta infractora, bem como um fim de prevenção geral negativa, ou seja, visa evitar que os demais agentes tomem o comportamento infractor como modelo de conduta>>[2].

Improcede, assim, esta conclusão da arguida recorrente.

4ª questão

Se devia ter sido aplicada a dispensa da sanção acessória de publicidade da condenação.

A recorrente alega, ainda, que foi condenada a título de negligência, não se alegando qualquer especial enquadramento fático ou de direito do qual resulte um juízo de especial intencionalidade da conduta da Recorrente; “ficamos perante uma realidade que nos parece inconstitucional, pois a Recorrente em sede de acusação é notificada para proceder ao pagamento voluntário, nos termos do nº1 do Art. 17º e da alínea a) do nº1 do Artº. 19, da Lei 107/2009, pelo seu montante mínimo correspondente á infração praticada com negligência. No mesmo prazo é notificada a apresentar resposta escrita, querendo, e como a defesa é um direito que assiste todos que convivam com um Estado de Direito, quis a Recorrente exercer o mesmo, porém, é penalizada de forma severa em sede de condenação, pois por se ter defendido, foi-lhe aplicada uma sanção acessória”; “a letra do n.º 1, do art.º 563.º, do C.T. dispõe três pressupostos para dispensa da sanção acessória de publicidade, e a letra da lei não vai, portanto, ao encontro da interpretação feita pelo tribunal a quo, porquanto é explícita no sentido de que o pagamento imediato é da coima a que o agente tiver sido condenado, assim como nada resulta da mesma que os requisitos são cumulativos, pois como qualquer condenação em coima só o é efectivamente após trânsito em julgado da decisão da sua aplicação, e desse modo, enquanto não estiverem esgotados todos os meios de defesa administrativos e judiciais da Recorrente, a coima nunca será aquela em que a Arguida foi condenada, estando a Recorrente ainda em tempo de efectuar o seu pagamento imediato assim que, e se, a mesma transitar em julgado, ficando desse modo, preenchidos dois dos requisitos para que a sanção de publicidade possa ser dispensada!”, pelo que, caso se decida pela manutenção da condenação da Recorrente, sempre será de decidir pela dispensa da sanção acessória de publicidade da condenação, atenta a legalidade aplicável.

A este propósito consta da sentença recorrida:

Por outro lado, entendemos também que se mostra correctamente aplicada a sanção acessória de publicidade, por se verificarem os requisitos previstos no artº 562º, nº 1 do CT para que a mesma seja aplicada à arguida, porquanto estamos perante uma contra-ordenação muito grave, existindo ainda reincidência da arguida quanto ao mesmo tipo de ilícito contra-ordenacional, contra-ordenação muito grave praticada há menos de 5 anos antes da prática dos factos em causa nos presentes autos, inexistindo por isso motivo para se dispensar a sua aplicação nos termos do artº 563º do mesmo diploma legal.”

Conforme resulta do artigo 562.º do CT:

<<1. No caso de contra-ordenação muito grave ou reincidência em contra-ordenação grave, praticada com dolo ou negligência grosseira, é aplicada ao agente a sanção acessória de publicidade>>.

E, <<1. A sanção acessória de publicidade pode ser dispensada, tendo em conta as circunstâncias da infracção, se o agente tiver pago imediatamente a coima a que foi condenado e se não tiver praticado qualquer contra-ordenação grave ou muito grave nos cinco anos anteriores.>> - n.º 1 do artigo 563.º do CT.

Assim sendo, uma vez que a arguida se encontra incursa na prática de três contraordenações muito graves deve ser-lhe aplicada a sanção acessória de publicidade, sendo irrelevante a alegada inexistência de um juízo de especial intencionalidade da conduta da recorrente.

Acresce que, tal sanção pode ser dispensada se o agente tiver pago imediatamente a coima a que foi condenado e se não tiver praticado qualquer contraordenação grave ou muito grave nos cinco anos anteriores.

Ora, resultando da matéria de facto provada que a arguida foi condenada pela prática de uma contraordenação muito grave, por factos ocorridos em 09/01/2013 e decisão transitada em 29/10/2015, não se encontra preenchido, desde logo, este último requisito e, consequentemente, não pode determinar-se a pretendida dispensa da sanção acessória de publicidade.

Por fim, resta dizer que não vislumbramos a inconstitucionalidade invocada pela recorrente.

Na verdade, conforme se determina no RJCL, na fase administrativa a arguida é notificada das infrações laborais para, no prazo de 15 dias, proceder ao pagamento voluntário da coima ou, em alternativa, apresentar resposta (artigos 17.º e 19.º, ambos da mesma Lei n.º 107/2009, de 14/09), sendo que, em sede de decisão condenatória foi-lhe aplicada uma sanção acessória prevista na lei e não por se ter defendido.

Acresce que, conforme resulta do n.º 3 do artigo 19.º da Lei n.º 102/2009, de 14/09, <<o pagamento voluntário da coima, nos termos do n.º 1, equivale a condenação e determina o arquivamento do processo, não podendo o mesmo ser reaberto, e não podendo os factos voltar a ser apreciados como contra-ordenação, salvo se à contra-ordenação for aplicável sanção acessória, caso em que prossegue restrito à aplicação da mesma>>, ou seja, mesmo no caso de pagamento voluntário se for aplicável uma sanção acessória à contraordenação o processo prossegue com vista à aplicação da mesma.

Improcede, assim, mais esta conclusão da recorrente.

                                                             *

Na improcedência do recurso, impõe-se a manutenção da sentença recorrida.

  V – DECISÃO

  Nestes termos, sem outras considerações, acorda-se, em conferência, na improcedência do recurso, em manter a sentença recorrida

Custas a cargo da arguida recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC`s.

    Coimbra, 2019/03/15                                                                (Paula Maria Roberto)

    (Felizardo Paiva)


[1] Relatora – Paula Maria Roberto
  Adjunto – Felizardo Paiva
[2] Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do RGC, Universidade Católica Editora, pág. 84.