Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
177/18.9T8VLF-A. C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: RESPONSABILIDADES PARENTAIS
PROCESSO TUTELAR CÍVEL
PROCESSO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
RAPTO INTERNACIONAL
Data do Acordão: 04/30/2019
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA - V.N.F.CÔA - JUÍZO C. GENÉRICA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS.269, 986, 987, 988 CPC, 1796, 1910 CC, LEI Nº 141/2015 DE 8/9 ( RGPTC ), CONVENÇÃO DE HAIA DE 1980 DE 25/10
Sumário: 1. No campo dos processos de jurisdição voluntária, regulados nos art.ºs 986º e seguintes do CPC, releva a actuação sábia e ponderada dos juízes, sabendo-se que não têm aqui a missão de resolver uma típica questão de direito, mas, antes, a de encontrar, dentro das várias soluções possíveis, a melhor resposta para um problema.

2 Assim, não se justificará suspender o processo em que se pede a regulação do exercício das responsabilidades parentais (de jurisdição voluntária), instaurado pela progenitora, a quem a lei (portuguesa) reconhece a titularidade do exercício das responsabilidades parentais (art.º 1910º do CC), sendo contraparte o progenitor (pai biológico) que raptou a criança no país onde residia há vários anos com a progenitora e família (Portugal), deslocando-a ilicitamente para o seu próprio país (Turquia), não devendo obstar à continuidade do processo a circunstância de o progenitor não ter reconhecido (formalmente) a paternidade ou se desconhecer tal reconhecimento, impondo-se, sim, dar continuidade às diligências que assegurem quer o regresso da criança quer as finalidades do processo.

Decisão Texto Integral:



            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:                      

           

I. No Tribunal Judicial da Comarca da Guarda (Juízo de competência genérica de Vila Nova de Foz Côa), I (…) , solteira, maior, de nacionalidade romena, residente na Rua (…) (...) , intentou a presente acção de regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente à menor E (…) , nascida a 13.3.2008[1], contra U (…) , casado, de nacionalidade turca, residente em (…)/Istanbul, alegando, nomeadamente, que a menor é filha da requerente e do requerido, encontrando-se a filiação estabelecida apenas relativamente à progenitora pelas razões melhor indicadas na petição inicial (p. i.); estes viveram em união de facto entre 2006 e 2011, na Turquia; o nascimento da menor não foi registado no período de um ano após a sua ocorrência, tal como impõe a Lei Turca, porquanto, o Requerido não quis reconhecer a menor como sua filha, uma vez que era casado e tinha outros filhos desse casamento; a 06.10.2011, e depois de a Recorrente ter já regressado à Roménia, o Tribunal Panciu, Distrito de Vrancea, Roménia, admitiu o pedido de registo tardio de nascimento de E (…), apresentado pela Recorrente, que só nesta altura o fez, por questões que se prendem apenas e só com a sua vida pessoal, sendo portanto, tal registo, omisso quanto à paternidade; no período compreendido entre 2013 e 17.5.2017 a menor residiu sempre com a requerente, em Portugal, à guarda de quem se encontrava, em (...) , quando, em 17.5.2017[2] o requerido se deslocou a Portugal e raptou a menor à saída da Escola (…)   (...) , tendo viajado com a filha indicando um nome falso no aeroporto; diligenciou junto da Autoridade Central para conseguir concretizar o regresso da filha a Portugal, nos termos da Convenção de Haia de 1980, de 25.10, relativa aos aspectos civis do rapto internacional de crianças, dando origem ao processo n.º (…); os procedimentos legais entre as respectivas autoridades centrais - portuguesa e turca - estão em curso e a menor já foi localizada e ouvida[3]; tomou conhecimento do paradeiro da criança no dia 09.8.2018; o exercício das responsabilidades parentais relativamente à menor nunca foi regulado, pelo que se impõe fixar judicialmente os termos em que serão exercidas, determinando-se com qual dos progenitores ficará a residir, fixando-se o regime de visitas do outro e o seu contributo a título de pensão de alimentos à menor.

            A Mm.ª Juíza a quo, por despacho de 24.01.2019, decidiu:

«Compulsados os autos, constata-se que apenas a maternidade da criança se encontra estabelecida (cf. certidão de nascimento).

Pelo exposto, declaro suspensa a presente instância até verificação da condição de estabelecimento da paternidade.

No mais, como se promove[4]

Inconformada, a requerente apelou formulando as seguintes conclusões:

1ª - O despacho recorrido apresenta como fundamento para a suspensão da instância, o não estabelecimento da filiação relativamente à paternidade e determina o art.º 269º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil (CPC) que “A instância suspende-se nos casos seguintes: quando o tribunal ordenar a suspensão ou houver acordo das partes.”

2ª - De acordo com o disposto no art.º 1796º, nº 2 do Código Civil (CC), “A paternidade presume-se em relação ao marido da mãe e, nos casos de filiação fora do casamento, estabelece-se pelo reconhecimento”.

3ª - A Recorrente e o Requerido nunca foram casados entre si e o mesmo nunca reconheceu legalmente a paternidade da menor.

4ª - Contudo, não estaria em causa um “simples reconhecimento” de paternidade, nem tal questão pode ser analisada de uma forma tão objectiva pois não é possível aferir, apenas porque na certidão de nascimento da menor, não consta o nome do Requerido como seu pai, que o mesmo não seja efectivamente o seu pai biológico.

5ª - A Recorrente viveu com o mesmo na Turquia, entre 2006 e 2011 e a menor E (...) nasceu a 13.3.2008.

6ª - Em 2011, a Recorrente regressou à Roménia, seu país de origem, uma vez que era vítima de maus tratos por parte do pai da menor, levando esta consigo.

7ª - O nascimento da menor não foi registado no período de um ano após a sua ocorrência, tal como impõe a Lei Turca, porquanto o Requerido não quis reconhecer a menor como sua filha, uma vez que era casado e tinha outros filhos desse casamento.

8ª - Estando em causa um cidadão de nacionalidade Turca, é conhecido do senso comum com tais cidadãos encaram e lidam com tais questões.

9ª - A 06.10.2011, e depois de a Recorrente ter já regressado à Roménia, o Tribunal Panciu, Distrito de Vrancea, Roménia, admitiu o pedido de registo tardio de nascimento de E (…), apresentado pela Recorrente, que só nesta altura o fez, por questões que se prendem apenas e só com a sua vida pessoal, sendo portanto, tal registo, omisso quanto à paternidade.

10ª - Em 2013, a Recorrente desloca-se para Portugal, novamente acompanhada pela sua filha menor.

11ª - Até 17.5.2017, a menor residiu sempre com a mãe/Recorrente, à guarda de quem se encontrava, frequentando a Escola (…) (...) e tendo o seu centro de vida em (...) .

12ª - A Recorrente não procedeu anteriormente à Regulação das Responsabilidades parentais da menor, uma vez que depois de abandonar a Turquia nunca mais teve contacto com o pai da menor.

13ª - Foi, portanto, com surpresa, já para não referir a angústia e sofrimento da mesma, que a Recorrente se deparou com a situação em análise, pois a 17.5.2018[5], o Requerido deslocou-se a Portugal, raptou a menor à saída da escola e viajou com a mesma para a Turquia, apresentando para tal documentação falsa no aeroporto.

14ª - Desde essa data até ao presente, a Recorrente não teve qualquer contacto com a menor, não sabe se a filha está bem, e quais as circunstâncias e condições em que vive com o pai na Turquia.

15ª - Considerando o local habitual de residência da menor e a competência da jurisdição portuguesa, emergem os presentes autos no desiderato de, juntamente com as diligências e procedimento da Autoridade Central Portuguesa e Autoridade Central Turca, se materialize o regresso da menor a Portugal.

16ª - Atendendo às circunstâncias concretas, será razoável suspender a instância e “exigir” a uma mãe que está há longos meses sem saber absolutamente nada da sua filha menor, que primeiramente se investigue e estabeleça a paternidade da mesma, para que depois se diligencie pelo regresso da mesma a Portugal?

17ª - Embora não conste na certidão de nascimento da menor o nome do pai, a Recorrente sabe que é este o pai biológico da menor, tal como o próprio também sabe e “admite” embora não tenha procedido ao reconhecimento da paternidade da menor, pelos motivos supra expostos, uma vez que admitiu quando prestou declarações perante as Autoridades Turcas, que a menor é sua filha biológica.

18ª - O Requerido, cidadão de nacionalidade Turca, que viveu com a Recorrente em união de facto entre 2006 e 2011, na Turquia, viria a Portugal raptar a menor, à porta da escola, com todos os riscos que tal rapto acarretou e teria a mesma consigo, a seu cargo, até ao presente, se não tivesse certeza de que a mesma é sua filha biológica?

19ª - A menor vivia com a mãe, o pai e o seu irmão mais novo em Portugal, estando perfeitamente integrada escolar e socialmente pelo que o vínculo afectivo com o pai biológico e com quem vive na Turquia há longos meses, não existia.

20ª - A mudança drástica que ocorreu na vida da menor provocou com toda a certeza grande instabilidade emocional na mesma, uma vez que se viu absolutamente privada da vida que tinha e das pessoas que faziam parte da mesma, nomeadamente, a aqui Recorrente.

21ª - Em tempos em que tanto se “apregoa” o Superior Interesse da Criança, pergunta a Recorrente se estará a acautelar-se a superior interesse da sua filha menor, com um despacho de suspensão da instância, no caso dos presentes autos.

22ª - Uma acção de averiguação e estabelecimento da paternidade, no caso dos autos, poria em causa o superior interesse da sua filha menor, sendo primordial proteger e promover os interesses da menor, com vista ao seu desenvolvimento integral e harmonioso.

23ª - Subjacente ao regime implementado na Convenção sobre Aspectos Civis do rapto Internacional de Crianças (Convenção de 1980) está o postulado de que muito embora se reconheça que a liberdade de deslocação dos cidadãos é um direito fundamental, assume-se também que essa liberdade pode e deve sofrer limitações quando interfira com a liberdade e o superior interesse de uma criança.

24ª - Está em causa uma situação de Alienação Parental.

25ª - Atento o exposto e atenta a falta de ponderação e fundamentação do despacho recorrido, deverá o mesmo ser revogado.

Por despacho de 18.02.2019, o recurso foi admitido com efeito meramente devolutivo, a subir em separado, e ordenou-se a extracção de determinados elementos e sua remessa ao Exmo. Magistrado do M.º Público para “eventual instauração de processo de averiguação oficiosa de paternidade”, bem como a notificação do Requerido “para, em 10 dias, vir informar os presentes autos se procedeu à perfilhação da menor” (sic).

O M.º Público respondeu à alegação da recorrente, sustentando a improcedência do recurso.

O objecto da presente apelação restringe-se, assim, à questão de saber se é de manter a decretada suspensão da instância ou se o processo deverá prosseguir os seus termos.


*

II. 1. Para a decisão do recurso releva o que se descreve no antecedente relatório.

2. Cumpra apreciar e decidir com a necessária concisão.

            Os processos tutelares cíveis têm a natureza de jurisdição voluntária (art.º 12º, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível/RGPTC, aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 08.9).

            Como tal, nas providências a tomar, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, tendo a liberdade de se subtrair a esse enquadramento rígido e de proferir a decisão que lhe pareça mais equitativa (mais conveniente e oportuna), a que melhor serve os interesses em causa; salvaguardados os efeitos já produzidos, será sempre possível a alteração de tais resoluções com fundamento em circunstâncias supervenientes[6] (cf. os art.ºs 987º e 988º, n.º 1, do CPC).

            3. Do regime geral do processo tutelar cível (RGPTC) importa destacar, entre outras, as seguintes disposições:

            - O Regime Geral do Processo Tutelar Cível regula o processo aplicável às providências tutelares cíveis e respectivos incidentes (art.º 1º).

            - Para efeitos do RGPTC, constituem providências tutelares cíveis, designadamente: a regulação do exercício das responsabilidades parentais e o conhecimento das questões a este respeitantes; a entrega judicial de criança; a inibição, total ou parcial, e o estabelecimento de limitações ao exercício das responsabilidades parentais; a averiguação oficiosa da maternidade e da paternidade (art.º 3º, alíneas c), e), h) e i)).

            - Os processos tutelares cíveis regulados no RGPTC regem-se pelos princípios orientadores de intervenção estabelecidos na lei de protecção de crianças e jovens em perigo e ainda pelos seguintes: Simplificação instrutória e oralidade - a instrução do processo recorre preferencialmente a formas e a actos processuais simplificados (art.º 4º, n.º 1, alínea a)).

            - Compete às secções de família e menores da instância central do tribunal de comarca em matéria tutelar cível, designadamente: regular o exercício das responsabilidades parentais e conhecer das questões a este respeitantes; ordenar a entrega judicial de criança; decretar a inibição, total ou parcial, e estabelecer limitações ao exercício das responsabilidades parentais; proceder à averiguação oficiosa da maternidade e da paternidade (art.º 6º, alíneas c), e), h) e i)).

            - Fora das áreas abrangidas pela jurisdição das secções de família e menores, cabe às secções cíveis da instância local conhecer das causas que àquelas estão atribuídas (art.º 8º, n.º 1).

           - Para decretar as providências tutelares cíveis é competente o tribunal da residência da criança no momento em que o processo foi instaurado. Sendo desconhecida a residência da criança, é competente o tribunal da residência dos titulares das responsabilidades parentais. Se os titulares das responsabilidades parentais tiverem residências diferentes, é competente o tribunal da residência daquele que exercer as responsabilidades parentais (art.º 9º, n.ºs 1, 2 e 3).

           - Os processos tutelares cíveis têm a natureza de jurisdição voluntária (art.º 12º).

            - Salvo disposição expressa e sem prejuízo do disposto nos art.ºs 52º e 58º, a iniciativa processual cabe ao Ministério Público, à criança com idade superior a 12 anos, aos ascendentes, aos irmãos e ao representante legal da criança (art.º 17º, n.º 1). Compete especialmente ao Ministério Público instruir e decidir os processos de averiguação oficiosa, representar as crianças em juízo, intentando acções em seu nome, requerendo acções de regulação e a defesa dos seus direitos e usando de quaisquer meios judiciais necessários à defesa dos seus direitos e superior interesse, sem prejuízo das demais funções que estão atribuídas por lei (n.º 2).

            - As decisões que apliquem medidas tutelares cíveis e de promoção e protecção, ainda que provisórias, devem conjugar-se e harmonizar-se entre si, tendo em conta o superior interesse da criança (art.º 27º, n.º 1). No caso de, em processo tutelar cível, se obterem indícios de uma situação de perigo para a criança, o Ministério Público requer, por apenso, o processo judicial de promoção e protecção e, se necessário, a aplicação de medida judicial de protecção da criança (n.º 3).

            - Em qualquer estado da causa e sempre que o entenda conveniente, a requerimento ou oficiosamente, o tribunal pode decidir provisoriamente questões que devam ser apreciadas a final, bem como ordenar as diligências que se tornem indispensáveis para assegurar a execução efectiva da decisão (art.º 28º, n.º 1).

            - O disposto nos artigos anteriores [relativos à “regulação do exercício das responsabilidades parentais e resolução de questões conexas”] é aplicável à regulação do exercício das responsabilidades parentais de filhos de cônjuges separados de facto, de filhos de progenitores não unidos pelo matrimónio e ainda de crianças apadrinhadas civilmente quando os padrinhos cessem a vida em comum (art.º 43º, n.º 1).

            - Se a criança abandonar a casa dos pais ou aquela que estes lhe destinaram ou dela for retirada, ou se encontrar subtraída à responsabilidade da pessoa ou da instituição a quem esteja legalmente confiada, deve a sua entrega ser requerida ao tribunal com jurisdição na área em que ela se encontre (art.º 49º, n.º 1).

            - Antes de decretar a entrega da criança, o juiz pode ordenar as diligências convenientes, nos termos do artigo 21º (art.º 50º, n.º 1). Quando o requerente da entrega for algum dos pais e estes vivam separados, a criança pode ser entregue àquele que o juiz considere mais idóneo, sem prejuízo de se definir o seu destino em acção de regulação do exercício das responsabilidades parentais (n.º 5).

4. E a Convenção sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, concluída na Haia em 25.10.1980, aprovada pelo Decreto do Governo Português n.º 33/83, de 11.5, - afirmando os Estados signatários a sua firme convicção de que os interesses da criança são de primordial importância em todas as questões relativas à sua custódia; e desejando proteger a criança, no plano internacional, dos efeitos prejudiciais resultantes de uma mudança de domicílio ou de uma retenção ilícitas e estabelecer as formas que garantam o regresso imediato da criança ao Estado da sua residência habitual, bem como assegurar a protecção do direito de visita - dispõe, nomeadamente:

- A presente Convenção tem por objecto: a) Assegurar o regresso imediato das crianças ilicitamente transferidas para qualquer Estado Contratante ou nele retidas indevidamente; b) Fazer respeitar de maneira efectiva nos outros Estados Contratantes os direitos de custódia e de visita existentes num Estado Contratante (art.º 1º).

- Os Estados Contratantes deverão tomar todas as medidas convenientes que visem assegurar, nos respectivos territórios, a concretização dos objectivos da Convenção. Para o efeito, deverão recorrer a procedimentos de urgência (art.º 2º).

- A deslocação ou a retenção de uma criança é considerada ilícita quando: a) Tenha sido efectivada em violação de um direito de custódia atribuído a uma pessoa ou a uma instituição ou a qualquer outro organismo, individual ou conjuntamente, pela lei do Estado onde a criança tenha a sua residência habitual imediatamente antes da sua transferência ou da sua retenção; e b) Este direito estiver a ser exercido de maneira efectiva, individualmente ou em conjunto, no momento da transferência ou da retenção, ou o devesse estar se tais acontecimentos não tivessem ocorrido (art.º 3º, 1ª parte).

- A Convenção aplica-se a qualquer criança com residência habitual num Estado Contratante, imediatamente antes da violação do direito de custódia ou de visita (art.º 4º, 1ª parte).

- Nos termos da presente Convenção o «direito de custódia» inclui o direito relativo aos cuidados devidos à criança como pessoa, e, em particular, o direito de decidir sobre o lugar da sua residência (art.º 5º, alínea a)).

- Cada Estado Contratante designará uma autoridade central encarregada de dar cumprimento às obrigações que lhe são impostas pela presente Convenção (art.º 6º, 1ª parte).

            - As autoridades centrais devem cooperar entre si e promover a colaboração entre as autoridades competentes dos seus respectivos Estados, por forma a assegurar o regresso imediato das crianças e a realizar os outros objectivos da presente Convenção (art.º 7º, 1ª parte). Em particular, deverão tomar, quer directamente, quer através de um intermediário, todas as medidas apropriadas para: a) Localizar uma criança deslocada ou retida ilicitamente; c) Assegurar a reposição voluntária da criança ou facilitar uma solução amigável; f) Introduzir ou favorecer a abertura de um procedimento judicial ou administrativo que vise o regresso da criança ou, concretamente, que permita a organização ou o exercício efectivo do direito de visita (2ª parte do mesmo art.º).

- Qualquer pessoa, instituição ou organismo que julgue que uma criança tenha sido deslocada ou retirada em violação de um direito de custódia pode participar o facto à autoridade central da residência habitual da criança ou à autoridade central de qualquer outro Estado Contratante, para que lhe seja prestada assistência por forma a assegurar o regresso da criança (art.º 8º, 1ª parte). Pedido que deverá conter, designadamente, a) Informação sobre a identidade do requerente, da criança e da pessoa a quem se atribua a deslocação ou a retenção da criança; b) Se possível, a data de nascimento da criança (2ª parte do mesmo art.º).

            - A autoridade central do Estado onde a criança se encontrar deverá tomar ou mandar tomar todas as medidas apropriadas para assegurar a reposição voluntária da mesma (art.º 10º).

- As autoridades judiciais ou administrativas dos Estados Contratantes deverão adoptar procedimentos de urgência com vista ao regresso da criança (art.º 11º, 1ª parte).

- Quando uma criança tenha sido ilicitamente transferida ou retida nos termos do art.º 3º e tiver decorrido um período de menos de 1 ano entre a data da deslocação ou da retenção indevidas e a data do início do processo perante a autoridade judicial ou administrativa do Estado contratante onde a criança se encontrar, a autoridade respectiva deverá ordenar o regresso imediato da criança (art.º 12º, 1º parágrafo). A autoridade judicial ou administrativa respectiva, mesmo após a expiração do período de 1 ano referido no parágrafo anterior, deve ordenar também o regresso da criança, salvo se for provado que a criança já se encontra integrada no seu novo ambiente (2º parágrafo).

            - Sem prejuízo das disposições contidas no artigo anterior, a autoridade judicial ou administrativa do Estado requerido não é obrigada a ordenar o regresso da criança se a pessoa, instituição ou organismo que se opuser ao seu regresso provar: a) Que a pessoa, instituição ou organismo que tinha a seu cuidado a pessoa da criança não exercia efectivamente o direito de custódia na época da transferência ou da retenção, ou que havia consentido ou concordado posteriormente com esta transferência ou retenção; ou b) Que existe um risco grave de a criança, no seu regresso, ficar sujeita a perigos de ordem física ou psíquica, ou, de qualquer outro modo, a ficar numa situação intolerável (art.º 13º, 1ª parte).

- Todo o pedido apresentado às autoridades centrais ou, directamente, às autoridades judiciais ou administrativas de um Estado Contratante ao abrigo da presente Convenção, bem como qualquer documento ou informação a ele anexado ou que seja fornecido por uma autoridade central, deverão ser recebidos pelos tribunais ou pelas autoridades administrativas dos Estados Contratantes (art.º 30º).

            5. Preceitua o Regulamento (CE) n.º 2201/2003, de 27.11 (relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental):

            - Que se aplica, nomeadamente, à atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental (art.º 1º, alínea b);

            - Que entende-se por 'Responsabilidade parental', o conjunto dos direitos e obrigações conferidos a uma pessoa singular ou colectiva por decisão judicial, por atribuição de pleno direito ou por acordo em vigor relativo à pessoa ou aos bens de uma criança. O termo compreende, nomeadamente, o direito de guarda e o direito de visita (art.º 2º, n.º 7); 'Titular da responsabilidade parental', qualquer pessoa que exerça a responsabilidade parental em relação a uma criança (n.º 8); 'Direito de guarda', os direitos e as obrigações relativos aos cuidados devidos à criança e, em particular, o direito de decidir sobre o seu lugar de residência (n.º 9); 'Deslocação ou retenção ilícitas de uma criança', a deslocação ou a retenção de uma criança, quando: a) Viole o direito de guarda conferido por decisão judicial, por atribuição de pleno direito ou por acordo em vigor por força da legislação do Estado-Membro onde a criança tinha a sua residência habitual imediatamente antes da deslocação ou retenção; e b) No momento da deslocação ou retenção, o direito de guarda estivesse a ser efectivamente exercido, quer conjunta, quer separadamente, ou devesse estar a sê-lo, caso não tivesse ocorrido a deslocação ou retenção (n.º 11).

            - Os tribunais de um Estado-Membro são competentes em matéria de responsabilidade parental relativa a uma criança que resida habitualmente nesse Estado-Membro à data em que o processo seja instaurado no tribunal (art.º 8º, n.º 1). O n.º 1 é aplicável sob reserva do disposto nos artigos 9º, 10º e 12º (n.º 2).

            - Em caso de deslocação ou retenção ilícitas de uma criança, os tribunais do Estado-Membro onde a criança residia habitualmente imediatamente antes da deslocação ou retenção ilícitas, continuam a ser competentes até a criança passar a ter a sua residência habitual noutro Estado-Membro e: a) Cada pessoa, instituição ou outro organismo titular do direito de guarda dar [der] o seu consentimento à deslocação ou à retenção; ou b) A criança ter estado a residir nesse outro Estado-Membro durante, pelo menos, um ano após a data em que a pessoa, instituição ou outro organismo, titular do direito de guarda tenha tomado ou devesse ter tomado conhecimento do paradeiro da criança, se esta se encontrar integrada no seu novo ambiente e se estiver preenchida pelo menos uma das seguintes condições: i) não ter sido apresentado, no prazo de um ano após a data em que o titular do direito de guarda tenha tomado ou devesse ter tomado conhecimento do paradeiro da criança, qualquer pedido de regresso desta às autoridades competentes do Estado-Membro para onde a criança foi deslocada ou se encontra retida, ii) o titular do direito de guarda ter desistido do pedido de regresso e não ter sido apresentado nenhum novo pedido dentro do prazo previsto na subalínea i), iii) o processo instaurado num tribunal do Estado-Membro da residência habitual da criança imediatamente antes da deslocação ou retenção ilícitas ter sido arquivado nos termos do n.º 7 do artigo 11º, iv) os tribunais do Estado-Membro da residência habitual da criança imediatamente antes da deslocação ou retenção ilícitas terem proferido uma decisão sobre a guarda que não determine o regresso da criança (art.º 10º).

            - O tribunal não pode recusar o regresso da criança ao abrigo da alínea b) do artigo 13º da Convenção da Haia de 1980, se se provar que foram tomadas medidas adequadas para garantir a sua protecção após o regresso (n.º 4 do art.º 11º). Não obstante uma decisão de retenção, proferida ao abrigo do artigo 13º da Convenção da Haia de 1980, uma decisão posterior que exija o regresso da criança, proferida por um tribunal competente ao abrigo do presente regulamento, tem força executória nos termos da secção 4 do capítulo III, a fim de garantir o regresso da criança (n.º 8 do art.º 11º).

            - Cada Estado-Membro designa uma ou várias autoridades centrais encarregadas de o assistir na aplicação do presente regulamento, especificando as respectivas competências territoriais ou materiais. Quando um Estado-Membro tenha designado várias autoridades centrais, as comunicações devem, em princípio, ser enviadas directamente à autoridade central competente (art.º 53º).

            6. Preceitua o art.º 1910º do CC (sob a epígrafe “filiação estabelecida apenas quanto a um dos progenitores”, na redacção conferida pela Lei n.º 61/2008, de 31.10) que se a filiação de menor nascido fora do casamento se encontrar estabelecida apenas quanto a um dos progenitores, a este pertence o exercício das responsabilidades parentais.

            7. Referidos os normativos da legislação interna e internacional sobre a matéria é tempo de concluir sobre a concreta questão colocada: deverá manter-se a suspensão da instância?

            Tratando-se, é certo, de matéria não isenta de dificuldades, inclinamo-nos, claramente, para uma resposta negativa, que, diga-se, não deixou de ser aquela dada, no plano processual, pelo próprio tribunal recorrido no despacho de admissão do recurso, porquanto decidiu, então, além do mais, ordenar a notificação do Requerido “para, em 10 dias, vir informar os presentes autos se procedeu à perfilhação da menor” (cf. ponto I., supra).

            Na presente situação, se é certo que, face aos elementos disponíveis, pertence à requerente o exercício das responsabilidades parentais, contudo, na prática, foi-lhe retirada a possibilidade do seu exercício, porquanto se interpôs o rapto (internacional) da menor perpetrado por aquele que - tudo indica - será o progenitor da menor (ao que se conhece ou indicia, pois que avesso a essa qualidade no plano legal/formal) e que, pelo menos, demonstra querer assumir a paternidade.[7]

            Encontrando-se razoavelmente esclarecidas, nos autos, as circunstâncias de a filiação se encontrar estabelecida apenas relativamente à progenitora/requerente[8], justificava-se aquela iniciativa do Tribunal a quo, tanto mais que a realidade suscita a definição dos poderes-deveres dos progenitores em relação à criança, mas também a tomada de diligências inerentes a uma situação de rapto internacional com a intervenção das Autoridades Centrais dos Estados envolvidos, independentemente da necessidade da eventual adopção de mecanismos de gestão e adequação processual.

            Ademais, estando-se no campo dos processos de jurisdição voluntária, regulados nos art.ºs 986º e seguintes do CPC, mais se reclama uma actuação sábia e ponderada dos juízes, sabendo-se que não têm aqui a missão de resolver uma típica questão de direito, mas, antes, a de encontrar, dentro das várias soluções possíveis, a melhor resposta para um problema.[9]

            8. No apontado enquadramento fáctico e normativo e não se afigurando que deva ser dada especial relevância a uma eventual diversidade processual atentas as principais finalidades almejadas pela requerente, quais sejam, implementar os necessários procedimentos tendentes à entrega da criança, sua filha, alvo de rapto, bem como ver reconhecido e actuado o seu indeclinável direito a exercitar as responsabilidades parentais, independentemente de o requerido (presumível pai biológico - cf., v. g., o art.º 1871º, n.º 1, alínea a) do CC) ter ou não procedido à perfilhação da menor (reconhecendo a paternidade), cremos, pois, que não se justifica suspender estes autos de regulação do exercício das responsabilidades parentais

            E tal deverá suceder, ainda que o M.º Público decida, em processo autónomo, proceder de imediato à “instauração de processo de averiguação oficiosa de paternidade” (com as dificuldades que certamente advirão de uma realidade com as suas raízes e razão de ser na República da Turquia, onde a requerente terá vivido com o requerido entre 2006 e 2011 e a menor E (...) nasceu a 13.3.2008) e se desenvolva e avance nos procedimentos estabelecidos entre as Autoridades Centrais das Repúblicas de Portugal e da Turquia tendo em vista a (eventual) entrega da criança, despoletados pelo rapto da menor perpetrado pelo requerido.[10]

9. Como se refere nas alegações de recurso (cf. as “conclusões 15ª a 18ª”, ponto I, supra):

- Considerando o local habitual de residência da menor e a competência da jurisdição portuguesa, emergem os presentes autos no desiderato de, juntamente com as diligências e procedimento da Autoridade Central Portuguesa e Autoridade Central Turca, se materialize o regresso da menor a Portugal.

- Atendendo às circunstâncias concretas, será razoável suspender a instância e “exigir” a uma mãe que está há longos meses sem saber absolutamente nada da sua filha menor, que primeiramente se investigue e estabeleça a paternidade da mesma, para que depois se diligencie pelo regresso da mesma a Portugal?

- Embora não conste na certidão de nascimento da menor o nome do pai, a Recorrente sabe que é este o pai biológico da menor, tal como o próprio também sabe e “admite” embora não tenha procedido ao reconhecimento da paternidade da menor - o Requerido, cidadão de nacionalidade Turca, que viveu com a Recorrente em união de facto entre 2006 e 2011, na Turquia, viria a Portugal raptar a menor, à porta da escola, com todos os riscos que tal rapto acarretou e teria a mesma consigo, a seu cargo, até ao presente, se não tivesse certeza de que a mesma é sua filha biológica?

            10. Prosseguindo os presentes autos com a adopção dos procedimentos tidos por convenientes, no contexto de uma larga e avisada gestão processual, daremos certamente a melhor resposta ao problema levado a Tribunal, norteados pelo indeclinável e primeiro princípio do respeito pelo interesse da menor (com vista ao seu desenvolvimento integral e harmonioso).

            Só assim se poderá executar o objectivo de combater o recurso ao rapto como forma de criar uma situação de facto contrária ao regime do exercício das responsabilidades parentais vigente (art.º 1910º do CC), em defesa do superior interesse da criança e de acordo com os princípios específicos da jurisdição voluntária.[11]

            11. Tratando-se de problemática não isenta de dificuldades, afigura-se, pelo que fica dito, e também pela fase incipiente do caso, que não se justifica suspender o processo em que se pede a regulação do exercício das responsabilidades parentais, instaurado pela progenitora, a quem a lei (portuguesa) reconhece a titularidade do exercício das responsabilidades parentais, sendo contraparte o progenitor (pai biológico) que raptou a criança no país onde residia há vários anos com a progenitora e família (Portugal)[12], deslocando-a ilicitamente para o seu próprio país (Turquia).

            E à continuidade do processo não deverá obstar a circunstância de o progenitor não ter reconhecido (formalmente) a paternidade ou se desconhecer tal reconhecimento, impondo-se, sim, dar continuidade às diligências que assegurem quer o regresso da criança (como se refere em II. 7. 8. e 10., supra) quer as finalidades do processo.  

            Procedem, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso.


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III. Pelo exposto, acorda-se em julgar procedente a apelação, revogando o despacho que declarou suspensa a instância até verificação da condição de estabelecimento da paternidade, que assim deverá prosseguir, como se indica em II. 11., supra.

Sem custas.


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30.4.2019

Fonte Ramos ( Relator )

Maria João Areias

Alberto Ruço



[1] Cf. os documentos de fls. 5 verso e 6 do processo físico.
[2] Existe lapso na data indicada no art.º 6º da p. i., como decorre da sua conjugação com o demais alegado na p. i. e os documentos juntos aos autos.
[3] Cf., designadamente, os documentos de fls. 7 e seguintes e 24 verso e seguintes do processo físico.
[4] Aludindo-se à promoção (de 11.01.2019) com o seguinte teor: «Uma vez que se verifica que a paternidade não se encontra estabelecida promovo que a instância seja suspensa até estabelecimento da paternidade da criança. Com efeito, a regulação do exercício das responsabilidades parentais pressupõe, ´ab initio`, o registo da maternidade e da paternidade relativamente à criança./ Face ao exposto promove-se seja notificada a progenitora da criança para, querendo, se pronunciar quanto a esta questão mais se solicitando que a progenitora informe o Tribunal do estado do processo relativo ao regresso da criança espoletado junto da Autoridade Central nacional relativa à Convenção de Haia, de 25 de Outubro de 1980
[5] Existe lapso - vide, v. g., a “conclusão 11ª” das alegações de recurso e a “nota 2”, supra.

[6] Isto é, no dizer da lei, tanto as circunstâncias ocorridas posteriormente à decisão como as anteriores, que não tenham sido alegadas por ignorância ou outro motivo ponderoso (art.º 988º, n.º 1, 2ª parte, do CPC).
[7] Vide Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, 1995, págs. 409 a 411 (anotação ao art.º 1910º), dando-nos uma perspectiva da evolução legislativa nesta matéria desde o Código Civil de 1867.
[8] Admitindo-se que a actuação da lei na Turquia seja ainda hoje idêntica, por exemplo, à que tivemos no nosso País até ao começo do séc. passado - em que “o registo de filho fora do prazo” só poderia ser efectuado a pedido do pai ou do marido da mãe e mediante autorização do juiz - e até ao momento em que passou a haver uma maior interligação entre os diversos organismos do Estado e um maior empenho cívico dos cidadãos.
[9] Vide Miguel Mesquita, Princípio da Gestão Processual, in RLJ 145º, pág. 95.

[10] Cf., a propósito, o acórdão da RC de 22.6.2010-processo 786/09.7T2OBR-A.C1 [assim sumariado: «I - O processo de entrega judicial de menor tem natureza de jurisdição voluntária, pelo que o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita; II - A Convenção Haia de 25 de Outubro de 1980 sobre os aspectos civis do rapto internacional de crianças tem por objectivo assegurar o regresso imediato das crianças ilicitamente transferidas para qualquer Estado-Membro; III - Nos termos do art.º 11º daquela Convenção e do art.º 11º, n.º 3, do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho de 27.11.2003, o tribunal deve adoptar procedimentos de urgência com vista ao regresso da criança; V- Aquele Regulamento pretende desencorajar o rapto de crianças pelos progenitores entre Estados-Membros e, se tal vier a ocorrer, garantir um regresso rápido da criança ao seu Estado-Membro de origem; VI - A deslocação de uma criança de um Estado-Membro para outro sem o consentimento de um dos titulares constitui um rapto da criança ao abrigo do mesmo Regulamento; VII - Este reforça o princípio segundo o qual o tribunal deve ordenar o regresso imediato da criança, limitando ao estritamente necessário as excepções previstas na al. b) do art.º 13º da referida Convenção; o princípio é que a criança deve sempre regressar se estiver garantida a sua protecção no Estado-Membro de origem.»], publicado no “site” da dgsi.

[11] Num estudo publicado na Revista JULGAR - N.º 24 – 2014, de análise da JURISPRUDÊNCIA SOBRE RAPTO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS, Maria dos Prazeres Beleza veio a concluir: «Finalmente, pode suceder que, não obstante ter sido indeferido o pedido de regresso da criança ilicitamente deslocada ou retida, com fundamento nas excepções previstas no artigo 13º da Convenção de Haia de 25.10.1980, o tribunal do Estado onde a criança tinha a sua residência habitual imediatamente antes da deslocação ou retenção, competente segundo o Regulamento (CE) n.º 2201/2003, profira “uma decisão posterior que exija o regresso da criança”, de acordo com o disposto no n.º 8 do art.º 11º respectivo. Nessa eventualidade, esta decisão de regresso, devidamente certificada (art.º 42º), goza de força executiva nos demais Estados Membros sem necessidade de ´exequatur`. Trata-se de mais uma medida trazida pelo Regulamento (CE) n.º 2201/2003 com o objectivo de combater o rapto, promovendo o regresso célere da criança que dele foi vítima.»

   Cf., ainda, entre outros, o acórdão da RP de 08.10.2015-processo 2593/11.8TMPRT-C.P1, proferido num processo de alteração da regulação das responsabilidades parentais [no qual se expendeu e concluiu: «II - Verificada a deslocação ou retenção ilícita de uma criança de um Estado Membro para outro Estado diferente do da sua residência habitual, haverá que providenciar pelo seu imediato regresso, como forma de desencorajar os “efeitos prejudiciais resultantes de uma mudança de domicilio ou de uma retenção ilícitas e estabelecer formas que garantam o regresso imediato da criança ao Estado da sua residência habitual, bem como assegurar a protecção do direito de visita”, cabendo a qualquer pessoa, instituição ou organismo titular do direito de guarda, pedir que sejam accionados os procedimentos adequados para obter o imediato regresso da criança ilicitamente deslocada ou retida.»], publicado no “site” da dgsi.
[12] Cf., v. g., os documentos de fls. 21 verso e seguintes e fls. 24 do processo físico.