Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3276/16.8T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: CONTRATO DE SWAP
TAXAS DE JURO
NULIDADE
Data do Acordão: 04/24/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso:
TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - LEIRIA - JC CÍVEL - JUIZ 4
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.280, 281, 1245 CC, 2 Nº1 E) CVM
Sumário:
O contrato de swap de taxas de juro, quer seja reportado a um ativo subjacente – vg. mútuo -, ou apenas a um valor nominal/nocional, está legalmente previsto, pelo que, livre e conscientemente celebrado, não pode, salvo porventura casos excepcionais de puro, excessivo e intolerável espírito especulativo, ser equiparado ao jogo e aposta ou tido como violador de princípios de ordem pública.
Decisão Texto Integral:
34

Processo nº 3276/16.8T8LRA


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA


1.
M (…), S.A., intentou contra BANCO (…), S.A. ação declarativa, de condenação, sob a forma de processo comum.

Pediu:
a) Seja declarada a nulidade do contrato nos termos dos artigos 280º, 281º e 1245º do Código Civil e por contrário à ordem pública.
b) Seja a ré condenada a pagar à autora todas as quantias pagas, no montante global de € 98.999,06 (noventa e oito mil e novecentos e noventa e nove euros e seis cêntimos).
c) Subsidiariamente, caso não tenha provimento o pedido de nulidade do contrato, seja a ré condenada a pagar à autora a quantia global de €98.999,06 (noventa e oito mil e novecentos e noventa e nove euros e seis cêntimos) a título de indemnização por danos causados, emergentes do cumprimento defeituoso dos seus deveres de informação na celebração do contrato de permuta de taxa de juro.
d) Seja a ré condenada a pagar à autora os juros de mora vincendos à taxa legal a contar da data da citação, contados sobre a quantia reclamada, até efetivo e integral pagamento.

Para tanto, e em síntese, alegou:
- É uma sociedade que se dedica à produção, comercialização, importação, exportações de frutas e produtos hortícolas, valorização das mesmas adquiridas aos seus acionistas e nos mercados nacional e internacional, através da concentração, embalagem, transformação e sua comercialização, preparação e conservação de frutos e de produtos hortícolas por outros processos.
- A ré é uma instituição de crédito, registada no Banco de Portugal.
- No âmbito da sua atividade a ré propôs à autora a celebração de um contrato de permuta de taxa de juro, denominado de “swap”, sendo que, para efeito, o gerente do balcão do BCP sito no … apresentou ao Sr. J (…), administrador da autora, um “alto quadro da ré”, que se deslocou à agência do banco para o efeito, e fez a apresentação de um contrato swap, apresentando esse produto como um investimento seguro e que seria uma boa oportunidade de investimento.
- O representante da ré não fez qualquer advertência sobre os riscos inerentes a este tipo de contrato e, como «corolário deste trabalho comercial, assente em escassa informação e apresentando apenas cenários “idílicos”, sem advertência de qualquer risco inerente, foi proposto a assinatura do contrato de “swap”, o que efetivamente veio a acontecer no dia 17 de outubro de 2011».
- No contrato assinado, não havia qualquer referência a valores de capital, a prazos de início e de termo do contrato e a taxas de juro, ou seja, não havia qualquer informação sobre as condições económicas do contrato.
- A autora recebeu uma carta da ré com os termos e condições do Swap de Taxa de Juro, datada de dia 18 de outubro de 2011, fazendo ainda referência que “constituindo este o “Documento de Confirmação” definido no “Contrato de swap de Taxa de Juro” que a M (…), S.A., se compromete a assinar oportunamente”; no entanto, essa informação apenas foi enviada à autora já depois de ter assinado o contrato de swap.
- Nesse documento, estabelece-se o valor da taxa de juro a pagar pela ré e o valor da taxa de juro a pagar pela autora, o montante nominal e prazo de vigência, sendo que este valor não corresponde a qualquer valor mutuado ou financiado à autora, «mas é um simples valor de referência sobre o qual se especularia com as taxas de juro permutadas, ou seja, o contrato de swap celebrado entre as partes não tem como fim conferir alguma segurança a um mútuo realizado pela autora, mas foi pura especulação sobre a variação de taxas de juro, considerando um montante de capital meramente hipotético e determinado para o efeito.»
- «Apesar de a autora ainda não ter compreendido inteiramente a “mecânica” deste contrato, ficou na expectativa sem tomar uma posição». No decorrer do primeiro ano de vigência do contrato, os prejuízos para a autora somavam cerca de €20.0000, pelo que se reuniu com o gerente do seu balcão a solicitar o cancelamento do contrato. As reuniões sucederam-se, até porque o próprio gerente de balcão revelou pouco conhecimento das responsabilidades decorrentes para as partes no contrato e não conseguia dar uma resposta assertiva e, em meados de maio de 2013, um funcionário do banco que veio expressamente de Lisboa, prestou a informação à autora de que a rescisão, naquela data, custaria à empresa cerca de €50.000,00, o que não foi aceite.
- Mantendo o contrato até à data da instauração da ação, a autora teve um prejuízo no montante de €98.999,06.

Contestou a ré.
Disse, sinóticamente:
Ser falso que o produto em causa tenha sido apresentado como sendo “um investimento seguro”, pois o mesmo tem sempre subjacente «alguns riscos», como a autora bem sabia, sendo que todos esses riscos e características do contrato de swap de taxa de juro «foram sobejamente explicados à autora, na pessoa do seu administrador, Senhor (…)».
Em momento algum, foi negado qualquer esclarecimento ou informação sobre os procedimento do produto em causa, nem foi exercida qualquer pressão por parte da ré no sentido de a autora o contratar, sendo que esta pretendeu, com a contratação do produto em questão, uma cobertura de taxa de juro para o envolvimento creditício por ela detido por perante a banca, ou seja, a autora desejava precaver-se de uma eventual subida das taxas de juro, considerando as «elevadas responsabilidades» que tinha para com o sistema bancário.
Através da contratação do swap da taxa de juro, a autora pretendia indexar a taxa fixa à Euribor, a 1 mês, sendo então expectável o crescimento da Euribor, a 1 mês, permitindo àquela ter rendimento proveniente da diferença entre os juros que pagava ao réu e os juros que receberia deste. «Porém, estalou a crise e a Euribor desceu drasticamente, sem que tal fosse previsível».
A autora teve tempo suficiente para ponderar e decidir pela contratação do contrato de Swap da taxa de juros, nos moldes que melhor especificou.
A atuação da autora consubstancia um abuso de direito, na modalidade de venire contra factum próprio, nos termos do disposto no artigo 334º do Código Civil.
Cumpriu «rigorosa e diligentemente todos os deveres a que se encontra vinculado, tanto na qualidade de entidade emitente, como na de intermediário financeiro», quer na vertente do disposto no CMV, quer na ótica da legislação atinente às Cláusulas Contratuais Gerais .
Pediu:
A improcedência da ação, e a sua absolvição do pedido.

2.
Prosseguiu o processo os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido:
«Por todo o exposto e ao abrigo das disposições legais citadas, julga-se a presente ação totalmente improcedente, absolvendo-se a ré de todos os pedidos deduzidos pela autora.»

3.
Inconformada recorreu a autora.
Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:
(…)
Contra alegou a recorrida, pugnando pela manutenção do decidido com os seguintes argumentos finais:
(…)
4.
Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, a questão essencial decidenda é a seguinte:

Nulidade do contrato por aplicação dos artºs 1245º e 281º do CC.

5.
Os factos dados como provados e que importa considerar, são os seguintes:
1. A ré é uma instituição de crédito, registada no Banco de Portugal, e, no âmbito da sua atividade, propôs à autora a celebração de um contrato de permuta de taxa de juro, denominado de “Swap”.
2. Para o efeito, o gerente do balcão do BCP sito no ..., apresentou a (…), administrador da autora, um funcionário da direção de vendas de produtos de tesouraria da ré, que aí se deslocou com vista a explicar tal produto àquele.
3. Em 27 de outubro de 2011, foi assinado, pelos representantes de autora e ré, o pelas partes denominado contrato de swap de taxas de juro que consta do documento de fls.12 a 19 do processo físico (que aqui se dá por integralmente reproduzido).
4. No contrato assinado, não havia qualquer referência a valores de capital, a prazos de início e de termo do contrato e a taxas de juro, aí se remetendo para o respetivo anexo.
5. Em momento anterior ao da assinatura do referido contrato, a autora recebeu uma carta da ré com os termos e condições do swap de taxa de juro, datado de dia 18 de outubro de 2011, fazendo ainda referência que “constituindo este o “Documento de Confirmação” definido no “Contrato de Swap de Taxa de Juro” que a …., se compromete a assinar oportunamente”, assinatura essa que veio a ser aposta em 27 de outubro de 2011.
6. Nesse documento, estabelece-se o valor da taxa de juro a pagar pela ré e o valor da taxa de juro a pagar pela autora, o montante nominal e prazo de vigência.
7. O montante nominal aí previsto não corresponde a qualquer valor mutuado ou financiado à autora, pela ré, interligado diretamente com o contrato de swap, mas é um simples valor de referência, escolhido pela autora, sobre o qual seriam calculadas as taxas de juro permutadas.
8. O contrato referido em 3. tem alguns riscos, como a autora bem sabia, pois tais riscos e características do contrato de swap de taxa de juro foram-lhe explicados, na pessoa do seu administrador, (…).
9. Com o mesmo contrato, a autora pretendeu uma cobertura de taxa de juro para a generalidade do envolvimento creditício detido por aquela perante a banca, ou seja, a autora desejava precaver-se de uma eventual subida das taxas de juro, considerando as responsabilidades que tinha para com o sistema bancário.
10. Através da contratação do swap da taxa de juro, foi visado indexar a taxa fixa à Euribor a 1 mês.
11. Um dos cenários então possíveis era o do crescimento da Euribor a 1 mês, permitindo à autora ter rendimento proveniente da diferença entre os juros que pagava à ré e os juros que receberia desta.
12. Na decorrência de uma situação de crise que então se instalou, a Euribor desceu drasticamente.
13. A 19 de outubro de 2011, a ré enviou à autora um fax, confirmando a contratação do swap e respetivas características.
14. Neste tipo de operação, este é, normalmente, o primeiro documento a ser assinado pelas partes.
15. E, no caso em apreço, foi o que aconteceu, tendo o fax referido sido o primeiro documento assinado por autora e ré.
16. Sem a assinatura deste documento não é possível assegurar a contratação da taxa de juro junto da Sala de Mercado de Derivados da ré.
17. Através da assinatura do referido fax, que continha as condições do contrato de swap, a autora confirmou a aceitação das mesmas.
18. Apesar de as Condições Gerais do contrato de swap estarem datadas, na primeira página, de 17 de outubro de 2011, as mesmas só foram assinadas, por autora e ré, mais tarde, concretamente, a 27 de outubro de 2011.
19. O mesmo aconteceu com o Documento de Confirmação do swap de taxa de juro, do qual constavam as datas de início e termo do contrato e respetivas taxas fixa e flutuante – apesar de estar datado, na primeira página, de 18 de outubro de 2011, só foi efetivamente assinado, também, a 27 de outubro de 2011.
20. A autora bem sabia das características e riscos inerentes ao contrato de swap, tendo-lhe sido explicados os cenários então possíveis e tendo tido oportunidade de colocar as suas dúvidas, na reunião referida em 2.
21. O administrador da autora, (…), o mesmo que assinou o contrato em representação daquela, desde data não apurada que detinha junto da ré um outro contrato de swap de taxa de juro, cujos concretos termos não foram aqui apurados.
22. No decorrer do primeiro ano de vigência do contrato, os prejuízos para a autora somavam cerca de €20.0000, pelo que esta se reuniu com o gerente do seu balcão a solicitar o cancelamento do contrato.
23. As reuniões sucederam-se e, em data não apurada, um funcionário da instituição bancária aqui ré, que se deslocara de … ao ..., prestou a informação à autora de que a rescisão, naquela data, custaria à empresa cerca de €50.000,00.
24. A autora, perante essa informação, desistiu de pedir a resolução do contrato, que manteve até ao final, havendo despendido, no âmbito do mesmo, o pagamento do montante global de €98.999,06.

6.
Apreciando.
6.1.
A julgadora decidiu esta pretensão da autora, aduzindo o seguinte discurso argumentativo:
«foi celebrado, entre a autora sociedade e a sociedade ré, um contrato de swap de taxas de juro – espécie de contrato em relação à qual é também usada a expressão permuta de taxa de juro e o inglês interest rate swap ou IRS.
Como ensina a Senhora Juíza Desembargadora Dra. Higina Orvalho Castelo, in “O Contrato de Swap de Taxa de Juro Cinco Anos na Jurisprudência Portuguesa”, Julgar Online, outubro de 2016, “O modelo contratual em causa é utilizado no comércio jurídico desde a década de 1980 (o swap de divisas tinha surgido na década precedente) (…)
Os swaps de taxas de juro – uma das categorias mais frequentes, a par dos swaps cambiais e dos swaps de divisas – «consistem na troca de juros de diferentes tipos relativos a um capital hipotético que nunca é trocado». Podem trocar-se taxas fixas por taxas variáveis, taxas variáveis calculadas por diferentes métodos ou índices, e taxas denominadas numa divisa.
Como todos os swaps, são contratos «entre duas partes que acordam na troca, ao longo do tempo e segundo regras predeterminadas, de uma série de pagamentos correspondentes a um valor hipotético de capital, entre elas acordado». Geralmente, e citando ainda o Regulamento, «os pagamentos ocorrem em numerário no correspondente à diferença entre as duas taxas de juro estipuladas no contrato e que se aplicam ao capital hipotético que foi acordado».”
Dispõe o artigo 1245º que “O jogo e a aposta não são contratos válidos nem constituem fonte de obrigações civil; porém, quando lícitos, são fonte de obrigações naturais, exceto se neles concorrer qualquer outro motivo de nulidade ou anulabilidade, nos termos gerais do direito, ou se houver fraude do credor na sua execução”.
Por seu turno, os dois outros normativos chamados à colação pela autora – isto é, os artigos 280º e 281º do Código Civil -, disciplinam, respetivamente, os requisitos do objeto negocial e o fim contrário à lei ou à ordem pública ou ofensivo dos bons costumes.
Preceitua o primeiro deles:
“1. É nulo o negócio jurídico cujo objeto seja física ou legalmente impossível, contrário à lei ou indeterminável.
2. É nulo o negócio contrário à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes.”
“Se apenas o fim do negócio jurídico for contrário à lei ou à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes, o negócio só é nulo quando o fim for comum a ambas as partes”, estabelece o segundo daqueles artigos.
Acerca da questão da legalidade de contrato de swap de juros nos moldes daquele que está em apreço nesta acção…passa-se a citar o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.05.2016, proferido no processo 27/14.5TVPRT.P1.S1 (disponível no respetivo site da dgsi):
«Em causa está um denominado contrato de swap, que é um derivado financeiro, isto é, um instrumento financeiro cujo valor deriva de outros valores, os valores de base e que, além dos swaps, abrange pelo menos as forward e os futuros. Pode, o swap, revestir várias modalidades, sendo as mais comuns o swap de taxa de juros, e o swap cambial. Nestes autos apenas está em análise o swap de taxa de juro, - na sua fórmula mais simples, conhecida por plain vanilla swap -, que é um contrato nominado, por referido no art.º 2º, n.º 1, al. e), do Código dos Valores Mobiliários, com a redação dada pelo Dec. – Lei n.º 357-A/2007, de 31/10, que, além do mais, no seu preâmbulo refere que, “relativamente ao elenco dos instrumentos financeiros, impõe-se clarificar os instrumentos financeiros que, além dos valores mobiliários, devem assim ser qualificados. Para este efeito, acolhe-se a lista constante da Diretiva (que o mesmo diploma transpôs para o direito interno, n.º 2004/39/CE do Parlamento e do Conselho, de 21/04/2004, a qual continha, na Secção C, alínea 4ª do Anexo I, a referência aos instrumentos financeiros em termos de regulação do mercado de capitais, neles incluindo os swaps), cuja principal novidade é a inclusão de instrumentos derivados sobre mercadorias e ativos de natureza nocional e, desta forma, a sujeição da prestação de serviços sobre estes a normas prudenciais e de conduta harmonizadas a nível comunitário”. Acresce que o swap se encontra definido pelo Regulamento (UE) n.º 549/2013 do Parlamento e do Conselho, de 21/05/2013, da forma seguinte:
“5.210 Definição: os swaps são acordos contratuais entre duas partes que acordam na troca, ao longo do tempo e segundo regras predeterminadas, de uma série de pagamentos correspondentes a um valor hipotético de capital, entre elas acordado. As categorias mais frequentes são os swaps de taxas de juro, os swaps cambiais e os swaps de divisas.
5.211 Os swaps de taxas de juro consistem na troca de juros de diferentes tipos relativos a um capital hipotético que nunca é trocado. Exemplos de taxas de juro que podem ser objeto de swaps: taxas fixas, taxas variáveis e taxas denominadas numa divisa. Geralmente os pagamentos ocorrem em numerário, no correspondente à diferença entre as duas taxas de juro estipuladas no contrato e que se aplicam ao capital hipotético que foi acordado.”
Por outro lado, nos swaps de taxa de juro o ativo usado normalmente é a taxa de juro Euribor (Euro Interbank Offered Rate) a três meses, como é aqui o caso.
Também na nossa jurisprudência já foi formulada uma definição caraterizando o contrato de swap de taxas de juro como o contrato pelo qual as partes acordam trocar entre si quantias pecuniárias expressas numa mesma moeda, representativas dos juros vencidos sobre um determinado capital hipotético, calculados por referência a determinadas taxas de juro (Acórdão deste S.T.J. de 10/10/2013 – relator Granja da Fonseca).
Assim, por este contrato as partes obrigam-se ao pagamento, uma à outra, de duas quantias pecuniárias no termo do período de contagem dos juros, embora o pagamento acabe por ser, em termos práticos, apenas um, - o do saldo credor resultante da compensação entre as duas quantias -, calculadas por aplicação de taxas de juro determinadas, que podem ser ambas fixas, ambas variáveis, ou uma fixa e outra variável, como é a hipótese dos autos, a um mesmo certo montante pecuniário que nunca chega a ser trocado: o capital hipotético, virtual ou nocional. Acordam as partes trocar o produto das taxas de juro previamente ordenadas, mediante prévio pagamento ao Banco de um preço pela operação e pelo risco que esta vai suportar.
No essencial da discordância da recorrente com o decidido no acórdão recorrido está o facto de, em seu entender, o contrato de swap em causa ter uma finalidade puramente especulativa, por na sua base inexistir, …qualquer operação financeira concreta cujo risco inerente à variação da taxa de juro vise cobrir, …
Ora, apesar de ser frequentemente apontada como causa ou função do contrato de swap a cobertura de risco, ou seja, a sua transferência para uma entidade bancária, ou a sua atenuação ou supressão, por forma a que, por regra geral, as empresas possam proteger-se contra variações desfavoráveis das taxas de juro sobre financiamentos que anteriormente lhes tenham sido concedidos e assim minorarem os prejuízos que daí lhes possam advir na hipótese de subida de tais taxas – é esta a hipótese normal, caso em que ocorre a situação denominada hedging, na qual, se as taxas de juro efetivamente subirem, a parte financiada recebe mais pelo contrato de swap do que aquilo que tem de pagar ao Banco pelo mesmo contrato, dessa forma conseguindo minorar o prejuízo resultante de ter de pagar mais, devido à subida das taxas de juro, na execução do contrato base -, certo é que também tem sido reconhecido que tal contrato pode ser utilizado com finalidades puramente especulativas sobre a taxa de juro, - a que, como veremos abaixo, nada obsta -, só para uma das partes ou para ambas, conforme só uma ou ambas visem através do swap realizar operações lucrativas com base na futura evolução das taxas de juro, sendo então o swap utilizado sem ligação a qualquer outro contrato (contrato subjacente), situação denominada trading. Neste caso, o swap tem natureza financeira, pois tem uma finalidade de financiamento por parte do cliente do Banco, sendo este que tem uma finalidade especulativa, e não é complemento de nenhum outro. E é nesta situação que se suscita a questão da eventual nulidade do contrato.
Só na primeira hipótese o contrato de swap da taxa de juro será válido, no entender do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nestes autos invocado pela recorrente como fundamento da admissibilidade da presente revista, datado de 29/01/2015, relatado por Bettencourt Faria mas com um voto de vencido; já na segunda hipótese, - que é a que se verifica na hipótese dos autos na medida em que no contrato não se especifica qualquer operação financeira cujo risco de variação da taxa de juro vise cobrir -, o contrato de swap também o será, como o entende o acórdão deste Supremo datado de 11/02/2015, relatado por Sebastião Povoas.
Ora, como neste último se sustenta, “As taxas de juro incidem sobre um capital virtual, hipotético (hoje comumente apodado de nocional, ou seja, meramente nominal), que não depende da concreta finalidade das partes, mas estando presente a natureza bilateral e sinalagmática do contrato de swap.” E acrescenta: “Na prática, um instrumento derivado pode ser utilizado sem ligação a um contrato nominado subjacente, uma vez que o próprio contrato de swap se basta a si próprio não sendo de considerar meramente especulativo apenas pelo facto de não ter por detrás outra figura contratual, já que pode tratar-se de um contrato de natureza financeira com a função de cobertura de riscos.”
E conclui, invocando ainda, entre outros, o defendido pelo Dr. Pedro Boullosa Gonzales, in “Interest Rate Swaps: Perspectiva Jurídica”, apud “Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários”, n.º 4, Abril – 2013, 23, segundo o qual tais figuras contratuais são autónomas e não necessariamente complementares a um contrato de mútuo ou outro tipo de financiamento, que os swaps de taxa de juro podem ter, ou não, um subjacente real, quer para ambos, quer para um dos outorgantes desse contrato (derivado) financeiro, sendo contratos comerciais, hoje nominados, de natureza obrigacional, onerosos e geradores, por si, de obrigações recíprocas.
Assim, face ao direito comunitário e ao acolhimento pelo legislador da lista de instrumentos financeiros constante da mencionada Diretiva, conjugando por outro lado os art.ºs 295º, n.º 1, e 289º, n.º 1, al. a), do Código dos Valores Mobiliários, com o art.º 4º, n.º 1, al. e), do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, - pelos quais se conclui que as instituições de crédito estão autorizadas à realização de transações, por conta própria ou da clientela, sobre instrumentos financeiros a prazo, podendo também negociar, por conta própria, os instrumentos financeiros previstos no Anexo I, Secção C, da DMIF (a citada Diretiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros, de 21 de Abril de 2004) - , e atendendo à primazia do direito comunitário sobre o direito nacional consagrada no art.º 8º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, é de entender que os swaps de taxas de juro com referência a um capital, quer real, quer hipotético ou nocional, que não têm o propósito direto de cobertura de risco, constituem instrumentos financeiros legais, não proibidos por lei, como o não são aqueles cujo valor nocional não corresponde a um passivo real. Caso contrário teria de se concluir também pela inadmissibilidade, por exemplo, da aquisição de títulos na esperança da subida dos respetivos preços para depois serem vendidos com lucro. Pelo que, sendo celebrados, como é o caso, com entidades financeiras autorizadas a exercer essa atividade nos termos dos diplomas acima indicados, se conclui pela sua validade.
Também, nas palavras do Prof. Calvão da Silva, in “Swap de taxa de juro: a sua legalidade e autonomia e inaplicabilidade da exceção do jogo e aposta”, apud R.L.J. n.º 3979, Abril – Maio 2013, 261, “nenhuma dúvida séria e consistente pode subsistir acerca da legalidade do swap da taxa de juro no direito português independentemente de o ativo subjacente ser real ou meramente nocional (nominal, fictício ou hipotético), dado o princípio comunitário da interpretação conforme a Diretiva das normas nacionais da correspondente transposição.”
Esta também não é afastada pelo regime legal do contrato de jogo e aposta, previsto no art.º 1245º do Cód. Civil, segundo o qual o jogo e a aposta não são contratos válidos nem constituem fonte de obrigações civis; porém, quando lícitos, são fonte de obrigações naturais, exceto se neles concorrer qualquer outro motivo de nulidade ou anulabilidade, nos termos gerais de direito, ou se houver fraude do credor na sua execução.
Com efeito, o contrato de swap não é subsumível a qualquer destas figuras, pois, no jogo, existe um acordo segundo o qual uma das partes se obriga a pagar à outra certa quantia mas sendo que o vencedor participou, intervindo na execução do jogo, coisa que não se verifica no swap; quando contratam, as partes sabem que existirá sempre uma desvantagem para alguma delas na execução do contrato, por o resultado deste depender de uma variável que não podem controlar, e que é a variação da taxa de juro, da qual, conforme suba ou desça, resultará que o saldo seja favorável a uma ou a outra. No entanto, dispõem-se a correr o risco correspondente, com base na análise que façam do mercado e por considerarem mais provável que da execução do contrato lhes resulte uma vantagem. Na aposta, há um desacordo inicial relativamente à ocorrência de um determinado evento, passado ou futuro, investindo o apostador certa quantia ou valor no sentido de lhe ser atribuída uma vantagem económica se o evento em que apostou se verificar ou tiver verificado, ao passo que as partes no contrato de swap não estão em desacordo quanto à eventualidade da ocorrência do evento, antes partindo da possibilidade da sua verificação, no caso, da subida da taxa de juro, e portanto da admissão do correspondente risco, para acordarem na transferência deste a troco de um preço, embora tal subida tenha acabado por não ter tido lugar; e o apostador intervém com um fim lúdico, enquanto no swap o agente atua com um objetivo puramente económico, no contexto de um mercado com relevante função económica fazendo, ao contrário daquele, uma previsão racional da evolução das variáveis com base nas taxas de referência fixadas pelo Banco Central Europeu e, no nosso País, pelas políticas financeiras do Governo e do Banco de Portugal.
Daí que não seja aplicável ao contrato de swap o art.º 1245º, mencionado, que considera nulos o jogo e a aposta, embora a regulamentação do jogo e aposta tenha determinado o aparecimento de dúvidas sobre se aquele dispositivo se encontra plenamente em vigor, suscitadas entre outros por Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Vol. II, 3ª ed., 852.
Acresce que, mesmo que se considerasse o contrato de swap abrangido na matéria de que trata o capítulo do Cód. Civil referente ao jogo e aposta, tal dispositivo também não seria aplicável, dado o disposto no art.º 1247º do mesmo Código, ao contrato de swap, por ser este objeto da legislação especial acima referida, que fixa validade a tal contrato e caráter jurídico civil às obrigações dele resultantes, com a consequente possibilidade da sua exigência judicial.
O swap da taxa de juro tem, como se disse, consagração legal efectiva como instrumento financeiro na redação do art.º 2º, n.º 1, al. e), do Código dos Valores Mobiliários, dada pelo Dec. – Lei n.º 357-A/2007, de 31/10, quer referido a um capital real, quer a um capital nocional ou hipotético, o que afasta a invalidação de tal contrato, mesmo que especulativo, com base, quer em violação da ordem pública, quer na exceção de jogo e aposta ou da consideração de se tratar de obrigações naturais, quer em nulidade por falta de causa, fraude à lei ou fim contrário a ela, que precisamente o permite.
Invoca ainda a recorrente o objetivo da política económica de combate à especulação consagrado no art.º 99º da CRP, o que levaria a que a admissão da validade do contrato de swap sem passivo ou financiamento subjacente constituiria ofensa à ordem pública.
Para além, porém, do que já se referiu quanto ao reconhecimento pelo próprio legislador da inexistência de tal ofensa ao admitir como lícito o contrato de swap de taxas de juro com referência a um capital, quer real, quer hipotético ou nocional, é de ter em conta o explicado a esse respeito pelo Cons. João Bernardo no seu voto de vencido no dito Acórdão de 29/01/2015, ao dizer que o art.º 99º, al. c), da CRP, ao dispor que é objetivo da política comercial o combate às atividades especulativas, é um preceito comprometido com a redação vigente até 1989 (então do art.º 109º, n.º 1), que impunha ao Estado a intervenção na racionalização dos circuitos de distribuição e na formação e controlo dos preços a fim de combater atividades especulativas, levando a sua interpretação, assente nesse elemento histórico e inserida no contexto resultante também de outros preceitos constitucionais, mormente os relativos à iniciativa privada, a que se deva colocar os swaps, mesmo os reportados a capital nocional (também designado por fictício ou hipotético) fora do âmbito do combate que o legislador constitucional determina.
De tudo resulta que, ao contrário do que defende a Recorrente, os contratos de swap nos quais o valor nocional não tem qualquer correspondência com o passivo ou os financiamentos da contraente, não são proibidos.
Assim, conclui-se que o contrato em causa não enferma de qualquer nulidade, ele é em si mesmo válido ainda que o montante nocional inscrito no contrato (€1.000.000,00) não tenha qualquer correspondência a quaisquer financiamentos ou obrigações que a Autora tivesse perante o Banco Réu ou perante outras entidades, o que, efetivamente, exclui a necessidade de produção de qualquer prova adicional sobre a eventual existência de relação, direta ou indireta, com os financiamentos anteriormente concedidos à recorrente.» - sublinhados da ora signatária.
Aplicando o entendimentos transcrito – ao qual, reafirma-se, se adere, na íntegra -, à situação sub judice, há que concluir que o contrato aqui posto em causa não enferma de qualquer nulidade, nomeadamente, por se tratar de contrato de jogo e oposta ou por ser contrário à ordem pública ou ofensivo dos bons costumes.
No mesmo sentido, veja-se, ainda (de entre outros), o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.01.2016, proferido no processo 876/12.9TVLSB.L1.S1 (também disponível no site da dgsi): “O contrato de swap configura um contrato típico e normativamente organizado e estruturado, validamente aceite e consagrado nas ordens jurídicas internacionais, nomeadamente no direito comunitário, e não um contrato meramente especulativo, como aderga de ser o jogo e aposta.”»
6.2.
Este argumentário alcança-se curial e adequado, quer em tese, quer considerando os contornos do concreto caso, pelo que urge chancelá-lo.
Diga-se, em seu abono e reiteração, que esta é a posição significativamente maioritária quer da doutrina, quer da jurisprudência.
Assim, e para além dos arestos citados na sentença, no sentido por ela defendido se pronunciaram, vg., mais os seguintes, todos in dgsi.pt.:
- Ac. da RL de 13.05.2013, p. 309.11.8TVLSB.L1-7
«O contrato de swap é o contrato pelo qual as partes se obrigam a trocar entre si periodicamente determinadas quantias pecuniárias, correspondentes a juros vencidos sobre um determinado capital hipotético, calculados por referência a determinada taxa de juro fixa e/ou variável, sendo as quantias em causa expressas na mesma moeda.
O contrato de swap é um contrato lícito, admitido e tutelado no nosso ordenamento jurídico, designadamente pelo art. 2º, do Código de Valores Mobiliários e pela Diretiva 2004/39/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Abril de 2004, transposta para o nosso direito pelo Decreto-Lei n.° 357-A/2007, de 31 de Outubro, que alterou o CVM.
O contrato de swap de taxa de juro é um contrato comercial, atípico, duradouro, consensual, sinalagmático, aleatório e oneroso.
Considerando os respectivos elementos essenciais, o contrato de swap não se confunde com o contrato de jogo e aposta, previsto no art.1245º, do CC.»
- Ac. da RL de 08.05.2014, p. 531/11.7TVLSB.L1-8.
«1.-O contrato de swap, ou contrato de permuta financeira, é o contrato pelo qual as partes se obrigam ao pagamento recíproco e futuro de duas quantias pecuniárias, na mesma moeda ou em moedas diferentes, numa ou várias datas predeterminadas, calculadas por referência a fluxos financeiros associados a um activo subjacente, geralmente uma determinada taxa de câmbio ou de juro.
2.-À semelhança dos demais contratos derivados, os "swaps" são fundamentalmente um instrumento de cobertura de risco, que permite às empresas, em particular, salvaguardar-se das consequências adversas das oscilações desfavoráveis das taxas de juro e de câmbio, embora também sejam ocasionalmente utilizados para finalidades arbitragistas, especulativas, e até puramente contabilísticas.
3.-os swaps sobre taxas de juros (interest rate swap) são contratos mediante os quais dois mutuários de empréstimos do mesmo montante e com o mesmo vencimento, mas com taxas de juro calculadas sobre bases distintas, se comprometem a fazer pagamentos recíprocos, com base nas taxas de juro da contraparte, sobre o valor nocional, mantendo-se as partes devedoras dos respectivos empréstimos para com os respectivos mutuantes.
4.-O tipo mais comum e mais transaccionado tem por base uma troca de pagamentos em taxa fixa por pagamentos em taxa variável e designa-se comummente por plain vanilla ou coupon swap.
5.-O pagador de taxa fixa recebe uma taxa variável e diz-se que assume uma posição longa ou que compra o swap. Por outro lado, o recebedor da taxa fixa paga uma taxa variável e diz-se que assume uma posição curta ou que vende o swap. Os pagamentos são feitos na mesma altura e na data dá regularização será calculado o diferencial entre os dois montantes e feita a compensação (netting), apenas havendo lugar ao pagamento da diferença líquida.
6.-É improcedente qualquer qualificação ou equiparação do contrato de swap de taxas de juro como Jogo e aposta, com a consequência de não originar obrigações civis válidas, pois no contrato de swap o risco a que as partes se expõem é em grande medida exógeno, isto é, resulta de circunstâncias exteriores ao contrato, com o activo ou passivo das partes e a variação das taxas de juro.
7.-A inaplicabilidade da chamada “excepção de jogo" (artigo 1245° do Código Civil) ao contrato de swap de taxas de juro corresponde ao relevante papel que este contrato hoje desempenha na gestão financeira do endividamento na actividade empresarial, sendo dominante na generalidade das ordens jurídicas e das economias desenvolvidas que nos são mais próximas.
8.-A qualificação de contratos de swap de taxas de juros celebrados por instituições financeiras, quer como contrapartes, quer como intermediárias, como contratos de jogo e aposta, com a consequente negação de eficácia vinculativa aos seus efeitos, limitaria a possibilidade de recurso a tais contratos na nossa ordem jurídica e pelas empresas portuguesas, também para finalidades com a gestão de riscos do balanço, colocando-as em desvantagem perante a generalidade das ordens jurídicas, onde tais contratos são admitidos, além de constituir uma restrição injustificada à actividade de intermediação financeira.»
- Ac. da RL de 28.04.2015, p. 540/11.6TVLSB.L2-1
«1. O contrato de swap é um contrato inominado e aleatório em que duas contrapartes convencionam trocar, durante um determinado período de tempo, uma série de pagamentos em dinheiro calculados com base em quantias hipotéticas de determinados bens (chamados notionals). Os mais conhecidos são os interest rate swaps, os currency swaps, os credit default swaps, os commodity swaps e os equity swaps.
2. Os swaps são contratos derivados (derivatives), isto é, ativos ou bens cujo valor deriva de um outro, chamado bem ou ativo subjacente. São derivados os forwards, futuros, opções e swaps. E todos eles são desde logo instrumentos financeiros de cobertura de risco; o que não impede que possam também ser usados com fins especulativos.
3. Os interest rate swaps, contratos de permuta de taxas de juro é um acordo entre dois contraentes para troca de pagamentos em datas regulares futuras, em que cada pagamento de suporte é calculado numa base diferente, havendo assim dois fluxos de dinheiro chamados legs of the swap, literalmente pernas da permuta. Na prática, um destes contraentes é uma empresa de exportação/importação, e o outro é um banco como intermediário financeiro.»
- Ac. da RL de 02.07. 2015, p. 2118-10.2TVLSB.L1.-2
«II - Os interest rate swaps são figuras contratuais autónomas e não necessariamente complementares a um contrato de mútuo ou outro tipo de financiamento.
III – O contrato de swap de taxa de juro é um contrato aleatório, mas isso não significa que deva ser qualificado ou equiparado ao contrato de jogo e aposta que é, apenas, um especial tipo de contrato aleatório entre outros.
IV - As prestações aleatórias e recíprocas do swap de taxa de juro são determinadas por facto exterior ao contrato e à vontade das partes (no caso a flutuação da Euribor) não se sabendo no momento da conclusão do mesmo se acabará por verificar-se uma vantagem e a parte que dela beneficiará.»
- Ac. da RL de 10.05.2016, p. 1246/14.0T8PDL.L1-7
I-Em termos genéricos, a figura do interest rate swap contempla essencialmente o acordo em que os celebrantes se obrigam a trocar, durante determinado período de tempo, uma série de pagamentos em dinheiro calculados tendo por base quantias hipotéticas de determinados activos, consistindo basicamente na troca de um empréstimo a uma taxa de juro fixa por um empréstimo a taxa de juro flutuante, ao longo de determinado período, encontrando-se a taxa fixa definida no contrato e sendo a taxa de juro flutuante a que resulta de um padrão previamente estabelecido , por exemplo a Euribor ( Euro Interbank Offered Rate).
II-O swap de taxa de juro resulta essencialmente do funcionamento da oferta e da procura a nível internacional, não oferecendo, à partida, quaisquer dúvidas acerca da respectiva licitude, uma vez que tem a necessária cobertura no princípio da autonomia das partes e da liberdade de celebração, genericamente previstos no artigo 405º do Código Civil.
III-Não é compreensível, nem razoável, que um instrumento financeiro de carácter geral e corrente, expressamente previsto e aceite pelo direito comunitário que prevalece sobre a ordem jurídica nacional, possa contraditoriamente ser entendido como violador da própria ordem pública interna na qual já vigora directamente, com primazia sobre a legislação nacional ordinária
IV-Tendo em vista a especificidade de cada situação factual concreta, poderão eventualmente colocar-se limites à validade de utilização deste tipo de instrumentos financeiros, mormente nas situações excepcionais em que se conclua ser absolutamente manifesto e inequívoco que a apresentação da proposta pela entidade financeira e subsequente concretização foi contrária aos ditames da boa fé e lisura negocial a que todos os sujeitos de direito se encontram especialmente vinculados.
V-Será, por exemplo, o caso da proposta destes produtos – swaps - a entidades que não se encontram manifestamente preparadas para os entender ou alcançar os seus efeitos (os indigentes financeiros), com enganoso e abusivo aproveitamento dessa circunstância por parte do proponente dos swaps; da propositada ou meramente displicente ausência da prestação da informação necessária, legalmente imposta, acerca das características principais do produto por parte da entidade financeira, tendo em vista levar o aceitante ao engodo e ao prejuízo grave; a absoluta e objectiva inadequação do instrumento financeiro às características do cliente ou à natureza da sua actividade comercial, com prova (quiçá de cariz matemático) da inevitabilidade do resultado desvantajoso para o cliente e altamente favorável para a instituição financeira.
VI-In casu, os contratos em apreço foram detalhadamente negociados entre as partes, sendo que as AA. revestem uma envergadura empresarial que lhes permitiu servirem-se de especialistas e conselheiros às suas ordens que escolheram, após pormenorizada análise, a proposta de swaps que tinham por mais conveniente, reunindo todas as capacidades e condições para se aperceberem do tipo de produto que lhes foi proposto e aceitaram-no porque, devidamente esclarecidos, entenderam na altura ser a solução financeira mais adequada para a gestão e defesa dos seus interesses económicos e comerciais.
VII-O risco assumido era precisamente o que era pressuposto pela adesão, voluntária, informada e consciente, do cliente do Banco ao instrumento financeiro em apreço e a álea que o contrato encerrava constituía a sua própria natureza, dependendo o efeito final da evolução da taxa de juro, como os celebrantes bem sabiam…»
- Ac. da RP de 15.09.2015, p. 29/14.1TVPRT.P1
«…parte relevante da doutrina entende que “o swap de taxa de juro é um instrumento financeiro derivado, não porque derive ou resulte do valor de um outro eventual negócio subjacente, designadamente de um mútuo, que pode nem existir, mas antes porque o seu valor é que deriva das alterações de uma variável aplicada ao montante “nocional”, real ou hipotético, variável esta que, nos casos de swaps de taxas de juro”.
“É aliás errado confundir a qualificação do swap como instrumento financeiro (e não contrato) derivado, que é uma mera qualificação económica, com qualquer relação de dependência jurídica de um negócio, crédito ou dívida subjacente, os quais não têm sequer de existir.”
“Com efeito, o contrato de swap é independente das relações jurídicas (designadamente das obrigações) que as suas partes tenham com terceiros, desde logo por aplicação do princípio geral do efeito relativo dos contratos (artº 406º nº2 CCiv).”
“(…) Saber se existe um activo ou passivo, de qualquer das partes, subjacente ao valor nocional, é assim uma mera questão externa ao contrato de swap e que apenas se prende com a motivação das partes para contratar.”
“A autonomia do swap relativamente a tais activos ou passivos – quando existam – é aliás essencial, pois o swap tem de poder ter um valor de mercado autónomo e independente para poder ser também transaccionado” (assim, Prof. P. Mota Pinto, Revista Decana, 143/401 e 402; no sentido de que o swap de taxa de juro não pode ser assimilado ao jogo ou aposta, cf. Profª Maria Clara Calheiros, CDP, 42/9, S.T.J. 11/2/2015, pº 309/11.8TVLSB.L1.S1, relatado pelo Consº Sebastião Póvoas, Ac.R.L. 8/5/2014, pº 531/11.7TVLSB.L1-8, relatado pelo Desemb. Ilídio Martins).
No mesmo sentido, de que o contrato de swap de taxa de juro não é um contrato acessório de contratos de empréstimo, ou outros contratos, que vençam juros, cf. Prof. Calvão da Silva, Revista Decana, 142/262.
…Nos “swaps” de juros, as partes acordam trocar entre si quantias pecuniárias expressas na mesma moeda, representativas de juros vencidos sobre um determinado capital hipotético, calculados por referência a determinadas taxas de juro fixas ou variáveis.
Em regra, a finalidade do cliente é cobrir o risco de flutuação das taxas de juro, mas, …pode igualmente ser uma finalidade de financiamento; a finalidade do Banco será, por seu turno, a finalidade especulativa.
Os “swaps” podem revestir duas variantes fundamentais, consoante o cálculo de juros de uma das partes se realiza a taxa fixa e o da outra a taxa variável, ou mediante a aplicação a ambas de taxas variáveis definidas em bases distintas.
…para a descaracterização do produto como derivado para cobertura de risco seria necessário que o contrato não cobrisse o risco em nenhum dos cenários de mercado possíveis, ou seja, que pelo contrato o risco exógeno se mantivesse inalterado. A questão da desigualdade dos campos de risco não apaga essa realidade.
Há que não esquecer que nos encontramos perante um contrato aleatório, isto é, um contrato fundamentado na incerteza e imprevisibilidade da evolução das taxas de juro (cf. Ac.R.L. 13/5/2014 cit.) – a aleatoriedade distingue o contrato em causa “uma vez que a realização da prestação principal por uma ou outra das partes, bem como a determinação do seu montante, dependem da verificação de um acontecimento incerto e de modo nenhum influenciado pelas partes”…
Ora, como se escreveu no Ac.R.C. 15/10/2013 Col.IV/24, relatado pela Desembª Albertina Pedroso, “uma vez que as prestações são periódicas e os valores futuros das mesmas podem vir a ser diferentes (porque as formas de cálculo respectivo são efectivamente diferentes), o contrato tem inerente uma componente de risco que cada uma das partes assume por ver nisso conveniência, seja mediante o recebimento de um prémio, seja por leitura favorável da evolução das taxas relevantes ou por benefícios que podem advir da conjunção com outros compromissos contratuais assumidos”…
O estudo do Prof. Calvão da Silva, Revista Decana, 143/365, ajuda igualmente a conformar os termos da questão:
“O desequilíbrio funcional superveniente não é mais do que o prolongamento do desequilíbrio genético querido e estipulado pelas partes ab initio para, por definição, valer in futurum, durante o prazo contratado no swap. É assim nos contratos aleatórios em que só finalmente se sabe quem ganha e quem perde e o “preço” é quantificado de antemão (na formação do contrato) em função do risco coberto pela concreta vontade das partes (risk hedger e risk taker).”
“Pense-se também num contrato de seguro e facilmente se entenderá que o prémio será maior ou menor consoante for mais ou menos extenso o risco incluído no âmbito de cobertura do contrato. Sendo a probabilidade do risco (v.g., tsunami) pequena, a grande probabilidade de a seguradora ganhar o prémio é contrabalançada pela potencial perda enorme que aceita correr se, contrariamente ao expectável, o tsunami vier a ocorrer.”
“O mesmo se passa no swap: na distribuição do risco da volatilidade da taxa de juro concretamente acordada, a medalha do cliente (risk hedger) tem numa face a elevada probabilidade de ganho pequeno e na outra face a pequena probabilidade de perda grande.”
“(…) A prestação do cliente é fixada num certo montante em ordem a reduzir seguramente os custos de financiamento aquando da conclusão do swap (taxa fixa abaixo da Euribor) e provavelmente durante a vida do contrato, segundo o juízo de prognose da evolução dos juros no mercado publicado ao tempo nos contratos a prazo (forwards da taxa de juro – artº 2º nº1 al.e) do Código de Valores Mobiliários).”
Em suma: entrando a superveniente onerosidade na álea normal do contrato, não cabe aludir a “violação da ordem pública” ou da “ilicitude de objecto”.»
- Ac. do STJ de 11.02.2015, p. 309/11.8TVLSB.L1.S1 cit. na sentença, mas que se cita com maior abrangência, dada a sua douta dilucidação da presente figura:
«1) No direito financeiro designam-se instrumentos derivados, ou simplesmente derivados, os instrumentos financeiros resultantes de contratos a prazo cujo valor resulta de outros valores: os valores de base.
2) “Swap” é um acordo contratual entre duas partes que aceitam trocar, ao longo do tempo e segundo regras predeterminadas uma série de pagamentos correspondentes a um valor nocional (hipotético) de capital entre elas negociado.
3) O conceito de “swap” é de origem anglo-saxónica, depois acolhido no direito europeu: Directivas 88/361/CEE, de 24 de Junho, a dar execução aos artigos 67.º e 56.º n.º 1 do TUE [livre circulação de capitais e não restrição a essa livre circulação e respectivos pagamentos]; 93/22/CEE, de 10 de Maio [Investimentos no domínio dos valores mobiliários]; 2003/6/CE, de 28 de Janeiro [Abuso de informação privilegiada e manipulação do mercado].
4) A Directiva 2004/39/CE de 21 de Abril (DMIF) fixou o conceito de instrumento financeiro e previu os “swaps” na alínea 4.ª do Anexo I, Secção C.
5) O artigo 2.º n.º 1, alínea c) a f) do Código de Valores Mobiliários reconheceu, expressamente, a figura do “swap”.
6) São negociados “over the counter” (em mercados de balcão, ou não organizados) sem intermediários sendo formatados casuisticamente (“tailor made”)
7) Há “hedging” quando o agente económico lançou mão do “swap” para diminuir a sua exposição à basculação de uma taxa de juro à qual já estava exposto numa outra relação jurídica, pretendendo minorar eventuais perdas.
8) No “swap” simples (“plain vanilla swap”) as partes acordam trocar o produto das taxas de juro previamente ordenados, mediante o prévio pagamento ao Banco de um preço pela operação e pelo risco que o banqueiro vai suportar.
9) As taxas de juro incidem sobre um capital meramente hipotético (nominal ou nocional) mas o “swap” pode ser utilizado sem ligação a qualquer outro contrato (contrato subjacente).
10) Basta-se a si próprio, tendo natureza financeira e não é complementar de outro (como v.g. mútuo ou algum financiamento) gozando de abstracção pura e absoluta.
11) Não se trata de jogo ou aposta não estando, em consequência sujeito ao disposto no artigo 1245.º do Código Civil.
12) Os contratos de “swap” de taxa de juro, que não têm o propósito directo de cobertura de risco, não são proibidos por lei, tal como o não são aqueles cujo valor nocional não corresponde a um passivo real.
13) O desequilíbrio negocial não é, só por si, gerador da nulidade do contrato, antes, se verificados os pressupostos e se tal for pedido, da respectiva resolução.»
- Ac. do STJ de 22.06.2017, p. 540/11.6TVLSB.L2.S1
«I. Os contratos de swap são contratos gizados com a função de servir como meio de gestão de ativos e passivos das empresas e outras instituições, mediante os quais as partes contratantes se comprometem a trocar, entre si, fluxos de tesouraria, durante determinado período acordado, nomeadamente sobre taxas de juros, ações, obrigações, divisas, matéria-primas, mercadorias e outros ativos ou passivos financeiros compatíveis com esse tipo contratual.
II. O contrato de swap de taxas de juro é um contrato de natureza atípica, em que, numa das suas modalidades, o valor transmitido por uma das partes é variável em função das taxas de referência escolhidas, enquanto que o valor transmitido pela outra parte é calculado na base de uma taxa fixa, portanto não dependente da flutuação das taxas de referência, mantendo-se inalterada durante a relação contratual. Assim, os fluxos gerados serão favoráveis a uma ou a outra das partes conforme a subida ou a descida da taxa de referência variável por relação à taxa fixa convencionada.
III. Os contratos de swap de taxas de juro tanto podem ser conectados com um contrato de mútuo como não terem sequer qualquer outro contrato associado. Na primeira hipótese, existirá um swap agregado a um financiamento para regular a respetiva taxa de juro; na segunda, o swap será de índole especulativa.
IV. No caso vertente, foi expressa e claramente assumido por ambas as partes que o contrato de swap celebrado tinha em vista a estabilização da situação financeira da aderente, cujo valor médio se encontrava refletido no valor nominal de € 3.000.000,00.
V. Neste contexto, afigura-se não estarmos perante um contrato swap de taxas de juro de natureza meramente especulativa, mas sim com um escopo definido e assumido por ambas as partes que era: o de visar a estabilização dos encargos financeiros da A.»
(sublinhado nosso).
Mesmo o Ac. do STJ de 29.01.2015, p. 531/11.7TVLSB.L1.S1 citado pelo recorrente, não se equipara o contrato de Swap ao jogo, e, quanto à aposta, apenas tal equiparação é admitida se nele as partes se pautaram pela especulação, pura e simples, ie., se não tiveram em mente prevenir qualquer risco ou pretenderam algum efeito útil atendível, apenas atuando pelo mero prazer que a vertigem do risco a alguns inculca.
Assim:
«XI - No contrato de swap…, existe um trato sucessivo de prestações recíprocas e não existe qualquer finalidade lúdica, pelo que o mesmo não pode ser assimilável ao contrato de jogo; todavia, dado que as prestações das partes não estão pré-determinadas e dependem da evolução de uma concreta taxa de juro, que existe uma contrapartida associada (e uma correspondente perda) à confirmação/infirmação das expectativas (ou, mais simplesmente, do acerto da previsão) – logicamente inversas e opostas - das partes acerca um facto futuro, incerto e incontrolável pelas partes (a variação dessa taxa) e que se recorre à compensação como forma de extinção das obrigações é possível aproximá-lo do contrato de aposta que se deve ter por lícita, por não assentar na sorte ou no azar…
XIV - Não se demonstrando que as partes – e, em particular, a autora – procuraram acautelar qualquer risco, fica por comprovar a existência de um “casamento” entre um hedger (que visa, por meio de um swap, prevenir um cenário de risco desfavorável) e um especulador (que formula previsões de sinal contrário e se dispõe a aceitar esse risco mediante o pagamento de uma compensação financeira), o que tornaria economicamente virtuosa (ou, por outras palavras, séria) e, nessa medida, aceitável e legítima a especulação.»
Ora mesmo concedendo nesta interpretação mais abrangente quanto à equiparação do swap meramente especulativo ao contrato de aposta sem qualquer utilidade social contrario à ordem publica e afectante da finalidade constitucional prevista no artº 99º al. c) da Lei Fundamental, há que convir que o caso concreto não encerra tais especificidades/requisitos.
Na verdade, provou-se que:
« 9. Com o mesmo contrato, a autora pretendeu uma cobertura de taxa de juro para a generalidade do envolvimento creditício detido por aquela perante a banca, ou seja, a autora desejava precaver-se de uma eventual subida das taxas de juro, considerando as responsabilidades que tinha para com o sistema bancário.»
Este concreto facto desde logo, por si, fulmina a pretensão da recorrente em querer taxar o contrato de meramente especulativo e, assim, ser equiparado ao jogo e aposta e contrario à ordem legal e constitucional e aos valores publicamente tidos como aceitáveis.
Não. Tendo ela responsabilidades perante a banca, com ele pretendeu proteger-se da subida das taxas de juro.
Por conseguinte, com o contrato, a recorrente e o recorrido não pretenderam jogar, apostar, atuando em termos meramente de fortuna e azar, unicamente de modo especulativo, sem qualquer substrato sério atendível.
Antes a autora pretendendo obter um efeito útil para a sua actividade económico-financeira.
Ou seja, o contrato teve uma finalidade, um efeito real, substancial, economicamente pretendido como profícuo e, assim, legítimo e aceitável, quer na perspectiva dos outorgantes, desde logo na da própria recorrente, quer na ótica do interesse geral/social.
Se esse efeito não foi consecutido é porque um dos factores que poderiam influenciar tal – a evolução, rectius subida, das taxas de juro - não se verificou pelo modo que seria adequado para a pretensão da recorrente.
Mas tal não basta – aliás é quasi irrevevante - para taxar o contrato de nulo.
Até porque de tal possibilidade ela já estava alertada e cônscia, como se provou – pontos 8 e 20.
Ademais, a autora não era estreante neste tipo de contratos, pois que se apurou – 21 - que O seu administrador Joaquim Tavares o qual assinou o contrato em representação daquela, desde data não apurada que detinha junto da ré um outro contrato de swap de taxa de juro.
E não tendo a autora alegado que tal contrato outrossim lhe foi intoleravelmente prejudicial.
Pelo que, talvez por virtude dos benefícios que terá colhido com o mesmo tenha avançado com a celebração do presente.
Revisitando o douto voto de vencido do Sr. Conselheiro João Bernardo no aludido Acordão de 29.01.2015:
«Não há dúvidas de que os múltiplos produtos financeiros que surgiram de há décadas para cá se inserem na cultura internacional dominante, em que o dinheiro vem assumindo um papel desumanizante.
Como não há dúvidas de que vêm mobilizando quantias monetárias astronómicas, em negócios em que pouco ou nada relevam as fronteiras dos países.
Para quem acredita na teoria da conspiração, alguém, com frieza inaudita, informado ao nano segundo e com atuação a nível mundial facilitada pela informática, molda a evolução económica no sentido que lhe convém, influenciando o lançamento no mercado de produtos financeiros que, a prazo, revertem em seu benefício, assim construindo fortunas colossais com correlativo empobrecimento de grande parte da população.
Além disso, muitos desses produtos financeiros integram-se na economia virtual, que, assim, assume dimensões assustadoras.
Todavia, não pode um tribunal deixar de se apoiar na produção legislativa, quer encarada a nível interno, quer olhando para o nosso país no contexto internacional em que, claramente, se insere…
A lei representa, em última análise, uma garantia para que aqueles que detêm o poder económico o não exerçam de modo, ou ainda de modo, mais prepotente. E não se pode perder de vista o n.º2 do artigo 8.º, ainda do Código Civil…
Neste quadro imenso, a palavra cabe aos responsáveis políticos, nomeadamente nas vertentes de atuação internacional, ficando para os tribunais o estreito papel de fazer cumprir a legalidade.
Sendo certo, por outro lado, que tal quadro não aponta necessariamente para a fragilidade de quem investe nos novos produtos financeiros. Precisamente porque se trata de novos produtos e de investimentos muito valiosos, exige-se deles grande cautela, incompatível com excesso de confiança. A representação da possibilidade de perda deve ser permanente.»
(sublinhado nosso).
Ainda que a aludida cultura seja, em termos ético-sociais e, até, de jure constituendo, questionável, certo é que os tribunais decidem casos concretos atento o seu envolvimento factual/circunstancial e, acima de tudo, com respeito pela interpretação mais plausível dos preceitos legais atinentes.
No caso vertente, atento o seu envolvimento fáctico-legal, a síntese final a retirar, e até porque a autora não era inexperiente na matéria, é que o contrato em causa não enferma do jaez que ela lhe atribui e dos vícios que lhe aponta, pelo que a sua pretensão não pode ser acolhida.

Improcede o recurso.

7.
Sumariando- artº 663º nº7 do CPC.
O contrato de swap de taxas de juro, quer seja reportado a um ativo subjacente – vg. mútuo -, ou apenas a um valor nominal/nocional, está legalmente previsto, pelo que, livre e conscientemente celebrado, não pode, salvo porventura casos excepcionais de puro, excessivo e intolerável espírito especulativo, ser equiparado ao jogo e aposta ou tido como violador de princípios de ordem pública.

8.
Deliberação.
Termos em que se acorda negar provimento ao recurso e, consequentemente, confirmar a sentença.

Custas pela recorrente.

Coimbra, 2018.04.24.


Carlos Moreira ( Relator)
Moreira do Carmo
Fonte Ramos