Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
113/11.3JACBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA JOSÉ NOGUEIRA
Descritores: ANOMALIA PSÍQUICA ANTERIOR
INIMPUTABILIDADE
PENA DE PRISÃO
INTERNAMENTO
Data do Acordão: 10/22/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA (2.ª SECÇÃO DA VARA DE COMPETÊNCIA MISTA)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 104.º, N.º 1, DO CP
Sumário: Decorrendo dos factos provados ser o arguido, já à data da prática das condutas delituosas, portador de uma perturbação esquizoafectiva, correspondendo em psiquiatria a uma doença grave e com carácter crónico, carecendo de um regular e adequado acompanhamento médico-psiquiátrico e, bem assim, que o regime dos estabelecimentos prisionais o afecta negativamente ou que ele perturbará seriamente esse regime, mostram-se verificados os pressupostos enunciados no artigo 104.º, n.º 1, do CP, conducentes ao seu internamento em estabelecimento destinado a inimputáveis pelo tempo correspondente à duração da pena – artigo 104.º, n.º 1 do Código Penal.
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra

I. Relatório

1. No âmbito do processo Comum Colectivo n.º 113/11.3JACBR da Vara de Competência Mista de Coimbra – 2.ª Secção, foi o arguido A..., melhor identificado nos autos, pronunciado pelos factos e crimes constantes da acusação pública de fls. 288 a 294, sendo-lhe, então, imputada a prática, como autor material e em concurso real, de três crimes de violação agravada, p. e p. pelos artigos 164.º, n.º 1, al. a) e 177.º, n.º 6, ambos do Código Penal.

2. Realizada a audiência de discussão e julgamento pelo Tribunal Colectivo foi proferido [em 17.01.2014] acórdão, cujo dispositivo se transcreve:

«Nos termos expostos, os Juízes que compõem este Tribunal Colectivo deliberam o seguinte:

Julgam a pronúncia procedente e consequentemente:

1. Condenam o arguido A... pela prática de três crimes de violação agravada, p. e p. pelos art.ºs 164º, n.º 1, al. a) e 177º, n.º 6 do Código Penal nas penas parcelares de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão por cada um dos crimes, e em cúmulo na pena única de 11 (onze) anos de prisão.

2. Condenam o arguido nas custas criminais correspondente a taxa de justiça de 5 (cinco) Ucs. (art.ºs 8.º, n.º 9, do Reg. Custas Processuais, e Tabela III anexa), e, bem assim, nos legais encargos do processo (art.ºs 514.º do CPP, 16.º do Reg. Custas Processuais), sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido.

(…)».

3. Inconformado, recorre o arguido extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões:

1. Estão incorrectamente julgados os seguintes pontos da matéria factual dada como provada (por referência ao Acórdão proferido pelo douto Tribunal):

“XIII. A menor com dores contraiu-se e chegou a ter perda de sangue com o início da penetração superficial do pénis do arguido no interior da sua vagina.”

“XXIII. Depois, estando a menor deitada de barriga para cima, na cama desta, o arguido deitou-se em cima dela, colocando o seu pénis em cima da vagina desta e começando a movimentá-lo em vai-vem, logrando mais uma vez, introduzi-lo superficialmente na vagina da menor, a qual com dores, mais uma vez, se retraiu.”

“XXXVIII. Depois começou a movimentar o seu pénis erecto de forma ritmada, procurando novamente introduzi-lo no interior da vagina da menor, o que só logrou de forma muito superficial – pois a menor ao sentir dores, novamente se retraiu, dificultando tal penetração.”

2. Deve ser alterada a matéria de facto dada como provada, sugerindo-se a seguinte redacção, caso outra melhor o douto Tribunal da Relação não formule:

“XIII. A menor com dores contraiu-se e chegou a ter perda de sangue, apesar de não ter havido penetração, sequer superficial, do pénis do Arguido no interior da sua vagina.”

“XXIII. Depois, estando a menor deitada de barriga para cima, na cama desta, o arguido deitou-se em cima dela, colocando o seu pénis em cima da vagina desta e começando a movimentá-lo em vai-vem, não logrando introduzi-lo, sequer superficialmente, na vagina da menor, a qual com dores, mais uma vez, se retraiu.”

“XXXVIII. Depois começou a movimentar o seu pénis erecto de forma ritmada, procurando introduzi-lo no interior da vagina da menor, o que não logrou, sequer de forma superficial – pois a menor ao sentir dores, novamente se retraiu, dificultando tal penetração.”

3. Estão incorrectamente julgados os seguintes pontos da matéria factual dada como não provada (por referência ao Acórdão proferido pelo douto Tribunal):

- O Arguido fora dos períodos de remissão é incapaz de compreender como se comportar em sede de relacionamento afectivo e de conformar a sua actuação com as regras de conduta socialmente aceites, sendo incapaz de compreender a censura quanto àquelas condutas que lhe vêm imputadas e cuja infracção constitui o tipo legal pelo qual vem acusado;

- O Arguido, no momento dos factos que lhe vêm imputados não se encontrava em período de remissão;

- E estava incapaz de compreender a censura ética e jurídica das condutas que lhe vêm imputadas;

- O Arguido perdeu o sentido e a relação com o sistema da realidade, fruto da sua doença;

4. Deve ser alterada a matéria de facto dada como provada, passando os seguintes pontos para a matéria de facto provada:

“XLVII. O Arguido fora dos períodos de remissão é incapaz de compreender como se comportar em sede de relacionamento afectivo e de conformar a sua actuação com as regras de conduta socialmente aceites, sendo incapaz de compreender a censura quanto àquelas condutas que lhe vêm imputadas e cuja infracção constitui o tipo legal pelo qual vem acusado.”

“XLVIII. O Arguido, no momento dos factos que lhe vêm imputados não se encontrava em período de remissão.”

“XLIX. E estava incapaz de compreender a censura ética e jurídica das condutas que lhe vêm imputadas.”

“L. O Arguido perdeu o sentido e a relação com o sistema da realidade, fruto da sua doença;”

5. Ou, subsidiariamente, deve ser alterada a matéria de facto dada como provada, passando os seguintes pontos para a matéria de facto provada:

“XLVII. O Arguido fora dos períodos de remissão compreende deficientemente como se comportar em sede de relacionamento afectivo e como conformar a sua actuação com as regras de conduta socialmente aceites, sendo deficientemente capaz de compreender a censura quanto àquelas condutas que lhe vêm imputadas e cuja infracção constitui o tipo legal pelo qual vem acusado.”

“XLVIII. O Arguido, no momento dos factos que lhe vêm imputados não se encontrava em período de remissão.”

“XLIX. E estava deficientemente capaz de compreender a censura ética e jurídica das condutas que lhe vêm imputadas.”

“L. O Arguido perdeu, ligeiramente, o sentido e a relação com o sistema da realidade, fruto da sua doença;”.

6. O RELATÓRIO DA PERÍCIA MÉDICO-LEGAL Perícia Psiquiatra, constante a fls. 333 a 340, esclarece que, na eventualidade de vir a ser determinado o cumprimento de pena de prisão efectiva por parte do Arguido, o regime dos estabelecimentos comuns prisionais lhe será prejudicial e ele prejudicará seriamente tal regime (fls. 337 v);

7. O douto Tribunal recorrido deveria ter dado como provado tal facto, não se tendo sobre o mesmo pronunciado.

8. Deve ser alterada a matéria de facto dada como provada, passando a mesma a incluir o seguinte ponto:

“LI. O regime dos estabelecimentos comuns prisionais será prejudicial ao Arguido e ele prejudicará seriamente tal regime.”.

9. Ou o Arguido é inimputável, faltando-lhe a capacidade de entender a sua conduta, devendo ser-lhe aplicada uma medida de segurança, tendo o douto Tribunal violado o art. 91º, do Código Penal, e devendo ser revogada a decisão em crise e substituída por uma outra que decrete o internamento do Arguido;

10. Ou, subsidiariamente, o Arguido tem a sua imputabilidade diminuída, devendo ser internado em estabelecimento destinado a inimputáveis, pelo tempo correspondente à duração da pena que lhe venha a ser imposta, tendo o douto Tribunal violado o n.º 1, do art. 104º, do Código Penal, e devendo ser revogada a decisão em crise e substituída por uma outra que decrete o internamento do Arguido em estabelecimento destinado a inimputáveis, pelo tempo correspondente à duração da pena que lhe venha a ser imposta.

11. O arguido cometeu somente dois crimes;

12. Pois o primeiro dos três eventos criminosos ocorreu em Setembro de 2010, no domínio da redacção da L 59/2007 (a qual considerava crime continuado o perpetrado contra bens eminentemente pessoais, quando a vítima era a mesma, como o foi), pelo que está abrangido pela continuação criminosa, resultante do segundo dos três eventos criminosos;

13. Todavia, o douto Tribunal recorrido condenou o Arguido pela prática de três crimes;

14. Violou o douto Tribunal recorrido o nºs 2 e 3, do art. 30º, do Código Penal, devendo ter condenado o Arguido somente pela prática de dois crimes, um dos quais continuado abrangendo os factos ocorridos em Setembro de 2010 e os factos ocorridos em Janeiro de 2011 e outro dos quais abrangendo os factos ocorridos em Março de 2011;

15. Deve a decisão em crise ser revogada e substituída por uma outra que condene o Arguido pelo cometimento de dois crimes e não três.

16. O Arguido nunca chegou a penetrar, sequer superficialmente, a vagina da menor, B..., e a cópula vestibular ou mesmo a cópula vulvar não são abrangidas pela previsão do art. 164.º, pelo que não praticou o crime que lhe é imputado, no que concerne à parte da acusação que refere a suposta cópula;

17. Violou o douto Tribunal o art. 164º, do Código Penal, que aplicou, indevidamente;

18. O Arguido, quanto aos factos de Setembro de 2010 e Janeiro de 2011, praticou o crime previsto e punido pelo n.º 2, do art. 171º, do Código Penal (atento o coito oral);

19. E, quanto aos factos de Março de 2011, praticou o crime previsto e punido na al. a), do n.º 3, do art. 171º, do Código Penal;

20. Deve a decisão ser revogada e substituída por uma outra que, sem prescindir do antes exposto (com especial relevância para o constante da Conclusão Nove e para o constante da Conclusão Dez) condene o Arguido pela prática de dois crimes, um continuado, pela prática do crime previsto e punido pelo nº 2, do art. 171º, do Código Penal, e outro não continuado, pela prática do crime previsto e punido na al. a), do n.º 3, do art. 171º, do Código Penal.

Com o que o douto Tribunal fará Justiça.

Termina com o requerimento de renovação de prova, conforme fls. 476 a 477, sobre o qual, por ocasião do despacho preliminar, já incidiu decisão.

4. Por despacho exarado a fls. 478 foi o recurso a ser admitido, fixado o respectivo regime de subida e efeito.

5. Ao recurso respondeu a Exma. Procuradora da República, concluindo:

- que a decisão em matéria de facto se mostra correcta, estando a respectiva fundamentação em perfeita consonância com a prova produzida, objectivamente avaliada, à luz do preceituado no art. 127.º do CPP.

- Os elementos de prova que serviram a motivação do Tribunal e concretamente aqueles que o recorrente agora invoca nos termos do art. 412.º, nº 3, b) do C.P.P., não implicam, ao invés do alegado, decisão diversa.

- Os factos integram efectivamente a prática pelo arguido A... de três crimes de violação agravada, p. e p. pelos arts. 164º, nº 1, a) e 177º, nº 6 do CP, pelos quais o Tribunal o condenou, e bem, na pena única de 11 anos de prisão.

- o Tribunal pronunciou-se sobre todas as questões, relevantes, que se impunha abordar, na globalidade da ponderação efectuada e das conclusões coerentemente alcançadas.

- Não foi violado qualquer princípio ou norma jurídica, nomeadamente as referidas pelo recorrente.

- Deverá ser negado provimento ao recurso e confirmada a decisão recorrida.

6. Remetidos os autos à Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto no parecer junto a fls. 496 a 497, corroborando a posição expendida na resposta apresentada pelo Ministério Público, contrariou a argumentação do recorrente quer em sede de matéria de facto, quer de direito, pronunciando-se, assim, no sentido da improcedência do recurso.

7. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do CPP, reagiu o recorrente, retomando o já invocado no requerimento recursório.

8. Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos foram os autos à conferência, cumprindo, agora, decidir.

II. Fundamentação

1. Delimitação do objecto do recurso

De harmonia com o disposto no n.º 1 do artigo 412.º do CPP e conforme jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça o âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas da respectiva motivação sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito – [cf. acórdão do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19.10.1995, DR, I Série – A, de 28.12.1995].

No caso em apreço questiona o recorrente:

- O acervo factual apurado, que impugna;

- Em consequência a qualificação jurídico-penal dos factos;

- O afastamento do «crime continuado»;

- A violação do artigo 104.º do Código Penal.

2. A decisão recorrida

Ficou a constar do acórdão recorrido [transcrição parcial]:

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:

Factos Provados:

I. A menor B... nasceu em (...), Coimbra, a 30 de Março de 1999, sendo filha de C... e de D....

II. Reside com a mãe no (...), nesta Cidade.

III. Em Agosto de 2010 o arguido foi viver maritalmente com a mãe da menor na morada acima indicada, situação que se prolongou até 10 de Março de 2011.

IV. O arguido passou assim a residir na mesma morada onde vivia a menor B..., entre Agosto de 2010 e 10 de Março de 2011.

V. Durante tal lapso de tempo a menor B... tinha apenas onze anos, o que era do pleno conhecimento do arguido.

VI. Em dia não concretamente apurado do mês de Setembro de 2010, mas seguramente em altura em que o ano lectivo já tinha começado, o arguido, aproveitando-se do seu “papel” de companheiro da mãe da menor, foi buscar a B... à escola e levou-a para casa, sita no (...) e acima indicada.

VII. A menor não estranhou e foi com o arguido para casa.

VIII. Ao chegar a casa, ao final das aulas, verificou que não estava lá ninguém para lá dos dois e havia um tapete que não conhecia estendido no chão da sala.

IX. A menor foi para o seu quarto arrumar as suas coisas e depois dirigiu-se para a sala para ir ligar o computador ali existente.

X. O arguido, que ali se encontrava, pegou na menor, encaminhou-a para cima do supra referido tapete, deitou-a no mesmo, virada de barriga para cima e tirou-lhe a roupa que esta trazia vestida, deixando-a integralmente nua.

XI. Em seguida, o arguido tirou as calças e cuecas, ficando nu da cintura para baixo e mantendo a camisola que trazia vestida.

XII. Com a menor naquela posição, o arguido deitou-se então em cima desta, dando-lhe beijos na boca e colocando o seu pénis na vagina da menor, ali o mantendo em movimentos ritmados de vai-vem procurando deste modo ali penetrar e ejacular.

XIII. A menor com dores contraiu-se e chegou a ter perda de sangue com o início da penetração superficial do pénis do arguido no interior da sua vagina.

XIV. O arguido, dando por concluída a sua conduta, levantou-se, levantou a menor e enrolou no tapete a roupa dos dois que ficou suja com esta actuação (que posteriormente deitou no lixo).

XV. O arguido, de forma séria e insistente, advertiu a menor para não contar nada a ninguém, pois caso contrário matava o padrinho desta – o mesmo sabia que a menor tinha uma especial afeição pelo padrinho – e que da próxima vez lhe batia.

XVI. O arguido saiu então de casa (com o tapete e roupa, que deitou num contentor longe de casa) e a menor B... foi-se fechar no seu quarto cheia de medo dele.

XVII. Posteriormente o arguido foi buscar a companheira ao final das aulas que esta estava a frequentar e regressaram a casa os dois, encontrando-se a B... já com o pijama vestido e fechada no seu quarto.

XVIII. Na casa acima indicada onde a menor reside com a mãe – e durante o período acima indicado, também com o arguido – por vezes ali fica e pernoita também a irmã mais nova da B....

XIX. Nessa altura, a mãe da menor dormia no mesmo quarto que a filha mais nova – pois esta tinha medo de ficar sozinha -, a B... dormia no seu quarto e o arguido dormia na sala ou num outro quarto ali existente.

XX. Em dia não concretamente apurado do mês de Janeiro de 2011, numa ocasião em que a imã mais nova da B... ali pernoitou – e que a mãe dormiu no mesmo quarto que a irmã e o arguido ficou a dormir na sala – aproveitando-se do facto da companheira e filha mais nova já estarem a dormir, o arguido dirigiu-se ao quarto da B... e onde esta se encontrava deitada na sua cama.

XXI. Nessa ocasião, o arguido tirou as calças e cuecas que trazia vestidas, tirou também as calças e cuecas da B..., ficando os dois na cama desta, nus da cintura para baixo.

XXII. Em seguida, com os dedos, o arguido começou a esfregar a zona da vagina da menor, em movimentos ritmados para cima e para baixo, ao mesmo tempo que lhe dava beijos na boca.

XXIII. Depois, estando a menor deitada de barriga para cima, na cama desta, o arguido deitou-se em cima dela, colocando o seu pénis em cima da vagina desta e começando a movimentá-lo em vai-vem, logrando mais uma vez introduzi-lo superficialmente na vagina da menor, a qual com dores, mais uma vez, se retraiu.

XXIV. Temendo que esta gritasse com dores e com isso acordasse a companheira, o arguido então saiu de cima da menor B... e pegando-lhe na cabeça, encaminhou-a em direcção ao seu pénis.

XXV. Depois disse-lhe para que esta abrisse a boca, o que a menor fez, tendo-lhe introduzido o seu pénis na boca da menor, dizendo-lhe ainda como proceder a movimentos de sucção ritmados, com o pénis no interior da boca da menor, o que esta fez (disse à menor para proceder como se “fosse um chupa-chupa), mantendo a menor nesta actividade até ter logrado ejacular, o que fez em direcção aos lençóis da cama da B....

XXVI. Algum tempo depois, estando a menor em casa a brincar com a irmã mais nova e com a mãe na cozinha, a B... disse ao arguido que ia contar à mãe o que ele lhe tinha feito, ao que este, de imediato, lhe desferiu um pontapé no ouvido, causando-lhe intensas dores.

XXVII. A menor, nunca contou nada à mãe e sujeitava-se às práticas que o arguido lhe impunha e acima indicadas, por este lhe dizer que lhe batia e matava a família se esta não fizesse o que lhe dizia ou se contasse alguma coisa a alguém.

XXVIII. A menor a tudo se sujeitava em silêncio e com muito medo do arguido.

XXIX. Em data não concretamente apurado de Março de 2011, por volta do Carnaval, da parte da tarde, a menor B... encontrava-se em casa sozinha com o arguido.

XXX. Este despiu a totalidade da roupa que trazia vestida, ficando integralmente nu.

XXXI. Foi então e assim ter com a menor B..., levando-a para o quarto que o arguido partilhava com a mãe da menor.

XXXII. Ali tirou a totalidade da roupa da menor B..., ficando esta também completamente nua.

XXXIII. Sabendo o que iria ocorrer a seguir e já não aguentando tais práticas, a menor B... desta vez ainda desferiu um pontapé no arguido procurando libertar-se e fugir dele.

XXXIV. Este, contudo e atenta a sua superioridade física, agarrou na menor, manietando-a, colocando-a do seguinte modo:

XXXV. Virou a menor com a barriga de frente para a cama e de costas para si.

XXXVI. Obrigou-a a curvar-se, colocando as mãos da criança em cima da cama.

XXXVII. Depois o arguido colocou-se por detrás da menor, agarrando-a deste modo e colocou o seu pénis erecto na vagina da menor, abordando-a por detrás e com esta curvada da forma acima descrita.

XXXVIII. Depois começou a movimentar o seu pénis erecto de forma ritmada, procurando novamente introduzi-lo no interior da vagina da menor, o que só logrou de forma muito superficial – pois a menor ao sentir dores, novamente se retraiu, dificultando tal penetração.

XXXIX. O arguido mais uma vez manteve-se nesta conduta até ejacular, o que fez para cima do édredon que estava colocado na cama da mãe da menor e onde também ele dormia.

XL. Depois o arguido colocou as cuecas dos dois a lavar e foi tomar banho.

XLI. Não suportando mais esta situação, no dia 10 de Março de 2011 a menor pediu ajuda na escola, tendo de imediato sido chamada a mãe da criança, que posta ao corrente da situação – que desconhecia em absoluto – de imediato terminou o relacionamento que mantinha com o arguido e tomou as providências devidas para proteger a criança.

XLII. O arguido bem sabia que a menor B... tinha apenas onze anos quando manteve com esta os contactos de cariz sexual acima indicados e que ocorreram em três ocasiões distintas.

XLIII. Estes ocorreram sempre na casa da menor e onde o arguido residia por na ocasião ser companheiro da mãe da criança.

XLIV. O arguido sabia perfeitamente a idade da menor, a sua inerente incapacidade em avaliar o desvalor das condutas que sobre esta praticava, querendo e conseguindo utilizá-la para satisfazer os seus instintos libidinosos, do modo acima indicado, o que ocorreu em três ocasiões distintas.

XLV. Para lograr que a menor se sujeitasse a tais práticas sem oposição, o arguido quis e conseguiu proferir expressões e adoptar condutas idóneas a atingir o sentimento de segurança e tranquilidade de qualquer cidadão, bem como da ofendida, como atingiram, a qual ficou convicta que se manifestasse oposição às condutas do arguido ou as contasse a terceiros, o arguido era capaz de lhe causar a ela ou aos seus familiares alguma lesão grave, irreversível ou até mortal, fins que o arguido representou e logrou alcançar.

XLVI. O arguido agiu sempre de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas lhe estavam vedadas por lei.

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Outros Factos Provados:

O arguido tem vindo a evidenciar, desde a terceira década de vida , uma perturbação esquizoafetiva (F25 da CID-10).

Um tal quadro psicopatológico, corresponde em psiquiatria a uma doença grave e com carácter crónico, caracterizada pela presença tanto de sintomas esquizofrénicos, com ideias delirantes, alucinações e alterações do comportamento, e, também, por perturbações do humor, com sintomas afetivos de tipo depressivo (e/ou maníaco).

Um tal quadro psicopatológico não o impedia de avaliar da ilicitude dos seus atos ou de se determinar de acordo com essa avaliação.

Um tal quadro carece de um regular e adequado acompanhamento médico-psiquiátrico por parte de instituição de saúde vocacionada para o acompanhamento deste tipo de patologia.

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O processo de desenvolvimento de A... ocorreu no seio da família nuclear constituída, pelo pai, a mãe e duas irmãs. A família residiu em (...), num anexo da casa dos avós maternos, sendo que A... se encontrava mais a cargo dos avós do que dos pais.

Quando tinha 10 anos os pais divorciaram-se e a mãe com os filhos, estabeleceu residência na (...), povoação mais próxima do seu local de trabalho, Hospital (...).

Até aos 17 anos apresentou um processo desenvolvimental normativo, nunca tendo sido detetada qualquer perturbação de comportamento. Concluiu o 11º ano de escolaridade na escola x... com 18 anos e no seu percurso escolar contabiliza duas retenções, uma no ensino básico e outra no 9º ano de escolaridade.

Com 17 anos começaram a surgir problemas do foro psiquiátrico tendo iniciado acompanhamento nessa especialidade, situação que mantém ainda atualmente.

À data, as grandes alterações de comportamento prendiam-se com o facto de sofrer de alucinações auditivas e visuais.

No seu percurso de vida sofreu vários internamentos no Hospital (...) e no Hospital (...), sendo que, alguns dos internamentos ocorreram na sequência de recaídas por falta de toma da medicação. Muito cedo, cerca dos 24 anos foi reformado por invalidez absoluta, com diagnóstico de esquizofrenia paranoide e como meio de subsistência recebe 379 euros de pensão de invalidez.

Com uma das companheiras residiu cerca de um ano e desse relacionamento nasceu uma filha, atualmente com 6 anos de idade.

A nível social não são conhecidos comportamentos conflituosos ou desadequação relacional significativa. Contudo, o arguido está sinalizado pela comissão social local da junta de freguesia de (...), que conhecendo o seu diagnóstico psiquiátrico faz supervisão sobre relacionamento público entre o arguido e a filha, numa tentativa de prevenir qualquer incidente.

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O arguido não tem antecedentes criminais.

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Factos Não Provados:

O Arguido fora dos períodos de remissão é incapaz de compreender como se comportar em sede de relacionamento afectivo e de conformar a sua actuação com as regras de conduta socialmente aceites, sendo incapaz de compreender a censura quanto àquelas condutas que lhe vêm imputadas e cuja infracção constitui o tipo legal pelo qual vem acusado;

O Arguido, no momento dos factos que lhe vêm imputados não se encontrava em período de remissão;

E estava incapaz de compreender a censura ética e jurídica das condutas que lhe vêm imputadas;

O Arguido e B... tomavam banho juntos e nus;

O Arguido e B... dormiam, esporadicamente, juntos, com o conhecimento e a com a concordância da mãe de B...;

O Arguido e B... beijavam-se na boca;

A B... ia, nua, deitar-se com o Arguido e pedia-lhe para a tocar de modo sexual;

O Arguido perdeu o sentido e a relação com o sistema da realidade, fruto da sua doença;

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CONVICÇÃO DO TRIBUNAL:

A prova é apreciada de acordo com as regras da experiência e a livre convicção do julgador (art. 127º do C. Processo Penal), liberdade que não pode nem deve significar o arbítrio ou a decisão irracional “puramente impressionista-emocional que se furte, num incondicional subjectivismo, à fundamentação e à comunicação” (Prof. Castanheira Neves, citado por Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, I, 43).

Pelo contrário, a livre apreciação da prova exige uma apreciação crítica e racional, fundada, é certo, nas regras da experiência, mas também nas da lógica e da ciência, e tudo para que dela resulte uma convicção do julgador objectivável e motivável, únicas características que lhe permitem impor-se a terceiros.

Ensina o Prof. Figueiredo Dias (Lições de Direito Processual Penal, 135 e ss.), que no processo de formação da convicção há que ter em conta os seguintes aspectos: - a recolha dos dados objectivos sobre a existência ou não dos factos com interesse para a decisão, ocorre com a produção de prova em audiência, - é sobre estes dados objectivos que recai a livre apreciação do tribunal, como se referiu, motivada e controlável, balizada pelo princípio da busca da verdade material, - a liberdade da convicção anda próxima da intimidade pois que o conhecimento ou apreensão dos factos e dos conhecimentos não é absoluto, tendo como primeira limitação a capacidade do conhecimento humano, portanto, as regras da experiência humana, assim, a convicção assenta na verdade prático-jurídica, mas pessoal, porque para a sua formação concorrem a actividade cognitiva e ainda elementos racionalmente não explicáveis como a própria intuição.

Esta operação intelectual, não é uma mera opção voluntarista sobre a certeza de um facto, e contra a dúvida, nem uma previsão com base na verosimilhança ou probabilidade, mas a conformação intelectual do conhecimento do facto (dado objectivo) com a certeza da verdade alcançada (dados não objectiváveis), e para ela concorrem as regras impostas pela lei, como sejam as da experiência, da percepção da personalidade do depoente – aqui relevando, de forma especialíssima, os princípios da oralidade e da imediação – e da dúvida inultrapassável que conduz ao princípio “in dubio pro reo” (cfr. Ac. do T. Constitucional de 24/03/2003, DR. II, nº 129, de 02/06/2004, 8544 e ss.).

Não se tratará pois, na “ convicção”, de uma mera opção “voluntarista” pela certeza de um facto e quanto à dúvida, ou operada em virtude da alta verosimilhança ou probabilidade do facto, mas sim de um processo que só se completará quando o tribunal por uma via racionalizável ao menos a posteriori, tenha logrado afastar qualquer dúvida para a qual pudessem ser dadas razões, por pouco verosímil ou provável que ela se apresentasse”.

Daí que haja necessidade de tais comprovações serem sempre motivadas.

Por sua vez, a prova da verificação nos crimes de natureza sexual, por força das circunstâncias, é particularmente difícil, na medida em que escasseia a prova directa, e regra geral só têm conhecimento da maioria dos factos o arguido e a vítima. Daí que assuma especial relevância o depoimento da vítima, desde que, como é evidente, o mesmo seja credível e esteja em sintonia com as regras da experiência comum, pois só nesse caso é susceptível de formar a convicção do julgador.

Conforme refere o Acórdão da Relação do Porto de 6.3.1991, «I. O Tribunal coletivo aprecia livremente a prova e não está inibido de socorrer-se das declarações dos ofendidos desde que credíveis e coerentes. II. Tratando-se de crimes sexuais, essas declarações têm especial valor, dado o ambiente de secretismo que rodeia o seu cometimento» (in CJ, T.II, p. 287)

No caso presente, a prova do crime imputado ao arguido assentava essencialmente nas declarações da menor ofendida. Tendo a mesma à data dos factos 11 anos, a valoração do seu depoimento exige do tribunal especiais cuidados. Desde logo, estando em face de uma situação de cariz sexual a mesma não pode deixar de se apresentar à menor com as dificuldades inerentes ao seu estado de desenvolvimento intelectual e sexual. Daqui decorre que a apreensão que a mesma possa fazer da realidade não pode ser a mesma que um adulto faria na mesma situação. Neste sentido, o tribunal terá que estar atento à prova, designadamente às suas declarações e aos depoimentos das pessoas que com ela conviveram e a quem esta relatou os factos, por forma a depurar aquilo que é o seu discurso, daquilo que possa ser um discurso importado de um qualquer adulto designadamente da sua mãe.

Por outro lado, uma criança com 11 anos não tem um desenvolvimento intelectual que lhe permita construir por si uma estória falsa totalmente coerente e credível, juntando pormenores de cariz sexual que a mesma não vivenciou.

Antes de proceder a tal apreciação há que atender ao facto de não ter sido deduzido qualquer pedido de indemnização civil o que em nosso entender afasta qualquer condicionante monetária que levasse à criação de uma realidade diversa da efectivamente ocorrida.

Só tendo em atenção este pano de fundo é possível compreender as suas declarações para memória futura e lhes dar o devido valor probatório.

Quanto às declarações para memória futura da ofendida menor as mesmas convenceram o tribunal da sua veracidade uma vez que das mesmas transparece o perfil psicológico da menor supra referido, e em nenhum momento das suas declarações transparece qualquer sentimento de vingança, ou qualquer incoerência que não seja justificável pelas condicionantes psicológicas e emocionais da menor. Com efeito, a menor de uma forma consistente, coerente e credível relatou os factos nos termos constantes da acusação, confirmada pela pronúncia, não havendo nos autos quaisquer factos que contrariem as suas declarações antes havendo outros elementos objetivos que corroboram as mesmas.

Destas declarações destacam-se as seguintes passagens:

Das declarações da menor resulta que no primeiro momento - que a menor situa no mês de Setembro de 2010 - o arguido começou-a a abraçá-la e a dar-lhe beijos na boca, dizendo "é como os namorados fazem" esclarecendo que "Tentou pôr dentro do meu bibi, que..." "Doeu e deitei sangue", reforçando ainda que ele tentou fazer mais força para entrar. Após refere que "Ainda o vi a enrolar a minha roupa e a dele no tapete que levou para o lixo. Depois fui para o meu quarto com medo. Estava cheiinha de medo". Refere que pela janela observou ele a arrancar com o carro pelo que presumiu que tivesse ido deitar a roupa e o tapete a um caixote de lixo longe dali (a mãe deu por falta dessa roupa conforme referido pela mãe em audiência de julgamento). Com efeito a mãe ouvida em audiência de julgamento refere que nesse dia encontrou a filha já com o pijama vestido, o que não era normal, mas embora lhe tenha perguntado qual o motivo, ela não respondeu e fechou-se no quarto.

A menor refere perentoriamente que não teve coragem de contar à sua mãe ou a qualquer outra pessoa pois o arguido ameaçou que ia matar "o tio E... (o seu padrinho) quando ele “tivesse num ensaio de música, porque ele é DJ” (sic) e que, se o fizesse, para a próxima vez lhe batia” sendo certo que “...nessa noite ele não saiu de casa, talvez para assegurar que não contava nada...". A menor é perentória ao referir que tal ameaça ocorreu em todas as três situações mencionadas na acusação.

Na segunda vez que o arguido a abordou sexualmente - que a menor situa em Janeiro de 2011 -, refere que nessa altura, "estava lá a minha mãe e a G... no quarto dela para dormir ...". Esclareceu que também dessa vez fez força para “entrar a pilinha dele” mas não conseguiu porque “doeu”. Mais referiu que não conseguiu pedir ajuda porque ele colocou-se em cima e com o peso dele não o conseguiu.

Refere que quando o mesmo lhe mexia com a mão, metia-a “no bibi, começando a pôr para cima e para baixo" (disse com o dedo indicador esticado movendo-o para cima e para baixo) e em Janeiro pediu-lhe para dar um beijo no pénis e empurrou-a para baixo para que praticasse coito oral nele (exemplificou com o dedo, colocando-o na boca e fechando-a em torno dele, meteu e tirou o dedo várias vezes), "como se fosse um chupa-chupa". Desta feita, ele ejaculou para os lençóis, "saiu um líquido meio amarelado e começou a dizer eu, eu, au" (sic), "como se estivesse a desfazer-se, (...) como se estivesse a gostar"

Relatou, ainda, que um dia em que a sua mãe estava a fazer o jantar e estava a brincar com a G..., com uns carros, sentada no chão. Entretanto disse ao padrasto: "Ó A..., agora é que vou contar mesmo à minha mãe e ele deu-me um pontapé no ouvido, e ele sabia que eu tinha problemas de ouvidos". Depois foi ter com a sua mãe a chorar e contou-lhe que tinha sido a G... a fazê-lo, pois ele pediu e tinha medo de não fazer as coisas que ele dizia, "ele ameaçava" (este depoimento foi corroborado pelo depoimento da mãe audiência de julgamento)

Já a última vez, ocorreu na altura do Carnaval em Março de 2011, altura em que se encontrava sozinha com o arguido em casa, da parte da tarde. Ele levou-a para o quarto da mãe, despiu-a, ficando completamente nua, sendo que ele também já assim estava. Ainda lhe deu um pontapé mas ele obrigou-a a colocar as suas mãos em cima da cama, tendo ficado com as costas voltadas para ele, em pé mas debruçada sobre a cama. Nessa ocasião, ele colocou o seu pénis junto da vagina e começou a esfregar, acabando por sair novamente o líquido do pénis para cima do édredon existente na cama. Depois vestiu-se, foi pôr as cuecas de ambos para lavar e foi tomar banho.

Acrescenta que ele quis ver consigo filmes de cariz pornográfico que tinha no computador portátil, "vocês não vão encontrar, ele escondeu" . Descreve como tendo "um homem e uma mulher adultos, a fazer relações todos nus" (sic). O filme intitula-se "Comando do meu primo", e o arguido agarrava-lhe com força no braço para não sair, "".e se eu virasse assim, ele punha-me assim a cara para ver." (sic) e dizia-lhe "este és tu e eu e aquilo que nós fazemos e vamos fazer no futuro" (o que veio em parte a ser corroborado pela análise do computador do arguido - exame de exame direto de fls. 137 a 139)

A menor foi sujeito a Avaliação Psicológica, encontrando-se o respectivo relatório de fls. 104 a 112, de onde se sublinha que ". ..denota a existência de alguma ambivalência afectiva (situação frequente em casos de abuso sexual intrafamiliar)." e que " ...não foram detectados indícios que levem a pôr em causa a credibilidade do discurso da menor ou a supor que esta tenha tendência para fantasiar.".

Por sua vez, o Relatório da Medicina-Legal (cfr. fls. 51 a 53 e 99 a 101) relativo à Perícia de Natureza Sexual que foi efetuado à menor resultou que "Não foram encontrados (...) quaisquer elementos que nos permitam afirmar ou infirmar que sobre a examinada tenham sido exercidas práticas sexuais, importando assinalar que a ausência de vestígios físicos não significa que o abuso sexual não possa ter ocorrido, uma vez que num grande número dessas situações não resultam vestígios.", no entanto, "A nível genital observou-se uma área discretamente nacarada na face medial do pequeno lábio esquerdo que não é possível excluir tratar-se de vestígio de lesão traumática não recente. ".

Do exame pericial feito ao telemóvel do arguido constante de fls. 66 a 70 donde o mesmo através das mensagens aonde o mesmo admite ter tido contactos de natureza sexual com a menor ainda que não admita expressamente qualquer penetração ou violência (vide mensagens de 12.3.2011 e 16.3.2011).

Mais se atendeu ao exame das dependências da casa aonde ocorreram os factos e aonde foram recolhidos os vestígios sujeitos a exame pericial, conforme alegado pela menor (cf. fls. 71 a 97). Analisados tais vestígios em exame pericial, concluiu-se que um dos vestígios do lençol de baixo e outro do lado acima do quarto de criança corresponde a material biológico do arguido A... (cf. fls. 149 a 151) o que corrobora a versão apresentada pela menor.

Quanto aos factos relativos ao relacionamento da mãe da menor com o arguido o tribunal atendeu ao depoimento daquela que confirmou os factos mencionados na acusação quanto a esta matéria.

Quanto ao estado psicológico e psiquiátrico do arguido o tribunal atendeu ao teor do relatório pericial de fls. 333 a 340 o qual não foi contrariado pelo depoimento dos peritos em audiência de julgamento, antes saiu reforçado quando o médico psiquiatra taxativamente referiu que o mesmo tinha capacidade para avaliar a sua conduta e conformá-la de acordo com a avaliação que da mesma fez, não tendo a sua doença do foro psiquiátrico a potencialidade de excluir tal capacidade. Por outro lado, nenhuma prova foi feita que o arguido estivesse a sofrer nos momentos referidos na acusação de qualquer situação de alucinação, tanto mais que se tal ocorresse seria a mesma facilmente detetável pelas pessoas que com ele conviviam, designadamente a menor e a mãe, o que não ocorreu. Com efeito, esta doença quando se manifesta em situações de alucinação ou delírio é perfeitamente detetável uma vez que há alterações da forma, posse e conteúdo do pensamento traduzidos na ação do individuo. Por fim, é de assinalar que o arguido após tais práticas sexuais teve sempre a preocupação de eliminar todos os vestígios que o pudessem comprometer, o que demonstra uma conduta racional incompatível com uma atuação delirante que caracteriza a doença.

Por fim, não pode o tribunal deixar de dar o devido relevo ao relatório pericial de fls. 51 a 53 donde constam as declarações da menor aos peritos em termos similares aos já declarados à JIC. Nesta matéria é relevante a referência constante que a menor faz de que o arguido colocou o pénis à entrada da vagina forçando a sua entrada e sentiu dores, acabando o arguido por não prosseguir com a sua ação. Daqui resulta em nosso entender, em conjugação com as demais declarações da menor em sede de declarações para memória futura já supra mencionados, que houve penetração parcial ou superficial do canal vaginal, uma vez que tal justificará as dores tidas pela menor e o sangramento[1]1, não se opondo a tal conclusão o facto de o himen não ter sido rasgado. A menor ao referir que o arguido não conseguiu mas doeu, tendo inclusive deitado sangue, em nosso entender, quer referir que houve apenas uma penetração parcial ou superficial do canal vaginal da menor. Com efeito, não nos podemos esquecer que só nesta parte do órgão sexual feminino - a vagina - é que estamos perante um canal musculomembranoso fortemente suprido por vasos sanguíneos e linfáticos. Em face do desenvolvimento anatómico da menor só aqui se situaria a resistência à introdução do pénis do arguido, com a consequente dor e sangramento como aconteceu em todas as vezes - a dor - tendo o sangramento ocorrido, como seria natural, na primeira vez. Qualquer cópula vulvar não provocaria por si só dor ou sangramento, uma vez que nestes casos estamos apenas perante a fricção da Glande peniana na Fenda vulvar sem penetração.

Pelo exposto, entende o tribunal que o arguido nos três momentos enunciados na acusação penetrou com o seu pénis, ainda que parcialmente, no canal vaginal da menor.

Por fim, atentas as declarações da menor e da própria mãe não resultam minimamente provados os factos alegados pelo arguido na sua contestação quanto ao comportamento da menor, tanto mais que estes não são compatíveis com a idade da menor e o relacionamento normal que uma menor daquela idade tem com um adulto. A ter existido tais práticas seriam sempre constatadas pela mãe da menor, sendo que esta nega quaisquer comportamentos dessa natureza.

Mais se atendeu à certidão de nascimento da menor a fls. 301.

Quanto às condições económicas do arguido atendeu-se ao relatório da DGRSP.

No que diz respeito aos antecedentes criminais, o Tribunal atendeu ao teor do CRC de fls. 411.

3. Apreciação

a.

Tendo sido documentadas, através de gravação, as declarações prestadas oralmente na audiência de julgamento, poderá este tribunal conhecer de facto [cf. os artigos 363.º e 428.º do CPP], desde que se mostre cumprido o disposto no artigo 412.º, n.ºs 3 e 4 do CPP.

Nos termos do n.º 3 do citado preceito quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente especificar:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; e, eventualmente

c) As provas que devem ser renovadas.

O nível de exigência do recurso em matéria de facto, reforçado com a Reforma de 2007, tem de ser lido à luz do entendimento, sobejamente, afirmado pelos tribunais superiores de que os recursos constituem remédios jurídicos destinados a corrigir erros de julgamento, não configurando, como tal, o recurso da matéria de facto para a Relação um novo julgamento em que este tribunal aprecia toda a prova produzida na 1.ª instância como se o julgamento ali realizado não existisse [cf., vg. os acórdãos do STJ de 15.12.2005, 09.03.2006, 04.01.2007, proferidos, respectivamente, nos procs. n.º 05P2951, n.º 06P461, n.º 4093/06 – 3.ª].

No caso em apreço resulta das conclusões de recurso pretender o recorrente impugnar a matéria de facto, também, na vertente alargada, pois que em execução de tal propósito convoca, senão naquelas pelo menos na motivação donde as mesmas emergem, o teor de declarações, depoimentos, bem como o conteúdo de outros meios de prova – designadamente periciais e respectivos esclarecimentos complementares – elementos, estes, que vão para além do texto do acórdão recorrido, tudo a denunciar que a sindicância requerida a este tribunal extravasa da verificação de eventuais vícios ao nível da lógica jurídica da matéria de facto, da confecção técnica do decidido, apreensíveis a partir do seu texto, a denunciar incoerência interna com os termos da decisão [cf. acórdão do STJ de 07.12.2005, CJ, ASTJ, T. III, pág. 224].

Convém, assim, relembrar que a especificação dos “concretos pontos de facto” só se mostra cumprida com a indicação do facto individualizado que consta da sentença recorrida … que considera incorrectamente julgado, sendo insuficiente a alusão a todos ou parte dos factos compreendidos em determinados números ou itens da sentença, sendo que A exigência legal de especificação das “concretas provas” só se queda satisfeita com a indicação do conteúdo específico do meio de prova [cf. acórdão do TRC de 22.10.2008, proferido no proc. n.º 1121/03.3TACBR.C1].

Significa, pois, que o labor do tribunal de 2.ª Instância num recurso da matéria de facto não é uma indiscriminada expedição destinada a repetir toda a prova (…), mas sim um trabalho de reexame da apreciação da prova (e eventualmente a partir dos) nos pontos incorrectamente julgados, segundo o recorrente, e a partir das provas que, no seu entender, impõem decisão diversa da recorrida – [cf. acórdão do STJ de 24.10.2002 (proc. n.º 2124/2)] (destaque nosso).

Aspecto que não se confunde com a eventualidade de uma outra aproximação à prova, pois caso a mesma consinta duas ou mais decisões de facto e o julgador, fundamentadamente, optar por uma delas em detrimento das outras, a decisão que proferir sobre a matéria de facto é, em princípio, inatacável.

A não observância nem nas conclusões nem na correspondente motivação, na dimensão legalmente exigível, dos ónus de impugnação [cf. n.ºs 3 e 4 do CPP], inviabiliza o «convite ao aperfeiçoamento», pois tal conduziria à distorção/violação do equilíbrio/paridade processual, traduzida na faculdade de o sujeito processual «incumpridor» vir a apresentar um novo recurso, sabido como é que a motivação constitui o limite ao aperfeiçoamento [cf. vg. os acórdãos do TC n.ºs 259/2002, DR, II. S, de 13.12. e 140/2004, DR, II S, de 17.04, bem como, entre outros, os acórdãos do STJ de 17.02.2005 (proc. n.º 05P058), de 09.03.2006 (proc. n.º 06P461), de 28.06.2006 (proc. n.º 06P1940), de 04.01.2007 (proc. n.º 4093/06- 3.ª)].

Contudo, não assumindo uma postura excessivamente formalista não deixaremos de assumir o encargo de, compaginando as conclusões – as quais, não é demais recordar, delimitam o objecto do recurso – com a respectiva motivação, ir, neste domínio, até ao limite do aceitável.

Vejamos, pois.

Numa primeira fase indica o recorrente como incorrectamente julgados os pontos XIII., XXIII e XXXVIII dos factos provados, pugnando no sentido da respectiva alteração, por forma a dos mesmos passar a constar:

- “XIII. A menor com dores contraiu-se e chegou a ter perda de sangue, apesar de não ter havido penetração, sequer superficial, do pénis do arguido no interior da sua vagina”;

- “XXIII. Depois, estando a menor deitada de barriga para cima, na cama desta, o arguido deitou-se em cima dela, colocando o seu pénis em cima da vagina desta e começando a movimentá-lo em vai-vem, não logrando introduzi-lo, sequer superficialmente, na vagina da menor, a qual com dores, mais uma vez, se retraiu”;

- “Depois começou a movimentar o seu pénis erecto de forma ritmada, procurando introduzi-lo no interior da vagina da menor, o que não logrou, sequer de forma superficial – pois a menor ao sentir dores, novamente se retraiu, dificultando tal penetração.

As concretas provas que imporiam decisão diversa da recorrida vem indicadas nos pontos 6. a 30. da motivação, remetendo para: a Informação constante de fls. 7 dos autos; o Relatório de Perícia de natureza sexual de fls. 99 a 101; o Relatório de Avaliação Psicológica efectuada a B... de fls. 104 a 112; as declarações da menor, as quais – em parte significativa transcreve.

É, assim, evidente – como de resto o recorrente se encarrega de esclarecer [cf. ponto 7. da motivação] - que dos factos provados, agora em questão, o que realmente provoca a sua reacção é a consideração [por parte do Colectivo] – como provado – do acto de «penetração», ainda que superficial ou muito superficial.

Deixando de parte a «Informação» de fls. 7, insusceptível de se sobrepor ao Relatório de Perícia de natureza sexual, no que a tal aspecto concerne, nenhum dos elementos probatórios convocados pelo recorrente – no essencial os valorados pelo Colectivo - se nos apresentam de modo a impor decisão diversa da recorrida.

Com efeito, se é certo que o teor do Relatório de Medicina – Legal [Perícia de natureza sexual] efectuado à menor resulta inconclusivo, convocando-se os segmentos realçados na fundamentação da decisão de facto, a saber: “Não foram encontrados (…) quaisquer elementos que nos permitam afirmar ou infirmar que sobre a examinada tenham sido exercidas práticas sexuais, importando assinalar que a ausência de vestígios físicos não significa que o abuso sexual não possa ter ocorrido, uma vez que num grande número dessas situações não resultam vestígios”, no entanto, “A nível genital observou-se uma área discertamente nacarada na face medial do pequeno lábio esquerdo que não é possível excluir tratar-se de vestígio de lesão traumática não recente”, a «interpretação» das palavras da menor – cuja veracidade, na esteira da Avaliação Psicológica de fls. 104 a 112 [da qual se destaca «… denota a existência de alguma ambivalência afectiva (situação frequente em casos de abuso sexual intrafamiliar)» …«não foram detectados indícios que levem a pôr em causa a credibilidade do discurso da menor ou a supor que esta tenha tendência para fantasiar»] o recorrente não questiona – não se nos afigura compatível com a singeleza com que o mesmo a encara, sendo impossível estabelecer qualquer paralelo entre a linguagem/expressão de uma menor de 11 anos de idade [com as dificuldades inerentes ao seu estado de desenvolvimento intelectual e sexual] e a de um adulto, requerendo aquela uma atenção redobrada, por forma a permitir ler nas entrelinhas, leitura, essa, que transparece, à margem da dúvida razoável, ter sido correctamente levada a efeito pelo Tribunal.

Neste sentido respigam-se as seguintes passagens do acórdão:

«Das declarações da menor resulta que no primeiro momento (…) o arguido começou a abraçá-la e a dar-lhe beijos na boca, dizendo “é como os namorados fazem” esclarecendo que “Tentou pôr dentro do meu bibi, só que …” “Doeu e deitei sangue”, reforçando ainda que ele tentou fazer mais força para entrar …».

«Na segunda vez que o arguido a abordou sexualmente …Esclareceu que também dessa vez fez força para “entrar a pilinha dele” mas não conseguiu porque “doeu”.

Refere que quando o mesmo lhe mexia com a mão, meti-a “no bibi, começando a pôr para cima e para baixo” (disse com o dedo indicador esticado movendo-o para cima e para baixo) e em Janeiro pediu-lhe para dar um beijo no pénis e empurrou-a para baixo para que praticasse coito oral nele (exemplificou com o dedo, colocando-o na boca e fechando-a em torno dele, meteu e tirou o dedo várias vezes), “como se fosse um chupa-chupa”. Desta feita, ele ejaculou para os lençóis, “saiu um líquido meio amarelado e começou a dizer au, au“ (sic), “como se estivesse a desfazer-se, (…) como se estivesse a gostar”.

«Já a última vez …, altura em que se encontrava sozinha com o arguido em casa …Ele levou-a para o quarto da mãe, despiu-a, ficando completamente nua, sendo que ele também já assim estava. Ainda lhe deu um pontapé mas ele obrigou-a a colocar as suas mãos em cima da cama, tendo ficado com as costas voltadas para ele, em pé mas debruçada sobre a cama. Nessa ocasião, ele colocou o seu pénis junto da vagina e começou a esfregar, acabando por sair novamente o líquido do pénis para cima do édredon …».

«Por fim, não pode o tribunal deixar de dar o devido relevo ao relatório pericial de fls. 51 a 53 donde constam as declarações da menor aos peritos em termos similares aos já declarados à JIC. Nesta matéria é relevante a referência constante que a menor faz de que o arguido colocou o pénis à entrada da vagina forçando a sua entrada e sentiu dores, acabando o arguido por não prosseguir a sua acção. Daqui resulta em nosso entender, em conjugação com as demais declarações da menor em sede de declarações para memória futura já supra mencionados, que houve penetração parcial ou superficial do canal vaginal, uma vez que tal justificará as dores tidas pela menor e o sangramento …, não se opondo a tal conclusão o facto de o himen não ter sido rasgado. A menor ao referir que o arguido não conseguiu mas doeu, tendo inclusive deitado sangue, em nosso entender, quer referir que houve apenas uma penetração parcial ou superficial do canal vaginal da menor. Com efeito, não nos podemos esquecer que só nesta parte do órgão sexual feminino – a vagina – é que estamos perante um canal musculomembranoso fortemente suprido por vasos sanguíneos e linfáticos. Em face do desenvolvimento anatómico da menor só aqui se situaria a resistência à introdução do pénis do arguido, com a consequente dor e sangramento como aconteceu em todas as vezes – a dor – tendo o sangramento ocorrido, como seria natural, na primeira vez. Qualquer cópula vulvar não provocaria por si só dor ou sangramento, uma vez que nestes casos estamos apenas perante a fricção da Glande peniana na Fenda vulvar sem penetração.

Pelo exposto, entende o tribunal que o arguido nos três momentos enunciados na acusação penetrou com o seu pénis, ainda que parcialmente, no canal vaginal da menor».

Ora, estando este tribunal pelo teor das declarações, prestadas para memória futura, da menor, bem como pela análise dos demais elementos indicados, designadamente periciais, em condições de asseverar a fidedignidade das passagens de uns e outros reproduzidas no acórdão, sopesada a prova indicada pelo recorrente com o propósito de contrariar o acervo factual acima identificado – no fundo, como já afirmámos, no essencial, a mesma de que o Colectivo se socorreu, nenhuma divergência se detectando no que respeita à prova pericial – impõe-se, sem rodeios, concluir que a sua dissidência assenta numa «interpretação redutora» das declarações da menor, realçando as passagens em que esta refere «tentou pôr dentro do meu bibi, só que …»; «Não» [na sequência de haver sido questionada «Mas ele não conseguiu?»; «Tentou» [após ter sido perguntada «E depois ele já não fez mais força para entrar? Ele … mas ele ainda tentou?»], «declarações» que, lidas na íntegra, aliadas ao sangramento [da primeira vez] e às dores sofridas pela menor [em todas elas] – sem descurar a estrutura do orgão sexual feminino -, confere consistência à apreciação do tribunal, cuja razoabilidade se impõe aos olhos do comum das pessoas, à luz das regras da experiência e no «quadro» de desenvolvimento intelectual, psicológico e sexual da miúda, tornando destituídas de fundamento, sério, conjecturas – sem sustentação – de o «sangramento ter sido menstrual» [sem cuidar, contudo, de mencionar o teor completo da rubrica referente aos “Antecedentes ginecológicos e/ou obstétricos» (Relatório Pericial de natureza sexual), no segmento onde se lê: «Refere episódio de perdas sanguíneas vaginais em Dezembro de 2010 que terão sido interpretadas como possível início de menstruação pelo médico assistente, não tendo contudo ocorrido novos episódios»], das dores poderem ter resultado do «coito vulvar», mostrando-se irrelevante, no caso, a argumentação de o hímen não se encontrar rasgado, tendo, quanto a este aspecto, presente a «superficialidade» da penetração.

Concluindo, diremos, que não sufragamos a leitura minimalista das declarações da menor, corroborando, antes, a convicção do tribunal que decorre de um processo que se nos afigura «lúcido», devidamente esclarecido, conforme às regras da experiência, não evidenciando qualquer dúvida razoável, a qual, não vê que se devesse ter colocado, nem se coloca a este tribunal, surgindo, antes, realisticamente suportado.

Em suma, a prova indicada pelo recorrente não impõe decisão diversa da recorrida relativamente aos pontos em referência, os quais, em consequência, se mantém inalterados.

Ainda em sede de impugnação da matéria de facto surgem os invocados erros de julgamento, agora relativamente aos pontos não provados do seguinte teor:

- «O Arguido fora dos períodos de remissão é incapaz de compreender como se comportar em sede de relacionamento afectivo e de conformar a sua actuação com as regras de conduta socialmente aceites, sendo incapaz de compreender a censura quanto àquelas condutas que lhe vêm imputadas e cuja infracção constitui o tipo legal pelo qual vem acusado»;

- «O Arguido, no momento dos factos que lhe vêm imputados não se encontrava em período de remissão»;

- «E estava incapaz de compreender a censura ética e jurídica das condutas que lhe vêm imputadas»;

- «O Arguido perdeu o sentido e a relação com o sistema da realidade, fruto da sua doença», devendo – aduz - ser objecto de alteração de modo a passarem a integrar o acervo factual provado.

Subsidiariamente - prossegue o recorrente - «deve ser alterada a matéria de facto dada como provada, passando os seguintes pontos para a matéria de facto provada [destaque nosso]:

“XLVII. O Arguido fora dos períodos de remissão compreende deficientemente como se comportar em sede de relacionamento afectivo e como conformar a sua actuação com as regras de conduta socialmente aceites, sendo deficientemente capaz de compreender a censura quanto àquelas condutas que lhe vêm imputadas e cuja infracção constitui o tipo legal pelo qual vem acusado.”

“XLVIII. O Arguido, no momento dos factos que lhe vêm imputados não se encontrava em período de remissão.”

“XLIX. E estava deficientemente capaz de compreender a censura ética e jurídica das condutas que lhe vêm imputadas.”

“L. O Arguido perdeu, ligeiramente, o sentido e a relação com o sistema da realidade, fruto da sua doença».

Mais deveria passar a constar dos factos provados um ponto LI. do seguinte teor: «O regime dos estabelecimentos comuns prisionais será prejudicial ao Arguido e ele prejudicará seriamente tal regime” – [cf. pontos 3. a 8. das conclusões], no seguimento do que conclui o recorrente:

«Ou o Arguido é inimputável, faltando-lhe a capacidade de entender a sua conduta, devendo ser-lhe aplicada uma medida de segurança, tendo o douto Tribunal violado o art. 91º, do Código Penal, e devendo ser revogada a decisão em crise e substituída por uma outra que decrete o internamento do Arguido;

«Ou, subsidiariamente, o Arguido tem a sua imputabilidade diminuída, devendo ser internado em estabelecimento destinado a inimputáveis, pelo tempo correspondente à duração da pena que lhe venha a ser imposta, tendo o douto Tribunal violado o nº1, do art. 104º, do Código Penal, e devendo ser revogada a decisão em crise e substituída por outra que decrete o internamento do Arguido em estabelecimento destinado a inimputáveis, pelo tempo correspondente à duração da pena que lhe venha a ser imposta» - [cf. pontos 11. e 12 das conclusões].

No que concerne às concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida quanto aos factos, ora, em apreço – em sede de motivação – indica o recorrente: O Relatório de Exame Médico – Legal Psiquiátrico de fls. 308 e 309; O Relatório da Perícia Médico – Legal/Perícia Psiquiatra, constante de fls. 333 a 340; O depoimento da testemunha H..., Médico Psiquiatra, referido na Acta de audiência de discussão e julgamento de 20.12.2013, com gravação através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no douto Tribunal recorrido, iniciado às 17.39” e terminado às 18.04”; Esclarecimento dos peritos I...e J... , referidos na Acta de audiência de discussão e julgamento de 20.12.2013, com gravação do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação em uso no Tribunal recorrido, iniciados às 18.05 e terminados às 18.52, prova donde extraí os factos alinhados nos pontos 33. a 38. da motivação – referindo expressamente que «Os depoimentos e esclarecimentos referidos simplesmente alicerçam os referidos relatórios» - retomados nas conclusões, dirigidos, no essencial, à sua inimputabilidade ou, em alternativa, a um «estado» de imputabilidade diminuída capaz de conduzir à aplicação do n.º 1 do artigo 104.º do Código Penal

Também, nesta matéria, convém relembrar o que em sede de fundamentação da decisão de facto ficou a constar do acórdão recorrido:

«Quanto ao estado psicológico e psiquiátrico do arguido o tribunal atendeu ao teor do relatório pericial de fls. 333 a 340 o qual não foi contrariado pelo depoimento dos peritos em audiência de julgamento, antes saiu reforçado quando o médico psiquiatra taxativamente referiu que o mesmo tinha capacidade para avaliar a sua conduta e conformá-la de acordo com a avaliação que da mesma fez, não tendo a sua doença do foro psiquiátrico a potencialidade de excluir tal capacidade. Por outro lado, nenhuma prova foi feita de que o arguido estivesse a sofrer nos momentos referidos na acusação de qualquer situação de alucinação, tanto mais que se tal ocorresse seria a mesma facilmente detetável pelas pessoas que com ele conviviam, designadamente a menor e a mãe, o que não ocorreu. Com efeito, esta doença quando se manifesta em situações de alucinação ou delírio é perfeitamente detetável uma vez que há alterações da forma, posse e conteúdo do pensamento traduzidos na acção do indivíduo. Por fim, é de assinalar que o arguido após tais práticas sexuais teve sempre a preocupação de eliminar todos os vestígios que o pudessem comprometer, o que demonstra uma conduta racional incompatível com uma atuação delirante que caracteriza a doença».

Malgrado, uma vez mais, o recorrente não estabelecer a necessária correlação entre os concretos pontos incorrectamente julgados e as concretas provas que relativamente a cada um deles impõem decisão diversa da recorrida, é perfeitamente perceptível o sentido da preconizada alteração, visando a «declaração» da sua «condição» de inimputável ou, na ausência de «lastro» para tanto, pelo menos, «padecer» de uma imputabilidade diminuída, conducente à aplicação do regime de internamento em estabelecimento destinado a inimputáveis.

Vigorando em processo penal o princípio da «Livre apreciação da prova», de acordo com as regras da experiência e da livre convicção [artigo 127.º do CPP], é o próprio legislador que cuida de abrir excepções, designadamente quanto ao valor da prova pericial.

Com efeito, o valor probatório da perícia é fixado pela lei, não sendo o respectivo resultado livremente valorável pelo tribunal. Dito de outra forma o juízo do perito encontra-se subtraído ao princípio da livre apreciação da prova, devendo o julgador fundamentar a divergência em relação às conclusões do perito [artigo 163.º, n.ºs 1 e 2 do CPP].

É certo que nem toda a divergência entre o perito e o julgador é relevante, contudo, a fundamentação da divergência relativamente a juízos técnico-científicos-artísticos deve assentar em razões de ordem técnica, científica ou artística e não já, tão só e sobretudo, em meras inferências, circunstâncias ou aspectos derivados de raciocínios resultantes das regras da experiência comum, por mais razoáveis e lógicos que surjam aos olhos do julgador. A argumentação do tribunal tem, consequentemente, de se situar no domínio do perito. Assim, «O julgador fundamenta suficientemente a sua divergência, por exemplo quando: adere às conclusões da opinião vencida numa perícia colegial; adere às observações expressas pelo consultor técnico; adere a uma das opiniões perante uma ou mais perícias com resultados contraditórios» - [cf. Paulo Pinto de Albuquerque, «Comentário do Código de Processo Penal», pág. 445 e na jurisprudência vg. o acórdão do TRC de 15.05.2006, CJ. XXXI, III, pág. 43], ou seja o juiz só pode dissentir de tais juízos, opondo-lhes um juízo contrário ou divergente igualmente científico – [cf. neste sentido Figueiredo Dias, “Direito Processual Penal”, I, 209; Germano Marques da Silva, “Curso de Processo Penal”, II, 153; o acórdão do STJ de 01.10.2008, proc. n.º 08P2035, disponível em www.dgsi.pt/jstj.]

Da análise do acórdão em referência resulta expressamente do texto da decisão que o Colectivo aderiu ao resultado da perícia psiquiátrica médico-legal, acompanhada do relatório de avaliação psicológica em contexto médico - legal, cuja realização foi solicitada pelo arguido [no requerimento de abertura da instrução] na qual se incluem as respostas aos «quesitos» apresentados pelo ora recorrente, não contrariados – antes corroborados - pelos esclarecimentos prestados em audiência pelos respectivos peritos [cf. fls. 304 a 306, 313, 334 a 339].

Vale a pena, pois, respigar as conclusões da perícia psiquiátrica médico – legal [fls. 334 a 337] incidente sobre o recorrente, realizada no Instituto de Medicina Legal, do seguinte teor:

«1. O examinando tem vindo a evidenciar, desde a terceira década da vida, uma Perturbação esquizoafectiva (…).

2. Para os factos de que vem indiciado, um tal quadro psicopatológico não o impedia de avaliar da ilicitude dos seus atos ou de se determinar de acordo com essa avaliação, pelo que, do ponto de vista psiquiátrico-forense e para os factos de que vem indiciado, tão só são de admitir atenuantes (ligeiras) à sua imputabilidade [destaque nosso].

3. Um tal quadro carece de um regular e adequado acompanhamento médico-psiquiátrico, por parte de instituição de saúde vocacionada para o acompanhamento deste tipo de patologias, como forma de influenciar positivamente (e na medida do possível) o prognóstico do caso, sendo que na eventualidade de vir a ser determinado o cumprimento de pena de prisão efetiva por parte do examinado, o regime dos estabelecimentos comuns prisionais, lhe será prejudicial ou ele prejudicará seriamente tal regime» [destaque nosso].

Convocando, agora, a resposta aos quesitos formulados pelo arguido/recorrente, temos que:

a. Sobre o quesito: « A... sofre de alguma perturbação do foro psiquiátrico, nomeadamente esquizofrenia ou psicose-esquizofrénica?», pronuncia-se a perícia: «Sim, Perturbação Esquizoafetiva».

b. Sobre o quesito: «Na positiva, A..., tem períodos em que é incapaz de compreender ser censurável praticar ou tentar praticar cópula e/ou coito oral com rapariga de 11 anos?», pronuncia-se a perícia: «Não».

c. Sobre o quesito: «Na positiva, entre Agosto de 2010 e 10 de Março de 2011, A... já sofria de alguma perturbação do foro psiquiátrico, nomeadamente esquizofrenia ou psicose-esquizofrénica?», pronuncia-se a perícia: «Sim, de Perturbação Esquizoafetiva».

d. Sobre o quesito: «Na positiva, A..., entre Agosto de 2010 e 10 de Março de 2011, … estava incapaz de compreender ser censurável praticar ou tentar praticar cópula e/ou coito oral com rapariga de 11 anos?», pronuncia-se a perícia: «Não».

Relevante, ainda, a seguinte passagem do identificado Relatório, onde se mostra consignado: «Para os factos de que vem indiciado (…) não se apura a existência (à data) de sintomatologia de nível psicótico (ou outra) que o impedissem (ou impeçam) de avaliar em toda a sua extensão da licitude ou ilicitude dos seus atos ou de se determinar de acordo com a avaliação feita» - o que, desde logo, torna destituído de interesse o alegado período de remissão/ não remissão em que o arguido se encontraria por ocasião das suas acções, porquanto irrelevante à luz do relatório de perícia psiquiátrica médico-legal realizado pelo INM.

Ora, sendo este o quadro, perante a já evidenciada força que merece a prova pericial, determinada de acordo com a lei, resulta inequívoco não haver lugar para outra decisão de facto, não podendo os juízos científicos que encerra ser contrariados pelo relatório de Exame Médico-Legal Psiquiátrico [datado de 15.03.2012] junto pelo recorrente de fls. 308/309, levado a efeito pelo seu médico assistente fora do âmbito do processo e, como vem referido no Relatório de Perícia Psiquiátrica Médico – Legal, «aparentemente para fins de reforma por invalizez», tão pouco pelo depoimento de H..., o qual, sendo, embora, o psiquiatra que assiste o recorrente foi ouvido na qualidade de testemunha, diferentemente dos peritos I...e J...subscritores do Relatório de Perícia Psiquiátrica Médico-Legal e de Avaliação Psicológica efectuada em contexto médico-legal.

Já no que concerne à invocada inconsideração no seio do acórdão em crise do ponto 3. das conclusões da dita perícia psiquiátrica, a saber: «Um tal quadro carece de um regular e adequado acompanhamento médico-psiquiátrico, por parte de instituição de saúde vocacionada para o acompanhamento deste tipo de patologias, como forma de influenciar positivamente (e na medida do possível) o prognóstico do caso, sendo que na eventualidade de vir a ser determinado o cumprimento de pena de prisão efetiva por parte do examinado, o regime dos estabelecimentos comuns prisionais, lhe será prejudicial ou ele prejudicará seriamente tal regime», afigura-se-nos assistir alguma razão ao recorrente enquanto pretende ver vertido nos factos provados este último segmento [destaque nosso].

Na verdade, ainda em sede de factos provados, após considerar que «Um tal quadro psicopatológico não o impedia [reportando-se ao arguido] de avaliar da ilicitude dos seus atos ou de se determinar de acordo com essa avaliação», consignou o Colectivo: «Um tal quadro carece de um regular e adequado acompanhamento médico-psiquiátrico por parte de instituição de saúde vocacionada para o acompanhamento deste tipo de patologia» [cf. fls. 431 – com destaque nosso], sem que, contudo, tenha dado como assente [provado] que «o regime dos estabelecimentos comuns prisionais, lhe será prejudicial ou ele prejudicará seriamente tal regime» circunstância de relevo à luz do disposto no artigo 104.º, n.º 1 do Código Penal – regime por cuja aplicação, ainda que «subsidiariamente» se debate o recorrente, não acompanhando nós, nesta parte, o entendimento preconizado pela Exma Procuradora da República quando faz apelo ao regime de execução das penas no âmbito do qual, é certo, não são irrelevantes os factores de saúde do recluso, designadamente física e mental, na ponderação da sua afectação a determinado estabelecimento prisional - [cf. os artigos 5.º, 9.º e 20.º da Lei n.º 115/2009, de 03.09], sendo tal competência do director-geral dos Serviços Prisionais, circunstância que, salvo o devido respeito, não pode ser confundida com a decisão no sentido de ordenar o internamento do agente [não declarado inimputável] em estabelecimento destinado a inimputáveis pelo tempo correspondente à duração da pena, decisão, esta, de natureza judicial e não administrativa.

Sendo, pois, inequívoco no que a tal respeita o sentido do relatório de perícia psiquiátrica médico-legal, no ponto destacado pelo recorrente, impõe-se alterar a matéria de facto provada, aditando-lhe no item «Outros Factos Provados», imediatamente a seguir ao segmento «Um tal quadro carece de um regular e adequado acompanhamento médico-psiquiátrico por parte de instituição de saúde vocacionada para o acompanhamento deste tipo de patologia», o seguinte facto: «Em consequência do quadro psicopatológico de que o arguido já era portador à data dos factos delituosos a que se reportam os autos o regime dos estabelecimentos comuns prisionais é-lhe prejudicial ou ele perturbá-lo-à de forma séria».

No mais, não impondo – bem pelo contrário – a prova indicada decisão diversa da recorrida – em qualquer das «versões» preconizadas, com o único objectivo de contrariar, por um lado, o acto de «penetração, ainda que superficial», por outro a «imputabilidade» do arguido -, não se detectando vício ao nível da confecção técnica da decisão, juízos ilógicos, irrazoáveis tirados em violação das regras da experiência, do comum acontecer das coisas da vida, ou evidenciando alguma dúvida razoável, menos, ainda, derrogação de prova pericial, considera-se, com o aditamento ao acervo factual provado do facto descrito supra, definitivamente fixada a matéria de facto.

b.

Em consequência da preconizada alteração da matéria de facto no que respeita à verificação do acto de «penetração», que quis colocar em causa, insurge-se o recorrente contra a subsunção jurídico - penal dos factos no(s) crime(s) de violação, defendendo, antes, a sua recondução aos crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo artigo 171.º, n.º 2 e 171.º, n.º 3, al. a), ambos do Código Penal - [cf. os pontos 16., 17., 18. e 19. das conclusões, com o «desenvolvimento» constante dos pontos 61. a 66 da motivação].

Não tendo procedido, neste concreto aspecto, o invocado «erro de julgamento», única objecção colocada ao enquadramento jurídico - penal, poderíamos ser tentados a ficar por aqui.

Não obstante, dado estarmos agora no domínio do direito vejamos o que a propósito vem consignado no acórdão, do qual se respiga:

No crime de violação o bem jurídico protegido pela incriminação é a liberdade sexual de outra pessoa. Quanto ao grau de lesão do bem jurídico protegido, a violação é um crime de dano. Quanto à forma de consumação do ataque ao objecto da acção, é um crime de mera actividade (cf. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário ao Código Penal, p. 449).

O tipo objectivo consiste no constrangimento da vítima a sofrer ou praticar, consigo ou com outrem, um ou mais actos sexuais de especial relevo: cópula, coito anal, coito oral, introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objectos sendo que a vítima do crime pode ser pessoa do sexo masculino ou feminino, maior ou menor de idade. A menoridade da vítima é relevante para efeitos de agravamento da moldura penal e da definição da natureza do procedimento criminal. O agente do crime pode ser uma pessoa do sexo masculino ou feminino, maior de 16 anos, sendo, portanto, um crime comum. Pode ser cometido por acção ou omissão (…).

A cópula, tal como o coito anal ou oral, constituem crime de violação quer a vítima tenha uma posição activa (“praticar, consigo ou com outrem”), quer tenha uma posição passiva (“sofrer”) na relação sexual. A introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objectos só constitui crime de violação quando a vítima tem posição passiva, isto é, quando “sofre” a introdução. Sendo a vítima constrangida a penetrar o agente ou outrem na vagina ou no ânus com partes do corpo ou objectos verifica-se o crime de coacção sexual (…).

Para o preenchimento do tipo objetivo exige-se sempre a introdução completa ou incompleta do órgão sexual masculino na vagina, não se bastando com a chamada cópula vestibular ou vulvar (cf. Mouraz Lopes, Os Crimes contra a Liberdade e Autodeterminação Sexual no Código Penal, 4.ª ed., p. 45 – vide ainda Acórdão da Relação de Coimbra de 17.2.1993, in CJ, T. I, p. 70).

Quanto ao elemento violência ou ameaça grave, sufragamos o entendimento plasmado por Mouraz Lopes no citado livro aonde o mesmo refere que, «Trata-se no fundo de impedir a valoração de consentimento da vítima quando esta não é totalmente livre. Daí que, quando perante uma situação de coacção, moral ou física, que leve a vítima a aderir à cópula, ainda assim se estará perante uma situação de violência e, como tal, passível de integrar o crime. Importará, no entanto atender à diferença que a própria lei estabelece entre a utilização da violência e a utilização de ameaças graves ou de meios que coloquem a vítima na impossibilidade de resistir. Trata-se de situações objectivamente diferentes que como tal, têm que ser avaliadas. Por um lado, necessário é, sempre, que entre a conduta do agente do crime e a prática sexual de relevo em causa se verifique um nexo de causalidade. Assim, por exemplo, se alguém, utilizando o conhecimento que tem sobre um facto pessoal da vítima, que esta não quer ver divulgado, a coage, com a divulgação dessa informação, a ter relações sexuais consigo, pode estar-se no âmbito de um crime de violação, se o acto sexual em causa for a cópula, desde que essa informação – o meio coactivo – tenha suficiente peso para, em termos de causalidade adequada, levar a vítima a ter de praticar o acto. De igual modo a ameaça da prática de actos de violência contra um terceiro, familiar próximo da vítima, ou que com ela tenha uma relação de facto muito próxima, consubstanciará a possibilidade de concretização do crime» (idem, p. 51/52).

Na avaliação da idoneidade do meio empregue para consubstanciar uma situação de violência ou ameaça grave há que atender a vários fatores designadamente a idade da vítima, o seu desenvolvimento psicológico, bem como condicionantes psicológicas ou físicas, ainda que temporárias, existentes à data dos factos.

No caso em apreço, estando em causa uma menor de 11 anos há que atender ao estado de desenvolvimento psicológico e físico da mesma em relação ao arguido, bem como ao peso que os afetos e as ligações familiares têm nas crianças desta idade.

Note-se que as ameaças graves que o arguido exerceu sobre a menor – ameaçando que matava o tio/padrinho da mesma com quem aquela tinha uma forte relação emocional – foram anteriores aos factos uma vez que o arguido com tal ameaça nas três vezes referidas na acusação obrigou-a a sofrer os comportamentos em causa. De qualquer modo, as ameaças – na situação descrita no n.º 1, al. a), do art.º 164.º do CP – serviram não só para a silenciar em relação ao que já se passara mas também para a constranger severamente quanto a atos idênticos que se lhes seguissem e efetivamente se lhes seguiram.

O tipo subjetivo admite qualquer modalidade de dolo. O agente deve representar a oposição da vontade da vítima.

Não é admissível o crime continuado de violação quando ela implique violência física ou psíquica, pela razão de que o dolo deste meio de supressão da vontade da vítima é incompatível com a constatação de uma diminuição considerável da culpa. Dito de outro modo, não há culpa sensivelmente atenuada onde o agente utilize repetidas vezes violência física ou psíquica sobre a vítima (…).

Quanto à agravante do n.º 6 do art.º 177º do Código Penal, referida a vítimas menores de 14 anos, visa-se tutelar o direito à proteção da sexualidade numa fase inicial ou em desenvolvimento, que, pelas suas características, é carecida de tutela jurídica (…).

Tendo presente tais considerações e atenta a matéria assente dúvidas não restam ao tribunal que o arguido por três vezes – em Setembro de 2010, Janeiro e Março de 2011 – obrigou a menor de 11 anos contra a vontade dela a ter com ele relações sexuais, tendo em todas estas vezes ocorrido penetração superficial do pénis do arguido no interior da sua vagina (sendo que em Janeiro de 2011 acresce a prática de coito oral). O arguido, sabia da idade da menor e só conseguiu realizar os seus intentos porque ameaçou a menor que se não aderisse aos seus intentos mataria o seu padrinho.

Temos assim que o arguido por meio de ameaça grave constrangeu a menor a praticar consigo cópula vaginal e coito oral – este em Janeiro de 2011.

O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei, não havendo qualquer elemento probatório que leve o tribunal a concluir que o arguido naquelas datas estivesse incapacitado pela sua doença de compreender e avaliar a ilicitude da sua conduta, tanto mais que a conduta de o mesmo eliminar todos os vestígios do seu comportamento logo após as práticas sexuais denota uma atuação racional que entende que o que fez é ilícito e criminalmente punível e visa com tal atuação impedir que seja descoberto. Estamos assim perante um ato que nada tem a ver com uma conduta delirante ou a coberto de qualquer delírio que se caracteriza pela sua própria natureza pela irracionalidade da conduta. Se o arguido estivesse numa fase em que a doença se manifestava não teria tido qualquer preocupação em eliminar os vestígios da sua atuação uma vez que não entenderia a mesma como ilícita ou criminalmente punível.

Nestes termos, concluindo-se que o arguido é, para estes factos, imputável, porque capaz de compreender a ilicitude dos seus atos e de se orientar em face dessa avaliação, deverá o mesmo ser condenado pela prática de três crimes de violação agravada, p. e p. pelo art.º 164º, n.º 1, al. a) e 177º, nº 6 do Código Penal.

Apreciação que não nos merece reserva, pois que se mostram reunidos os elementos típicos – objectivos e subjectivos – dos crimes de violação agravada em referência, os quais, aliás – como já dito – só surgem contestados em função da negação – sem sucesso, embora – da apurada «penetração superficial».

Como tal, por sufragarmos em matéria de qualificação jurídico-penal, a análise do Colectivo, quer quanto ao constrangimento da menor por meio de «ameaça grave» - traduzida, no caso, na ameaça da prática de actos de violência contra um familiar próximo da vítima com quem a mesma mantinha uma relação muito próxima, o que tem de ser visto à luz do estado de desenvolvimento psicológico de uma menor de 11 anos de idade e do «peso que os afectos e ligações familiares têm nas crianças desta idade» - a sofrer, além do mais, «cópula» - concretizada com a penetração - superficial, embora - do pénis na sua vagina – o que não se confunde com a cópula vulvar ou vestibular -, estando o arguido ciente da idade da vítima, quer quanto ao tipo subjectivo – o qual se basta com qualquer modalidade de dolo - transparecendo acertado o enquadramento jurídico-penal levado a efeito no acórdão recorrido.

Não se mostram, assim, violados as normas a propósito convocadas pelo recorrente.

c.

Carece, igualmente, de fundamento a pretensão do recorrente quando defende a «aplicação» ao caso do crime continuado, chamando, para o efeito, à colação o artigo 30.º, n.º 3 do Código Penal na redacção introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro - posteriormente alterada pela Lei n.º 40/2010, de 3 de Setembro – e, bem assim, a circunstância de a primeira acção criminosa haver ocorrido em Setembro de 2010, ou seja em momento anterior à entrada em vigor da alteração intoroduzida ao citado preceito pela Lei n.º 40/2010.

Talvez deficiência nossa, reportando-se as condutas criminosas subsequentes [a Setembro de 2010] a Janeiro de 2011 e Março de 2011, tendo presente a data de consumação de um eventual crime continuado, ocasião em que já vigorava a «nova» redacção do dito n.º 3 do artigo 30.º, não se entende o fio condutor da argumentação, a propósito, apresentada.

De qualquer forma, ainda que a última acção delituosa se desse no domínio de vigência da anterior redacção da citada norma, também, aqui, secundamos a posição do Colectivo quando consigna: «Não é admissível o crime continuado de violação quando ela implique violência física ou psíquica, pela razão de que o dolo deste meio de supressão da vontade da vítima é incompatível com a constatação de uma diminuição considerável da culpa. Dito de outro modo, não há culpa sensivelmente atenuada onde o agente utilize repetidas vezes violência física ou psíquica sobre a vítima (…)».

Na verdade, olvida o recorrente que o n.º 3 do artigo 30.º do Código Penal – na redacção anterior - não pode ser dissociado do seu n.º 2, o que conduz a que previamente se assente na verificação de uma unificação jurídica de um concurso efectivo de crimes que protegem o mesmo bem jurídico, fundada numa culpa diminuída, residindo, por conseguinte, os seus pressupostos: na realização plúrima de violações típicas do mesmo bem jurídico; na execução essencialmente homogénea das violações e no quadro de solicitação do agente que diminui consideravelmente a sua culpa.

Com efeito como refere o acórdão do STJ de 05.11.2008 [proc. n.º 08P2812], «… sempre que é a mesma a pessoa do ofendido em bens eminentemente pessoais, a jurisprudência deste STJ maioritariamente entendeu que a plúrima violação de bens daquela natureza, cometida por forma substancialmente homogénea, num quadro temporalmente unificado, só integra aquela figura se ocorrer um quadro exterior ao agente que diminua consideravelmente a culpa do agente.

É, pois, uma questão de culpa de que o aplicador da lei não pode divorciar-se, e que com dificuldade se pode ver, por ex.º, em caso de abusos sexuais de crianças, incapazes de avaliarem os seus actos, mesmo que consentidos, por a lei presumir, “juris et de jure”, a vontade de livre disposição do seu corpo ou obstarem a que outrém o faça.

 (…)

Este STJ, de 25.5.2005, em recurso da decisão da Relação, tributário daquele pensamento, afirmou que sem circunstâncias exteriores ao agente redutoras da culpa não concorre a figura do crime continuado e, depois do exame da matéria de facto, foi muito claro em afirmar que “ … dos factos provados não resulta que esta reiteração criminosa tenha sido fruto mais de uma falada situação exterior (circunstâncias exógenas) do que de motivos endógenos inerentes à personalidade do arguido.

Resulta, ao invés, ter sido o próprio arguido a criar e a dominar o condicionalismo favorável à concretização do seu propósito criminoso quanto ao cometimento dos crimes em questão”

E mais afirmou que não surgiram “circunstâncias exteriores facilitando o crime”, antes estas apresentaram-se conscientemente procuradas por ele próprio para concretizar a sua intenção”

Reportando-se ao segmento normativo em questão, discorre o aresto «não possuir o mesmo um alcance inovador, que conduziria a um chocante e absurdo resultado de ter de ver-se o agente do crime, sobretudo em caso de as vítimas serem crianças de tenra idade e muito jovens ou mentalmente incapazes, justamente os mais indefesos da sociedade e serem eles os mais desprotegidos, punido, apenas, por um só crime quando sobre a vítima se praticaram vários, ofendendo o sentimento jurídico reinante no seio da comunidade.

Isto mais visível é no caso de crianças vivendo sob o mesmo tecto do abusador em que em lugar de manter contenção e respeito sobre o seu instinto sexual aquele exerce acção infrene e assim mais censurável, como nos parece inevitavelmente ser …»

E, prosseguindo «Mas seguramente temos como assente que o legislador não quis divergir da orientação do antecedente e assim a violação plúrima de bens eminentemente pessoais de que é vítima uma mesma pessoa só é crime continuado se concorrer o circunstancialismo de que a lei o faz depender, esse sendo o alcance da remissão do n.º 3 para os n.ºs 2, do art.º 30.º, do CP, e de cujos pressupostos não quis abdicar, afastando-o, então, pela verificação da inexistência de um quadro exterior ao agente reduzindo-lhe o grau de culpa, facilitante do resultado, antes por ele criado, aproveitando-se da fragilidade da criança, do seu ascendente ou de um método enganoso.

O aditamento não permite, pois, uma interpretação segundo a qual uma violação plúrima de bens eminentemente pessoais em que a ofendida é a mesma pessoa se reconduza automaticamente ao crime continuado, afastando-se um concurso real (cfr. Ac. do STJ, de 8.11.2007, p.º n.º 3296/07 – 5.ª Sec, acessível in www.dgsi.pt), só significa que o tribunal deve constatar, esgotantemente, se se mostrarem preenchidos os seus pressupostos enunciados no n.º 2, de que se não pode desligar numa interpretação sistemática e global do preceito.

Interpretação em contrário seria, até, manifestamente, atentatória da CRP, restringindo a um limite inaceitável o respeito pela dignidade humana, violando o preceituado no art.º 1º, comprimindo de forma intolerável direitos fundamentais em ofensa ao disposto no art.º 18.º, da CRP.

Na mesma linha de orientação o acórdão do STJ de 23.01.2008 (proc. n.º 07P4830), quando refere «Nos termos do art. 30.º, n.º 2 do CP, constitui um único crime a prática repetida do mesmo tipo legal de crime, executada de forma essencialmente homogénea, e no quadro de uma solicitação exterior que diminua a culpa do agente.

Este último elemento constitui o fundamento da unificação criminosa: a diminuição da culpa do agente, resultante da “cedência” a uma solicitação exterior. Por isso sempre que a repetição da conduta criminosa seja devida a uma tendência da personalidade do agente, a quaisquer razões de natureza endógena, ou sempre que ocorra independentemente de qualquer solicitação externa, ou que decorra de oportunidade provocada ou procurada pelo próprio agente, haverá pluralidade de crimes e não crime continuado.

O elemento unificador das condutas consiste na diminuição da culpa do agente, e não na unidade de resolução criminosa ou na homogeneidade da actuação delitiva. Esta última, assim como a proximidade temporal das condutas, é um elemento meramente indiciário da continuação criminosa, que deverá ser confirmado pela verificação de uma solicitação exterior mitigadora da culpa. Por sua vez, a unidade de resolução criminosa nem sequer existe no crime continuado, pois o que o caracteriza esta figura é precisamente a renovação de tal resolução perante as solicitações externas exercidas sobre o agente».

A respeito da «diminuição sensível da culpa» não podemos deixar de acompanhar as palavras de Pinto de Albuquerque, quando, a propósito do abuso sexual de uma mesma criança, refere «A ciência médica e a experiência da vida mostram que o abuso sexual repetido de uma criança provoca uma tortura psicológica na criança que vive no pavor constante de vir a ser mais uma vez abusada pelo seu abusador. A consciência, o aproveitamento e até o gozo do abusador com esta tortura psicológica são incompatíveis com a afirmação de uma culpa diminuída do agente abusador. Quando for esse o caso, não há diminuição sensível da culpa, ao contrário há uma culpa agravada do agente do crime (inteiramente certos a este propósito, INÊS FERREIRA LEITE, 2004:153, e MAIA GONÇALVES, 2007: 649). E o que se disse para o abuso sexual de uma criança, vale, de igual modo, para a reiteração dos crimes contra as pessoas em que o agente do crime usa de ameaça grave, violência, abuso de autoridade resultante de uma relação familiar, de tutela ou curatela ou de uma dependência hierárquica, económica ou de trabalho ou aproveitamento de temor causado sobre a vítima. Em síntese, não há continuação criminosa, por falta do requisito legal da diminuição sensível da culpa, sempre que o agente, para cometer um crime contra as pessoas, usa de ameaça grave, violência, abuso de autoridade resultante de uma relação familiar, de tutela ou curatela ou de uma dependência hierárquica, económica ou de trabalho ou aproveitamento de temor causado sobre a vítima. Daí, a necessidade de a jurisprudência ser particularmente rigorosa na aferição dos pressupostos subjectivos da continuação criminosa que revelem a diminuição sensível da culpa, como também sublinha muito justamente FIGUEIREDO DIAS (2007: 1041).

A diminuição sensível da culpa só tem lugar quando a ocasião favorável à prática do crime se repete sem que o agente tenha contribuído para essa repetição. Isto é, quando a ocasião se proporciona ao agente e não quando ele activamente a provoca. No caso de o agente provocar a repetição da ocasião criminosa (por exemplo, ele procura de novo a vítima no local onde ela se encontra, sendo certo que de outro modo ele não se cruzaria com ela), não há diminuição sensível da culpa (com inteira razão, INÊS FERREIRA LEITE, 2004: 155, e SILVA DIAS, 2007:111). Ao invés, a culpa pode até ser mais grave, por revelar firmeza e persistência do propósito criminoso» - [cf. «Comentário do Código Penal», Universidade Católica Editora, pág. ob. cit. pág. 139].

No caso concreto, muito embora o arguido tenha repetido o mesmo tipo legal, a verdade é que os factos provados não revelam esse pressuposto essencial da considerável diminuição da culpa; pelo contrário, o que dos mesmos decorre é que o arguido, determinado pela vontade de satisfazer os seus instintos libidinosos, procedeu a um aproveitamento calculado de situações – seja por via da ausência da mãe da menor, seja pela circunstância de a mãe da criança se encontrar a dormir noutro quarto – para melhor concretizar o seu propósito criminoso.

Em suma, se a conduta do arguido não preenchia a figura do crime continuado antes da alteração ao Código Penal, introduzidas pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, igualmente não o configura à luz da mesma, pois a lei nova é coincidentemente portadora de uma mesma eficácia punitiva, em nada o beneficiando, manifestando-se uma mesma continuidade normativo-típica, não se excluindo a pluralidade criminosa quando vítima é a mesma, se não concorrerem os pressupostos da continuação criminosa, tal como no n.º 2 do art.º 30.º, do CP, se definem.

Bem andou, pois, o Colectivo quando, em face dos factos apurados, excluiu o crime continuado.

d.

Decorrendo dos factos provados ser o arguido já à data da prática das condutas delituosas portador de uma perturbação esquizoafectiva, correspondendo em psiquiatria a uma doença grave e com carácter crónico, carecendo de um regular e adequado acompanhamento médico – psiquiátrico e, bem assim, que o regime dos estabelecimentos comuns prisionais lhe é prejudicial ou ele perturbá-lo-à de forma séria, mostram-se presentes os pressupostos conducentes ao seu internamento em estabelecimento destinado a inimputáveis pelo tempo correspondente à duração da pena – artigo 104.º, n.º 1 do Código Penal.

Com efeito, encontra-se o citado normativo «ligado à preocupação de resolver o problema daqueles indivíduos que são declarados imputáveis mas que, em virtude de anomalia psiquica, se não afeiçoam ao regime vigente nos estabelecimentos para imputáveis», SIMAS SANTOS/LEAL HENRIQUES, 1999, p. 232 (…).

Não se trata, consequentemente, de uma medida de segurança, limitando-se o art.º 104. a “jogar” com o conceito de inadaptados ou indisciplinados , para os quais o regime dos estabelecimentos comuns é prejudicial …» - [cf. M. Miguez Garcia e J.M. Castela Rio, “Código Penal; Parte geral e especial”, 2014, pág. 435/436].

No quadro descrito, impõe-se, pois, determinar o internamento do arguido nos termos do artigo 104.º, n.º 1 do Código Penal,

III. Decisão

Nos termos expostos acordam os juízes que compõem este tribunal em julgar parcialmente procedente o recurso e, em consequência:

a. Aditar aos factos provados «Em consequência do quadro psicopatológico de que o arguido já era portador à data dos factos delituosos a que se reportam os autos o regime dos estabelecimentos comuns prisionais é-lhe prejudicial ou ele perturbá-lo-à  de forma séria»;

b. Determinar o internamento do arguido/recorrente em estabelecimento destinado a inimputáveis pelo tempo correspondente à duração da pena única de 11 [onze] anos de prisão que lhe foi cominada no acórdão recorrido [artigo 104.º, n.º 1 do C. Penal];

c. Em tudo o mais manter inalterado o acórdão recorrido.

Sem tributação

Coimbra, 22 de Outubro de 2014

(Maria José Nogueira - relatora)

(Isabel Valongo - adjunta)


[1] Conforme resulta da anatomia do órgão vaginal o canal vaginal é um tubo músculo-membranáceo mediano, que superiormente insere-se no contorno da parte média da cérvix do útero e para baixo atravessa o diafragma urogenital para se abrir no pudendo feminino, cujo orifício chama-se óstio da vagina. Por sua vez, o óstio da vagina é obturado parcialmente por um diafragma mucoso, denominado hímen. A cópula vulvar consiste apenas na fricção da Glande peniana na Fenda vulvar sem penetração. Com efeito a fenda vulvar é a abertura anterior da vulva, situada entre os grandes lábios, e que limita externamente a vagina