Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1198/07.2TBFIG.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JOSÉ EUSÉBIO ALMEIDA
Descritores: DIREITO APLICÁVEL
SUBSIDIARIEDADE
INDEMNIZAÇÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL
CONCESSIONÁRIO
Data do Acordão: 10/19/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA FIGUEIRA DA FOZ – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 483º E 1348º, Nº 2, DO CC
Sumário: I – Perante normas com o mesmo conteúdo (normas que concedem o mesmo direito ao pretendente), e mesmo que a pretensão se apresente multiplamente fundamentada, é indiferente a opção do tribunal, órgão que escolhe o Direito aplicável, porquanto, nessa escolha, não está vinculado ao alegado pelas partes (artº 664ºCPC).

II – Se qualquer norma é, em potência, atributiva do direito peticionado, uma delas pode estar mais conforme com a pretensão formulada e, neste sentido, a questão não é a prevalência da norma especial sobre a norma geral, mas da pretensão principal sobre a subsidiária (expressamente invocada ou pressuposta).
III – Invocados os factos que preenchem a norma geral, a aplicação da norma subsidiária só se justifica se e quando nem todos eles ficam provados.
IV – Se o autor alega todos os pressupostos da obrigação de indemnizar (assim configurando a sua acção) e todos ficam provados, quando o juiz aplica o direito (a esses factos) não deve começar por indagar da norma aplicável aos casos em que nem todos se provam.
V – Ocorrido um dano, do que se trata é de saber se quem o sofre há-de suportá-lo ou, em vez, se há alguém responsável pelo dano; havê-lo-á quando alguém haja praticado uma acção causadora do dano e ilícito-culposa. Quando assim aconteça o dano é imputado a esse alguém, que responde por ele, perante o lesado.
VI – O concessionário (o locatário a quem o gozo da coisa foi concedido) continua a ter a tutela aquiliana “em relação a todos os danos na esfera da sua imediação, isto é, em relação aos danos decorrentes de actos que afectem a ligação imediata à coisa e, inclusivamente, aos danos que provoquem a deterioração reparável da coisa”.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra:

1. Relatório

1.1 Os autos na 1.ª Instância

A..., Lda. instaurou a presente acção sumária e, demandando B... e C..., pediu a condenação destes no pagamento (a) da quantia de 10.198,66€ de indemnização por danos, (b) nos juros de mora, e (c) a concluírem as obras de reconstrução do anexo e do abrigo de combustível, pavimentando-os com cimento, rebocando as paredes e colocando a cobertura em chapa metálica ondulada.

Fundamentam a pretensão dizendo, ora em síntese, que são arrendatários de uma imóvel que confina com outro, este propriedade dos réus, onde (estes) iniciaram obras de demolição e escavação, mas que tais trabalhos não foram executados com as cautelas que se impunham nem com a técnica constante do projecto. Com efeito – acrescentam – a escavação não foi feita por pequenos troços nem tomadas medidas de recalcamento e, por isso, provocou o desmoronamento dos muros de sustentação e separação entre os prédios e a derrocada de um anexo, bem como a abertura de um fosso que deixou a céu aberto um tanque de combustível. Porém, os réus não aceitaram a responsabilidade, o que a levou a solicitar parecer sobre as suas causas. Concretizam os danos, nomeadamente relativos à paragem da bomba de abastecimento e terminam a dizer que os demandados não concluíram as obras destinadas a repor a situação anterior.

Os réus contestaram, pedindo a improcedência da acção e, no mesmo articulado, provocaram a intervenção de D..., invocando da sua qualidade de empreiteiro e o direito de regresso. No seu articulado, embora aceitando vários factos alegados na p.i., afirmam que o barracão não faz parte do arrendamento, e também o cumprimento de todas as regras e cautelas que a situação impunha e o projecto previa, acrescentando que as causas do desmoronamento não foram as indicadas, porque começou a chover torrencialmente e o depósito de combustível estava assente em areia, onde se foram acumulando vários resíduos de hidrocarbonetos; dizem que não havia muro de sustentação entre os prédios, nem houve aluimento de terras, mas apenas da areia impregnada com combustível; afirmam que a bomba já estava avariada no início das escavações, que os danos que aceitaram reparar são diferentes dos que ora se invocam e que as quantias pretendidas excedem muito a normal reparação da bomba.

A autora respondeu, negando a versão da contestação e reafirmando o já dito na p.i.

Oportunamente foi admitida a intervenção do chamado como parte acessória, e foi citado. Na sua contestação salientou que não foi o responsável pela direcção dos trabalhos ou pelo material utilizado e, apenas por mera cautela, acrescentou o seu desconhecimento sobre a demolição e escavação, o funcionamento da bomba de combustível ou sequer as causas do sucedido.

Apreciada, depois de contraditório, a questão do valor da causa, foi o mesmo fixado em 13.698,66€ no despacho saneador e na mesma peça relegou-se para conhecimento final a legitimidade da autora, e elaborou-se base instrutória, a qual, após reclamação, veio a ser alterada. Os autos prosseguiram com a realização da audiência de julgamento, onde, depois de inspecção ao local, se procedeu à gravação da prova. Designada data para a fixação da matéria de facto, entendeu o Exmo. Juiz que não estava bem esclarecido sobre uma das causas apontadas para o desmoronamento e, por isso, voltou a ouvir quatro das testemunhas arroladas.

Conclusos os autos, foi proferida sentença que declarou a autora parte ilegítima no que toca ao pedido de reparação dos réus a concluírem obras de reconstrução do anexo e julgou, por isso, a acção parcialmente procedente, condenando os réus a “a) pagarem à autora da quantia de €10.127,33 (dez mil cento e vinte e sete euros e trinta e três cêntimos), acrescida de juros à taxa legal de 4%, contados desde a citação, nos termos conjugados do artigo 559.º do Código Civil, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 200-C/80, de 24 de Junho, e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril” e “b) a concluírem as obras de reconstrução do abrigo da bomba de combustível, pavimentando-o com cimento e colocando a respectiva cobertura em chapa metálica ondulada”.

1.2 O recurso

Os réus, inconformados, vieram recorrer. Pondo em causa alguma matéria de facto e a solução jurídica encontrada, entendem que a Relação deve revogar a decisão da 1.ª instância na parte em que condena os ora recorrentes. Terminaram as suas alegações com as seguintes conclusões:

[…]

A recorrida contra-alegou, pugnando, face à inobservância do disposto no art.º 690.º- A do CPC, pela rejeição dessa parte do recurso; à cautela, no entanto, discriminam as diversas provas que sustentam a correcção do decidido e defendem, igualmente, que o Direito foi correctamente aplicado, devendo improceder a apelação.

1.3 Objecto do recurso

As questões a decidir, derivadas limitativamente das conclusões das alegações dos recorrentes (artigos 684.º, n.º 3 e 690.º, 1 do Código de Processo Civil – CPC – na redacção ainda aplicável aos autos, e sem prejuízo das que imponham conhecimento oficioso ou fiquem prejudicadas pelo conhecimento de outras) são as seguintes:

a) Impugnação dos factos identificados com os números 14.º; 34.º; 40.º, 42.º a 46.º na sentença.

b) Do incorrecto enquadramento do decidido no artigo 1348.º do Código Civil e inexistência da obrigação de indemnizar, atento o facto da instalação do seu depósito ser irregular, porque desconforme à lei.

c) Da concorrência da conduta da recorrida para os danos e da significativa redução da indemnização, no termos do artigo 570.º do CC.

d) Da consideração do relatório pericial como dano emergente.

e) Do contrato de empreitada junto aos autos e consequente responsabilidade do empreiteiro pelos eventuais danos.

f) Da repartição das custas.

Os autos foram a Vistos e nada vemos  que impeça o conhecimento do recurso.

2. Fundamentação

2.1 Fundamentação de facto

2.1.1 Da impugnação dos factos identificados com os números 14.º, 34.º; 40.º, 42.º a 46.º.

[…]

2.1.2 Os factos

Considerando já as alterações a que se procedeu, na sequência da impugnação feita pelos recorrentes, a seguinte a matéria de facto a considerar[1]:

[…]

2.2 O Direito

Como se referiu, a sentença, além do mais[2][3], condenou os réus, ora recorrentes, no pagamento à recorrida da quantia de 10.127,33€, acrescida de juros à taxa legal de 4%, contados desde a citação, e ainda a concluírem as obras de reconstrução do abrigo da bomba de combustível, pavimentando-o com cimento e colocando a respectiva cobertura em chapa metálica ondulada”.

Nas conclusões de direito, oportunamente referidas e depuradas das que mantinham uma dependência directa com os factos impugnados, os recorrentes defendem que não há obrigação de indemnizar ou que, pelo menos, esta teria de ser reduzida (nos termos do artigo 570.º do Código Civil - CC), entendem que o custo do relatório pericial não é um dano emergente, que há responsabilidade do empreiteiro e que houve uma incorrecta repartição das custas.

Apreciando:

2.2.1 Obrigação de indemnizar

2.2.1. a) Prévia apreciação metodológica

O tribunal a quo integrou o deferimento da pretensão da recorrida na previsão do n.º 2 do artigo 1348.º do CC (Código de onde serão as normas doravante citadas sem outra referência) e daí fez derivar a responsabilidade indemnizatória, esclarecendo que, em tais casos, se prescinde da (prova da) ilicitude e culpa, e defendendo que o titular do direito indemnizatório é, não apenas o proprietário do prédio vizinho, mas igualmente (por interpretação extensiva) o proprietário de estabelecimento comercial instalado nesse prédio vizinho: daí, e por isso, a responsabilidade dos recorrentes, independente da (eventual) responsabilidade do empreiteiro, e o direito à reparação da recorrida, não obstante arrendatária do imóvel, já que proprietária de um conjunto de bens (estabelecimento) que foram danificados. No entanto, o tribunal, admitindo a hipótese (“ainda que não fosse”) de inaplicabilidade do citado artigo 1348.º, diz que a autora continuava a ter direito à indemnização, nos termos gerais, ou seja, nos termos do artigo 483.º, pois provou todos os pressupostos dessa obrigação (geral) e, citamos, “sempre se manteria, pois, à luz das regras gerais, a obrigação de indemnizar a cargo dos réus”.

Os factos que, nesta parte, fundaram a decisão da 1.ª instância são os mesmos que deixámos assentes; a aplicação do direito foi a acabada de referir; o recorrente, por seu turno, insurge-se contra a subsunção normativa e afasta a sua responsabilidade com fundamento na ilegalidade (leia-se na instalação ilegal) da construção vizinha.

A metodologia seguida na 1.ª instância (subsumindo o caso na norma especial e subsidiariamente na norma geral) parece, num raciocínio rápido, a metodologia mais adequada. Talvez o não seja, porém. E se a questão pode não levar, no final, a resultado diverso do que se alcançou na decisão sob censura, parece-nos adequado, mesmo assim, que nela nos detenhamos, porquanto (também) equaciona, como seu efeito reflexo, a discordância do recorrente.

Perante os factos provados (que, além do mais, provam a culpa e a ilicitude), e necessariamente deles partindo, teríamos percorrido o caminho metodológico inverso, caminho esse, aliás, que terminaria logo na aplicação do artigo 483.º. Vamos tentar dizer porquê.

O problema colocado[4], prendendo-se com o chamado concurso de normas, traduz-se, nesta oportunidade, num falso concurso (de normas), mesmo que não seja um falso problema (no contexto do recurso, desde logo). Efectivamente, como salienta a doutrina, perante normas com o mesmo conteúdo, diríamos, perante normas que concedem o mesmo direito ao pretendente,[5]e mesmo que a pretensão se apresenta multiplamente fundamentada,[6] será indiferente a opção do tribunal, órgão que escolhe o Direito aplicável (a norma), porquanto, nessa escolha, não está vinculado às partes.

Entendemos, ainda assim, que a eventual indiferença do resultado não cauciona uma completa indiferença de metodologia, melhor dito, de método,[7] sob pena de o intérprete percorrer um alargado – e desnecessário – conjunto de normas. Alargado porque, como é claro, diversas normas podem ser aplicadas a cada caso, todas elas atribuindo o mesmo direito; desnecessário, porque uma basta à pretensão. A questão relevante será, então, a do percurso integrativo dos factos, e esse percurso não pode alhear-se da formulação da pretensão. Diríamos que se qualquer norma é, em potência, atributiva do direito peticionado, uma delas pode estar mais conforme com a pretensão formulada. E neste sentido, sentido que adequa a substância ao processo, a questão não é – ou não é principalmente – a prevalência da norma especial sobre a norma geral, mas da pretensão principal sobre a subsidiária (expressamente invocada ou pressuposta). A norma primeiramente escolhida pelo tribunal da 1.ª instância revela-se específica ou especial em relação ao artigo 483.º; no entanto, olhando a pretensão formulada ao tribunal, ela já será subsidiária e a outra (a geral) será principal. A aparente indiferença na escolha do direito (norma) deve ser corrigida com a pretensão formulada, prevalecendo, se bastante, a que decorre desta última.

O caso em apreço melhor esclarece a nossa ideia: a autora, na sua p.i., invocou o artigo 483.º (o que ao caso nem interessa) e (já interessando) aduziu os factos que preenchem todos os elementos (requisitos) da responsabilidade civil por factos ilícitos; e assim prosseguiu o processo, saneado de acordo com todas as soluções plausíveis de direito. Feito o julgamento e fixados os factos, constatou-se que todos os requisitos da responsabilidade civil alegados (com factos) na p.i. ficaram demonstrados[8]. Perante esses factos, o tribunal começou por aplicar uma norma que beneficiaria o autor: prescindia da ilicitude e da culpa; depois, confirmando que também a ilicitude e a culpa estavam demonstradas, reforçou a condenação dos recorrentes com base na norma geral. Só que, fez todo este percurso metodológico quando já tinha na sua posse a totalidade dos factos provados (e alegados) pela autora (aqui recorrida) para (aplicação do) artigo 483.º.

Em suma, o que defendemos é que, invocados os factos que preenchem a norma geral, a aplicação da norma subsidiária só se justifica se, e quando, nem todos eles ficam provados. No exemplo dos autos, não obstante o alegado na p.i., podia não se ter provado a culpa ou a ilicitude e, mesmo assim, os recorrentes deviam ser condenado, justamente porque existe – entre outras – a norma que constitui o artigo 1348.º. Nesta percepção, chamamos subsidiária à norma que exige menos no contexto da pretensão formulada pelo autor: a questão deixa de ser – apenas – a da livre escolha do direito, mas a ponderação da pretensão concreta.

É verdade que o Juiz não está sujeito ao direito alegado (artigo 664.º do CPC), mas o direito precisa dos factos e, no momento da decisão, estando da posse da matéria assente, o raciocínio decisório, se bastante à pretensão, deve ser aquele que vem sendo debatido pelas partes: daí a relevância do alegado na petição e que, necessariamente, foi objecto de contraditório[9]. É também certo que o juiz pode entender ser de aplicar uma norma diferente da indicada (ou pressuposta), mas, em rigor, já para essa hipótese o processo devia ter sido encaminhado (era uma das soluções plausíveis de direito), e quando assim é, necessariamente está em causa a aplicação subsidiária e não, como aqui sucede, a aplicação da norma pressuposta e totalmente provada em sede de facto.

Em conclusão, diríamos que num caso como o presente, e sempre que entre duas normas que concedem o mesmo direito (e em que o concurso de normas, por isso, parece não ter relevância prática[10]) mas uma delas é menos exigente (leia-se, tem menos requisitos de aplicabilidade) a escolha da norma aplicável deve ter em conta a configuração da acção e a norma subsidiária (a menos exigente) só deve ser equacionada se, por falta de prova de todos os elementos normativos integradores, o direito não for logo concedido pela norma principal.

Ou seja, se o autor alega todos os pressupostos da obrigação de indemnizar (assim configurando a sua acção) e todos ficam provados, quando o juiz aplica o direito (a esses factos) não deve começar por indagar da norma aplicável aos casos em que nem todos se provam[11].

Todas as considerações anteriores, que logo reconhecemos poderem padecer de algum desinteresse prático, permitem, no entanto, vincar, precisamente nesta apelação, que os recorrentes foram efectivamente condenados (também) nos termos do artigo 483.º, mas, em nosso entender, devem ser condenados (principal e suficientemente) nos termos deste mesmo preceito.

E, deste modo, ficaram claramente prejudicadas a reticências que os recorrentes colocam à aplicação do artigo 1348.º e importa apurar (sem descurar, ainda assim, que o fundamento de oposição se coloca igualmente em relação à norma geral) se têm efectivamente a obrigação de indemnizar a recorrida. Os recorrentes entendem que essa obrigação não existe, pois, em razão do próprio comportamento do lesado (a irregular instalação do depósito) está afastada. Os recorrentes colocam um conjunto de hipóteses que não versam sobre os factos apurados (a construção de uma piscina, cheia de água, quando se parte uma parede…) e, salvo o devido respeito, não os modificam e, insistindo na culpa da lesada, recolocam a obrigação de indemnizar (ou a falta dela) no artigo 570.º. Em tese, pode resultar da aplicação do artigo 570.º, a redução, mas também a exclusão da obrigação de indemnizar e, por isso, como método, começaremos pela obrigação e só depois apreciaremos a redução ou exclusão.

2.2.1.b) Obrigação de indemnizar (responsabilidade civil)

A responsabilidade que aqui tratamos é a extracontratual ou aquiliana (artigos 483.º a 510.º), distinguível[12] da contratual (incumprimento das obrigações e mora do devedor – artigos 798.º a 812.º) mas com esta podendo comungar da obrigação de indemnizar (artigos 562.º a 572.º).      

A responsabilidade civil tem origem remota, e há muito se encontra consagrada no sistema jurídico português[13]. O seu elemento consensual, a sua razão de ser, a sua condição indefectível, além da sua medida (E. Santos Júnior, ob. cit, págs. 239), é o dano: alguém é civilmente responsável porque é responsável, de acordo com o Direito (já que lesou um direito subjectivo alheio ou um interesse juridicamente protegido), a reparar ou compensar um dano.

Se o dano assume a importância consensual acabada de aludir, já é discutível a amplitude dos chamados pressupostos da responsabilidade civil e o papel da culpa, abrangendo ou não a ilicitude. No entanto, as dúvidas dogmáticas não têm sido obstáculo a uma adequada aplicação jurisprudencial, na medida em que as construções teóricas à volta deste instituto, comprimindo ou alargando os respectivos pressupostos, não apagam a relevância dos factos com que vai trabalhando a jurisprudência.

Dentro da responsabilidade civil, o Código Civil de 1966 começa por autonomizar a “responsabilidade por factos ilícitos”, dizendo que é excepcional a obrigação de indemnizar independente de culpa (483.º, n.º 2) e estabelecendo o seguinte princípio geral (483.º, n.º1): “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”. O que se diz, podendo ser dito de muitas maneiras, é, na parte que ora importa, que a pessoa (singular ou colectiva) que, intencionalmente ou apenas por descuido – falta de cuidado – violar, contra a lei, o direito de outra, tem que reparar (indemnizar) todos os danos daí resultantes para esta.

Nesta responsabilidade (por factos ilícitos ou, mais pormenorizadamente, ilícitos e culposos) é possível encontrar diferentes sistematizações a distinguir os seus pressupostos: numa orientação mais clássica (Antunes Varela e Almeida e Costa[14]) fala-se de facto voluntário do lesante; ilicitude (violação do direito de outrem); nexo de imputação do facto ao lesante (subdividida em imputabilidade e culpa, esta nexo psicológico que liga o facto à vontade do agente); dano e nexo de causalidade entre facto e dano[15]; numa orientação sintética, Pessoa Jorge fala de acto ilícito, prejuízo reparável e ausência de causas de isenção de responsabilidade[16] e Menezes Cordeiro acaba por aglutiná-los (apenas) em dano e imputação[17]. O que nos parece mais relevante na compreensão do instituto da responsabilidade civil e, por ele, da responsabilidade civil por factos ilícitos é, partindo do dano,[18] construir o seu verdadeiro sentido e alcance; aí, seguindo as palavras de E. Santos Júnior[19], também “pensamos, de facto, que a cindibilidade de elementos se faz, por metodologia e sindicância, em termos de positivação ou de aplicação do Direito, ou ainda por razões didácticas, mas o acto ilícito deve ser considerado como unidade. Dos elementos que compõem essa unidade hão-de fazer parte aqueles que a lei quis referir e exigiu no art. 483.º, n.º1. A lei será assim respeitada, mas parece que a formulação global mais adequada não estará dependente da enumeração legislativa. Apelando a uma ideia de unidade, necessariamente complexa, aproximamo-nos, assim, em maior ou menor medida, de concepções como a da faute francesa ou da teoria alemã da acção ilícita. Verdadeiramente, ocorrido o dano, do que se trata é de saber se quem o sofre há-se suportá-lo ou, em vez, se há alguém responsável pelo dano; havê-lo-á, quando alguém haja praticado uma acção causadora do dano e ilícito-culposa. Quando assim aconteça o dano é imputado a esse alguém, que responde por ele[20], perante o lesado”.  

Feitas as considerações pretéritas, importa, apreciando os factos, apurar da correcção condenatória dos recorrentes, enquanto responsáveis civis pela reparação do dano. E, revistos os factos, a resposta é muito clara e no sentido que a recorrida provou tudo quanto era necessário para a imputação ilícita e culposa do dano sofrido ao facto praticado pelos recorrentes. Com efeito, sem cuidar agora do quantum dos danos ou das outras questões que este recurso implica, ficou apurado que: “8) Os RR. mandaram demolir um edifício já velho e edificar um novo, na sua propriedade, tendo contratado para o efeito o empreiteiro D... , com quem celebraram um contrato com vista à realização da maioria das obras necessárias; 9) Acontece que nos referidos trabalhos de escavação não foi utilizada a técnica constante do projecto; 10) A escavação não foi feita por pequenos troços; 11) Não foi feita a determinação exacta do comprimento de cada troço na altura da própria escavação; 12) Não foram tomadas medidas de recalcamento; 14) Em virtude dos factos referidos de “9)” a “12)” aquelas escavações, no dia 7 de Abril de 2006, provocaram o desmoronamento do muro de sustentação e separação entre os prédios; 15) E provocaram a derrocada de um anexo que servia de recolha de material diverso e da cobertura da bomba de combustível (…); 16) E ainda a abertura de um fosso que deixou a céu aberto um tanque de combustível (gasóleo) que funcionava soterrado no prédio arrendado à A (…) 22) Com aquela deslocação de terras foram causados diversos danos nas instalações da A”.

Houve danos na propriedade (no direito de) da recorrida; danos causados por deslocação de terras, por desmoronamento do muro de sustentação; desmoronamento causado por se não ter utilizado a técnica projectada, não ter sido feita a escavação em pequenos troços nem com recalcamento; escavação feita na sequência da demolição de um prédio velho e para construir um novo; a mando dos recorrentes. Dano, direito de propriedade, causalidade, ilicitude, facto, culpa.

A conclusão anterior carece apenas de dois acrescentos esclarecedores: o primeiro, que melhor se reforçará aquando da (também alegada) má apreciação da “responsabilidade” do empreiteiro, obriga-nos a dizer, apenas mas relevantemente, que a matéria de facto não revela uma responsabilidade excludente ou concorrente com a dos recorrentes, não funcionando o disposto no artigo 497.º A segunda, mais relevante, prende-se com o direito de propriedade do estabelecimento comercial.

A natureza do estabelecimento comercial tem sido objecto de intensa análise doutrinal[21], mas, sem entrarmos excessivamente no campo que a outros pertence, acompanhamos as conclusões que nos parecem mais adequadas e o identificam com uma coisa que, mesmo que incorpórea, coisa incorpórea complexa ou composta, pode ser objecto de direito de propriedade[22]. Uma coisa que é, para alguns, uma universalidade de facto (por isso corpórea e uma coisa só – Oliveira Ascensão), mas sempre se revelará um agregado de coisas (outras), quando atomisticamente consideradas; não deixa de ser coisa, porque objecto de relações jurídicas (artigo 202.º, n.º1) e coisa móvel (artigo 205.º, n.º1), porque não é taxativamente considerada no n.º 1 do artigo 204.º, ou seja, por não ser (coisa) imóvel. Ora, como refere Jorge Coutinho de Abreu (Curso…, cit., pág. 238) “além de não estar vedada a hipótese de, no próprio contexto do CCiv., certas coisas incorpóreas serem objecto de propriedade, o certo é que diversas normas supõem, ou afirmam mesmo, poder o estabelecimento ser objecto do direito de propriedade (e de outros direitos reais)”.

Sem delongas, diremos que o que verdadeiramente está em causa é a defesa do direito de propriedade sobre o estabelecimento comercial, defesa que especialmente deve ser acolhida pela lei quando, como no caso sucede, o estabelecimento está vinculado ao espaço onde se encontra instalado: a destruição do espaço, mais, a destruição de diversos componentes (corpóreos) do estabelecimento põe em causa a própria manutenção ou viabilidade dele. E, neste preciso sentido, foi violado o direito (absoluto) de propriedade de que é titular a recorrida, titular (dona, proprietária) do estabelecimento.

Mas pode objectar-se que o direito da recorrida não é um verdadeiro direito real; que, porque locatária, tem um direito de crédito, ou tem, pelo menos, apenas esse direito quanto a alguns componentes do estabelecimento.

Não entendemos assim e a decisão sob censura, mormente na parte não impugnada – ilegitimidade da recorrida – igualmente assim não entendeu: como resulta da transcrição que fizemos (em nota, supra), o tribunal considerou que só quanto ao anexo seria válida a conclusão de o locador não ter direito à realização das obras (reconstituição natural) mas acrescentou que, quanto a tudo o mais (incluindo a reconstituição do abrigo da bomba) a legitimidade derivava da titularidade do estabelecimento e dos bens em concreto que o compõem. E considerou, por isso, a recorrente equiparada ao proprietário vizinho para efeitos do artigo 1438.º, ou seja, considerou-a titular de um direito de propriedade.

O que pretendemos dizer, quase a concluir, é que o proprietário do estabelecimento, se o é para efeitos do artigo 1348.º, não pode deixar de o ser para efeitos do artigo 483.º. Mas se a questão se recolocar em termos de direito pessoal de gozo (da recorrida) – e sem recolocar a questão da legitimidade, pois transitada – não chegaremos a conclusão diferente: o concessionário (o locatário a quem o gozo da coisa foi concedido) continua a ter a tutela aquiliana “em relação a todos os danos na esfera da sua imediação, isto é, em relação aos danos decorrentes de actos que afectem a ligação imediata à coisa,[23]” e inclusivamente aos danos que provoquem a deterioração reparável da coisa[24].

A terminar, esclarecida a posição que seguiríamos, diremos que, se não tivessem sido provados todos os requisitos do artigo 483.º, e concretamente a culpa e/ou ilicitude, concordaríamos com a subsunção (subsidiária) no artigo 1348.º já que, por interpretação extensiva (que não por analogia, pois estamos perante uma norma de carácter excepcional) o titular do estabelecimento deve ser equiparado ao titular do prédio (imóvel vizinho)[25].   

2.2.2 Da extinção ou redução da obrigação de indemnizar (artigo 570.º) por ser irregular (desconforme à lei) a instalação do depósito da recorrida

Já anteriormente vimos (mas ainda sem apreciarmos o seu quantum) que os recorrentes devem ser responsabilizados pela reparação dos danos sofridos pela recorrida: a tal obriga a sua conduta, ou seja, a conduta que lhes é imputável e que, efectivamente, causou danos. A questão que agora se coloca não se prende com uma eventual repartição de culpas, no sentido previsto pelo artigo 497.º, mas com o disposto no artigo 570.º; este preceito, sintomaticamente inserido na Secção que trata da “obrigação de indemnização” diz-nos o seguinte no seu n.º 1[26]: Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.

Estamos naqueles casos em que é o próprio lesado quem, com o seu comportamento, contribui para a produção ou para o agravamento do dano; casos que exigem, por isso, além da causalidade do comportamento em relação aos danos, “um juízo de censura acerca da conduta do lesado[27]”, que tenha havido culpa da parte deste[28].

Importa acentuar, desde já, que a possibilidade de redução ou exclusão da indemnização do lesado (prevista no citado artigo 570.º, n.º1) se refere aos casos em que o dano (ou seu agravamento, ou seja, o dano global) não tem origem apenas na causa que se imputa ao lesante, mas exige que igualmente seja desencadeada pelo lesado, sendo correcto afirmar-se que o dano “não ocorreria sem a articulação causal das duas condutas” (José Carlos Brandão Proença, A Conduta do Lesado como Pressuposto e Critério de Imputação do Dano Extracontratual, Almedina, 1997, pág. 426); por isso, a hipótese legalmente prevista – acrescenta o mesmo autor – “integra a chamada concorrencial real, efectiva ou necessária de causas”. Corolário do acabado de referir (consagração de a necessidade da concausa se referir a condutas efectivas) é o forçoso afastamento da previsão do artigo 570.º, n.º 1 das situações que caberiam na causa hipotética ou virtual do dano[29].

Colocado o cerne da questão na concausalidade efectiva das condutas, esclarecendo também que a culpa do lesado deve aferir-se a uma “violação da autoresponsabilização”, ou seja, um descuido nos seus interesses próprios[30] e que o critério de indagação causal é matéria de facto, daí decorrendo que o sentido da norma, quando a indagar é o da norma causal real e não o da norma hipoteticamente causante (ali, o artigo 483.º; aqui as normas de construção invocadas pelos recorrentes) parece-nos claro e inequívoco que, no caso presente, nenhuma violação culposa e causal pode ser adequadamente imputada à recorrida como fundamento (suficiente mas necessário) da extinção ou sequer da diminuição da indemnização.

Assim, falecendo em sede de factos apurados, a ligação entre a conduta da lesada e o dano ocorrido, parece-nos liminarmente de afastar a conclusão recursória que ora apreciámos.   

2.2.3 Da consideração do relatório pericial como dano emergente.

Insurgem-se os recorrentes quanto ao facto de o tribunal ter considerado o relatório pericial como um dano emergente, quando em nada contribuiu para averiguar a extensão dos danos, danos que, a existirem, estariam plasmados nas facturas, reparações de facto e nas despesas de combustível, para as quais não era preciso qualquer relatório e nem o tribunal os justifica com base nele.

A propósito desta questão, e oportunamente, decidiu-se a alteração da matéria de facto, precisamente no sentido em que a recorrida não se viu obrigada a solicitar o relatório pericial, mas: “(33) Tendo os RR. começado por pôr em causa que tudo o sucedido no prédio arrendado à A. houvesse sido provocado pelas escavações levadas a cabo no seu prédio; (34) A autora, em razão do referido no facto anterior, decidiu solicitar a elaboração de relatório técnico capaz de determinar as causas do evento, recorreu para isso ao Instituto de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico em Ciências de Construção do Departamento de Engenharia Civil da Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade de Coimbra”.

Independentemente do afastamento da formulação conclusiva, sempre deveríamos entender – e aqui em sentido diverso do decidido em 1.ª instância – que o relatório pericial (leia-se, o seu custo) não é uma dano emergente; melhor dito, sequer um dano indemnizável. Claro que a recorrida diminuiu o seu património na medida em aquele custo foi por si pago; diminuiu-o como, num juízo de razoabilidade, podemos dizer que terá sucedido com os telefonemas que fez para um eventual acordo ou na escolha e contratação de um mandatário. Por muito que tenhamos uma visão actualista do dano e uma abrangência que não se restrinja aos que directamente parecem resultar do evento, sempre a causalidade impõe cautelas e adequação: a indemnização é de todos os danos, mas só daqueles que, causados pelo evento (facto lesivo) como tal se apresentam.

Diríamos até que, se nem todos os gastos são danos causais, e por isso indemnizáveis, gastos há que podem ser ponderados em juízo, mesmo que não sejam danos. E, sem mais delongas, entendemos que assim sucede, no caso presente. O fundamento legal para o pagamento da perícia não deve ser a responsabilidade por facto ilícito, mas o instituto das custas de parte, na previsão que concretamente é feita pelo artigo 33.º do CCJ, aplicável aos presentes autos.   

2.2.4 Da responsabilidade do empreiteiro

Os recorrentes, numa das suas conclusões, dizem: “O Tribunal parece ter ignorado o Contrato de Empreitada atempadamente junto ao processo. Resulta do conteúdo do mencionado contrato, que o empreiteiro é responsável pelos eventuais danos a causar”.

Colocada a questão assim, em sede de recurso, parece-nos que o seu sentido útil só poderá ser a tradução da pretensão dos recorrentes em verem agora (e aqui) condenado o empreiteiro, naturalmente se houver condenação, e no lugar deles ou com eles, recorrentes. Mas se este parece ser o sentido útil do alegado, não parece que tenham razão na pretensão.

Com efeito, ao longo do processo, os recorrentes não invocaram a sua ilegitimidade e decidiram provocar a intervenção processual do empreiteiro, dizendo, para a fundamentarem que das clausulas contratuais derivava a responsabilidade daquele por, além do mais, danos causados a terceiros, sendo o empreiteiro, por último[31], responsável; e daí, expressamente invocaram o seu (deles, recorrentes) direito de regresso. O empreiteiro (ainda que, depois, no seu autónomo articulado, tenha defendido não ter sido o responsável pela direcção dos trabalhos e nem sequer ter executado os trabalhos relativos à escavação – fls. 179) veio a intervir como parte acessória, porque se concluiu “pela viabilidade dos réus lançarem mão de uma acção de regresso, acção que naturalmente está conexa com a causa principal” (fls. 163). A sentença, finalmente, sobre a questão em causa, escreve (exactamente) que “Quanto ao chamado D... a presente sentença apenas constitui quanto a si caso julgado nos termos do art.º 332.º, n.º 4 do CPC”.

Assim, se a questão suscitada é de natureza processual, parece-nos manifesto nada haver a censurar ao decidido, onde, pedido e admitido o chamamento, foram expressamente referidos os efeitos (para o chamado – directamente -, como para o titular do regresso) daí decorrentes[32]. Se, admitindo outras hipóteses, os recorrentes pretendem dizer que o tribunal apreciou erradamente a matéria de facto, precisamente no sentido de dever ter concluindo pela responsabilidade causal de terceiro (hipótese para a qual se vê sentido útil na referência ao articulado do contrato de empreitada, origem – contratual - do direito de regresso) cabe apenas dizer que nada há a reapreciar relativamente à matéria de facto, nem esta seria já a ocasião própria. A sentença, por outro lado, esclarece, remetendo para os factos, nomeadamente para os que se não provaram, o porquê da não condenação simultânea do chamado. Por último, também não estará em causa a responsabilidade delitual por facto de terceiro numa eventual relação de comissão, atenta, desde logo, a natureza do contrato de empreitada, a natureza não subordinada do empreiteiro[33].   

Em suma, nada vemos que permita concluir nos termos em que concluem os recorrentes nem sequer que a sua conclusão tenha alguma viabilidade modificativa da decisão sob censura. 

2.2.2.5 Da repartição de custas

Os recorrentes, confrontados com o decaimento de 99% (depois de a sentença ter julgado a autora parte ilegítima quanto à pretensão de reparação de um barracão) estranhos que essa reparação, no contexto do valor da causa, represente não mais de 100,00€. No fundo o que os recorrentes dizem – porquanto no mais, a substância da decisão absolutória lhes é favorável – é que as custas foram mal repartidas.

Entendemos que, aqui, os recorrentes têm razão. Vejamos:

Inicialmente foi dado à causa o valor de 10.198,66€. Posteriormente, e porque aquele valor não considerava o pedido de reconstrução do anexo e do abrigo, o valor da causa foi fixado em 13.698,66€, correspondendo ao inicial, acrescido de 3.500,00€ (valor aceite pelas partes) pelas aludidas obras. A recorrida foi considerada parte ilegítima quando à pretensão de reconstrução de uma delas e não há elementos sobre o valor específico de um ou outra.

Porque assim é, e na falta de outros elementos, o decaimento da recorrida deve corresponder a ½ x 3.5000,00€, ou seja a 1.750,00€. Atento o valor da causa e esse decaimento, a repartição de custas devia ter sido fixado sensivelmente na proporção de 7/8 e 1/8, respectivamente para recorrente e recorrida. De todo o modo (e por isso dissemos “devia”) também esta proporção deve ser modificada, em razão do vencimento parcial dos recorrentes, que tem reflexos no decido em 1.ª instância) o que, a final, se determinará[34].

Não vemos outras questões que hajam sido suscitadas ou importe resolver e, em suma, entendemos que bem andou o tribunal da 1.ª instância, ainda que seguindo uma metodologia algo diversa da que perfilhamos, ao condenar os recorrentes na reparação dos danos (indemnização e reconstituição) causados à recorrida, ressalvando o ter considerado o valor correspondente ao relatório pericial e a repartição de custas que fez. 

3. Decisão

Pelo exposto, neste recurso de apelação em que são recorrente B... e C... e recorrida A... , Lda., acorda-se no Tribunal da Relação de Coimbra:

3.1) Em julgar parcialmente procedente a impugnação da decisão da matéria de facto requerida pelos recorrentes e, em consequência, todos os restantes mantendo, alterar os seguintes factos considerados na sentença:

- 14) Em virtude dos factos referidos de “9)” a “12)” aquelas escavações, no dia 7 de Abril de 2006, provocaram o desmoronamento do muro de sustentação e separação entre os prédios.

 - 34) A autora, em razão do referido no facto anterior, decidiu solicitar a elaboração de relatório técnico capaz de determinar as causas do evento, recorreu para isso ao Instituto de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico em Ciências de Construção do Departamento de Engenharia Civil da Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade de Coimbra.

3.2) Em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, descontando o valor correspondente ao custo do relatório pericial e alterando a repartição de custas, condenar os recorrentes a (a) pagarem à recorrida a quantia de 8.590,63€ (oito mil, quinhentos e noventa euros e sessenta e três cêntimos), acrescida de juros à taxa legal de 4%, contados desde a citação e (b) a concluírem as obras de reconstrução do abrigo da bomba de combustível, pavimentando-o com cimento e colocando a respectiva cobertura em chapa metálica ondulada.

Custas na 1.ª instância e no recurso na proporção de ¾ e ¼, respectivamente para os recorrentes (réus) e para a recorrida (autora).      


José Eusébio Almeida (Relator)
Gregório Jesus
Martins de Sousa

[1] Para melhor compreensão da lide, igualmente se deixam sintetizada, por referência à quesitação a matéria de facto que o tribunal considerou não provada ou, num dos casos, não escrita:

- Desde 23 de Março de 2006 a A., temendo qualquer acidente, deixou de transitar com os seus veículos pela parte do logradouro adjacente ao prédio dos RR. (quesito 9.º); - Parte na qual estava instalada e funcionava a já referida bomba de combustível (quesito 10.º); - A qual, por assim ser, a A. Deixou de poder usar a partir do dia 23 de Março de 2006 inclusive (quesito 11.º);  - Ao longo dos anos, na referida “caixa” de areia, se foram acumulando vários resíduos de hidrocarbonetos, como óleos e gasóleos que se foram derramando (quesito 37.º); - Dada a existência de uma concentração anormal de hidrocarbonetos e seus resíduos concentrados nos terrenos, foi necessário proceder a escavações em maior profundidade (quesito 37.º-A); - Assim, logo que foi removida a parede de sustentação da areia, toda a zona envolvente cedeu, o que aliado à chuva, à quantidade anormal de hidrocarbonetos misturados na areia, ao peso do depósito e à passagem dos autocarros a poucos metros, provocou o desmoronamento (quesito 38.º); - A A. deveria ter feito uma “caixa” de sustentação para segurar a areia em que tinha que envolver o mencionado depósito de combustível, e nunca apoiar, como apoiou uma grande quantidade de areia, na parede do prédio dos RR. (quesito 39.º - não respondido); - Quando se iniciou a escavação no prédio dos RR. a bomba de combustível da Autora já estava avariada (quesito 42.º); - o que, atento o facto de se tratar de um terreno de composto por areia, ali colocada pela Autora, aliado ao facto de ter chovido bastante, teria sido impossível evitar o desmoronamento verificado (quesito 44.º); - A bomba de combustível deslocou-se, tendo apenas as tubagens sido afectadas (quesito 46.º) - A bomba de combustível poderia ter sido reparada em Abril ou Maio de 2006 (quesito 46.º-A); - Quando a Autora contactou o R. marido já tinha encomendado um relatório à Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (quesito 47.º) e – No que respeita ao barracão referido em H), este é da propriedade do senhorio da Autora e não faz parte do contrato de arrendamento da Autora (quesito 48.º).

[2] Referimo-nos à questão da ilegitimidade da recorrida que, atenta a conformação desta, não está em apreciação no recurso.
[3] Ainda assim, parece-nos que tem relevo para a restante apreciação do recurso, a construção jurídica feita na 1.ª instância, justamente a propósito da legitimidade. Aí se refere (e citamos) o seguinte: “esta ilegitimidade não inquina aquele pedido na totalidade. A autora pede a reparação do anexo e do abrigo da bomba. Ora, quanto ao anexo, é válido tudo o que vai dito supra, pois trata-se de parte do imóvel locado (ponto “B/” da lista de factos assentes, que corresponde à configuração da acção pela autora). Mas quanto à cobertura da bomba, a conclusão não pode ser a mesma, pois ela não é objecto de arrendamento, mas sim um dos elementos do estabelecimento comercial de que a autora é proprietária e que se encontra instalado no imóvel arrendado (ponto “C/” da lista de factos assentes, que corresponde à configuração da acção pela autora). A autora é, simultaneamente, arrendatária do imóvel e proprietária do estabelecimento comercial nele instalado, o mesmo é dizer dos seus vários elementos corpóreos e incorpóreos, onde se inclui a bomba de abastecimento e respectivo abrigo. As considerações supra sobre a ilegitimidade só se aplicam na medida em que se exija a reparação das coisas de que a autora é arrendatária e não daquelas de que é proprietária. A ilegitimidade só abrande, por isso, a parte do terceiro pedido que diz respeito ao anexo e não á cobertura da bomba” (sublinhados e negrito nossos).

[4] Com interesse, porquanto trata da aplicação do artigo 492.º, do artigo 493.º e do concurso de responsabilidades, cf. Ana Maria Taveira da Fonseca, “Responsabilidade civil pelos danos causados pela ruína de edifícios ou outras obras”, in Novas Tendências da Responsabilidade Civil, Almedina, 2007, págs. 85 e ss., em especial págs. 127 a 138.
[5] As várias estipulações normativas têm que definir consequências distintas, já que “se assim não fosse, o concurso de normas jamais assumiria qualquer relevância prática” – Miguel Teixeira de Sousa, O Concurso de Títulos de Aquisição da Prestação, Almedina, 1998, págs. 16 e também, com interesse na definição da causa de pedir, nos seus efeitos no concurso e sobre a relevância deste, págs. 162 e 163 e págs. 223 a 225 e 240 a 244.
[6] Cf. Pedro Romano Martinez, Cumprimento Defeituoso, em especial na compra e venda e na empreitada, Almedina, 1994, págs. 284 e ss., em especial, pág. 287.
[7] Sobre a diferença, A. Castanheira Neves, Metodologia Jurídica – Problemas fundamentais, Coimbra Editora / Universidade de Coimbra, 1993, págs. 9 e 10.
[8] Só isso permite, efectivamente, que o tribunal afirme (correctamente) que os recorrentes também estão obrigados a indemnizar nos termos do artigo 483.º
[9] Mariana França Gouveia, A Causa de Pedir na Acção Declarativa, Almedina, 2004, págs. 382 e ss., em especial, págs. 389 e 391.
[10] Seguindo a construção que opta, em sede de método, pela relevância da pretensão (como expressamente se faz) fica algo prejudicada a que atenderia ao “fim da norma”, quando estamos em sede concurso. Sem embargo, sempre se dirá o seguinte: se olharmos ao fim das normas (1348.º e 483.º) entendemos dever concluir-se que, então, estamos perante uma concurso aparente que deve ser resolvido, aqui, a favor da norma geral: efectivamente aquele primeiro preceito não tem por fim proteger os danos resultantes da violação da propriedade, em geral considerada e, como sucedeu na sentença sob censura, só por interpretação extensiva pôde ser aplicado. Neste contexto, entre uma norma que protege os proprietários de prédios vizinhos, indemnizando os danos por si sofridos e só por extensão se pode aplicar ao proprietário de estabelecimento comercial vizinho, haveria um concurso aparente, favorável à norma (artigo 483.º) que protege, em geral, o direito de propriedade, enquanto direito absoluto e mesmo que seja, no caso, o direito de propriedade sobre um estabelecimento comercial. Cf., sobre concurso aparente de normas e subsidiariedade Diogo Leite de Campos, A Subsidiariedade da Obrigação de Restituir o Enriquecimento, Almedina, 2003 (reimpressão) págs. 45. 
[11] Não pensamos que seja diferente da situação que ocorre quando o juiz aplica as regras da responsabilidade pelo risco, depois do demandante ter fundamentado a sua acção na responsabilidade pela culpa. O exemplo pode, ainda assim, não ser totalmente correcto, tendo em conta os limites da responsabilidade pelo risco, mas faz compreender o caminho (o método) a seguir: não provada a culpa, o juiz (sendo os factos principais os mesmos – cf. Mariana França Gouveia, A Causa…, cit., págs. 391) condena pelo risco e não faz o caminho (método) contrário.
[12] Pela generalidade dos autores, ainda que venha sendo assumida dogmaticamente como disciplina autónoma, e abrangendo as duas realidades – Cf. Manuel Carneiro da Frada, Direito Civil Responsabilidade Civil – O método do caso, Almedina, 2010 (reimpressão), págs. 37 e ss. Sobre a “tese da unidade” das duas responsabilidades, António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, II, Tomo III, Almedina, 2010, págs. 387 e ss.
[13] Sobre a sua evolução e consagração actual, entre outros, António Menezes Cordeiro, Tratado…, cit, págs. 291 a 381 e Da Responsabilidade Civil dos Administradores das Sociedades Anónimas, Lex, 1997, págs. 399 a 457; E. Santos Júnior, Da Responsabilidade Civil de Terceiro por Lesão do Direito de Crédito, Almedina, 2003, págs. 179 a 202 e Adelaide Menezes Leitão, Normas de Protecção e Danos Puramente Patrimoniais, Almedina, 2009, págs. 225 a 258.
[14] Respectivamente, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 8.ª edição, Almedina, 1994, págs. 532 e ss. e Direito das Obrigações, 8.ª edição, Almedina, 2000, págs. 500 e ss.
[15] Jorge Ribeiro de Faria, Direito das Obrigações, Vol. I, Almedina, pág. 413, enumera também cinco pressupostos (um facto voluntário; a ilicitude, a culpa; o dano; o nexo de causalidade entre o facto e o dano), antecipados com este esclarecimento: “para que tenha lugar a responsabilidade civil por factos ilícitos são necessários vários pressupostos. Di-los, de resto, com suficiente clareza, o artigo 483.º. depressa se vê, na verdade, à face dele, que incorre em responsabilidade, e portanto numa obrigação de indemnizar, quem pratica um facto voluntário (é a “Handlung” dos alemães), que traduza ou incorpore um juízo de desvalor objectivo da ordem jurídica (“Rechtswidrigkeit”), sendo o seu agente censurável (“Verschuldengrundsatz”), ponto é que tenham ocorrido danos que se ligam causalmente àquele facto.  
[16] Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil, p.55, apud E Santos Júnior, Da Responsabilidade…, cit., pág. 261
[17] E na imputação encontram-se os pressupostos que habitualmente se classificam como ilicitude, culpa e causalidade (Direito das Obrigações, Vol. II, Lisboa, 1990 (reimpressão) pág. 291
[18] Independentemente ou para além das presunções que beneficiam determinado lesado, sem culpa pode haver responsabilidade, sem ilicitude pode também haver responsabilidade, mas sem dano nunca existirá.
[19] Da Responsabilidade…, cit., pág. 266.
[20] Sublinhado nosso.
[21] Entre outros, Orlando de Carvalho, Critério e Estrutura do estabelecimento Comercial, I (O problema da empresa como objecto de negócios), Atlântida, 1967, págs. 307 e ss.; A. Menezes Cordeiro, Manual de Direito Comercial, I, Almedina, 2001, págs. 255 a 260; Jorge Coutinho de Abreu, Da Empresarialidade – As Empresas no Direito, Almedina, 1996, págs. 69 e ss., em especial, págs. 75 a 78; Curso de Direito Comercial, Vol. I, 5.ª edição, Almedina, 2004, págs. 231 a 238 e Fernando de Gravato Morais, Alienação e Oneração de Estabelecimento Comercial, Almedina, 2005, págs. 63 e ss.
[22] Em sentido divergente, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume III (com a colaboração de Henrique Mesquita), 2.ª edição, Coimbra Editora, 1987, págs. 84 e ss., que sustentam (partindo da leitura dos artigos 1302.º e 1303.º) que só as coisas corpóreas podem ser objecto do direito de propriedade, salvo se, quanto às incorpóreas, houver regulamentam especial que lho atribua. Ainda assim, cf. Augusto da Penha Gonçalves, Direitos Reais, Universidade Lusíada, Lisboa, 1992, pág. 76, onde se escreve: “mesmo sem sair das fronteiras do Código Civil, afigura-se-nos algo excessivo afirmar que, no citado artigo 1302.º, se consagra um princípio geral extensivo a todos os direitos reais. Não são, efectivamente, poucos os casos de direitos reais previstos neste diploma cujo objecto suscita, pelo menos dúvidas, maiores ou menores, quanto à sua qualificação como coisa corpórea”.
[23] José Andrade Mesquita, Direitos Pessoais de Gozo, Almedina, 1999, págs.223 e ss., em especial 226 e 229. E acrescenta: “pode recorrer à tutela aquiliana em relação a todas as lesões de facto e ainda em relação às lesões (pretensamente) de direito que atinjam a referida zona de imediação” (pág. 226), dando depois exemplo de factos que só à primeira vista lesionam o concedente (“quando alguém, por exemplo, rouba frutos pendentes num terreno arrendado, o dano é integralmente sofrido pelo arrendatário, apesar de os frutos se integrarem na coisa do locador”.
[24] José Andrade Mesquita, Direitos…, cit., págs. 230 a 233, depois de dizer que o concedente continua a ter o poder de exigir a reparação, pois o direito pessoal de gozo não provoca uma temporária irrelevância do interesse do dominus, entende que o mesmo direito tem o concessionário. Transcrevemos: “Caso não se admita que o concessionário tem direito a exigir a reconstituição da situação anterior à prática do facto lesivo (reconstituição natural), ele poderá sofrer com a eventual inacção do concedente, maxime nos casos em que este nem sequer é contratualmente responsável. Por outro lado, não se compreenderia que ao titular de um direito pessoal de gozo se atribuísse uma pretensão indemnizatória quando a coisa não é reparável, e se lhe negasse idêntica pretensão na hipótese inversa. Acresce que as deteriorações reparáveis causam também ao concessionário (pelo menos normalmente) danos insusceptíveis de reconstituição natural, resultantes de não poder utilizá-la em condições normais, enquanto não se proceder á reparação. Ora, se o concessionário tem direito ao ressarcimento destes danos, seria injustificável que, com vista a fazê-los cessar, não pudesse pedir a reparação da coisa. Deve, por conseguinte, entender-se que o titular de um direito pessoal de gozo, tal como o respectivo concedente, sempre que um terceiro seja responsável por lesões reparáveis sofridas pela coisa, pode pedir a reconstituição natural”.
[25] Nesse sentido, e esclarecedor, o acórdão do STJ de 25.09.2003 (relator Conselheiro Salvador da Costa), disponível no sítio da dgsi. Em sentido diferente – mas admitindo a tutela possessória: acórdão da Relação de Lisboa de 19.03.98, CJ, 1998, T. II, págs. 98 e ss., e da mesma relação, de 14.02.2008 (dgsi), embora aqui o lesado não fosse titular de qualquer estabelecimento mas de um arrendamento habitacional. No acórdão da Relação de Lisboa de 23.02.95 CJ, 1995, T. I, págs. 134 e ss. (também citado na decisão) fala-se em analogia, mas apenas para anotar essa referência da decisão ali recorrida e acrescentar que a questão, porque não suscitada, está fora do conhecimento da Relação (pág. 137, in fine). Finalmente, desta Relação de Coimbra e com especial semelhança ao caso presente, (ainda que só dispondo do sumário) o acórdão de 14.12.1999, conclui o seguinte: 1. Em princípio, e salvo caso fortuito ou de força maior, o proprietário é sempre responsável pelos desmoronamentos ou deslocações de terras no prédio vizinho que resultem de escavações no seu próprio prédio, seja com base na responsabilidade objectiva, nos termos do art.º 1348.º, n.º2, seja com base na responsabilidade por actos ilícitos, nos termos do art.º 483.º. 2. Das duas, uma: ou tomou as precauções julgadas necessárias e, por não haver culpa, temos a responsabilidade objectiva consagrada no art.º 1348.º; ou não tomou e temos a responsabilidade por factos ilícitos, consagrada no art.º 483.º(…)”
[26] E no n.º 2 esclarece-se que, “se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar”. Ou seja, se houver culpa efectiva do lesado e presumida do lesante, não há indemnização. Talvez este preceito ajude a perceber que não é inócua a escolha da norma, como referimos no ponto anterior.
[27] Paula Meira Lourenço, A Função Punitiva da Responsabilidade Civil, Coimbra Editora, 2006, pág. 263.
[28] Almeida Costa, Direito…, cit, pág. 715. Aí refere: “A formulação legal afasta, pois, os actos do lesado que, embora constituindo concausa do dano, não mereçam um juízo de reprovação ou censura. Quer dizer, a redução ou exclusão da indemnização só ocorre quando o prejudicado não adopte a conduta exigível com que poderia ter evitado a produção do dano ou o agravamento dos seus efeitos”.
[29] “Afirmada, pois, a causalidade real e situado o crédito do lesado no momento da prática do ilícito, não se permite ao lesante a demonstração de certas atitudes virtuais do lesado em relação ao bem, com o escopo de procurar a exoneração” (Brandão Proença, A Conduta…, cit., pág. 432)
[30] Quanto ao conceito de culpa é bastante pensar-se “que tem a ver com uma conduta negligente ou intencional do lesado, cuja incidência típica reverte em dano próprio, pessoal ou patrimonial” Brandão Proença, A Conduta…, cit., págs. 20/21, nota 8)
[31] Sublinhado nosso.
[32] “Como decorrência da natureza acessória da intervenção do chamado, remete-se, relativamente ao caso julgado, para o preceituado sobre tal matéria no artigo 341.º, relativamente ao assistente” – Carlos Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Almedina, 1999, pág. 255.
[33] O afastamento da empreitada enquanto relação de comissão parece-nos unânime na doutrina, tal como na jurisprudência, nomeadamente na do Supremo. Antunes Varela afirma a necessidade da existência de subordinação e o único autor que se afasta desse entendimento (Menezes Leitão) continua a afastar a empreitada, atenta a autonomia do empreiteiro e a inexistência de uma delegação pelo “comitente” – Cf. Maria da Graça Trigo, Responsabilidade Civil Delitual por Facto de Terceiro, Coimbra Editora, 2009, págs. 264 e ss. E, em especial, págs. 267, 268 e 271.
[34] Proporção que entendemos dever ser idêntica no recurso, pois embora o recorrente não tenha atribuído valor a este (diverso do da 1.ª instância, desde logo) o seu vencimento também deve abranger a própria questão das custas na primeira instância e o que, a tal respeito, acaba de ser dito.