Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
33/09.1PEFIG-A.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: INÁCIO MONTEIRO
Descritores: REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
PENA DE PRISÃO
COMETIMENTO DE NOVO CRIME
AUDIÇÃO DO ARGUIDO
Data do Acordão: 06/21/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA (J C CRIMINAL – J4)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART. 56.º, N.º 1, AL. B), DO CP
Sumário: A condenação da arguida, por crime de tráfico de estupefacientes p. e p. no art. 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, na pena de 6 anos de prisão revela que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas, nos termos do art. 56.º, n.º 1, al. b), do CP, não sendo obrigatória a audição pessoal da arguida na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão, por não estar em causa o seu incumprimento.
Decisão Texto Integral:





Acordam, em conferência, os juízes da 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra

I- Relatório
No processo supra identificado, a arguida A... foi condenada, por acórdão transitado em julgado em 4 de Janeiro de 2011, como co-autora material de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 2l.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, de 22/1, na pena de 4 anos de prisão, suspensa na sua execução, por igual período, mediante a implementação de um complementar regime de prova.
Veio depois a referida arguida a ser condenada, e além do mais (por acórdão também já transitado em julgado, proferido nos autos de processo comum colectivo n.º 45/l2.8PEFIG, igualmente desta Instância Central Criminal - Juiz 4 - da Comarca de Coimbra), como co-autora material de outro crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, na pena de 6 anos de prisão, pena esta que se encontra actualmente a cumprir, por factos ocorridos entre, pelo menos, Outubro de 2012 e 19 de Junho de 2013 (cfr. certidão de fls. 993 a 1097 e certificado do registo criminal de fls. 1101 e 1108, dos autos), ou seja, durante o período de suspensão da execução da pena de prisão determinada no processo comum colectivo n.º 33/09.1PEFIG.
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O Ministério Público promoveu em 7/11/2016 (fls. 117 e 118) a revogação da apontada suspensão da execução, afirmando, e no essencial, denotar a arguida uma evidente dificuldade em orientar a sua vida de acordo com os valores mais básicos do direito, como o atesta a condenação, no processo n.º 45/12.8PEFIG, em pena de 6 anos de prisão, por factos praticados durante o período de suspensão da execução de pena, isto é pelo menos de Outubro de 2012 a 19 de Junho de 2013, pelo meso tipo legal de crime, em pena de prisão efectiva, em fase de cumprimento.
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Cumprido o contraditório, foi concedida à arguida, a qual já se encontrava presa, no cumprimento da pena de prisão efectiva em que foi condenada no processo comum colectivo n.º 45/12.8PEFIG, a possibilidade de se pronunciar sobre a eventual revogação da mencionada suspensão de execução da pena de prisão que lhe foi definida nos presentes autos e apesar de notificada através do seu defensor (fls. 120) e pessoalmente no EP de Tires, conforme fls. 121 a 123, a mesma nada disse.
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Por despacho de 8/12/2016 (fls. 124 a 128) o senhor juiz titular do processo, face ao não cumprimento da condição de suspensão da execução da pena, devido à prática do mesmo tipo legal de crime e condenação em pena de 6 anos de prisão, revogou a suspensão da execução da pena de 4 anos de prisão em que a arguida A... foi condenada, ordenando o seu cumprimento, nos termos do art. 56.º, n.º 1, al. b) e n.º 2, do CP.
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Despacho de revogação da suspensão da execução da pena:
«A arguida A... foi condenada, nos presentes autos de processo comum colectivo n.º 33/09.lPEFIG, por acórdão transitado em julgado em 4 de Janeiro de 2011, como co-autora material de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 2l.º/nº 1 D.L. n.º 15/93, de 22/1, na pena de 4 anos de prisão, sendo todavia a respectiva execução suspensa por igual período temporal, mediante a implementação de um complementar regime de prova.
Veio depois a referida arguida a ser condenada, e além do mais (por acórdão também já transitado em julgado, proferido nos autos de processo comum colectivo n.º 45/l2.8PEFIG, igualmente desta Instância Central Criminal - Juiz 4 - da Comarca de Coimbra), como co-autora material de outro crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 21°/n.º 1 D.L. n.º 15/93, na pena de 6 anos de prisão - pena essa que, aliás, se encontra actualmente a cumprir -, por factos ocorridos entre, pelo menos, Outubro de 2012 e 19 de Junho de 2013 (cfr. certidão de fls. 993 a 1097 e certificado do registo criminal de fls. 1101 e 1108, tudo dos presentes autos), ou seja, durante o período de suspensão da execução da pena de prisão determinada no processo em que nos encontramos ora.
Concedida à arguida - actualmente presa, como dissemos, no cumprimento da pena de prisão efectiva em que foi condenada no há pouco aludido processo comum colectivo n.º 45/12.8PEFIG - a possibilidade de se pronunciar sobre a eventual revogação da mencionada suspensão de execução da pena de prisão que lhe foi definida nos presentes autos, a mesma nada disse.
O Ministério Público defendeu a revogação da apontada suspensão da execução, afirmando, e no essencial, denotar a arguida uma evidente dificuldade em orientar a sua vida de acordo com os valores mais básicos do Direito, como o atesta a condenação em pena de prisão efectiva por si entretanto experimentada.
Bom, vejamos o que decidir.
Segundo o art. 56°/n.º 1 do Código Penal (C.P.), «a suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado: a) infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano individual de readaptação social; ou b) cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas».
De todos é sabido que a teleologia própria das denominadas penas de substituição, maxime das que substituem penas de prisão de curta duração, reveste uma inegável, embora não exclusiva, "colagem" à consecução dos objectivos de prevenção especial, intimamente conexionados a uma política criminal de reintegração do condenado na sociedade; isto, a par da necessidade de protecção de bens jurídicos (art. 400/n.º 1 C.P.; a propósito, cfr. Prof. Anabela Miranda Rodrigues, "Critérios de escolha das penas de substituição no Código Penal Português", separata do número especial do Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, "Estudos em Homenagem ao Professor Eduardo Correia", Coimbra, 1988, págs. 22 e 23, e 31 e ss.).
Mais concretamente, impõe o art. 50.° C.P. a análise judicativa da especificidade de cada hipótese por forma a poder concluir-se (ou não) por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do agente, isto é, por forma a entender-se (ou não) que a «(...) censura do facto e a ameaça da pena - acompanhadas ou não da imposição de deveres e (ou) regras de conduta (...) "bastarão para afastar o delinquente da criminalidade" (...)». E «para a formulação de um tal juízo - ao qual não pode bastar nunca a consideração ou só da personalidade, ou só das circunstâncias do facto -, o Tribunal atenderá especialmente às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto». Mas a lei toma também claro que, «(...) na formulação do aludido prognóstico, o Tribunal reporta-se ao momento da decisão, não ao momento da prática do facto» (Prof. Jorge de Figueiredo Dias, "Direito Penal Português. As consequências jurídicas do crime", Lisboa, 1993, pág. 343; no mesmo sentido, vide ainda Ac. Rel. Guimarães de 10/5/2010, in www.dgsi.pt).
Ora, a possibilidade de revogação da suspensão da execução da pena de prisão situa-se a jusante daquilo que acabamos de expor, devendo as causas da revogação serem entendidas «(...) como demonstrativas das falhas do condenado no decurso do período da suspensão. O arguido deve ter demonstrado, com o seu comportamento, que não se cumpriram as expectativas que motivaram a concessão da suspensão» (Drs. Manuel Leal-Henriques e Manuel Simas Santos, "Código Penal Anotado", volume I, 3a edição, Lisboa, 2002, pág. 711), e que foram, como vimos, determinantes para essa mesma decisão suspensiva.
No tocante à hipótese expressa na alínea b) do n.º 1 do art. 56° C.P.; impõe-se dizer, de modo mais pormenorizado, que a existência, pura e simples, de uma condenação criminal por ilícito praticado no período da suspensão de execução não leva, ipso facto, à revogação de tal suspensão, pois que será necessário algo mais, isto é, que se perceba denunciar aquela condenação a ideia - sustentada e sustentável - de «( ... ) que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas» [citada alínea b) do n." 1 do art. 56°]. Pede-se, portanto, do julgador a formulação de um juízo acerca do todo factual que enformou o decurso do período de suspensão de execução, certamente em uma ponderação do conjunto de elementos disponíveis quanto à postura global - judicial e não judicial - do condenado. Retomando uma ideia que há pouco deixámos sugerida, quase que poderíamos dizer ser exigível, nesta fase - conatural ao decurso do período da suspensão -, a formação do inverso de um juízo de prognose póstumo acerca daquilo que significou para o arguido a suspensão da execução da pena e as suas cambiantes. Como que se exigirá, pois, um juízo semelhante, embora pelo prisma inverso, àquele que esteve na base da concessão da suspensão.
E o que nos revela o caso dos presentes autos?
Desde logo, a condenação da arguida pela prática, em plena fase de suspensão da execução aqui decidida, de um crime doloso de inequívoca gravidade e do mesmo cariz daquele por que foi sancionada nos presentes autos, a saber, de um crime de tráfico de estupefacientes, encontrando-se, pois, a cumprir uma pena de prisão de 6 anos.
 A propósito da fisionomia fáctica do delito acabado de referir, não poderemos deixar de notar uma óbvia tendência, por banda da arguida, em não se manter afastada de crimes que envolvem um perigoso desrespeito por valores básicos da subsistência comunitária, na feição da eminente dimensão da saúde pública.
Mas, se analisarmos mais atentamente o certificado do registo criminal da arguida, perceberemos que a condenação acabada de referir, no processo comum colectivo n.º 45/l2.8PEFIG, é apenas uma entre as cinco (!!!) que ocorreram por factos praticados pela mesma arguida no período da suspensão da execução aqui determinada, pois que temos igualmente as seguintes condenações, por ordem cronológica da ocorrência dos factos ilícitos:
- pela perpetração, em 4 de Fevereiro de 2011, de um crime de furto simples, p. e p. no art. 203°/n.º 1 C.P. (processo sumaríssimo n.º l22/l1.2PBFIG, do então 2° Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz);
- pela prática, em 12 de Abril de 2011, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. no art. 25°-a) D.L. n.º 15/93 (processo comum singular n.º l27/l1.3JALRA, do então 3° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria);
- pela perpetração, em 20 de Junho de 2011, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. no art. 86°/n.º l-d), por referência aos arts. 2°/n.º 3-g) e 3°/n.ºs 2-a) e 4, todos da Lei n.º 5/2006, de 23/2 (processo comum singular n.º l272/l1.0TAFIG, do então l° Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz);
- pelo cometimento, em 25 de Setembro de 2011, de dois crimes de furto simples, p. e p. no art. 203°/n.º 1 C.P. (processo comum singular n.º 934/l1.7PBFIG, do então 1° Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz);
- e pela prática, em 10 e 29 de Outubro de 2011, de dois crimes de furto qualificado, p. e p. nos termos das disposições conjugadas dos arts. 203°/n.º 1 e 204°/n.º l-b) C.P. (processo abreviado n.º 6432/l1.lP8LSB, da então 2a Secção do 2° Juízo da Pequena Instância Criminal de Lisboa) (cfr., com mais detalhe, o certificado do registo criminal de fls. 1101 a 1108).
Pelo que, perante todo o quadro inerente à prática dos factos ilícitos pela arguida, cremos ser de supor que, efectivamente, as finalidades que estiveram na base da suspensão da execução nos presentes autos não puderam, por meio desta (suspensão), ser alcançadas, já que, como vimos, escassíssimos meses após a condenação aqui ocorrida veio ela a praticar diversos crimes, restando depois condenada em pena de prisão efectiva. Ou seja, a suspensão da execução da pena decidida nos presentes autos não a impediu de voltar a delinquir, pondo em causa todo o processo de reintegração social que se esperava que a arguida (desde logo, diga-se, no seu próprio interesse) pretendesse efectivamente protagonizar.
E se, por um lado, as informações que vinham sendo recolhidas nestes autos, quanto à postura prisional actual da arguida, não eram totalmente negativas, também não nos parece, de facto, por outro lado, e como bem realça o Ministério Público, que possam pôr de lado o panorama de uma vida de criminalidade que a mesma arguida, no decurso da suspensão do presente processo, foi desenvolvendo em distintos e sucessivos momentos
 Pensar de modo diverso do que acabamos de frisar equivalerá, ao cabo e ao resto, a uma tentativa de deturpação da realidade jurídico-penal que foi sendo construída pela arguida.
Em suma, é de concluir que a arguida não interiorizou a plena relevância, quer da sua situação penal, quer da necessidade de passar a pautar a vida de acordo com os ditames básicos do dever-ser jurídico-penal, defraudando, assim, a esperança então depositada pelo Tribunal na respectiva recuperação ao suspender, nos presentes autos, a execução da pena de prisão.
Pelo exposto, declara-se revogada a suspensão da execução da pena de prisão em que a arguida A... foi condenada nos autos em que nos encontramos, devendo a mesma, em consequência, cumprir os 4 anos de prisão a si aqui aplicados.
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Deste despacho foi notificada a arguida através da defensora oficiosa (fls. 129) e pessoalmente (fls. 135), com o qual não se conformou e interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões:
« 1. Antes de ter procedido à revogação da pena de prisão suspensa na sua execução sujeita a regime de prova, deveria o tribunal ter ouvido presencialmente a arguida/condenada nos termos e para os efeitos dos artigos, 492.°, n.º 2, 495.º, n.º 1 e 2 ex vi artigo 498.º, n.º 3 do CP, cometendo assim a nulidade prevista no artigo 119.º, al. c) do CPP, conforme se motivou e para aí integralmente se remete.
2. O n.º 2 do artigo 495.°, do CPP, (se viável e sem culpa do condenado), exige que a audição do arguido pelo tribunal, seja presencial pois decorre inequivocamente dos princípios gerais do processo penal, designadamente os que têm consagração constitucional, com destaque para os consignados no artigo 32.º, n.ºs 1 e 5, da CRP, segundo o qual o processo criminal assegura todas as garantidas de defesa e o contraditório.
3. Interpretar-se normativamente tal dispositivo, no sentido, que se basta pela notificação à arguida para se pronunciar, querendo, sobre a aludida pretensão, sem necessidade de a ouvir na presença do técnico que acompanha o regime de prova é inconstitucional.
Termos em que se requer a V. Exas., a procedência do recurso, e a revogação do despacho recorrido, devendo o tribunal a quo ouvir a condenada sobre o incumprimento do Trabalho a Favor da Comunidade, ou, realizar as diligências indispensáveis tendentes ao cumprimento pela condenada da pena de substituição que lhe foi aplicada, assim se fazendo a Sã e Costumada Justiça!».
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Notificado o Ministério Público nos termos do art. 413.º, n.º 1, do CPP, sustenta que à arguida foi assegurado o contraditório, tendo sido notificada com cópias do despacho e promoção que anunciavam a probabilidade de revogação da suspensão da execução da pena, a qual foi revogada ao abrigo do art. 56.º, n.º 1, al. b), do CPP, sem que tenha havido a nulidade a alegada do art. 119.º, al. c), do CPP, uma vez que a situação em concreto não obriga à audição presencial da arguida, pelo que, em seu entender deve ser negado provimento ao recurso.
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Nesta instância, os autos tiveram vista da Ex.mo Senhor Procurador-geral Adjunto, para os feitos do art. 416.º, n.º 1, do CPP, o qual emitiu douto parecer acompanhando de perto as contra-alegações do MP na 1.ª instância, no sentido da improcedência do recurso
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Notificada a arguida, nos termos do art. 417.º, n.º 2, do CPP não respondeu.
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Foi cumprido o art. 418.º, do CPP, e uma vez colhidos os vistos legais, indo os autos à conferência, cumpre decidir.
II- O Direito
As conclusões formuladas pelo recorrente delimitam o âmbito do recurso.
São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, as quais deve conhecer e decidir sempre que os autos reúnam os elementos necessários para tal.

Questão a decidir:
Apreciar se a arguida, condenada em 4 anos de prisão, por crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22/1, suspensa na sua execução, sujeita a regime de prova e se durante o período de suspensão vier a praticar o mesmo tipo legal de crime, pelo qual foi condenada em 6 anos de prisão, que fundamentou a revogação da pena suspensa, ao abrigo do art. 56.º, n.º 1, al. b), do CP, deveria ser ouvida presencialmente, na companhia do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições de suspensão.

Apreciando:
Como se constata dos autos a arguida A... foi condenada, no processo comum colectivo n.º 33/09.1PEFIG, por acórdão transitado em julgado em 4 de Janeiro de 2011, como co-autora material de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 2l.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, de 22/1, na pena de 4 anos de prisão, suspensa na sua execução, por igual período, mediante a implementação de um complementar regime de prova.
Posteriormente a arguida foi novamente condenada, por acórdão transitado em julgado, proferido nos autos de processo comum colectivo n.º 45/l2.8PEFIG, também da Instância Central Criminal - Juiz 4 - da Comarca de Coimbra, como co-autora material de outro crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, na pena de 6 anos de prisão, pena esta que se encontra actualmente a cumprir, por factos ocorridos entre, pelo menos, Outubro de 2012 e 19 de Junho de 2013 (cfr. certidão de fls. 993 a 1097 e certificado do registo criminal de fls. 1101 e 1108, dos autos), ou seja, durante o período de suspensão da execução da pena de prisão determinada no processo comum colectivo n.º 33/09.1PEFIG.
Como decorre ainda do certificado do registo criminal junto aos autos, a arguida foi ainda condenada por factos praticados no período da suspensão da execução da pena aplicada no processo comum colectivo n.º 33/09.1PEFIG nos seguintes processos:
1. Pela prática, em 4 de Fevereiro de 2011, de um crime de furto simples, p. e p. no art. 203°/n.º 1 C.P. (processo sumaríssimo n.º l22/l1.2PBFIG, do então 2° Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz);
2. Pela prática, em 12 de Abril de 2011, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. no art. 25°-a) D.L. n.º 15/93 (processo comum singular n.º l27/l1.3JALRA, do então 3° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria);
3. Pela prática, em 20 de Junho de 2011, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. no art. 86°/n.º l-d), por referência aos arts. 2°/n.º 3-g) e 3°/n.ºs 2-a) e 4, todos da Lei n.º 5/2006, de 23/2 (processo comum singular n.º l272/l1.0TAFIG, do então l° Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz);
4. Pela prática, em 25 de Setembro de 2011, de dois crimes de furto simples, p. e p. no art. 203°/n.º 1 C.P. (processo comum singular n.º 934/l1.7PBFIG, do então 1° Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz);
5. Pela prática, em 10 e 29 de Outubro de 2011, de dois crimes de furto qualificado, p. e p. nos termos das disposições conjugadas dos arts. 203°/n.º 1 e 204°/n.º l-b) C.P. (processo abreviado n.º 6432/l1.lP8LSB, da então 2a Secção do 2° Juízo da Pequena Instância Criminal de Lisboa) (cfr., com mais detalhe, o certificado do registo criminal de fls. 1101 a 1108).
Foi com base nas diversas condenações sofridas pela arguida, por factos ocorridos no período da suspensão da execução da pena aplicada no processo comum colectivo n.º 33/09.1PEFIG e essencialmente pela condenação no processo comum colectivo n.º 45/l2.8PEFIG, como co-autora material de outro crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, na pena de 6 anos de prisão, pena esta que se encontra actualmente a cumprir, que a suspensão da execução da pena foi revogada.
Constatada esta condenação, a arguida foi notificada para se pronunciar sobre a eventual revogação da suspensão de execução da pena de prisão, pessoalmente no EP de Tires, conforme fls. 121 a 123 e através do seu defensor (fls. 120) e a mesma nada disse.
Pretende agora a arguida a nulidade da decisão recorrida, por entender que previamente à revogação aludida deveria ser ouvida presencialmente, na companhia do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições de suspensão.
Não lhe assiste razão.
Vejamos o que diz sobre a revogação da suspensão o art. 56.º, do CP:
«1 - A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado:
 a) Infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social; ou
 b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.
 2 - A revogação determina o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença, sem que o condenado possa exigir a restituição de prestações que haja efectuado». 
A arguida confunde a revogação que emerge da falta de cumprimento das condições da suspensão ou do plano de reinserção social, com a revogação em consequência da prática de crimes durante o período da suspensão da execução da pena.
Ambas as situações estão previstas no n.º 1, daquele artigo, a primeira situação na al. a) e a segunda na al. b).
Em ambas as situações é obrigatório cumprir o contraditório, antes da revogação da suspensão da execução da pena.
Porém, são regimes bem diferentes, relativamente à obrigação de ouvir ou não presencialmente o arguido, na companhia do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições de suspensão.
Conforme dispõe o art. 492.º, n.ºs 1 e 2, do CPP, o despacho de revogação da suspensão é precedido da audição do condenado e ainda dos serviços de reinserção social “no caso de a suspensão ter sido acompanhada de regime de prova”, quando esteja em causa a modificação dos deveres, regras de conduta e outras obrigações impostas.
No mesmo sentido apontam os art. 55.º e 495.º, do CPP, cuja aplicação pressupõem, como decorre das próprias epígrafes, da falta de incumprimento das condições de suspensão.
A arguida tinha a pena de 4 anos de prisão, suspensa na sua execução, mediante a implementação de um complementar regime de prova no processo comum colectivo n.º 33/09.1PEFIG.
E a revogação da suspensão da execução da pena não tem directamente a ver com a violação concreta do plano de reinserção social, isto é, não teve como fundamento o incumprimento das obrigações e deveres impostos no regime de prova.
E sendo os serviços de reinserção social uma entidade fundamental para a boa execução do plano de reinserção social, para o qual se pretende a colaboração do arguido, esta é a justificação para este ser ouvido na presença do técnico que o acompanha, sem o que não se pode concluir se infringiu grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social, como se exige no art. 56.º, n.º 1, al. a), do CP.
Questão diferente é a dos autos, cuja revogação da suspensão da execução da pena teve como fundamento o facto da arguida ter cometido outros crimes durante o período de suspensão, pelos quais veio a ser condenada. 
E nesta perspectiva, a lei aponta um regime mais simples como não podia deixar de ser, importando apreciar para que se imponha a revogação, se a prática de crime ou crimes pelos quais veio o arguido a ser condenado revelarem que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas, nos termos do art. 56.º, n.º 1, al. b), do CP.
E nesta situação, a audição presencial da arguida, na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições de suspensão só tem que ser obrigatória quando a revogação tenha por fundamento o não cumprimento das condições ou violação das regras impostas no regime de prova, o que não é o caso, pois decorre do facto de ter praticado vários crimes, pelos quais foi condenada, designadamente por crimes de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, na pena de 6 anos de prisão.
E nestes termos o tribunal apenas tinha que notificar a arguida, sobre a promoção do Ministério Público, de revogação da suspensão da execução da pena.
O contraditório foi cumprido, tendo sido notificada pessoalmente a arguida e o seu defensor, para se pronunciarem, sobre a eventual revogação da mencionada suspensão de execução da pena de prisão que lhe foi definida nos autos e apesar de notificada através do seu defensor (fls. 120) e pessoalmente no EP de Tires, conforme fls. 121 a 123, a mesma nada disse.
Se não se defendeu foi porque não quis.
Nesta conformidade indefere-se a nulidade arguida, prevista no artigo 119.º, al. c) do CPP, por a arguida não ter sido ouvida na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão.
Embora não nos cumpra apreciar especificamente no segmento do recurso as razões da revogação da suspensão sempre diremos que a arguida não só não ignorou a sua defesa, como não podia ter pior comportamento durante o período de suspensão da execução da pena de 4 anos de prisão em que havia sido condenada nestes autos.
Pior é difícil acontecer.
A arguida A... , foi condenada no processo comum colectivo n.º 33/09.1PEFIG, por acórdão transitado em julgado em 4 de Janeiro de 2011, por crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 2l.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, de 22/1, na pena de 4 anos de prisão, suspensa na sua execução, por igual período, mediante regime de prova.
A pena, esta suspensa até 4 de Janeiro de 2015
Durante o período de suspensão foi novamente condenada, por acórdão transitado em julgado, proferido nos autos de processo comum colectivo n.º 45/l2.8PEFIG, pelo mesmo crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, na pena de 6 anos de prisão, por factos ocorridos entre, pelo menos, Outubro de 2012 e 19 de Junho de 2013.
Para além desta sofreu ainda as seguintes condenações, durante o período de suspensão:
1. Por um crime de furto simples, praticado em 4 de Fevereiro de 2011
2. Por um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, praticado em 12 de Abril de 2011.
3. Por um crime de detenção de arma proibida, praticado em 20 de Junho de 2011.
4. Por dois crimes de furto simples, praticados em 25 de Setembro de 2011.
5. Por dois crimes de furto qualificado, praticados em 10 e 29 de Outubro de 2011.
A arguida ignorou em absoluto a suspensão da execução da pena, com a prática de oito crimes, nos primeiros 2 anos e 5 meses do período de suspensão, entre os quais um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade e um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, pelo qual acabou de ser condenado na pena de 6 anos de prisão.
A continuação reiterada da actividade criminosa, por crimes de diversa natureza e designadamente por crime grave de tráfico de estupefacientes na pena de 6 anos de prisão, revelam inquestionavelmente que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas, nos termos do art. 56.º, n.º 1, al. b), do CP.
A arguida foi condenada em pena de prisão efectiva, o que denota que as perspectiva que estavam na origem da motivação da suspensão foram goradas e que as finalidades de a arguida manter uma boa conduta, não praticando crimes, como pressuposto de qualquer tipo de suspensão não foram alcançadas.
Conforme escreve Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código Penal, 3.ª Ed., UCE, pág. 317:
“Só a condenação em pena de prisão efectiva pode revelar que as finalidades que estiveram na base de uma decisão prévia de suspensão não puderam ser alcançadas, pois a condenação em pena de multa ou em pena de substituição supõe um juízo de prognose ainda favorável ao agente pelo tribunal da segunda condenação”.
Em conclusão: A condenação da arguida por crime de tráfico de estupefacientes p. e p. no art. 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, na pena de 6 anos de prisão, revela que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas, nos termos do art. 56.º, n.º 1, al. b), do CP, não sendo obrigatória a audição pessoal da arguida na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão, por não estra em causa o seu incumprimento, julgando-se assim improcedente a nulidade arguida, prevista no artigo 119.º, al. c) do CPP, por não ser aplicável em concreto o regime previsto nos art. 56.º, al. a), 492.º e 495.º, n.º 1 e 2, do mesmo diploma legal.
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III – Decisão:
Pelos fundamentos expostos, acordam os juízes da 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra, em negar provimento ao recurso interposto pela arguida A... , e, consequentemente se confirma a decisão recorrida que revogou a suspensão da execução da pena.
Custas pela arguida, cuja taxa de justiça se fixa em 3UCS (art.513.º, n.ºs 1 e 3, do CPP e art.8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa).

Coimbra, 21 de Junho de 2017
(Inácio Monteiro - Relator)
(Alice Santos - Adjunta)