Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
115/09.0PAPBL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CALVÁRIO ANTUNES
Descritores: ESCOLHA E MEDIDA DA PENA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
Data do Acordão: 02/03/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE POMBAL
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS , 181º,184º, 347º 40º,47º,50º70º,71º DO CP E
Sumário: 1.No caso em apreciação são manifestas as necessidades de prevenção geral positiva ou de integração que se fazem sentir, tendo em conta um certo grau de perigosidade que o comportamento do arguido já demonstra, evidenciado pela sua conduta anterior aos factos.
2.Na verdade, face aos factos provados, no caso concreto, temos que nos últimos oito anos (desde 29/1/01, até á data dos factos destes autos), o recorrente já sofreu 11 (onze) anteriores condenações, pela prática do diversos tipos de crime – condução de veículo automóvel sem habilitação legal, condução em estado de embriaguez, injúrias agravadas e diversos roubos.
3.Tendo em conta o disposto nos artigos 70º e 40º, n.º 1 do CP e pelos motivos acima expostos, resulta claro ser insuficiente a aplicação ao arguido de uma pena não privativa a liberdade a fim de se conseguir de forma adequada e suficiente a recuperação social do arguido e se satisfazerem as exigências de reprovação e de prevenção do crime.
4.Tendo em atenção o tipos de ilícito em causa, as circunstâncias acima descritas, entendemos que se mostram adequadas para o arguido as penas de 3 meses de prisão, pela prática de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos art°s 181° e 184°do CP, e a pena de 18 meses de prisão, pela autoria material de um crime de resistência e coacção sob funcionário, p. e p. pelo art° 347°, n°1 do CP.
5. Tendo em atenção os factos concretos e a personalidade do agente, mostra-se correcta a efectivação do cúmulo jurídico das penas parcelares única de 20 meses de prisão.
6.Desde que aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias.
7. No caso, tendo em atenção, por um lado, as elevadas exigências da de prevenção especial, o arguido não obstante as diversas e diferentes penas que lhe foram aplicadas, não assumiu o mal praticado nem a gravidade dos factos; pelo outro as elevadas exigências de prevenção geral face à cada vez maior frequência com que se verificam os tipos legais em causa, o número de crimes praticados pelo arguido, impondo-se acautelar a confiança da comunidade na norma jurídica violada, tudo ponderado a simples censura dos factos e ameaça da pena não são suficientes para afastar o arguido da prática do crime e simultaneamente e satisfazer as necessidades de reprovação e prevenção do crime, nos termos do artigo 50°, n° 1, do Código Penal.
Decisão Texto Integral: I. Relatório:
1. No processo supra identificado, foi julgado o arguido, FZ solteiro, desempregado, filho de JJ. e OL nascido a 25/…..1983, natural de … residente na …., Pombal.
Imputando-lhe a prática, com base nos factos descritos a fls. 1 e v°, 2 v° e 3, os quais aqui se dão por reproduzidos, para todos os efeitos legais, em concurso real e efectivo e em autoria material um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo artº 347° e um crime de injúrias agravadas, previsto e punido pelos art°s 181° e 184°, todos do Cód. Penal.
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Realizado o julgamento, o tribunal recorrido decidiu:
1. Condenar o arguido FZ com autor material de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos art°s 181° e 184°do CP, na pena de 3 meses de prisão.
2. Condenar o mesmo arguido com autor material de um crime de resistência e coacção sob funcionário, p. e p. pelo artº 347°, n°1 do CP, na pena de 18 meses de prisão.
3. Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares supra aplicadas, de acordo com os critérios fixados na lei, condena-se o arguido na pena única de 20 meses de prisão.
4. Condenar o mesmo arguido em 3 UCs de taxa de justiça, acrescida de 1% a favor das vítimas e nas custas do processo, fixando-se a procuradoria em 1/3.
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2. Inconformado, o arguido interpôs o presente recurso, formulando nas respectivas motivações as seguintes (transcritas) conclusões:

O douto acórdão exarado, salvo o devido respeito, determinou de forma desajustada as medidas concretas das penas correspondentes aos crimes, marcando-as por uma nota de severidade que as tornou excessivas (violando o disposto nos artigos 40°, 70° e 71 o do Código Penal,
A pena concretamente aplicada aos crimes de injúrias agravada e de resistência e coacção sob funcionário - pena única de 20(vinte) meses de prisão efectiva -- é excessiva e ultrapassa em larga medida a culpa do arguido.
De igual modo, o ilustre Tribunal a quo violou, inequivocamente, o ínsito no artigo 70° do Código Penal, no qual, o legislador manifesta notória preferência pela aplicação de penas não privativas a liberdade.
E o artigo 40°, nº 1 do Código Penal que assinala também à pena uma feição humanitária, no sentido de não deixar ao abandono, de ressocializar o agente.
Pelo que, no caso, a aplicação da pena de multa, seria a única opção possível - por ser a que verdadeiramente realiza as intenções político-criminais mais profundas do ordenamento jurídico-penal vigente - e realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, ou seja, a protecção dos bens jurídicos e a reintegração.
Pelo que errou na tarefa de escolha da pena.

Do todo ressalta que:
O douto Tribunal não ponderou de forma criteriosa quer a culpa, quer as exigências de reprovação e de prevenção (geral, ligada à defesa da sociedade e à contenção da criminalidade e especial positiva, ligada à reinserção social do agente) – art.º 40°, n.º 1 e 2- bem como as demais exigências do art. 71°, todos, do Código Penal, na determinação concreta das penas fixadas ao recorrente.
Ao ter imputado ao recorrente um grau de culpa tão elevado só atendeu ao passado criminal do agente, não ponderando circunstancialismos passíveis de a atenuar (o facto de o arguido estar a inserir-se na comunidade, frequentando um curso de formação profissional e tendo uma filha) e que são susceptíveis de a mitigar e, nessa lógica, não ponderou devidamente o grau de ilicitude dos factos - que aferindo-se quer pelos meios utilizados (linguagem que faz parte do seu meio ambiente e passado social) quer pelas consequências do crime - será de gravidade mediana. Não ponderou as circunstâncias que não fazendo parte do tipo depuseram contra ou a favor do arguido.
Pelo que não pôs em prática nenhuma das atenuantes gerais em detrimento da reinserção - cuja existência preferiu ignorar - podendo e devendo ter optado por penas parcelares mais baixas e, até, por outro tipo de penas (em violação do art. 70° do Código Penal).
Como consequência, da condenação em penas parcelares tão excessivas, aplicou uma pena única, em cúmulo jurídico, também excessiva - vinte meses de prisão.
Parecendo que o encadeamento dos crimes, passado criminal do arguido por crimes distintos, à excepção de um, e a personalidade evidenciada pelo mesmo não são suficientes para a afirmação de mais do que simples pluriocasionalidade.
O douto Tribunal a quo, nesta sede, e atento o alegado supra, não teve em conta o fim da prevenção especial das penas, porque as penas quando excessivas deixam de realizar os seus fins (pelo que violou o disposto nos artigos 40° e 71º do Código Penal).
Requer-se a fixação da pena unitária num ponto próximo do limiar inferior da moldura do concurso de molde a não prejudicar de forma irremediável a sua reinserção social.
Conclui-se que o douto acórdão deverá ser revogado e/ou modificado no que respeita, à escolha, às medidas parcelares das penas aplicadas e à pena única, uma vez que são excessivas e desajustadas.
Devem V/Ex.ªs Ex.mos Juízes conhecer dos vícios invocados ex vi 426, n.º 1 do Código de Processo Penal, procedendo ao reexame da matéria de direito.
E, em consequência, diminuir consideravelmente a pena concretamente aplicada ao arguido, possibilitando-lhe tratamento mais consentâneo com a sua dignidade humana.
Nestes termos, na procedência da argumentação supra expendida, deve ser dado provimento ao presente recurso, tudo com as necessárias consequências legais, devendo, nomeadamente, ser reconhecida a errónea determinação da medida da pena em concreto perpetrada pelo douto tribunal "a quo",
Assim, Vossas Excelências, no mais douto e sapiente critério e suprindo as lacunas do patrocínio, decidirão, como sempre, de
INTEIRA REPARAÇÃO E JUSTIÇA
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3, O Magistrado do Ministério Público veio oferecer a sua resposta, de fls. 88/97, onde sustenta que a sentença recorrida não merece reparos, devendo manter-se inalterada, apresentando as seguintes (transcritas) conclusões:
“1. Razões de prevenção - geral e especial - impõem, no que respeita à conduta ilícita em questão, a preferência pela moldura abstracta da pena de prisão.
2. Considerando os factos apurados, a culpa (dolo directo) do arguido e referidas exigências de prevenção geral e especial, compreende-se que estamos perante um caso que justifica a fixação das penas concretas em valor acima do mínimo legal.
3. Afigurando-se-nos justa, adequada e proporcional a pena de 20 meses de prisão, aplicada ao arguido, tanto no que respeita à sua natureza, bem como quanto ao seu quantum.
Porém, Vossas Excelências farão, como sempre
Justiça!”
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4. Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, no douto parecer que emitiu, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.

Notificado, nos termos e para os efeitos consignados no artº 417.º, n.º 2, do C. P. Penal, o arguido nada disse.
Foram colhidos os vistos legais.
Procedeu-se à conferência, com observância do formalismo legal, cumprindo, agora, apreciar e decidir.
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II. Fundamentação.
1. Delimitação dos poderes cognitivos do tribunal ad quem e objecto do recurso:
É hoje entendimento pacífico que as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98, sem prejuízo das de conhecimento oficioso.
Por isso, temos, como

Questões a decidir:
Apreciar se face aos factos dados como provados, se a pena de prisão aplicada ao arguido deve ser substituída por outra ou não; se deve ser alterada ou não, ou finalmente, se deve ser suspensa.,
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2. Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos (por transcrição):

“1. No dia …/…..09, pelas 7.30h, quando se encontrava de serviço, P… agente da PSP nesta cidade, deslocou-se ao estabelecimento denominado "Pastelaria…" nesta cidade, onde já se encontrava o arguido.
2. No interior de tal estabelecimento, o arguido, dirigindo-se ao mencionado agente policial disse: "Ó bófia tu também vens aqui", ao que o destinatário não respondeu.
3. No entanto, enquanto o mesmo se encontrava junto ao balcão, o arguido que estava um pouco mais atrás junto da sua companheira TG, numa mesa do estabelecimento, voltou a dirigir-se ao mencionado agente dizendo, entre outras expressões de carácter exacto não apurado "...tu só és autoridade quando estás com mais colegas, sozinho não vales nada, de mano para mano desfaço-te todo, meto-te o cacetete pelo cu acima, se estivesses na rua sozinho, eu e os meus amigos ciganos fazíamos-te a folha...".
4. Face a tal comportamento, enfim, o agente da PSP identificado, dirigiu-se a ele e deu-lhe voz de detenção, solicitando-lhe de seguida a sua identificação, tendo o arguido respondido que, de momento não a tinha consigo.
5. Nessa altura, o agente da PSP MN, que se encontrava no exterior da esquadra da PSP, nas imediações do local onde se passavam os factos supra descritos, apercebendo-se de que algo se passava entrou no estabelecimento para apoiar o seu colega.
6. Nessa mesma altura, o arguido recusou acompanhar os referidos agentes à esquadra, apesar de já lhe ter sido dada voz de detenção, começando a levantar os braços, esbracejando, visando libertar-se da detenção e abandonar o local.
7. Por isso, os dois mencionados agentes da PSP, usando a força física, agarraram-no pelos braços e arrastaram-no para o exterior e até à esquadra.
8. Durante esse percurso, em momento exacto não apurado, o arguido olhando para o agente MN, proferiu as seguintes expressões: " quando te encontrar na rua sozinho, faço-te a folha, corto-te o pescoço, não vales nada de mano para mano".
9. Já na Esquadra, quando estava a ser elaborado o expediente relacionado com a detenção, o Chefe da PSP L. dirigiu-se ao arguido e questionou-o sobre a sua residência, ao que o mesmo respondeu que não tinha nada que a dizer, que estava no seu documento de identificação.
10.O referido agente insistiu, dizendo que tinha que ser fornecida a mencionada informação, uma vez que ela não constava do cartão de cidadão e quando se aproximou do arguido para lhe tentar demonstrar que, de facto ali não estava mencionada a morada, o mesmo arguido, sem que nada o fizesse prever, deu-lhe uma "chapada na cara" e depois um murro, atingindo-o em ambos os casos na face esquerda, provocando-lhe dores e um corte no lábio superior.
11.Uma vez que o arguido se aprestava para repetir aquele tipo de actuação, o referido agente desferiu-lhe um murro que o atingiu na face e levou a que o mesmo se desequilibrasse, embatendo com a cara num espelho existente na parede do local onde se encontrava: um hall da esquadra, o que lhe provocou uma ferida na face do lado direito, da qual sangrou.
12.Após isso e ao ser detectado que o arguido sangrava foi-lhe perguntado se queria ir ao hospital receber tratamento médico ao que o arguido respondeu que não, tendo passado as mãos pelo sangue que jorrava, limpando-as de seguida na camisola, ao mesmo tempo que dizia "estão fodidos, porque vou mostrar isto tudo ao juiz".
13.Face ao estado de exaltação em que se encontrava, o arguido acabou por ser algemado, tendo mais tarde sido conduzido ao Hospital e ao Tribunal.
14. Em consequência dos factos que se vêm de relatar, tanto o cheque L. como o arguido receberam tratamento médico, tendo àquele sido diagnosticado edema periorbitário do olho esquerdo, edema do lábio superior e escoriações na face interna do mesmo.
15. Por seu turno, o arguido apresentava hematoma peri-orbitário à esquerda, pequena ferida interna no lábio inferior, escoriações nos cotovelos e pequena ferida na face - região externa do olho direito.
16. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente.
17. Sabia que as expressões proferidas e dirigidas ao agente P. que se encontrava no exercício de funções o atingiam no seu brio profissional, auto-estima e reputação.
18. Com as agressões físicas levadas a cabo e as ameaças proferidas, que sabia destinadas a agentes da autoridade no exercício das suas funções, visava demovê-los de procederem em conformidade com os deveres emergentes das suas funções, designadamente impedindo-os de proceder à sua detenção e à subsequente identificação, o que só não logrou conseguir por motivos alheios à sua vontade.
19. Sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.
20. Em audiência negou completamente os factos com relevo na análise dos autos, tendo tentado, com o auxílio da sua companheira evitar o apuramento dos factos como de facto ocorreram, dizendo que apenas cumprimentou o agente da PSP e que foram estes que, tendo-o detido sem motivo, logo que o levaram para a esquadra o agrediram fisicamente, não tendo ele agredido, ofendido ou ameaçado quem quer que fosse.
21. É solteiro, mas vive com uma companheira, de quem tem uma filha bebé.
22. Encontra-se desempregado mas a frequentar um curso de formação profissional.
23. Por decisão transitada em julgado e datada de 29.1… foi condenado pela prática a 13.2… de um crime de roubo na pena de 18 meses de prisão.
24. Por decisão transitada em julgado e datada de 22.6…. foi condenado pela prática a 17.12….de dois crimes de roubo na pena única de 16 meses de prisão.
25. As penas mencionadas em 23 e 24 vieram a ser objecto de decisão cumulatória que, transitada em julgado, aplicou ao arguido a pena única de 2 anos de prisão.
26. Por decisão transitada em julgado e datada de 12.7…. foi condenado pela prática a 29.6….de um crime de roubo na pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos.
27. Efectuado cúmulo jurídico que englobou todas as decisões supra mencionadas, ao arguido foi aplicada a pena única de 2 anos e 3 meses de prisão.
28. Por decisão transitada em julgado e datada de 10.5.02 foi condenado pela prática a 22.7…. de um crime de roubo e um crime de dano com violência na pena de 15 meses de prisão.
29. Efectuado cúmulo jurídico englobando todas as penas supra mencionadas ao arguido foi aplicada a pena única de 2 anos e 9 meses de prisão.
30. Por decisão transitada em julgado e datada de 25.10…. foi condenado pela prática a 3.9… de um crime de roubo na pena de 18 meses de prisão.
31. Efectuado cúmulo jurídico englobando todas as penas supra mencionadas, ao arguido foi aplicada a pena única de 3 anos e 9 meses de prisão.
32. Tal pena foi declarada extinta por despacho de 15.10….
33. Por decisão transitada em julgado e datada de 1.9… foi condenado pela prática a 24.8… de um crime de condução em estado de embriaguez na pena de 4 meses e 15 dias de prisão, substituída por 150 horas de trabalho a favor da comunidade.
34. Por decisão transitada em julgado e datada de 21.6…. foi condenado pela prática a 3.5… de um crime de condução sem habilitação legal na pena de 8 meses de prisão suspensa por 3 anos.
35. Por decisão transitada em julgado e datada de 11.10…. foi condenado pela prática a 19.7… de um crime de condução em estado de embriaguez na pena de 8 meses de prisão, suspensa por 2 anos.
36. Por decisão transitada em julgado e datada de 12.3… foi condenado pela prática a 19.7… de um crime de condução sem habilitação legal na pena de 12 meses de prisão, suspensa por igual período.
37. Por decisão transitada em julgado e datada de 16.10…. foi condenado pela prática a 24.8…. de um crime de condução sem habilitação legal na pena de 9 meses de prisão, a cumprir por dias livres.
38. Por decisão transitada em julgado e datada de 7.4… foi condenado pela prática a18.9… de um crime de injúria agravada e um crime de ofensa à integridade física simples na pena de 1 ano de prisão.
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A restante matéria alegada não resultou provada, nomeadamente, não se provou que os factos ocorridos tivessem tido outras motivações, circunstancialismo, desenvolvimento ou consequências que não os que se dão como provados.
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A matéria de facto dada como provada teve por suporte a conjugação dos seguintes elementos de prova:
- Relatórios médicos, exames periciais e documentos juntos aos autos;
- Declaração inicial e final do arguido no que concerne ao respectivo estado civil profissão e agregado familiar.
- Depoimentos das testemunhas inquiridas, os quais relataram de forma clara, concisa, serena e coerente os factos relatados, com conhecimento directo e pessoal e os descreveram da forma como se deu como provada;
- As regras de experiência comum.
Os factos alegados e não dados como provados não beneficiaram de prova credível bastante para levar á sua consignação.
Efectivamente, as testemunhas de acusação descreveram os factos da forma que se deu como provada, o que fizeram de forma clara, serena e concisa, que logrou convencer da veracidade das afirmações proferidas e, por isso de deu como provada.
Acresce que tal versão compatível com as regras de experiência comum, foi corroborada, no que tange à parte inicial e final pela prova oficiosamente determinada e produzida, mormente pelo depoimento da funcionária da pastelaria, que muito embora sem ter atentado exactamente em tudo o que se passou, porque ia fazendo o seu serviço, entrando e saindo da zona onde estava o polícia e o arguido e também porque ficou muito nervosa e não atentou em tudo, mas descreveu os factos como claramente desafiadores e provocatórios por banda do arguido para com o polícia, assim credebilizando o depoimento deste e descredibilizando o deste a da companheira que tentou confirmá-lo, embora de forma muito pouco credível.
Igualmente disse tal testemunha que o arguido não queria ir com os polícias, esbracejava e teve que ir arrastado, como os polícias descreveram e o próprio negou.
Relativamente ao que se passou na esquadra, a versão do arguido não só não é minimamente credível, uma vez que não é conforme com as regras de experiência, não fazendo qualquer sentido que no átrio da esquadra, logo à entrada, um polícia lhe desfira, de pronto, dois murros, à vista de toda a gente, até de forma a ser avistada pela companheira do arguido.
Acresce que menos credível ainda é que o Chefe L, sem mais nem para quê, lhe tenha espetado de propósito, no olho uma esferográfica sem ele arguido ter feito ou dito nada e mais uma vez tudo isso à vista da companheira, que permanecia no exterior.
Essa versão nem sequer explica as extensas lesões apresentadas pelo Chefe da PSP em causa, sendo que as declarações deste e dos seus colegas, de facto, explicam tudo o que se passou, justificando até as lesões do arguido, aceitando o dito chefe que para evitar a repetição das agressões, para que o arguido se preparava, lhe deu, de facto um murro e que ele se desequilibrou, tendo batido no espelho pendurado na parede, com o rosto, espelho esse que está preso no final com duas "estacas" em metal, onde terá aberto a ferida que tinha na face e cuja existência tentou aproveitar para invocar ter sido agredido sem qualquer participação da sua parte.
De resto, tal versão que já era mais sustenta e credível e foi apresentada de forma absolutamente clara e coerente foi corroborada em sede de inspecção, que revelou a existência do espelho, suas características de colocação na parede exactamente como descrito pela dita testemunha, sendo que, debaixo do dito espelho existiam de facto algumas pingas de sangue como o próprio Chefe L havia dito, deixadas pelo arguido e que não mandou limpar porque pensou que poderiam vir a ser analisadas até final do julgamento.
Tal deslocação contribuiu ainda para descredibilizar o depoimento já de si absolutamente inconsistente do arguido e da companheira uma vez que do local onde a mesma diz ter visto, só poderia avistar os factos caso os intervenientes estivessem estrategicamente colocados a meio de duas portas e no caso de estas estarem todas abertas, o que genericamente não ocorre nas Esquadras e não ocorria no dia da deslocação como genericamente não ocorre na Esquadra em causa, nem sendo plausível que todos ali se fossem colocar como que para a "fotografia", quase especificamente para serem vistos em ocasiões diversas, de acordo com a versão do próprio arguido e companheira, de pé, sem ser ao pé de qualquer secretária ou mesa de apoio, quase no início da sala, logo à entrada, quando o que ali se estava a fazer era a elaborar o expediente da detenção.
Tudo isso levou à consignação dos factos tal como o foram.”
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3. Apreciando.

3.1. Face a tais factos, dados como provados e não provados, na primeira instância, vejamos então, se assiste alguma razão ao recorrente.
Produzida a prova foi o arguido condenado como autor material de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos artºs 181° e 184°do CP, na pena de 3 meses de prisão e como autor material de um crime de resistência e coacção sob funcionário, p. e p. pelo art° 347°, n°1 do CP, na pena de 18 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico das penas parcelares supra aplicadas foi o arguido condenado na pena única de 20 meses de prisão.
O arguido conformou-se com a tipificação efectuada pelo tribunal a quo. Isto é o arguido concorda que praticou dois crimes (o de injúria agravada e o de resistência e coacção sob funcionário) discordando apenas da escolha e da medida das penas e ainda da sua não suspensão.

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3.2. Cumpre-nos agora apreciar se deveria ter sido aplicada ao arguido uma pena de prisão ou uma pena de multa.

Ao crime de injúrias, pelo qual o arguido foi condenado é aplicável uma pena de 1 mês e 15 dias a 4 meses e 15 dias de prisão ou de 15 a 180 dias de multa (artigos 181° n° 1 e 184°).
Por sua vez o crime de resistência e coacção sobre funcionário, p. e p. pelo art°347°, n°1 do CP. é punido com pena de prisão até 5 anos.
No caso ora em recurso foi dada preferência pela aplicação de uma pena privativa da liberdade, ou seja, o tribunal “a quo”, optou pela aplicação de penas de prisão.
Contra isso se insurge agora o arguido/recorrente.
Vejamos então.
Na operação de determinação da medida da pena, momento em que se realiza a Justiça na ordem dos factos e em que o próprio Direito se vem a concretizar no caso concreto, temos que partir do disposto nos artºs. 40°, 70º e 71° do Código Penal.
Ou seja neste primeiro passo de escolha da pena (art. 70°) há que fazer apelo especialmente ao conceito da prevenção geral entendendo-a neste contexto. Compete antes de mais ao direito penal a protecção de bens e valores fundamentais da comunidade social proporcionando as condições indispensáveis ao livre desenvolvimento e realização da personalidade ética.
Ora, um dos pensamentos fundamentais do sistema punitivo consagrado no Código Penal, que é o da reacção contra as penas institucionalizadas ou detentivas, por sua própria natureza lesivas do sentido ressocializador – em especial, quando de curta duração – que deve presidir à execução das penas.
Na verdade, o Código Penal actual, traça um sistema punitivo que arranca do pensamento fundamental de que as penas devem ser executadas com um sentido pedagógico e ressocializador.
Por isso, sempre que possível, deve dar-se preferência á aplicação de penas não detentivas, obedecendo ao art. 70.º, do CP que estipula que quando ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal deve dar preferência à segunda sempre que esta realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
No caso dos autos a multa surge como alternativa à prisão cumpre desde já saber se aos arguidos deve ser aplicada uma pena privativa ou não privativa da liberdade, relativamente ao crime de injúria agravadas.
Porém, como é sabido que a protecção de bens jurídicos é feita através da reposição, manutenção e incremento da confiança dos cidadãos na norma que é violada. Assim, essa tarefa há-de ser conseguida através da aplicação de uma pena tal ao prevaricador (sempre com os limites evidentes da culpa (artigo 40° n° 2 do CP)) de modo a que a comunidade possa passar a ter razões para acreditar que a violação daquela norma não passa despercebida aos olhos do Estado e que, por isso, é para respeitar.
Diremos então que o critério legal a seguir é simplesmente este: o tribunal deve preferir à pena privativa de liberdade uma pena alternativa (de multa) sempre que, verificados os respectivos pressupostos de aplicação, a pena alternativa se revele adequada e suficiente à realização das finalidades da punição.
O mesmo é dizer que a aplicação de uma pena alternativa à pena de prisão, no caso a pena de multa, depende tão somente de considerações de prevenção especial, sobretudo de prevenção especial de socialização, e de prevenção geral sob a forma de satisfação do «sentimento jurídico da comunidade».
Postos estes considerandos, no caso em apreciação são manifestas as necessidades de prevenção geral positiva ou de integração que se fazem sentir, tendo em conta um certo grau de perigosidade que o comportamento do arguido já demonstra, evidenciado pela sua conduta anterior aos factos.
Na verdade, face aos factos provados, no caso concreto, temos que nos últimos oito anos (desde 29/1/01, até á data dos factos destes autos), o recorrente já sofreu 11 (onze) anteriores condenações, pela prática do diversos tipos de crime – condução de veículo automóvel sem habilitação legal, condução em estado de embriaguez, injúrias agravadas e diversos roubos.
Nessas condenações foram-lhe aplicadas penas de prisão efectivas, penas de prisão suspensas, penas de prisão substituídas por trabalho a favor da comunidade e de prisão por dias livres,
O arguido cumpriu algumas dessas penas, mas, pelos vistos tal não bastou para que o mesmo alterasse o seu tipo de comportamento,
De tudo isto transparece uma certa carência de socialização, aferida em função de uma personalidade que pluriocasionalmente insiste na prática de crimes da referida ou de diferente natureza.
Tal facto é referido pela sentença recorrida, onde consta que “….. contudo, o cadastro do arguido é extensíssimo e nem o facto de haver já cumprido pena de prisão efectiva o afastou da criminalidade, mantendo comportamento prevaricador após a sua libertação, embora em áreas diversas da criminalidade, mas persistindo em tal forma de actuação e encontrando-se num crescendo da sua actuação.
Por tudo isso, entende-se que só optando pela pena privativa de liberdade lograrão as finalidades da punição ser alcançadas.”
Concordamos com tal opção, tendo em conta o disposto nos artigos 70º e 40º, n.º 1 do CP e pelos motivos aí expostos, donde resulta ser insuficiente a aplicação ao arguido de uma pena não detentiva, a fim de se conseguir de forma adequada e suficiente a recuperação social do arguido e se satisfazerem as exigências de reprovação e de prevenção do crime.
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3.3. Cumpre-nos agora apreciar se está ou não correcto o quantitativo da pena aplicada, que o recorrente considera elevadas.

Como já referimos, o arguido e ora recorrente foi condenado, em concurso real efectivo, como autor de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos art°s 181° e 184°do CP, na pena de 3 meses de prisão e como autor material de um crime de resistência e coacção sob funcionário, p. e p. pelo art° 347°, n°1 do CP, na pena de 18 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico das penas parcelares supra aplicadas foi o arguido condenado na pena única de 20 meses de prisão.
Defende o recorrente que, ter-se-á que considerar que, atentas as circunstâncias do caso, as penas impostas, pelos crimes, são excessivas, bem como o cúmulo, pelo que deverão ser reduzidas.
Vejamos.
Como se sabe, a todo o crime corresponde uma reacção penal, pela qual a comunidade expressa o seu juízo de desvalor sobre os factos e a conduta realizada pelo arguido, partindo-se para o efeito do respectivo tipo legal.
Ora, tendo em conta os critérios da sua determinação, a pena deve ser aferida em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo ainda, numa segunda fase, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, rodearam o mesmo, antes ou depois do seu cometimento, quer resultem a favor ou contra o agente.
Assim e retomando os critérios para a determinação concreta da pena, temos, duas regras centrais: a primeira consiste em ter presente que a culpa é o fundamento para a concretização da pena; a segunda, é de que deverá ter-se em conta os efeitos da pena na vida futura do arguido na sociedade e a necessidade desta se defender do mesmo, mantendo a confiança da comunidade na tutela da correspondente norma jurídica que foi violada.
Perante isto, podemos dizer que nesta acção a pena serve primacialmente, por um lado, para a retribuição justa do ilícito e da culpa (função retributiva), contribuindo ainda, por outro lado e ao mesmo nível, para a reinserção social do arguido, procurando não prejudicar a sua situação social mais do que estritamente necessário (função preventiva especial positiva) – como aludia Kohlrausch “Na determinação da pena o tribunal deve considerar principalmente que meios são necessários para que o réu leve de novo uma vida ordenada e conforme a lei” (vide “Mitt IKV Neue Folge”, t. 3, p. 7, citado por H.-H. Jescheck, in “Tratado de Derecho Penal”, Vol. II, p. 1195).
Ou ainda, como refere Figueiredo Dias (Consequências Jurídicas do Crime, pág. 227 e seg) a propósito da questão da medida da pena, a finalidade da aplicação desta reside primordialmente na tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível na reinserção do agente na comunidade. A determinação da medida da pena é, assim, a conjugação da expectativa da comunidade na manutenção da vigência da norma infringida que se consubstancia com a ideia de prevenção geral positiva e as exigências derivadas da inserção social e reintegração do agente na comunidade.
Tal conjugação terá como parâmetro a culpa que constitui um limite máximo que não pode ser ultrapassado.
Para a determinação da medida concreta da pena há que fazer apelo aos critérios definidos pelos artigos 71º, 40º e 47º, n.º 1 do Código Penal, nos termos dos quais, tal medida será encontrada dentro da moldura penal abstractamente aplicável, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo ainda a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente.
Atendendo à materialidade considerada provada, são os seguintes os factores que relevam para a medida da pena:
- Execução do facto
O arguido actuou com consciência da ilicitude do seu acto e plena liberdade de decisão e com intenção de injuriar o ofendido, tendo dirigido ao ofendido as expressões que utilizou apenas e só para o injuriar.
Sabia que tais comportamentos eram ilícitos bem como sabia que o ofendido é agente da PSP, em exercício de funções.
Mais sabia que devia obediência á ordem de detenção e que por isso deveria acompanhar os agentes da PSP, á esquadra, mas mesmo assim, a tal se recusou. Por isso foi levado á força e no caminho da esquadra, disse, olhando para o agente Nunes: " quando te encontrar na rua sozinho, faço-te a folha, corto-te o pescoço, não vales nada de mano para mano".
Assim, contra o recorrente milita o grau de ilicitude da conduta deste arguido e o modo gravoso de execução dos factos, na preparação e execução dos mesmos, bem evidenciado no factualismo provado, bem como o tipo de personalidade manifestado nos factos e a culpa manifestada na execução dos mesmos, sendo o seu dolo directo (modalidade mais gravosa do dolo).
Como antecedentes criminais, temos que, nos últimos oito anos (desde 29/1/01, até á data dos factos destes autos), o recorrente já sofreu 11 (onze) anteriores condenações, pela prática do diversos tipos de crime – condução de veículo automóvel sem habilitação legal, condução em estado de embriaguez, injúrias agravadas e diversos roubos.
O arguido negou a prática dos factos, pretendendo que se acreditasse numa versão pelo mesmo inventada. Assim, do passado criminal do arguido (artigo 71º, nº2, al. e) do Código Penal), resulta claro que o mesmo, que em sede de julgamento continua a negar a prática dos factos, o mesmo demonstra um total desrespeito, desafio e afrontamento pelas normas legais vigentes e imperativas, o que leva a uma culpa de grau elevadíssimo.
A seu favor, apenas as suas condições pessoais e inserção social.
Ora, compulsando a materialidade considerada provada e tendo em conta os factores enunciados e o disposto no citado artigo 71º, entendemos ser de manter a medida das penas. É que, face ao elevado grau de ilicitude da conduta do arguido, à intensidade do dolo, às concretas exigências de prevenção geral e a personalidade revelada pelo arguido, fica inviabilizada por si só a possibilidade de acolhimento da pretensão por ele formulada.
Assim, perante estas concretas circunstâncias e face à moldura penal do tipo legal de crime acima mencionada, entendemos, que se mostram adequadas para o arguido as penas de 3 meses de prisão, pela prática de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos art°s 181° e 184°do CP, e a pena de 18 meses de prisão, pela autoria material de um crime de resistência e coacção sob funcionário, p. e p. pelo art° 347°, n°1 do CP.
Igualmente entendemos correcta a efectivação do cúmulo jurídico das penas parcelares supra aplicadas na pena global e única de 20 meses de prisão.
Ou seja, atentos os critérios contidos nos artigos 40º, 70º e 71º C Penal, como suficientemente claro, se deixou exarado na decisão recorrida – ser, assim, óbvia a constatação que bem se decidiu, não merecendo qualquer censura, mostrando-se ajustadas, quer a espécie, quer a medida concreta da pena.
Consequentemente, não foi violada qualquer das disposições legais referidas, mormente arts. 181º, 184º e 347°, nº1, do C.Penal, nem o art.º 18 da CRP, pelo que, também nesta parte o recurso improcederá.

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3.4. Da suspensão da pena.

Como se sabe, a suspensão da execução da pena depende da verificação cumulativa de dois pressupostos: um formal, material o outro.
O primeiro exige que a pena de prisão aplicada não exceda 5 anos. O pressuposto material consiste num juízo de prognose, segundo o qual, o Tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclui que a simples censura do facto e a ameaça de prisão bastarão para afastar o delinquente da criminalidade, salvaguardando as exigências mínimas da prevenção geral (artigo 50º do Código Penal).
E o tribunal só deve decretar a suspensão da execução quando concluir, face a esses elementos que essa é a medida adequada a afastar o delinquente da criminalidade. O instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o tribunal e o condenado. Assim, o tribunal convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade, mas se tem sérias dúvidas sobre a capacidade do arguido para compreender a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, a prognose deve ser negativa (neste sentido o Ac. do STJ de 11-01-2001, proc. n.º3095/00-5).
Ou seja, é necessário que, por um lado se faça uma prognose social favorável quanto ao arguido no sentido de que, perante a factualidade apurada se conclui que o mesmo aproveitará a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, não voltando, com elevado grau de certeza, a delinquir e, por outro lado, que a suspensão cumpra as exigências de reprovação do crime servindo para satisfazer a confiança da comunidade nas normas jurídicas violadas.
Traduzindo-se na não execução da pena de prisão aplicada, nos casos de medida não superior a 5 anos, entendemos, com o apoio da melhor doutrina, que a suspensão constitui uma verdadeira pena autónoma (com elementos relevantes sobre a natureza de pena autónoma, de substituição, da pena suspensa, veja-se o Acórdão da Relação de Évora, de 10.07.2007, Proc. n.º 912/07-1, www.dgsi.pt).
É uma forma de cumprimento de uma pena funcionando como medida de substituição que não determinando a perda da liberdade física condiciona a vida daqueles a quem é aplicada durante todo o período em que é fixada (Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, Aequitas - Editorial Notícias, 1993, p. 90).
Acresce que são finalidades exclusivamente preventivas, que determinam a preferência por uma pena de substituição, sem esquecer que a finalidade primordial é a de protecção dos bens jurídicos. Não está aqui em causa uma qualquer finalidade de compensação da culpa, mas considerações de prevenção geral sob a forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico, em função das quais se limita o valor da socialização em liberdade que ilumina o instituto da suspensão da execução da pena (Figueiredo Dias, ob. cit., p. 344).
A suspensão da pena é uma medida com um cariz pedagógico e reeducativo, visando proporcionar ao delinquente condições ao prosseguimento de uma vida à margem da criminalidade e exigir-lhe que passe a pautar o seu comportamento pelos padrões ético-sociais dominantes.
Subjacente à aplicação desta medida existe um juízo favorável a que a socialização do arguido, em liberdade, possa ser alcançada. Mas este juízo deve assentar em factos que, com suficiente probabilidade, indiciem que o arguido assumirá o tal comportamento adequado ao não cometimento de novos ilícitos.
Para a formulação deste juízo, deverá o Tribunal atender em especial às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto, prognose esta reportada ao momento da decisão e não ao da prática do crime.
A conclusão de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição assenta, obviamente, no pressuposto de que, por um lado, o que está em causa não é qualquer certeza mas, tão-só, a esperança fundada de que a socialização em liberdade possa ser lograda e de que, por outro, o tribunal deve encontrar-se disposto a correr um certo risco - digamos: fundado e calculado - sobre a manutenção do agente em liberdade.
Havendo razões sérias para duvidar da conformação do comportamento do agente a não delinquir ou se, não obstante o juízo de prognose ser favorável, as necessidades de reprovação e prevenção do crime aconselharem a não suspensão da execução da pena de prisão, então esta medida deve ser negada. Ou seja, o Tribunal deverá correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza, mas se tem sérias dúvidas sobre a capacidade do arguido para compreender a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, a prognose deve ser negativa (neste sentido o Ac. do STJ de 11-01-2001, proc. n.º3095/00-5).
Perante o citado normativo os julgadores não podem estribar-se em condições acerca da culpa do arguido, mas somente reportar-se às finalidades preventivas da punição. A suspensão terá de assegurar as finalidades da prevenção geral e as necessidades de prevenção especial ou de reintegração.
Em suma, é necessário que, por um lado se faça uma prognose social favorável quanto ao arguido no sentido de que, perante a factualidade apurada se conclui que o mesmo aproveitará a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, não voltando, com elevado grau de certeza, a delinquir e, por outro lado, que a suspensão cumpra as exigências de reprovação do crime servindo para satisfazer a confiança da comunidade nas normas jurídicas violadas.
Como já se aflorou, só se deve optar pela suspensão da pena quando existir um juízo de prognose favorável, centrado na pessoa do arguido e no seu comportamento futuro. A suspensão da pena tem um sentido pedagógico e reeducativo, sentido norteado, por sua vez, pelo desiderato de afastar, tendo em conta as concretas condições do caso, o delinquente da senda do crime. Contudo, esse juízo de prognose não corresponde a uma certeza, antes a uma esperança fundada de que a socialização em liberdade se consiga realizar. Trata-se pois de uma convicção subjectiva do julgador que não pode deixar de envolver um risco, derivado, para além do mais, dos elementos de facto mais ou menos limitados a que se tem acesso (Cfr. Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pag. 344).
Ou seja, de um lado, cumpre assegurar em que a suspensão da execução da pena de prisão não colida com as finalidades da punição. Mas por outro lado, tendo em conta as necessidades de prevenção geral, importa que a comunidade não encare, no caso, a suspensão, como sinal de impunidade, retirando toda a sua confiança ao sistema repressivo penal.
Isto é, desde que aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias.
Ou ainda, como é referido no douto Ac. do STJ, de 18-12-2008 Proc nº SJ200812180028375, relatado pelo ilustre Conselheiro, Dr Souto Moura, in www.dgsi.pt “- De um lado, cumpre assegurar que a suspensão da execução da pena de prisão não colida com as finalidades da punição. Numa perspectiva de prevenção especial, deverá mesmo favorecer a reinserção social do condenado; por outro lado, tendo em conta as necessidades de prevenção geral, importa que a comunidade não encare, no caso, a suspensão, como sinal de impunidade, retirando toda a sua confiança ao sistema repressivo penal.”
Tecidas estas breves considerações, dir-se-á que, no caso em apreço, julgamos que a socialização possível não deverá realizar-se no imediato em liberdade.
Na verdade, não foram carreados para os autos elementos suficientes que nos façam emitir o aludido juízo de prognose favorável, a respeito de um comportamento futuro do arguido, a ponto de tudo se resumir a uma simples censura do facto e ameaça da prisão, antes pelo contrário.
Como se pode observar na sentença recorrida o tribunal a quo justificou a não suspensão da execução da pena com o facto de o arguido ter um cadastro extensíssimo e o facto de haver já cumprido pena de prisão efectiva o que o não afastou da criminalidade, pelo que só a pena privativa de liberdade lograrão as finalidades da punição ser alcançadas.
Assim, temos, por um lado, as necessidades de prevenção especial, pois o arguido não obstante as diversas e diferentes tipos e suspensões de pena, não assumiu o mal praticado nem a gravidade dos factos, pelo que nos parece que não se recuperará com a simples ameaça da pena. Por outro lado, as elevadas exigências de prevenção geral face à cada vez maior frequência com que se verificam os tipos legais em causa, o número de crimes praticados pelo arguido, a que não pode ser alheio o alarme e insegurança social que se vem verificando, impondo-se acautelar a confiança da comunidade na norma jurídica violada, julgamos que a simples censura dos factos e ameaça da pena não são suficientes para afastar o arguido da prática do crime e simultaneamente e satisfazer as necessidades de reprovação e prevenção do crime, nos termos do artigo 50°, n° 1, do Código Penal.
Face a todo o exposto, temos de concluir que todo o circunstancialismo revela uma personalidade em relação à qual não é possível fazer um juízo fundado de prognose favorável, no sentido de que a simples censura do facto e a ameaça da pena bastarão para afastá-lo da criminalidade.
Por isso, entendemos que não pode formular-se quanto ao arguido uma prognose favorável, no sentido de que não voltará a delinquir, pelo que não deverá beneficiar da suspensão da execução da pena, sendo evidente que o recorrente não tem razão, o que fundamenta e determina a rejeição do recurso.

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III – Decisão.

Face ao exposto, acordam os Juízes que compõem esta Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra, em negar provimento ao recurso, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente com taxa de justiça de 6 UCs.
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(Processado e revisto, pelo relator, o primeiro signatário)

Coimbra, 03 de Fevereiro de 2010.

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(Calvário Antunes)


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(Mouraz Lo