Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
308/06.1TTLMG-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: ACIDENTE
MORTE
RETRIBUIÇÃO
SALÁRIO MÍNIMO NACIONAL
Data do Acordão: 11/17/2021
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DO TRABALHO DE LAMEGO DO TRIBUNAL DA COMARCA DE VISEU
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 20.º, N.º 1, ALÍNEA D), E N.º 2, 26.º, N.º 2 E N.º 8 DA LEI N.º 100/97 DE 13/09
Sumário: Em caso de acidente de trabalho mortal, a retribuição do sinistrado a atender para efeitos de quantificação das pensões devidas é a que o mesmo auferia à data do acidente, mesmo que a morte tenha ocorrido num momento em que o salário mínimo nacional vigente à data da morte seja superior àquela retribuição.
Decisão Texto Integral:






Acordam[1] na Secção Social (6.ª secção) do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - Relatório

A… e B…, residentes em …, …

intentaram a presente ação especial de acidente de trabalho contra

Companhia de Seguros C…, SA, com sede em …

alegando, em síntese que:

O sinistrado (filho dos AA.), foi vítima de um acidente de trabalho, em 27/08/2005, quando trabalhava como servente, auferindo a quantia mensal de € 389,00, acrescida de subsídio de alimentação diário no valor de € 4,40; o sinistrado ajudava todos os meses os AA. no sustento da família, contribuindo com pelo menos 2/3 do seu salário, sendo o mesmo imprescindível para tal; em consequência do acidente o sinistrado ficou 11 anos em coma e veio a falecer no dia 14/06/2016. 

Terminam, pedindo a condenação da Ré a pagar aos AA.:

a) A seguradora deve pagar a cada um dos autores, pais do sinistrado, até perfazerem a idade da reforma por velhice, a título de pensão por morte, uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, calculada com base em 15% da retribuição anual do sinistrado (€ 8.816,34), no montante de 1.322,45 (mil trezentos e vinte e dois euros e quarenta e cinco cêntimos), a partir da data da morte em 15-06-2016, inclusive, calculada nos termos da alínea d), do 1, e 2, ambos do artigo 20º da Lei 100/97, de 13 -09, e na alínea a), do nº1, do art.º 56º do Dec. Lei 143/99, de 30/04, acrescida dos juros legais desde a data da fixação da pensão (15-06-2016) até efetivo e integral pagamento.
b) A seguradora deve pagar a cada um dos autores, pais do sinistrado, a partir da idade da reforma por velhice, a título de pensão por morte, uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, calculada com base em 20% da retribuição anual do sinistrado (€ 8.816,34), no montante de 1.763,26 (mil setecentos e sessenta e três euros e vinte e seis cêntimos), calculada nos termos da alínea d), do 1, e 2, ambos do artigo 20º da Lei 100/97, de 13 -09, e na alínea a), do nº1, do art.º 56º do Dec. Lei 143/99, de 30/04, e acrescida dos juros legais desde a data a partir da idade da reforma por velhice, até efetivo e integral pagamento.
c) Deve a seguradora, deve pagar ao autor, pai do sinistrado, as despesas de funeral sem trasladação (cf. fls. 484), no montante de 2.120,00, nos termos do disposto no 3, do art.º 22º, da Lei 100/97, de 13-09, acrescida dos juros legais até efetivo e integral pagamento.
d) Deve a seguradora pagar aos autores uma indemnização que o tribunal julgue justa e equitativa, mas que se indica num valor não inferior a 50.000,00, por violação grosseira ou a título negligente das suas obrigações e dos seus deveres expressos na alínea a) do artigo 10º da Lei 100/97, na modalidade de prestações em espécie.
e) Condenar a seguradora a pagar aos autores, no demais que se vier a provar e que esteja dentro dos poderes conferidos por lei a este tribunal, nomeadamente, através da condenação extra vel ultra petitum.
f) Deve a seguradora ainda ser condenada a pagar as custas judiciais, custas de parte e demais encargos com o processo.”

                                                             *

A Ré seguradora contestou alegando, em sinopse, que:

Não é de aplicar a atualização salarial peticionada pelos AA., devendo a pensão eventualmente a fixar ser calculada com base no salário auferido pelo sinistrado à data do acidente, sendo esse apenas o que efetivamente foi transferido para a Ré.

Termina, dizendo que a presente ação deve ser julgada de acordo com a prova a produzir nos autos, com as demais consequências legais.                                             

*

Foi proferido o despacho saneador de fls. 547 e segs.; selecionada a matéria assente, identificado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova.

                                                             *

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento.

                                                             *

Foi, depois, proferida sentença (fls. 652 e segs.) e de cujo dispositivo consta:

“Face ao exposto, julga-se parcialmente procedente, por provada, a presente ação e, consequentemente, decide-se:

1. Reconhecer que D… faleceu em consequência das sequelas sofridas por força do acidente de trabalho de 27.08.2005;

2. Condenar a Companhia de Seguros C…, S.A. a pagar:

» ao Autor A… as seguintes prestações:

a) uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, calculada com base em 15% da retribuição anual do Sinistrado, no montante de 976,62€ a partir de 15.06.2016;

b) a quantia de 2.120,00€ a título de despesas de funeral sem transladação;

» à Autora B…a seguinte prestação:

a) uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, calculada com base em 15% da retribuição anual do Sinistrado, no montante de 976,62€ a partir de 15.06.2016;

» a ambos os Autores a quantia de 18,00€ a título de deslocações obrigatórias a este Tribunal.

3. Mais se condena a Seguradora a pagar aos Autores juros sobre tais quantias, à taxa legal, desde a data do respetivo vencimento até integral pagamento; sendo os juros relativos às despesas de funeral a contabilizar desde o trânsito em julgado desta decisão.

4. Absolve-se a Seguradora do demais peticionado.”

*

Os AA., notificados desta sentença, vieram interpor o presente recurso formulando as seguintes conclusões:

(…)

                                                             *

II – Questões a decidir

Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 639.º, n.º 1, do CPC), salvo as que são de conhecimento oficioso.

Cumpre, então, conhecer as questões suscitadas pelos AA. recorrentes:

Se a sentença é nula por omissão de pronúncia.

Se as pensões devidas aos AA. deviam ter sido calculadas com base na remuneração mínima mensal garantida em vigor à data da sua fixação ou da morte do beneficiário, sob pena de violação dos artigos 59.º, n.º 1, f) e 13.º da CRP.

                                                             *

                                                             *

III – Fundamentação

a) Factos provados constantes da sentença recorrida:

A) D… que foi vítima de acidente de trabalho no dia 27 de agosto de 2005, nasceu no dia 15 de fevereiro de 1985.

B) Nesse dia do acidente, o D…, tinha 20 anos de idade, era solteiro, e não tinha filhos.

C) D…, é filho dos autores, A… e B…, e estes são casados entre si, vivendo juntos, desde 06 de outubro de 1979.

D) O pai, A…, nasceu no dia 30 de outubro de 1957.

E) E a mãe, D. B… nasceu no dia 07 de setembro de 1961.

F) D…, tem três irmãos, também filhos dos aqui Autores: a irmã mais velha, E…; e dois irmãos, estes gémeos, um rapaz e uma outra menina, que nasceram ambos no dia 23 de fevereiro de 1994, de seu nome, F… e G….

G) À data do acidente de trabalho sofrido por D…, os seus irmãos F… e G… tinham apenas 11 anos de idade.

H) Nessa altura, a família era constituída por 6 pessoas: os quatro irmãos e os seus pais; e viviam todos na casa dos seus pais, os aqui Autores.

I) Era uma família simples, mas muito digna e honrada.

J) Na data do acidente, D…, trabalhava como servente, numa empresa de construção civil, denominada, H…, Lda., com o nº de identificação fiscal: …, e com sede no …, …, auferindo como vencimento ilíquido base a quantia mensal de € 389,00, mais subsídio de alimentação no valor de € 96,80.

K) À data do acidente, o Sinistrado, filho dos Autores auferia a remuneração anual de (€389,00 x 14 + 4,40 x 22 x 11 =) € 6.510,80.

L) A entidade empregadora tinha a sua responsabilidade emergente de acidente de trabalho transferida para a Ré Companhia de Seguros, pela totalidade do salário auferido pelo Sinistrado, através da apólice nº ….

M) No dia 27 de agosto de 2005, por volta das 15 horas e 30 minutos, dia muito infeliz e muito triste para todos, a empresa H…, Lda., para além de outros trabalhos de construção civil que tinha na quinta do …, tinha nesse dia para executar nessa quinta do …, um trabalho que consistia no transporte e fixação de uma pedra padieira em granito nas laterais ou ombreiras em pedra da porta do armazém dessa quinta.

N) Para fazer esse trabalho supra referido, foram mandados para o local, três (3) trabalhadores da empresa H…,  a saber: I… (de nacionalidade russa), J…  e D….; tendo, ainda, sido enviada para o local uma máquina retroescavadora, máquina esta de marca Komatsu.

O) De acordo com o trabalho que a empresa se obrigou a fazer para com os proprietários daquela quinta do … e que deu ordens aos seus três trabalhadores para o fazerem, e que era, como se disse já supra, o transporte pela máquina da empresa de uma pedra padieira em granito (verga superior de porta ou viga que cobre o vão de uma porta), para ser fixada ou apoiada em cima das ombreiras ou laterais da porta do armazém que já se encontravam feitas em muro de pedra, da entrada para o armazém dessa quinta do …, cujas manobras de condução e execução no local consistiram em aproximar a máquina retroescavadora da entrada do armazém da quinta, ficando do seu lado de fora, para a seguir e a partir daí com a referida máquina fazer o transporte da pedra de granito do solo até acima das ombreiras e depois apoiá-la ou fixá-la por cima destas ombreiras para aí ficar definitivamente, tendo a máquina sido conduzida pelo I…  em manobras de condução de avanço e recuo, até conseguir acertar com o melhor momento para apoiar ou fixar a pedra de granito nas ombreiras da porta da entrada do armazém, acabando a máquina por assentar a pedra padieira em granito em cima das laterais ou ombreiras da porta do armazém.

P) Para quem está virado de frente para a porta de entrada do armazém da quinta, o J…  encontrava-se do lado direito da máquina, na estrada nacional M313, e o D… encontrava-se do lado esquerdo da máquina, do lado do talude.

Q) Repentina e inadvertidamente e sem nada que o fizesse prever, a máquina retroescavadora conduzida pelo I…  fez um recuo, e, tocou na pedra de granito, que tinha acabado de transportar para cima das ombreiras da porta de entrada do armazém com os “garfos” da frente da máquina, provocando a sua queda, que acabou por atingir com violência a cabeça e o corpo do D…, que, logo ali de imediato caiu ao chão e desmaiou, perdendo os seus sentidos.

R) O Sinistrado, por força do acidente de que foi vítima - atingimento por objeto contundente, por pedra na cabeça e corpo -, ficou gravemente ferido, sofrendo TCE com contusão hemorrágica temporal esquerda e hematoma subdural ipsilateral; traumatismo torácico com fratura bilateral de costelas com Volet Costal, enfisema subcutâneo, hemo e pneumotórax, contusão pulmonar e pneumodiastino; choque hemorrágico; traumatismo medular com fraturas vertebrais múltiplas e fratura da omoplata e úmero esquerdo.

S) Tendo no dia do acidente sido transportado para as urgências da Unidade Hospitalar do …, e logo no dia a seguir foi imediatamente transferido para o … para o serviço de urgências do Hospital de …, onde ficou acamado e em tratamento desde o dia 28 de agosto de 2005 até ao dia 20 de novembro de 2005.

T) E desse Hospital foi de novo transferido para a Unidade Hospitalar do …, do Centro Hospitalar de …, onde ficou internado e acamado, medicado e em estado de coma, desde o dia 21-11-2005 até ao dia 17-01-2012, quase 7 anos.

U) No dia 18 de janeiro de 2012, foi transferido para a Unidade de Cuidados Continuados Integrados de Longa Duração do … onde esteve até ao seu falecimento.

V) Em consequência do dito acidente ocorrido a 27.08.2005, o Sinistrado ficou afetado da I.P.P. de 100% com IPA e necessidade de apoio de 3ª. pessoa, a partir de 26.07.2007.

W) O Sinistrado ficou internado e acamado, medicado e em estado de coma Glasgow Ao, Ut, M4 e tetraplégica espática, tendo permanecido continuamente neste estado durante quase 11 anos, desde pouco depois do acidente em 2005, em que tinha apenas 20 anos de idade, até à data do seu falecimento em 14 de junho de 2016, com 31 anos de idade.

X) Por acordo alcançado no âmbito da tentativa de Conciliação realizada, nos autos principais, a 10.03.2008, ficou estabelecido que:

“A Compª. de Seg. C…, S. A., pagará ao(à) sinistrado(a) uma pensão anual e vitalícia no montante de 5208,64€ (CINCO MIL DUZENTOS E OITO EUROS E SESSENTA E QUATRO CÊNTIMOS), a partir de 26.07.2007, inclusive, calculada nos termos do artº 17º, 1, al. a), da Lei 100/97 de 13/Set.;

Pagará a Seguradora, um subsídio por situação de elevada incapacidade, nos termos do artº. 17º, nº. 1, al. a), e 23º. da Lei supra referida no montante de 4.496,40€ (QUATRO MIL QUATROCENTOS E NOVENTA E SEIS EUROS E QUARENTA CÊNTIMOS)

Pagará ainda a Seguradora, nos termos do artº. 19º da Lei nº. 100/97, e artº. 48º, nº. 2, do DL 143/99, de 30/Abril, uma prestação suplementar mensal, a partir do dia seguinte ao da alta, no montante da remuneração mínima mensal garantida, actualizável anualmente, no valor de 403,00€ em 2007 e de 426,00€ a partir de 01.01.2008.

Mais pagará a Seguradora um subsídio para readaptação de habitação, até ao limite de 4 496,40€ (QUATRO MIL QUATROCENTOS E NOVENTA E SEIS EUROS E QUARENTA CÊNTIMOS), nos termos dos artº 24º, da Lei 100/97.

Mais pagará a Seguradora as despesas reclamadas pelo(a) tutor do sinistrado(a) no que respeita a alimentação e deslocações obrigatórias a este Tribunal, no valor de 60,00€.

A cargo da seguradora ficarão ainda todas as prestações que o sinistrado(a) necessite em consequência das lesões provocadas pelo acidente dos autos nos termos dos artigos 10º, al. a), da Lei 100/97, e 23º, do DL 143/99 - Regulamento.”

Y) Entretanto, o Sinistrado, filho dos Autores veio a falecer no dia 14 de junho de 2016.

Z) Em consulta técnico-científica elaborada pelo Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses, IP (INMLCF), datado de 12.09.2018, foi emitido Parecer no sentido de que a morte do Sinistrado se deveu a “falência multiorgânica com pneumonia de aspiração é de admitir que estas lesões tenham sido sequelas indiretas de grave acidente ocorrido em 27/08/2005”.

AA) A causa da morte do sinistrado D… foi consequência das sequelas derivadas do acidente de trabalho sofrido pelo mesmo a 27.08.2005.

BB) O autor completou o 4º ano de escolaridade, mas a autora, devido ao facto de ter 13 irmãos e de ter de tomar conta deles, ficou impossibilitada de frequentar a escola, completando apenas o 3º ano de escolaridade.

CC) À data do acidente, dia 27 de agosto de 2005, o autor era trolha e a autora era doméstica, situação que se manteve até aos dias de hoje.

DD) A casa dos autores, além de ser de difícil acesso, é composta por 2 quartos pequenos, um quarto onde dormia o casal e o outro as filhas, e ainda uma salita pequena onde dormiam os rapazes.

EE) O D…, com o seu rendimento de servente, ajudava todos os meses os seus pais no sustento da família e nas despesas da casa, contribuindo todos os meses com parte do seu salário, entregando esse dinheiro à sua mãe para esse efeito, sendo o mesmo imprescindível ao sustento da família.

FF) Era muito amigo dos seus pais e gostava muito deles, era humilde e com um bom coração e dado o parco rendimento e as dificuldades dos seus pais, ia dizendo que os seus rendimentos haveriam sempre de servir para ajudar os seus pais, e que estes nunca iriam passar fome ou dificuldades.

GG) Fez o 9º ano de escolaridade, era inteligente, mas precisamente por causa das necessidades e dificuldades dos seus pais teve de começar a trabalhar por volta dos 16 anos, contribuindo desde então mensalmente com os seus rendimentos para colmatar as dificuldades e necessidades dos pais.

HH) O autor A…, trabalhava à data do acidente, na mesma empresa H…. Lda., como trolha, auferindo a retribuição ilíquida mensal de € 496,00, mais subsidio de alimentação no valor de € 96,80.

II) O rendimento global dos autores, que provinha apenas do trabalho do autor, como trolha, no ano do acidente, em 2005, foi de € 6.750,67.

JJ) Mas, logo no ano a seguir ao acidente, em 2006, a empresa H…,  Lda., encerrou, e em 30/08/2006, o autor recebeu desta empresa a sua última retribuição ilíquida, tendo sido nesta altura o seu vencimento base mensal de € 506,00.

KK) E, consequentemente, o rendimento global dos autores no ano a seguir ao acidente, em 2006, que provinha apenas do trabalho do autor, como trolha, baixou, sendo de € 4. 656, 44.

LL) A aqui autora, à data do acidente não auferia qualquer rendimento, nem depois nem agora aufere rendimentos, nunca descontou nem desconta e não está abrangida por nenhum regime de segurança social.

MM) A filha do casal, à data do acidente, era solteira, encontrava-se a viver com os seus pais e irmãos, estava desempregada e não obtinha quaisquer rendimentos.

NN) Os salários do falecido D… e do seu pai, aqui autor, eram os únicos que à data do acidente contribuíam para pagar diariamente as despesas e o sustento de todos os seis membros da família, sendo absolutamente imprescindíveis para fazer face às despesas mais básicas e mais elementares de todos eles.

OO) O autor tinha e tem uma viatura usada para se deslocar para o trabalho, e paga de seguro automóvel obrigatório, o valor anual de € 173,79, que dá uma média mensal de € 14,48.

PP) À data do acidente, os dois rendimentos ilíquidos mensais que suportavam as despesas do agregado familiar rondavam o valor de € 1.077,80.

QQ) Sendo que, por diversas vezes, os autores precisaram e recorreram à ajuda de familiares e amigos, para fazerem face às suas necessidades, tendo estes os ajudado.

RR) O autor pagou o montante de € 1.430,00€ a título de despesas de funeral sem trasladação.

SS) Após o acidente, e face à baixa do rendimento dos autores, estes tiveram necessidade de continuar a usufruir regularmente dos rendimentos do sinistrado seu filho, agora, e primeiramente, através das indemnizações relativas às incapacidades temporárias desde o dia seguinte ao do acidente até à data da alta, pagas pela ré seguradora, e depois, após a data da alta, os pais através da mãe, continuaram a usufruir, através de um subsidio por situação de elevada incapacidade, no montante de € 4.496,40, e de uma pensão anual e vitalícia pela incapacidade permanente absoluta do seu filho, no montante de € 5.208,64, a partir de 26-07-2007, inclusive, e de uma prestação suplementar mensal, a partir da mesma data, no montante da remuneração mínima mensal garantida, atualizável anualmente, no valor de € 403,00 no ano de 2007, pagas pela ré seguradora.

TT) A seguir ao acidente, em 2006, a empresa onde o autor e o sinistrado seu filho trabalhavam, encerrou portas, tendo o autor marido a partir dessa altura se coletado em nome individual e passado a trabalhar como trolha por sua conta e risco, pelo que passaram a contar com o rendimento global de apenas 10% do seu rendimento anual, que é a percentagem do rendimento global da atividade do autor como trolha a considerar para efeitos de liquidação ou tributação de IRS.

UU) No ano anterior ao falecimento do sinistrado seu filho, em 2015, os autores, através do único rendimento que têm, do autor marido como trolha, auferiram o rendimento global anual, de € 6.672,70; e no ano do falecimento do filho, em 2016, auferiram o rendimento global nesse ano, de € 7.135,00; o que dá uma média dos dois anos mais próximos do óbito, de rendimento global anual do casal de 6.903,85, e mensal de € 575,32, e por cabeça, por cada um dos autores, o valor médio mensal de € 287, 66, o que era e é insuficiente para colmatar as suas necessidades mais básicas.

VV) Mantêm a necessidade de continuarem a usufruir regularmente dos rendimentos obtidos pelo seu filho, o que sempre fizeram até à data do seu falecimento, altura em que a ré seguradora deixou de pagar esses valores.

WW) O rendimento global que os autores obtiveram, no ano 2019, sempre obtido através do único trabalho de trolha do autor, foi no montante anual global de € 5.740,00, o que dá uma média mensal de € 478, 33, e por cabeça, por cada um dos autores, o valor médio mensal de € 239,16.

XX) Os autores suportam despesas: com água, cerca de € 25,39; Luz, cerca de € 63,00; seguro automóvel obrigatório da viatura do autor, com um valor médio de € 14,48; e com a alimentação para os dois numa média mensal de cerca de (200,00 x 2 =) € 400,00;

YY) O Autor, por força da sua atividade, pagou a título de contribuições para a segurança social: no ano de 2016 (falecimento do filho), o valor mensal de € 62,04; no ano de 2019, o valor mensal de 62,36; e em 2020, paga o valor mensal de € 77,33 (cf. doc. 20);

ZZ) O autor usava a viatura própria na sua atividade em nome individual e tem gastos com o consumo do gasóleo e despesas de manutenção da viatura.

AAA) Os autores fizeram muitas deslocações com a sua viatura, desde o dia do acidente em 27-08-2005 até ao dia do falecimento do filho em 16-06-2016, desde a sua aldeia de … (concelho de … às unidades hospitalares onde se encontrava acamado o seu filho, que foram, o Hospital de … no …, o Hospital de …, o Hospital do …, a Unidade de Cuidados Continuados de Longa Duração, pertença da Santa Casa da Misericórdia de …, e situada nesta cidade, onde aqui permaneceu cerca de 5 anos.

BBB) Quando o filho foi transferido para a cidade de …, já mais próximo da residência dos aqui autores, e que ida e volta são cerca de 12 quilómetros, o pai, o aqui autor, visitava o seu filho sempre que podia, por vezes aos sábados também, mas ia sempre todos os domingos e feriados que era quando lhe era possível ir. E a mãe do D…, ia visitar o seu filho todos os dias, todos os dias da semana e os dois do fim de semana.

CCC) Em gasóleo e outras despesas de manutenção gastavam no mínimo um valor médio mensal de cerca de € 150,00.

DDD) A autora toma medicação diariamente, gastando cerca de 30,00€ mensais.

CCC) A autora é uma pessoa doente, que já há muito tem problemas de saúde grave, que a impossibilita ou impede totalmente de trabalhar, pois sofre de um problema grave na zona do coração, que faz com que se canse com muita facilidade, tendo por isso muitas dificuldades em andar, e sendo obrigada a frequentemente parar quando caminha, problema que se agravou no ano de 2015 e desde então até hoje, de que, não é possível sequer ser operada, pois corre risco de vida, e para o qual, toma medicação.

DDD) A quinta do … situa-se logo a seguir à saída da cidade do …, cerca de 300 metros depois, junto à estrada nacional M313 do lado esquerdo da estrada no sentido/direção … para …, e a cerca de 3/4 quilómetros do estaleiro/sede da empresa H… em ….

EEE) E o seu armazém praticamente em pedra é contíguo a esta estrada nacional M313 e estende-se ao longo dela (não existindo espaço ou passeio entre o armazém e a estrada nacional).

FFF) Para fazer esse trabalho supra referido, foram mandados para o local, três (3) trabalhadores da empresa H… , a saber: I… (de nacionalidade russa), J…  e D…,

GGG) E foram usados bens e materiais da empresa H… , tendo sido enviada para o local uma máquina retroescavadora, que foi locada pela empresa e era por si diariamente usada e que já trabalhava na empresa pelo menos há cerca de 3/4 anos, e que, para além deste dia, continuou ainda depois deste dia a fazer trabalhos para a empresa.

HHH) A máquina retroescavadora essa, de marca Komatsu, modelo WB 93 R2, com o número de série 93 F 23125, que foi fornecida pela empresa L…, SA, à empresa H…  Lda. (entidade empregadora), através de leasing com a financeira M…, SA.

III) Tendo a M… e a H… celebrado para o efeito um contrato de locação financeira dessa máquina Komatsu, em que a M… era a locadora e a H… a locatária, que foi segurada na ré através da apólice nº 9840/46105/78, Bens em Leasing /9840, ficando a primeira como segurado e a segunda como tomador do seguro.
JJJ) Máquina que foi conduzida pelo trabalhador da H… I…, transportando alguns materiais e nesse dia o I…  transportou a máquina desde a sede da empresa em … até à quinta do …, tendo para o efeito, atravessado algumas ruas da cidade de … e depois continuado a sua marcha pela estrada nacional M313, até chegar à Quinta do …, percorrendo a máquina de um local ao outro uma distancia de cerca de 3/4 quilómetros.
KKK) E, aí chegada, a máquina atravessou, nesta estrada nacional M313, da sua faixa de rodagem do lado direito no sentido … – …, para o lado esquerdo da faixa de rodagem contrária ao seu sentido de trânsito, para entrar num caminho ligado a esta estrada nacional M313, e que é contíguo a esta estrada principal, e exterior à quinta do …, sendo um caminho que leva à entrada para o armazém desta quinta e que fica ao mesmo nível do piso desse armazém, onde aí antes do armazém a máquina parou, para de seguida começar a executar nesse local as manobras de condução a que a empresa H…, Lda., destinou neste dia para esta máquina, de acordo com o trabalho que a empresa se obrigou a fazer para com os proprietários daquela quinta do … e que deu ordens aos seus três trabalhadores para fazerem o transporte pela máquina da empresa de uma pedra padieira em granito para ser fixada ou apoiada em cima das ombreiras ou laterais da porta do armazém que já se encontravam feitas em muro de pedra, da entrada para o armazém dessa quinta do …, cujas manobras de condução e execução no local consistiram em aproximar a máquina retroescavadora da entrada do armazém da quinta, ficando do seu lado de fora, para a seguir e a partir daí com a referida máquina fazer o transporte da pedra de granito do solo até acima das ombreiras e depois apoiá-la ou fixá-la por cima destas ombreiras para aí ficar definitivamente.
LLL) Tendo a máquina sido conduzida pelo I…  em manobras de condução de avanço e recuo, até conseguir acertar com o melhor momento para apoiar ou fixar a pedra de granito nas ombreiras da porta da entrada do armazém, acabando a máquina por assentar a pedra padieira em granito em cima das laterais ou ombreiras da porta do armazém, e logo de seguida, o condutor da máquina I…,  disse aos seus colegas J…  e D… que já podiam entrar dentro do armazém.
MMM) Ambos os colegas se encontravam, tal como a máquina e o I… , do lado de fora do armazém, no caminho contiguo e ligado à estrada nacional M313, que vai dar à entrada do armazém a que acima fazemos referencia, e para quem está virado de frente para a porta de entrada do armazém da quinta, o J…  encontrava-se do lado direito da máquina, na estrada nacional M313, e o D… encontrava-se do lado esquerdo da máquina, do lado do talude.
NNN) Às ordens do condutor da máquina I…  de que podiam entrar no armazém, o J… avançou para dentro do armazém e o D… também.
OOO) Quando o J…  já se encontrava dentro do armazém e o D… estava próximo da entrada do armazém, eis que repentinamente, inadvertidamente e sem nada que o fizesse prever, a máquina retroescavadora conduzida pelo I… , fez um recuo, e, tocou na pedra de granito, que tinha acabado de transportar para cima das ombreiras da porta de entrada do armazém com os “garfos” da frente da máquina, provocando a sua queda, que acabou por atingir com violência a cabeça e o corpo do D…, que, logo ali de imediato caiu ao chão e desmaiou, perdendo completamente os seus sentido.
PPP) Em consequência do acidente dos autos, despendeu a Ré até ao momento as seguintes quantias: Incapacidades Temporárias €5.078,32; despesas médicas, medicamentosas e tratamentos €9.010,17; assistência vitalícia €287.614,96; pensão €52.648,42.
QQQ) À data da morte de D…, os seus irmãos F… trabalhava numa loja de … e G… trabalhava, em regime de part-time, no … (nascidos a 23.02.1994), auferindo rendimentos anuais provenientes de trabalho dependente (até 2018 rendimentos anuais globais inferiores a 10.000,00€, ascendendo os últimos – 2018 e 2019 – e relativos a um deles - ao máximo de 10.583,27€; e a filha mais velha do casal – E… começou a apresentar rendimentos em 2006, sempre isenta de IRS, sendo que a partir de 2009 já no estado de casada.
RRR) O Autor é pensionista por velhice desde 01.06.2020.

                                                             *

                                                             *

b) - Discussão

1ª questão

Nulidade da sentença por omissão de pronúncia

Alegam os AA. recorrentes que a sentença recorrida omitiu os pedidos formulados pelos AA. na alínea b) da petição inicial, pelo que, cometeu uma nulidade por omissão de pronúncia.

Vejamos:

Conforme resulta do artigo 615.º, n.º 1, d), do CPC a sentença é nula quando:

<<O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (…);>>.

Na verdade, conforme impõe o n.º 2 do artigo 608.º do CPC, <<o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)>>.

O tribunal deve apreciar todas as questões que lhe foram apresentadas pelas partes, sob pena de nulidade da decisão, o que já não ocorre com a falta de discussão de todas as razões ou argumentos invocados.

Nas palavras do Professor Alberto dos Reis[2], <<são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão>>.

Ora, lida a sentença recorrida facilmente se conclui que a mesma não sofre da invocada nulidade.

Na verdade, os AA. formularam na alínea b) do petitório o seguinte pedido:
b) A seguradora deve pagar a cada um dos autores, pais do sinistrado, a partir da idade da reforma por velhice, a título de pensão por morte, uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, calculada com base em 20% da retribuição anual do sinistrado (€ 8.816,34), no montante de 1.763,26 (mil setecentos e sessenta e três euros e vinte e seis cêntimos), calculada nos termos da alínea d), do 1, e 2, ambos do artigo 20º da Lei 100/97, de 13 -09, e na alínea a), do nº1, do art.º 56º do Dec. Lei 143/99, de 30/04, e acrescida dos juros legais desde a data a partir da idade da reforma por velhice, até efetivo e integral pagamento.
No entanto, decidiu-se na sentença recorrida que:
“Assim:
» a cada um dos Autores é devida uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, calculada com base em 15% da retribuição anual do Sinistrado, no montante de 976,62€ a partir de 15.06.2016, calculada nos termos do art. 20º, nºs 1, al. d) e 2, da lei nº 100/97 de 13.09 e art. 56º, nº 1, al. a), do DL nº 143/99 de 30.04;”.
Ora, resulta do que ficou dito que, tendo a sentença recorrida concluído no sentido de a pensão anual e vitalícia devida aos AA. ser obrigatoriamente remível, não se impunha que na mesma se fizesse qualquer referência ao citado pedido dos AA. por ter ficado naturalmente prejudicado, ou seja, sendo a pensão fixada, a partir de 15/06/2016, obrigatoriamente remível não tem lugar a fixação de uma pensão com base em 20% da retribuição do sinistrado a partir da idade da reforma por velhice dos AA..
Assim sendo, facilmente se conclui que a sentença recorrida não sofre da invocada nulidade por omissão de pronúncia.
Improcede, por isso, esta conclusão dos recorrentes.

2ª questão

Se as pensões devidas aos AA. deviam ter sido calculadas com base na remuneração mínima mensal garantida em vigor à data da sua fixação ou da morte do beneficiário, sob pena de violação dos artigos 59.º, n.º 1, f) e 13.º da CRP.

Alegam os AA. recorrentes que a interpretação do tribunal “a quo ” no presente caso em concreto, do art.º 20, nºs 1 alínea d) e nº 2, da Lei 100/97, de 13-09, e art.º 56º, nº 1, alínea a), do Dec. Lei nº 143/99, de 30/04, de  atribuir aos  beneficiários  pensionistas, nos casos de morte do sinistrado, passados muitos anos (neste caso quase 11 anos) após a  data do acidente, uma pensão anual e vitalícia,     obrigatoriamente     remível , com     base      no salário auferido pelo sinistrado à data do acidente em vez da remuneração mínima mensal garantida mais elevada à data da fixação da pensão ou da morte do beneficiário, configura uma violação do direito à justa reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho, consagrado no art. 59º, n.º 1, a l. f), da Constituição, conjugado ainda com o princípio da igualdade consagrado no art.º 13º da Constituição, já que lhes limita o direito de poderem receber pelo valor que à data da morte do sinistrado ou  à  data da fixação da pensão corresponde ao salário mínimo nacional; os citados normativos devem ser considerados inconstitucionais por violação do direito à justa reparação e do princípio da igualdade quando interpretados como a sentença de que ora se recorre interpretou; a pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, deve ser calculada com base no salário mínimo nacional ou remuneração mínima mensal garantida mais elevada à data da fixação da pensão ou à data da morte do sinistrado; a Ré/recorrida seguradora deve pagar a cada um dos autores/recorrentes, pais do sinistrado, uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, calculada com base em 15% da retribuição anual do sinistrado (€ 8.816,34), no montante de € 1.322,45, a partir de 15-06-2016, inclusive, calculada nos termos da alínea d), do nº 1, e nº 2, ambos do artigo 20º da Lei 100/97, de 13 -09, e na alínea a), do nº1, do art.º 56º do Dec. Lei nº 143/99, de 30/04, acrescida dos juros legais desde a data da fixação da pensão (15-06-2016) até efetivo e integral pagamento e a partir da idade da reforma por velhice, a título de pensão por morte, uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, calculada com base em 20% da retribuição anual do sinistrado (€ 8.816,34), no montante de € 1.763,26, calculada nos termos da alínea d), do nº 1, e nº 2, ambos do artigo 20º da Lei 100/97, de 13 -09, e na alínea a), do nº1, do art.º 56º do Dec. Lei nº 143/99, de 30/04, e acrescida dos juros legais desde a data a partir da idade da reforma por velhice, até efetivo e integral pagamento.

Por outro lado, a este propósito consta da sentença recorrida, além do mais, o seguinte:
“De referir, por último, que não é devida a atualização salarial como peticionada pelos Autores, devendo a pensão ser calculada com base no salário auferido pelo Sinistrado à data do acidente.
Assim:
» a cada um dos Autores é devida uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, calculada com base em 15% da retribuição anual do Sinistrado, no montante de 976,62€ a partir de 15.06.2016, calculada nos termos do art. 20º, nºs 1, al. d) e 2, da lei nº 100/97 de 13.09 e art. 56º, nº 1, al. a), do DL nº 143/99 de 30.04;”
Posto isto, vejamos se assiste razão aos recorrentes:
Conforme resulta do artigo 20.º da Lei n.º 100/97, de 13/09, aplicável atenta a data do acidente (agosto de 2005):
“1 - Se do acidente resultar a morte, as pensões anuais serão as seguintes:
(…)
d) Aos ascendentes e quaisquer parentes sucessíveis à data do acidente até perfazerem 18, 22 ou 25 anos, enquanto frequentarem, respectivamente, o ensino secundário ou curso equiparado ou o ensino superior, ou sem limite de idade quando afectados de doença física ou mental que os incapacite sensivelmente para o trabalho, desde que o sinistrado contribuísse com regularidade para o seu sustento: a cada, 10% da retribuição do sinistrado, não podendo o total das pensões exceder 30% desta.
2 - Se não houver cônjuge, pessoa em união de facto ou filhos com direito a pensão, os parentes incluídos na alínea d) do número anterior e nas condições nele referidas receberão, cada um, 15% da retribuição do sinistrado, até perfazerem a idade de reforma por velhice, e 20% a partir desta idade ou no caso de doença física ou mental que os incapacite sensivelmente para o trabalho, não podendo o total das pensões exceder 80% da remuneração do sinistrado, para o que se procederá a rateio, se necessário.
(…).”
E, por força do disposto no artigo 26.º da mesma LAT:
<<1. As indemnizações por incapacidade temporária absoluta ou parcial serão calculadas com base na retribuição diária ou na 30.ª parte da retribuição mensal ilíquida, auferida à data do acidente, quando esta representar a retribuição normalmente recebida pelo sinistrado.
2. As pensões por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, serão calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente recebida pelo sinistrado.
(…)
5. Se a retribuição correspondente ao dia do acidente não representar a retribuição normal, será esta calculada pela média tomada com base (…).
(…)
8. Em nenhum caso a retribuição poderá ser inferior à que resulte da lei ou de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.”
Da conjugação destes normativos resulta que as pensões por morte são calculadas com base na retribuição anual ilíquida recebida pelo sinistrado à data do acidente.
Na verdade, é o que se extrai dos n.ºs 1 e 2 do citado normativo, inexistindo qualquer fundamento legal para a pretensão dos recorrentes no sentido de ser considerada como base de cálculo a remuneração mínima mensal garantida em vigor à data da morte do sinistrado, interpretação esta que a lei não consente e por isso não pode ser considerada (n.º 2 do artigo 9.º do CC).
Como refere Carlos Alegre, <<as pensões (por incapacidade ou por morte), bem como as indemnizações (prestações pecuniárias por incapacidade temporária) são, agora, calculadas directamente sobre a retribuição que o sinistrado ou doente realmente auferia (ou devia auferir) na data do acidente ou do diagnóstico final da doença profissional. (…)
A retribuição corresponde, segundo o artigo 26.º, àquilo que o sinistrado recebia no dia do acidente (…), se isso representar a retribuição normalmente recebida.>>
E, no mesmo sentido, o artigo 71.º da nova LAT, nos termos do qual, <<a indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente>>.
É certo que a lei determina que em nenhum caso a retribuição poderá ser inferior à que resulte da lei ou de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho (n.º 8 do artigo 26.º da anterior LAT), no entanto, tal estipulação não pode deixar de referir-se à retribuição auferida à data do acidente, face ao disposto no n.º 1 do artigo 26.º da mesma LAT.
Acresce que, os recorrentes invocam a inconstitucionalidade da  interpretação do art.º 20, nº 1, d) e nº 2, da Lei 100/97, de 13-09 e do art.º 56º, nº 1, a), do Dec. Lei nº 143/99, de 30/04, no sentido de  atribuir aos  beneficiários  pensionistas, nos casos de morte do sinistrado, passados muitos anos (neste caso quase 11 anos) após a  data do acidente, uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível , com base no salário auferido pelo sinistrado à data do acidente, por violação do direito à justa reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho, consagrado no art. 59º, n.º 1, a l. f), da Constituição, conjugado ainda com o princípio da igualdade consagrado no art.º 13º da mesma lei, já que lhes limita o direito de poderem receber pelo valor que à data da morte do sinistrado ou à  data da fixação da pensão, corresponde ao salário mínimo nacional e, ainda, que os citados normativos devem ser considerados inconstitucionais por violação do direito à justa reparação e do princípio da igualdade quando interpretados como a sentença de que ora se recorre interpretou.
Conforme resulta do artigo 59.º, n.º 1, f), da CRP, todos os trabalhadores têm direito a assistência e justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho.
Por outro lado, <<todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei>> - n.º 1 do artigo 13.º da CRP, princípio (geral) da igualdade reiterado no n.º 1 do citado artigo 59.º da Lei fundamental (direitos dos trabalhadores), no sentido de que todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito: (…)>>.
Ora, pese embora o acidente em apreciação se revista de algumas nuances, posto que, ocorreu em 2005 e o sinistrado veio a falecer em 2016, a sua reparação nos termos supra enunciados e conforme resulta do artigo 26.º da anterior LAT, não se nos afigura que viole o direito à justa reparação nem o princípio da igualdade.
Na verdade, não existe qualquer discriminação ou disparidade de tratamento do trabalhador sinistrado, por um lado, nem violação do direito à justa reparação, na medida em que, as pensões são calculadas com base na retribuição auferida pelo sinistrado à data do acidente e serão atualizadas (artigo 6.º do DL n.º 142/99, de 30/04) ou obrigatoriamente remidas, neste caso, nos termos do disposto na Portaria n.º 11/2000, de 13/01, mais concretamente, com base nas tabelas do respetivo anexo, tendo em conta a idade do beneficiário e as respetivas taxas, sendo que, conforme resulta da matéria de facto provada, por acordo de 10/03/2008, a Ré seguradora ficou obrigada a pagar ao sinistrado uma pensão anual e vitalícia, o subsídio de elevada incapacidade, uma prestação suplementar mensal e um subsídio para readaptação da habitação, vindo o sinistrado a falecer no dia 14/06/2016.
E, também não é aplicável ao caso em apreciação o acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 4/2005, na medida em que, para além do mais, o mesmo diz respeito ao critério a que se deve atender para efeitos de determinar se uma pensão anual vitalícia resultante de acidente de trabalho ocorrido antes de 01/01/2000  é de reduzido montante para efeitos de remição.
Resta dizer que, pelos motivos expostos, não acompanhamos o decidido no Acórdão da Relação de Évora citado pelo Exm.º Procurador-Geral Adjunto no parecer que antecede.
Face a tudo o que ficou dito, a interpretação constante da sentença recorrida bem como os citados artigos 20.º, nº 1, alínea d) e nº 2, da Lei 100/97, de 13/09 e 56º, nº 1, alínea a), do Dec. Lei nº 143/99, de 30/04, não sofrem da invocada inconstitucionalidade, sendo devida aos AA. uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, calculada com base em 15% da retribuição anual do sinistrado auferida à data do acidente, tal como consta da sentença recorrida.
  Improcedem, assim, mais estas conclusões dos recorrentes.

                                                         *

Na total improcedência das conclusões formuladas pelos recorrentes, impõe-se a manutenção da sentença recorrida em conformidade.

                                                             *

                                                             *
(…)

                                                           *

                                                             *

V – DECISÃO

Nestes termos, sem outras considerações, acorda-se, na improcedência do recurso, em manter a sentença recorrida.

                                                             *

                                                             *

Custas a cargo dos AA. recorrentes, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhes foi conferido.                                                                                                                                                           *

                                                                       *

                                                                                     Coimbra, 2021/11/17

                                                                                      ____________________                                                                                                                                                                                                                     (Paula Maria Roberto)

                                                                                     ___________________

                (Ramalho Pinto)

                                   ___________________

                                        (Felizardo Paiva)

                                                                                                                                                           

    


[1] Relatora – Paula Maria Roberto
  Adjuntos – Ramalho Pinto
                     Felizardo Paiva

[2] Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra Editora, 1984, pág. 143.