Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
24/09.2TTLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: RAMALHO PINTO
Descritores: DESPEDIMENTO ILÍCITO
RETRIBUIÇÃO
TRABALHADOR
SUBSÍDIO DE DESEMPREGO
Data do Acordão: 11/12/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA – LEIRIA – SECÇÃO DE TRABALHO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 437º, Nº 1 DO CT DE 2003.
Sumário: I – Decorre do artº 437º, nº 1 do CT de 2003 que, em caso de despedimento ilícito e sem prejuízo da indemnização prevista na al. a) do nº 1 do artº 436º CT, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal.

II – Às retribuições referidas deduzem-se as importâncias que o trabalhador tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento – nº 2; o subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no nº 1, devendo o empregador entregar essa quantia à Segurança Social – nº 3.

III – Para poder beneficiar das deduções a que se refere o artº 437º CT/2003 e que digam respeito aos rendimentos auferidos desde o despedimento até ao encerramento da audiência de discussão e julgamento da acção declarativa, a entidade empregadora tem de alegar e provar tal matéria nessa mesma acção declarativa.

IV – O montante único de subsídio para criação do próprio emprego concedido no âmbito de candidatura a medida de iniciativas locais de emprego, regulada pela Portaria 196-A/2001, de 10/03, não é um subsídio de desemprego.

Decisão Texto Integral:

                       

                        Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

                        Nesta acção em que é Autor - A... e Ré  - B..., SA, veio o Autor deduzir o presente incidente de liquidação alegando que:

                        - a sentença condenatória transitou em julgado em 27.09.2010;

                        - nela foi a Ré condenada, na sequência de declaração de despedimento ilícito, a pagar ao Autor  as quantias referentes às retribuições que deixou de auferir desde 14 de Dezembro de 2008 até ao trânsito em julgado daquela sentença, nos termos do artº 437º do Código do Trabalho de 2003;

                        - de 14.12.2008 até então computam-se retribuições que deixou de auferir no montante total de € 17.576,83;

            - durante esse período o Autor recebeu um total de € 4.435,71 a título de subsídio de desemprego;

            - pelo que deve fixar-se em € 13.141,83 o montante das retribuições que o Autor deixou de auferir desde 14.12.2008 até ao trânsito em julgado da sentença.

            A Ré respondeu alegando que o autor:

            - no período entre 2008-11-11 a 2009-06-30 o Autor recebeu a título de subsídio de desemprego efetivamente a quantia de € 5.126,70 e não a referida por ele;

            - em Julho de 2009 o Autor recebeu do Instituto de Segurança Social a quantia de € 20.283,00 a título de subsídio de desemprego, numa prestação de montante único.

                        Foi proferida sentença, cuja parte dispositiva transcrevemos:

                        “Pelo exposto julgo o presente incidente de liquidação totalmente improcedente por não provado pelo que indefiro o mesmo.

                        Custas pelo autor

                        Valor do incidente: € 13.141,12”.

                                                                       x

                        Inconformado, veio o Autor interpor o presente recurso de apelação,  formulando as seguintes conclusões:

                        […]

                        A Ré contra-alegou, propugnando pela manutenção do julgado.

                        O Exmº Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

                                                                       x

                        Cumpre decidir.

                        Definindo-se o âmbito do recurso pelas suas conclusões, temos, como questões em discussão:

                   - a impugnação da matéria de facto;

                        - se deve ser deduzido às retribuições intercalares devidas ao Autor o montante único para criação do próprio emprego relativo ao remanescente do período de concessão que lhe tinha sido atribuído;

                        - se apenas poderiam ser descontados nas retribuições de tramitação os subsídios de desemprego recebidos dentro do período de 01/07/2009 a 10/01/2012, e nunca a totalidade dos subsídios recebidos.

                                                               x

                        Na 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos:

                        A) Nos autos principais, por sentença já transitada em julgado, foi a ré condenada, entre o mais, a pagar ao autor “as quantias referentes às retribuições que deixou de auferir desde 14 de Dezembro de 2008 até ao trânsito em Julgado desta sentença.”

                        B) Durante o período temporal entre 11.11.2008 a 30.06.2009 o autor recebeu, a título de subsídio de desemprego, um total de € 5.126,70.

                        C) O autor recebeu ainda o Montante único para criação do próprio emprego relativo ao remanescente do período de concessão que lhe tinha sido atribuído (01.07.2009 a 10-01-2012) no montante total de € 20.283,90.

                                                                       x

                        - a impugnação da matéria de facto:

                        Não são necessárias aqui grandes considerações, sendo de aceitar, com uma pequena limitação (do artº 16º da Portaria em questão), o proposto pelo apelante, e que tem tradução nos ofícios de fls. 278 a 280, emanados das autoridades competentes para tanto- ISS e IEFP.
                        Nestes termos, altera-se a redacção dos ponto B) e C) para a seguinte:
                        B) Durante o período temporal entre 11.11.2008 a 30.06.2009 o Autor recebeu, a título de subsídio de desemprego, um total de € 5.126,70, sendo o montante de subsídio de desemprego auferido no valor de € 22,29 / dia;
                        C) O Autor recebeu ainda o Montante Único para criação do próprio emprego relativo ao remanescente do período de concessão que lhe tinha sido atribuído (01.07.2009 a 10.01.2012) no montante total de €20.283,90 no âmbito de candidatura à medida “Iniciativas Locais de Emprego, do Programa de Estímulo à Oferta de Emprego”, regulada pela Portaria 196-A/2001 de 10 de Março, com as alterações introduzidas pela Portaria 255/2002 de 12 de Março – alínea b) do artigo 3º, tendo nesse âmbito beneficiado dos apoios previstos nessa Portaria no artº. 10º (Apoios à Criação de postos de trabalho por iniciativas locais de emprego)e  no art.º 11º (Apoios ao investimento em iniciativas locais de emprego).
                        - a segunda questão- se deve ser deduzido às retribuições intercalares devidas ao Autor o montante único para criação do próprio emprego relativo ao remanescente do período de concessão que lhe tinha sido atribuído:
                        Quanto a isto, decidiu-se na sentença recorrida que “tendo o Montante Único que foi atribuído ao autor origem, inegavelmente, na sua situação de desemprego involuntário, ao abrigo do disposto na presente Portaria, tem de se considerar que o montante recebido a esse título tem de se enquadrar no regime das deduções previstas no art 437º do CTrabalho vigente à altura, pelo que sendo o montante atribuído superior ao montante peticionado tem de improceder a presente liquidação.
                        Vejamos:
                        Como decorre do art.º 437º, nº 1, do CT de 2003 (que é o aqui aplicável), em caso de despedimento ilícito, e  “Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até trânsito em julgado da decisão do tribunal”. Às retribuições referidas deduzem-se: a) as importâncias que o trabalhador tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento – nº 2 ; b) o subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º 1, devendo o empregador entregar essa quantia à Segurança Social - nº 3.
                        Como se afirmou no Ac. desta Relação proferido na apelação nº 253/08.6TTGRD.C1, “a obrigação de pagar ao trabalhador ilicitamente despedido as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até à sentença mais não é do que uma forma de execução forçada do próprio contrato de trabalho, reconstituindo-se entre as partes o sinalagma – o empregador paga a retribuição, e apenas não recebe a prestação (actividade) do trabalhador porque o própria o impediu – cumprindo, de todo modo, o trabalhador a sua obrigação contratual, pois pressupõe-se que se manteve disponível para fornecer a sua actividade laboral. Ora, quando esta disponibilidade não se verificou, porque o trabalhador iniciou ou manteve outra actividade laboral após o despedimento, justifica-se plenamente que o empregador também não tenha de pagar a retribuição, na medida em que o trabalhador seja pago por essa nova ocupação laboral”.
                        Quanto às deduções e nas palavras de Albino Mendes Baptista (Estudos sobre o Código do Trabalho, 2.ª Edição, Coimbra Editora, pg. 244-246), não se prescindindo de uma relação de causalidade entre o despedimento e as retribuições que o trabalhador passou a auferir em virtude deste, a expressão “comprovadamente” tem uma manifesta repercussão em sede probatória, induzindo o entendimento de que o empregador, nas palavras do autor, sempre terá de demonstrar não só que o trabalhador recebeu importâncias como consequência da cessação do contrato, mas também que as não receberia se não fosse o despedimento.
                        Quanto à questão de saber se as deduções à compensação são ou não do conhecimento oficioso pode ver-se, designadamente, o Ac. do STJ de 10/07/2008, in www.dgsi.pt, proc. 08S457, que contém uma resenha de jurisprudência do STJ sobre a matéria, bem como os Ac. do STJ de 1 de Março de 2000, in CJ/STJ t. I e CJ-on line refª 9696/2000, Ac. da Relação do Porto de 16 de Janeiro de 2006, in CJ t. I e CJ-on line refª 7394/2006 e Ac. da Relação de Lisboa de 2 de Junho de 2005, in CJ t. III e CJ-on line refª 3401/2005.
                        No Ac. do STJ de 12 de Setembro de 2012 (in CJ/STJ, t. III/2012) considerou-se que “Sendo entendimento reiterado e pacífico deste Supremo Tribunal e Secção o de que a imperatividade do regime legal (seja o anteriormente à Codificação operada pelo Código do Trabalho/2003, seja o então instituído e/ou o ora vigente) não dispensa o empregador de alegar e provar que o trabalhador auferiu rendimentos de trabalho por actividade iniciada após o despedimento, sem o que não será possível operar/determinar a referida dedução na acção declarativa - como aliás bem a propósito se refere no Acórdão revidendo, invocando, em abono, o Acórdão de 17.6.2010, tirado na Revista n.º 615-B/2001.E1.S1, publicado em www.dgsi.pt/CJ-S.T.J. 2010, II, pg. 253/ss., com diversos outros no mesmo sentido, dentre eles, v.g., o Acórdão de 25.3.2010, prolatado na Revista n.º 690/03.2TTAVR-B.C1.S1 e, mais recentemente, o Aresto tirado na Sessão de 15.12.2011, na Revista n.ºs 282/03.6TTGRD-C.C1.S1 -, sempre pode pretender-se a dedução desses eventuais rendimentos em sede de oposição à execução, enquanto factos extintivos do direito do autor, mas apenas relativamente aos rendimentos reportados ao período subsequente ao encerramento da audiência de discussão e julgamento na acção declarativa, em conformidade com a previsão constante do art. 814.º, g), do C.P.C..”
                        No Ac. do mesmo Supremo Tribunal de 17/6/2010, in www.dgsi.pt, escreveu-se:
                        “A problemática concernente ao ónus de alegação e da prova dos factos demonstrativos da obtenção pelo trabalhador de rendimentos a deduzir, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 13.º da LCCT, não tem sido objecto de tratamento uniforme por parte da jurisprudência, incluindo a deste Supremo Tribunal.
                        Todavia, neste Supremo Tribunal, a jurisprudência tem vindo a orientar-se, há já algum tempo e de modo uniforme, no sentido de que aqueles ónus recaem sobre o empregador (cf., entre outros, os acórdãos de 20 de Setembro de 2006, Processo n.º 899/06, de 14 de Dezembro de 2006, Processo n.º 1324/06, de 12 de Julho de 2007, Processos n.os 4104/06 e 4280/06, de 10 de Julho de 2008, Processo n.º 457/08, e de 25 de Março de 2010, Processo n.º 690/03.2TTAVR-B.C1.S1, todos da 4.ª Secção)”.
                        E no citado Ac. de 14 de Dezembro de 2006:
                        “A dedução dos rendimentos do trabalho auferidos pelo trabalhador em actividades iniciadas posteriormente ao despedimento constitui um facto extintivo do direito do autor, e, como tal, incumbia à ré a alegação e prova dos factos em que se alicerça essa possível dedução, ónus que teria necessariamente de ser cumprido na contestação, já que posteriormente “só podem ser deduzidas, as excepções, incidentes ou meios de defesa que sejam supervenientes, ou que a lei expressamente admita passado esse momento, ou de que se deva conhecer oficiosamente” (artigo 489.º do CPC). Ou seja, a questão teria de ser suscitada e apreciada em primeira instância, o que está, de resto, em sintonia com o estabelecido no artigo 814.º do CPC quanto aos fundamentos da oposição à execução, em cuja alínea g) se refere que a oposição só pode fundar-se em «qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento.»
                        E, em conformidade com a tese assim explicitada, concluiu:
                        «[…] não tendo a ré suscitado, na acção declarativa, a questão da dedução dos rendimentos auferidos pelo trabalhador em actividades iniciadas posteriormente ao despedimento, o acórdão apenas podia salvaguardar a possibilidade de virem a ser deduzidos os rendimentos do trabalho auferidos pelo trabalhador recorrente posteriormente ao encerramento da discussão no processo de declaração».
                        Neste sentido também se pronunciou o mencionado acórdão de 12 de Julho de 2007, Processo n.º 4280/06, aí se tendo afirmado:
                        «Em princípio, é na sentença que aprecia a licitude do despedimento que, havendo elementos para se concluir que o trabalhador auferiu rendimentos, após a cessação do contrato, deve, estando eles quantificados, operar-se a dedução dos proventos auferidos até à data da sentença, condenando-se o empregador em quantia certa — valor das retribuições intercalares menos o valor daqueles proventos — ou, caso não estejam quantificados, proferindo-se, nos termos do artigo 661.º, n.º 2, do CPC, condenação no que vier, posteriormente, a ser liquidado.
                        Quando, na acção declarativa, não é suscitada a questão relativamente a rendimentos auferidos entre o despedimento e o encerramento da discussão, fica precludida, em relação a esse período, a possibilidade de o empregador vir a operar a dedução(-)  
                        E se a sentença proferiu condenação em quantia certa, quanto ao valor das retribuições intercalares, que vem a servir de título executivo — definindo os fins e limites da acção executiva, nos termos do artigo 45.º, n.º 1, do CPC —, a oposição, relativamente ao montante fixado, fundada na dedução de proventos a que se refere a alínea b) do n.º 2 do citado artigo 13.º só é atendível relativamente àqueles que o trabalhador auferiu depois de proferida a sentença, nos termos da alínea g) do artigo 814.º do CPC(-).
                        Nesta perspectiva, não pode considerar-se que ao executar a sentença, nos precisos termos em que ela define o direito do trabalhador, este tem o dever de fazer deduções relativamente às quais a possibilidade de invocação pelo executado se mostra precludida».
                        Na mesma linha de entendimento, o citado acórdão de 10 de Julho de 2008 considerou que, constituindo o despedimento ilícito o facto constitutivo do direito às retribuições intercalares previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 13.º da LCCT, a dedução estipulada na alínea b) do n.º 2 do mesmo preceito, funciona como facto extintivo desse direito, pelo que compete à entidade empregadora, contra quem é invocado o direito a essas retribuições, a alegação e prova de que o trabalhador auferiu rendimentos de trabalho por actividades iniciadas depois do despedimento, acrescentando que «[e]ssa alegação e prova terá que ser feita na acção declarativa: não o tendo sido, fica precludida a possibilidade de a entidade empregadora operar a dedução em relação aos rendimentos auferidos desde o despedimento até ao encerramento da audiência de discussão e julgamento (da acção declarativa). Todavia, já quanto aos (eventuais) rendimentos auferidos após o encerramento da discussão da audiência de julgamento, uma vez que a entidade empregadora não teve oportunidade de, na acção declarativa, alegar e provar os mesmos (cf. art. 663.º, n.º 1, do CPC), é possível a oposição no âmbito da acção executiva, podendo, por isso, alegar e provar a existência desses rendimentos.»
                        Tudo para concluir que a imperatividade do regime acolhido no artigo 13.º da LCCT não dispensa a entidade empregadora de alegar e provar que o trabalhador auferiu rendimentos de trabalho por actividade iniciada após o despedimento, pelo que, se o não fizer, não é possível operar a dedução aludida na alínea b) do seu n.º 2, entendimento que salvaguarda pilares estruturantes do nosso sistema jurídico, como são o princípio do dispositivo e as regras de distribuição do ónus da prova”.
                        Quer isto dizer que, para poder beneficiar das deduções a que se refere o artº 437º do CT/2003 e que digam respeito aos rendimentos auferidos desde o despedimento até ao encerramento da audiência de discussão e julgamento da acção declarativa, a entidade empregadora tem de alegar e provar tal matéria nessa mesma acção declarativa.
                        O referido “montante único” foi entregue ao Autor em Julho de 2009 - cfr. doc. de fls. 245; por sua vez, a audiência de julgamento ocorreu em 28 de Junho de 2010; e a sentença proferida não ordenou que se operasse a dedução a que se refere o nº 2 do referido artº 437º, sendo que a Ré nada alegou nesse sentido e antes da realização da audiência de julgamento, nomeadamente na sua contestação.
                        Assim, e para que o tribunal pudesse oficiosamente operar, nesta fase de liquidação, a dedução desse “montante único” seria necessário que o mesmo pudesse ser qualificado como subsídio de desemprego.
                        O que não é o caso.
                        O subsídio de desemprego é uma prestação do Estado, substitutiva da retribuição, que, uma vez recuperada, tem de ser devolvida à Segurança Social, não redundando por isso num qualquer benefício para o empregador- cfr. citado Ac. do STJ de 12 de Setembro de 2012 e M. Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte II, pg. 960. E o que o nº 3 do artº 437º do CT/2003 visa é o ressarcimento da Segurança Social com as prestações que, por via de um acto ilícito do empregador (despedimento ilícito), teve de suportar através do pagamento do subsídio de desemprego- Ac. da Rel. do Porto de 21/10/2013, in www.dgsi.pt.

                        Como resulta da matéria se facto provada- als. B) e C) e dos documentos de fls.  278 a 280, o Autor recebeu subsídio de desemprego durante o período temporal entre 11/11/2008 e 30/06/2009 e, por outro lado, recebeu o “Montante Único” para criação do próprio emprego relativo ao remanescente do período de concessão que lhe tinha sido atribuído (01/07/2009 a 10/01/2012) no montante total de €20.283,90, no âmbito de candidatura à medida “Iniciativas Locais de Emprego, do Programa de Estímulo à Oferta de Emprego”, regulada pela Portaria 196-A/2001 de 10 de Março, com as alterações introduzidas pela Portaria 255/2002 de 12 de Março – alínea b) do artigo 3º, tendo nesse âmbito beneficiado dos apoios previstos nessa Portaria no artº. 10º (Apoios à Criação de postos de trabalho por iniciativas locais de emprego) e no art.º 11º (Apoios ao investimento em iniciativas locais de emprego)

                        Dispõe, de relevante, essa Portaria 196-A/2001:

                        No respectivo preâmbulo:

                        “O presente regime de incentivos dedica ainda uma particular atenção aos beneficiários das prestações de desemprego, investindo-os na responsabilidade de aproveitar as oportunidades que surjam para a sua integração, quer por via dos apoios previstos para a sua contratação quer por via dos estabelecidos para estimular a sua capacidade de iniciativa individual ou associada. Procura-se, por esta forma, incitá-los a regressar ao mercado de trabalho, prevenindo, em simultâneo, o risco social que constitui a sua exclusão duradoura do mesmo.

                        (...)

                        No que se refere à natureza dos apoios, há que anotar a tentativa de, face à progressiva escassez de recursos financeiros disponíveis, dar passos no sentido de alcançar uma equação mais favorável entre subsídios a fundo perdido e subsídios reembolsáveis. Opta-se, para o efeito, pela atribuição de apoios reembolsáveis, em casos contados, o que permitirá, no futuro, com a intensificação desta lógica, para além de uma evidente economia de meios, alargar o espectro de cobertura de iniciativas com relevância para a prossecução dos fins da política de emprego”.

                        No seu artº 3º, e sob epígrafe “Âmbito de aplicação material”, rege que:

                        “O presente diploma aplica-se a projectos que, originando a criação líquida de postos de trabalho, a preencher por trabalhadores que se encontrem numa das situações previstas nos n.ºs 6.º e 7.º, se enquadrem, pelo menos, numa das seguintes modalidades:

                        a) Apoios à contratação;

                        b) Apoios a iniciativas locais de emprego;

                        c) Apoios a projectos de emprego promovidos por beneficiários das prestações de desemprego;

                        d) Apoios à conversão de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo”.

                        No artº 6º dá-se a noção de desempregado para efeitos de concessão dos apoios previstos em tal diploma:

                        “Desempregado:

                        1- Consideram-se desempregados, para efeitos do disposto no presente diploma, os trabalhadores, inscritos nos centros de emprego, que se encontrem numa situação de desemprego involuntário e que revelem capacidade e disponibilidade para o trabalho.

                        2- Consideram-se igualmente desempregados, para efeitos do disposto no presente diploma, os trabalhadores que se encontrem numa das seguintes situações:

            a) Inexistência anterior de prestação de atividade profissional por conta de outrem ou por conta própria;

            b) Cessação de atividade por conta própria, determinada por causas manifestamente não imputáveis ao trabalhador.

            3- Consideram-se ainda desempregados os trabalhadores que se encontrem contratualmente vinculados a:

            a) Empresa enquadrada em sector de atividade declarado em reestruturação, nos termos legais;

            b) Empresa em processo administrativo ou judicial de recuperação, nos termos legais.

            4- Consideram-se desempregados de longa duração, para efeitos do disposto no presente diploma, os trabalhadores que se encontrem inscritos nos centros de emprego há mais de 12 meses, independentemente de terem celebrado contratos de trabalho a termo, cuja duração conjunta, seguida ou interpolada, não ultrapasse os 12 meses.

            5- Os benefícios previstos no presente diploma podem ainda ser concedidos a pessoas que se encontrem em situação de particular desfavorecimento face ao mercado de trabalho, nos termos a definir por despacho do Ministro do Trabalho e da Solidariedade.”

                        Nos capítulos III e IV de tal Portaria regulamenta-se e exige-se respectivamente o cumprimento de um  “Procedimento de candidatura aos apoios e seu pagamento”  e um posterior “Acompanhamento dos projectos e avaliação do regime”.

                        Assim sendo, não pode deixar de se conferir razão ao apelante quando afirma que  que a natureza do “montante único para criação do próprio emprego” não é a de subsídio de desemprego mas antes, por determinação legislativa plasmada inequivocamente na Portaria nº 196-A/2001 de 10 de Março de 2001 (alterada pela Portaria nº. 255/2002, de 12/03) a natureza de “Apoios” no âmbito de um programa de estímulo à oferta de emprego na componente de criação de emprego.
                        Aliás, tal resulta da seguinte passagem do ofício de fls. 278, oriundo do Instituto da Segurança Social, claramente indiciadora da não consideração desse “montante único” como subsídio de desemprego:
                        “Na sequência do pedido de Pagamento do Montante Global das Prestações de Desemprego (Montante Único) para criação do próprio emprego que apresentou e do parecer favorável do Centro de Emprego da nMarinha Grande, a concessão do Subsídio de Desemprego foi cessada por atribuição do Montante Único, a partir de 01/07/2009. O beneficiário recebeu Montante Único relativo ao remanescente do período de concessão que lhe tinha sido atribuído (01/07/2009 a 10/01/2012), no valor de € 20.283,90 (vinte mil duzentos e oitenta e três euros e noventa cêntimos), ou seja € 22,29 * 910 dias”. (negrito nosso).
                        Assim sendo, e não tendo a respetiva factualidade sido alegada, pela Ré, como lhe competia, em momento próprio- antes da audiência de discussão e julgamento, não pode operar-se a dedução desse “montante único”, procedendo a apelação, embora em montante diferente do peticionado pelo Autor - € 12.450,13 (€17.576,83- € 5.126,70).      
                        E ficando prejudicado o conhecimento da terceira questão, supra-enunciada, objecto do recurso.

                                                           x

            Decisão:

            Nos termos expostos, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação e parcialmente procedente o pedido, revogando-se a decisão recorrida e liquidando-se a condenação genérica vertida na al. c) do ponto 2 da sentença na quantia de € 12.450,13, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito do presente acórdão.

            Custas, em ambas as instâncias, na proporção de vencidos.

                                                           Coimbra, 12/11/2015

                                                          

                                                           (Ramalho Pinto)

                                                          

                                                          

                                                           (Azevedo Mendes)

                                                      

                                                           (Joaquim José Felizardo Paiva)