Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3354/05.9TBAGD.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALBERTINA PEDROSO
Descritores: ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
ÓNUS DA PROVA
DEFESA POR IMPUGNAÇÃO
CONFISSÃO
LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO
PRESUNÇÕES JUDICIAIS
Data do Acordão: 11/13/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: BAIXO VOUGA ANADIA JGIC J 2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS.342, 352, 353, 358, 473, 474 CC, 28, 30, 552 CPC
Sumário: 1 – Aos autores que pretendem a restituição por via do instituto subsidiário do enriquecimento sem causa, incumbe o ónus da alegação e prova dos requisitos, positivos e negativos, vertidos no artigo 473.º, n.º 1, do CC, mormente da falta de causa justificativa para o enriquecimento.

2 – Em acção fundada no instituto do enriquecimento sem causa, a alegação pelo réu de que a deslocação patrimonial que aceita existir do património dos autores para o seu, teve como causa uma doação, constitui defesa por impugnação (por negação directa ou motivada), pelo que, o facto de o réu não demonstrar os factos que invocou não determina, por si só, a procedência da acção.

3– Em caso de litisconsórcio necessário a confissão efectuada pela co-ré em depoimento de parte de factos que são desfavoráveis aos réus não tem força probatória plena, valendo como elemento probatório que o tribunal apreciará livremente.

4 – Em sede de reapreciação da prova produzida, o tribunal da Relação pode recorrer a presunções judiciais para dar como provado um facto negativo, sempre que existam factos simples dos quais o mesmo seja a respectiva consequência lógica.

Decisão Texto Integral: Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – RELATÓRIO

1. OM (…) e mulher MR (…), instauraram contra FM (…) e SM (…), a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário, pedindo que a mesma seja julgada procedente por provada e, em consequência, os RR sejam condenados a ver reconhecida a nulidade do contrato de mútuo celebrado com os Autores e, consequentemente, a restituir-lhes o montante de 78.523,12 €, acrescidos de juros moratórios, que em 09.11.2005, ascendiam a 7.409,14 € e juros vincendos até efectivo e integral pagamento, e subsidiariamente que os RR sejam condenados, com base em enriquecimento sem causa, a restituir aos AA a dita quantia e referidos juros, acrescida de juros vincendos até efectivo e integral pagamento.

Em fundamento, alegaram, em síntese, que pouco após o casamento dos Réus, sendo a ré sua filha, os mesmos solicitaram aos Autores um empréstimo para comprar uma máquina giratória de rastos e um tractor para utilização na actividade profissional do Réu, ao que os AA acederam, tendo mutuado a quantia de 85.023,12 €, tendo ainda acordado que o pagamento seria efectuado até Julho de 2004, de acordo com os rendimentos que os Réus fossem obtendo. Estes ainda restituíram 6.500 €, tendo ficado em débito o montante de 78.523,12 €. Como o mútuo não foi celebrado por escritura pública, e face à nulidade do mesmo, devem restituir tal quantia, nos termos do disposto nos artigos 1143.º, 219.º, 220.º e 289.º do Código Civil.

Subsidiariamente, se assim não se entender, como a dívida foi contraída em proveito comum do casal e os RR viram o seu património enriquecido à custa dos AA uma vez que a máquina e o tractor adquiridos destinaram-se a ser utilizados pelo R. marido no exercício da sua actividade profissional, deverão restituir-lhes tal quantia a título de enriquecimento sem causa.

2. Regularmente citados, o Réu FM (...) contestou, afirmando que os AA nunca emprestaram qualquer dinheiro aos RR nem estes lho pediram, tendo sido os AA que resolveram doar a aludida máquina e tractor, para ele fazer pela vida, pois o réu é empresário de terraplanagens.

3. Os AA replicaram, mantendo que emprestaram o dinheiro aos RR, pois a banca comercial não lhes emprestou a quantia pretendida, e nunca quiseram ou tiveram a intenção de doar aos RR o valor correspondente ao preço das máquinas, em prejuízo das suas vidas e de outro filho que têm.

4. Foi proferido despacho saneador, seguido da selecção dos factos assentes e da elaboração da base instrutória, o qual foi objecto de reclamação que foi atendida.

5. Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença constante de fls. 236 a fls. 240 dos autos, que julgou totalmente improcedente a acção.

6. Os Autores interpuseram recurso da dita sentença para este Tribunal da Relação de Coimbra, que, pelo Acórdão constante de fls. 660 a 673, julgou parcialmente procedente o recurso, mantendo a sentença recorrida quanto à questão de mérito respeitante ao mútuo, e declarou nula a mesma, por omissão de pronúncia quanto à questão de mérito concernente ao enriquecimento sem causa, e assim, ordenou a ampliação da matéria de facto nos termos indicados no seu ponto III-4.

7. Em conformidade com o ali determinado, procedeu-se à ampliação da matéria de facto nos termos constantes do despacho de fls. 702 e 703, tendo-se procedido à realização de audiência de julgamento e respondido à matéria de facto ampliada que se mostrava controvertida, nos termos constantes do despacho de fls. 838 a 842, que não mereceu reclamação das partes.

8. Na sequência, foi proferida sentença que finalizou nos seguintes termos:

«Pelo exposto, julgo a presente acção (no respeitante ao pedido de condenação dos Réus, com base no enriquecimento sem causa, a restituir aos Autores a dita quantia) improcedente por não provada, e consequentemente, decido:

a) Absolver os Réus FM (…) e SM (…) do pedido».

9. Novamente inconformados, os AA apresentaram recurso de apelação da sentença proferida, formulando as seguintes conclusões:

«1ª – A matéria com que foi ampliada a Base Instrutória contém factos, designadamente os levados aos artºs. 15º, 16º e 17º da ampliação, que se reportam directamente a questão da existência ou inexistência do Contrato de Mútuo.

2ª - Como a sentença é um todo e, declarando-se a mesma nula, essa nulidade é abrangente, incidindo sobre a globalidade da decisão proferida em Primeira Instância, entende-se que a sentença ora proferida deveria, nesta sede, pronunciar-se sobre o Contrato de Mútuo, até porque há matéria bastante nos Autos, nomeadamente com a prova agora produzida, que indicia a existência daquele contrato de mútuo … Não o fazendo, a decisão ora objecto de recurso está ferida de nulidade, por omissão de pronúncia, quanto à questão da existência, ou inexistência do contrato de mútuo [artº. 668º nº. 1 al. d) do C.P.C.].

3ª – A propósito do mútuo resultou provado, quanto à Fundamentação de Facto da Primitiva Sentença, a matéria dos itens (2), (3), (4), (5), (7), (8), (9), (13), (14) (isto sem prejuízo da matéria levada aos artºs. 15º, 16º e 17º da ampliação da B.I., que se mostra incorrectamente julgada), de onde emerge evidente a existência de um contrato de mútuo (empréstimo), através do qual os AA. adiantaram aos RR. as importâncias necessárias para que o Réu FM (…) adquirisse o equipamento industrial a que se reportam os Autos … Como resulta também que os RR., bem cientes de que aquelas entregas correspondiam a um contrato de mútuo, procederam à restituição parcial das quantias mutuadas, como decorre dos itens (8), (9), (13) e (14) dos Factos Provados.

4ª – Ao não decidir pela existência do Contrato de Mútuo, com a obrigação da restituição do capital mutuado, por força da nulidade do contrato, o Tribunal “A Quo” violou o disposto nos artºs. 1143º e 289º do C. C.

5ª - Não obtendo os AA. a restituição do capital mutuado, por força da nulidade do contrato de mútuo, ou por alegadamente não se provar a existência do mútuo e a sua consequente nulidade … Sempre teriam direito a haver dos RR. a referida quantia com base no Instituto do Enriquecimento sem causa, que ocorre desde que verificado o seguinte condicionalismo: Que alguém obtenha um enriquecimento; Que o obtenha à custa de outro; E que o enriquecimento não tenha causa justificativa (cf. Galvão Telles, Obrigações, 3ª Ed. 127).

6ª – A este propósito resultou provada a matéria dos itens (1), (2), (3), (4), (5), (7), (10), (11), (12), (18), (19), (20) e (21) quer da Sentença na sua versão primitiva, quer da Sentença após a ampliação da B.I. … Mas já não resultaram provados os factos dos artºs. 1º, 2º, 3º, 4º, 6º (que o Autor marido, na sequência do negócio referido em 6º/ ampliação da B.I., tivesse dado a máquina ao Réu marido), 7º (que os RR., na sequência da entrega da máquina a aceitaram), 8º, 9º, 10º, 11º, 12º, 13º (que o Autor marido pretendia comprar o tractor para o Réu), 14º (que o Autor marido deu o tractor (...)VH ao Réu), todos da ampliação da Base Instrutória.

7ª - Aquela factualidade tida por provada, por contraponto com a não provada, demonstra, de forma inequívoca e indelével, que houve uma deslocação patrimonial avultada da esfera de direitos dos AA. para a dos RR., que não se reconduz a qualquer doação … Pelo que sempre se mostraria verificado o enriquecimento sem causa dos RR., que beneficiaram de um acréscimo patrimonial à custa do correlato empobrecimento do património dos AA..

8ª - O Autor que intenta acção fundada em enriquecimento sem causa não tem de provar um efectivo empobrecimento, bastando-lhe invocar e provar que aquele enriquecimento ocorreu à sua custa e carece de causa justificativa. E os AA., face à factualidade levada à sentença revidenda, fizeram prova daquela situação de enriquecimento dos RR. à sua (dos AA.) custa, cumprindo, assim, com o ónus que para eles decorre do artº. 342º do C. Civil.

9ª - De acordo com a repartição do ónus da prova, cabia ao Réu, que invocou que as quantias entregues o foram a título de doação, fazer prova desse mesmo facto (artº. 342º nº. 1 do C. Civil) … Ou, entendendo-se que tal facto (a invocada doação) é impeditivo ou extintivo do direito invocado pelos AA., sempre caberia aos RR. fazer prova desse facto (doação) em conformidade com o disposto no artº. 342º nº. 2 do C.Civil, o que não logrou fazer.

10ª - Tendo em consideração que resultou provado que os RR. restituíram aos AA. pelo menos as quantias mencionadas em (8) [No dia 22/07/2003 foi depositado para crédito da conta 004532404001632308947, de que os AA. são titulares, o montante de € 3.000,00 (ponto 9 da B.I.)] e (9) [No dia 06/07/2004 a Autora MR (…) depositou para crédito na conta 004532404001632308947, de que os AA. são titulares, o montante de € 2.500,00, dos quais € 2.385,00 provinham de cheques e € 115,00 de numerário (ponto 13 da B.I.)], dos factos provados … Tal facto só pode evidenciar uma de duas situações: Ou que estamos perante um contrato de mútuo (e os RR. procederam à restituição parcial das quantias mutuadas); Ou que, reconhecendo que se tratou de um adiantamento para aquisição de bens, os RR. restituíram aos AA. parte dos valores com que enriqueceram o seu património à custa do empobrecimento dos AA.

11ª – Não decidindo pela verificação do enriquecimento sem causa o Tribunal “A Quo” violou o disposto nos artº. 342º, 349º, 473º e 474º do C. Civil.

12ª - Atendo-nos tão só à matéria aditada à B.I., em sede de ampliação, e de acordo com o doutamente decidido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, ou seja, à matéria dos quesitos 1º a 17º, constante do despacho de 04/10/2010 (Refª.: 8950748), resulta de toda a prova produzida, documental, por depoimento de parte e testemunhal (esta gravada em suporte magnético) produzida em audiência de julgamento, que os artºs. 15º (ampliação), 16º (ampliação) e 17º (ampliação) da B.I. aditada, estão incorrectamente julgados, e mereciam todos eles a resposta de provado, posto que as respostas remissivas dadas a tais artigos da B.I., e constantes do despacho de 31/10/2011 (Refª.: 12762215), não se coadunam, nem se ajustam, ou emergem da prova produzida.

13ª – O que de facto emerge da prova produzida é que: Os RR. pediram aos AA. para lhes adiantar o montante necessário à aquisição da máquina giratória e do tractor, com o compromisso de lhes restituir aquele valor; Os AA. anuíram a fazer esse adiantamento (no fundo um empréstimo), concordando que, logo que escolhida a giratória e o tractor, o Autor pagaria a cada um dos vendedores; O Autor entregou ao Réu FM (...)o cheque referido em C) dos Factos Assentes no dia 25/07/2009; O acordado entre os AA. e RR. foi que a restituição seria feita por fases até Julho de 2004, de acordo com os rendimentos que fossem obtendo; No dia 22/07/2003 os RR. entregaram aos AA., para amortização daquele adiantamento (empréstimo), € 3.000,00 (Facto Provado nº. 8); E no dia 06/07/2004 os RR. entregaram aos AA., para amortização do mesmo adiantamento (empréstimo), € 2.500,00 (Facto Provado nº. 9); Que a entrega desse dinheiro para a aquisição da giratória e do tractor não representou qualquer oferta ou doação; Que o adiantamento (empréstimo) e acordo de restituição por fases é anterior à desavença entre os RR.; Que os AA., para efectuarem aqueles adiantamentos (empréstimo) tiveram de dispor da quase totalidade das suas poupanças de uma vida; Que os AA. não quiseram doar aquelas importâncias, em dinheiro, nem quaisquer bens aos RR.; Que os AA. nunca fariam uma doação dessa natureza, aliás, de quase todas as suas poupanças, prejudicando as suas próprias vidas e satisfação das suas necessidades, e prejudicando os interesses de outro filho que têm.

14ª - É o que se pode extrair dos depoimentos produzidos em audiência e gravados através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, designadamente do depoimento pessoal de parte da Ré SM (…), que respondeu à matéria dos artºs. 15º, 16º e 17º da Base Instrutória, que confessou, como consta da assentada elaborada pelo Tribunal, e que se mostra gravado das 10:02:58 às 10:19:34; da testemunha (…) que respondeu à matéria dos artºs. 1º a 4º da Base Instrutória, cujo depoimento se mostra gravado das 10:46:20 às 11:07:36; da testemunha (…), que respondeu a toda a matéria da Base Instrutória, cujo depoimento se mostra gravado das 11:07:38 às 11:33:24; da testemunha (…), que respondeu à matéria dos artºs. 15º, 16º e 17º da Base Instrutória, cujo depoimento se mostra gravado das 11:33:26 às 11:49:04; da testemunha (…), que respondeu a toda a matéria da Base Instrutória, cujo depoimento se mostra gravado das 11:49:07 às 12:05:32 – Acta de Audiência de 04/10/2011.

15ª - O Tribunal “A Quo” não deu cumprimento ao disposto no artº. 659º nº. 3 e extravasou dos limites impostos pelo disposto no artº. 660º nº. 2, que violou … E o Meritíssimo Juiz “A Quo” deixou de pronunciar-se sobre questões que deveria ter apreciado, tendo, por outro lado, conhecido de questões de que não podia tomar conhecimento … O que tudo determina a nulidade da Sentença nos termos do artº. 668º nº. 1 als. c) e d) do C. P. Civil, com as consequências do disposto no artº. 712º nº. 1 als. a) e b), 2, 3, 4 e 5 do C. P. Civil.

16ª - Da análise de toda a prova, por confissão, documental e testemunhal produzida nos Autos, é forçoso concluir-se pela existência de erro na apreciação da prova (artº 690º A nº. 1 e 712º do C. P. Civil), que importa reparar.

17ª - Ao decidir nos termos da Sentença revidenda o Tribunal “A Quo” violou o disposto nos artºs. 342º; 349º, do C. Civil; artºs. 659º nº. 3; 660º nº. 2, do C. P. Civil.

NESTES TERMOS, e com o douto suprimento desse Venerando Tribunal, revogando a Sentença de Primeira Instância, julgando a acção procedente, por provada, na vertente da verificação do contrato de mútuo e condenando os RR. no pedido da al. A) da P.I. (A) – A ver reconhecida a nulidade do contrato de mútuo celebrado com os AA. e, consequentemente, a restituir a estes o montante de € 78.523,12 (setenta e oito mil, quinhentos e vinte e três euros e doze cêntimos), acrescido de juros moratórios, que na presente data (09/11/2005), ascendem a € 7.409,14 (sete mil, quatrocentos e nove euros e catorze cêntimos), e juros vincendos até efectivo e integral pagamento.

- Ou, sendo outro o entendimento, julgando a acção procedente, por provada, na vertente da verificação do enriquecimento sem causa e condenando os RR. no pedido da al. B) da P.I. (B) – Serem os RR. condenados, com base no enriquecimento sem causa (artº. 473º do C.C.), a restituir aos AA. a quantia de € 78.523,12 (setenta e oito mil, quinhentos e vinte e três euros e doze cêntimos), acrescida de juros moratórios, que na presente data (9/11/2005) ascendem a € 7.409,14 (sete mil, quatrocentos e nove euros e catorze cêntimos), e juros vincendos até efectivo e integral pagamento, Vªs. Exª.s farão, como sempre, a habitual JUSTIÇA».

10. Não foram apresentadas contra-alegações.

11. O Mm.º Juiz pronunciou-se no sentido de não se verificarem as nulidades assacadas pelos recorrentes à sentença proferida.


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Mantém-se a validade e regularidade da instância.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.


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II. O objecto do recurso[1].

As questões a apreciar no presente recurso de apelação, pela sua ordem lógica de apreciação, consistem em saber se:

- a sentença recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia, em virtude de não se ter pronunciado quanto à questão da existência ou inexistência do invocado contrato de mútuo; e de nulidade por excesso de pronúncia;

- deve ser alterada a resposta à matéria de facto referente aos pontos 15.º a 17.º da base instrutória referente à ampliação da matéria de facto;

- se mostram verificados os pressupostos do enriquecimento sem causa dos RR.


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III – Fundamentos

III.1. – De facto

Foram os seguintes os factos considerados como provados na primeira sentença proferida nos presentes autos[2] e na sentença ora proferida:

1 – FM (…) casou no dia 17.05.2003 com SM (…), filha de OM (…)e de MR (…) (al. a) dos Factos Assentes).

2 - No dia 07.07.2003 o Autor entregou à C– (…)Ldª o cheque nº 6059447441, sacado sobre a Caixa K (...), datado de 07.07.2003, que se encontrava já preenchido, além do mais, com o valor de € 59.500,00 (al. b) dos Factos Assentes).

3 - O Autor entregou à AT (…), Lda., o cheque nº 335944744, sacado sobre a Caixa K (...), datado de 25.07.2003, que se encontrava já preenchido, além do mais, com o valor de € 25.523,12 (al. c) dos Factos Assentes).

4 - A C (…), Lda., emitiu a factura nº 47, datada de 31.07.2003, em nome de FM (…), referente à compra da máquina giratória de rastos de marca Samsung, modelo Se 210LC 3, série FCY 1467 pelo montante de € 59.500,00, IVA incluído (al. d) dos Factos Assentes).

5 - A AT (…), Lda., emitiu a factura nº 003739, datada de 25.07.2003, em nome de FM (…), referente à compra do tractor de marca Scania, com a matrícula nº (...)VH, com o quadro nº VLDR4X20009032647 pelo montante de € 24.523,12 (al. e) dos Factos Assentes).

6 - A Ré sempre deu o seu consentimento e apoio ao réu na sua actividade e nas dívidas que contraía, sendo da sua actividade profissional que o Réu sustentava o seu agregado familiar (al. f) dos Factos Assentes).

7 - A máquina e o tractor referidos em 5) e 6) destinavam-se a ser utilizados pelo réu no exercício da sua actividade profissional de demolições e terraplanagens (ponto 2 da Base Instrutória).

8 - No dia 22.07.2003 foi depositado para crédito na conta 00453240 4001632308947, de que os autores são titulares, o montante de €3.000,00 (ponto 9 da Base Instrutória).

9 - No dia 06.07.2004 a autora MR (…) depositou para crédito na conta 0045 3240 4001632308947, de que os Autores são titulares, o montante de € 2.500,00, dos quais € 2.385,00 provinham de cheques e € 115,00 de numerário (ponto 13 da Base Instrutória).

10 - O Réu utilizou a máquina e o tractor referidos em 4) e 5) na sua actividade profissional (ponto 14 da Base Instrutória).

11 - O Réu expandiu a sua actividade com a máquina e o tractor referidos em 4) e 5) (ponto 15 da Base Instrutória).

12 - O que trouxe aos Réus um acréscimo patrimonial (ponto 16 da Base Instrutória).

13 - O Réu, aquando do convénio a que se refere o documento referido em 5), transmitiu à AT (…), Lda. um seu tractor mediante o pagamento por esta, em contrapartida, de € 3.000,00 (ponto 17 da Base Instrutória).

14 - O Autor fez questão em passar o cheque referido em 3) e recebeu da AT (…), Lda., com autorização do Réu, o cheque de € 3.000,00 referente a essa transmissão (ponto 18 da Base Instrutória).

15 - Os Autores afirmaram em público que tinham oferecido uma máquina e um tractor ao seu genro para ele fazer pela vida (ponto 19 da Base Instrutória).

16 - Após as desavenças conjugais entre os Réus os Autores começaram a afirmar que tinham entregue dinheiro ao Réu para comprar as máquinas, mas que este se vinculou a mais restituir-lhes o montante (ponto 20 da Base Instrutória).

17 - O casamento entre os Réus foi dissolvido por divórcio decretado por sentença de 10.01.2007, transitada em julgado em 23.01.2007, proferida pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial de Águeda (doc. de fls. 109).

18 - Depois do Réu marido encontrar uma máquina giratória que gostava na empresa «C (…), Lda., o Autor e o Réu deslocaram-se lá (ponto 5 da ampliação).

19 - Na ocasião aludida em 18), o Autor marido fez o negócio, comprou a máquina e depois entregou-a ao Réu (ponto 6 da ampliação).

20 - Depois do aludido no ponto 19), os Réus passaram a usá-la diariamente na sua actividade profissional (ponto 7 da ampliação).

21 - Em Julho de 2003, o Autor marido deslocou-se com o Réu marido à empresa AT (…), Lda. onde o Autor marido fez negócio, comprou o tractor e depois entregou-o ao Réu, que passou a usá-lo na sua actividade profissional (ponto 13 da ampliação).

22 – O autor nasceu em 02-12-1947 e a autora nasceu em 23-07-1953 – cfr. documentos de fls. 25 e 25 verso[3].


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III.2. – O mérito do recurso

III.2.1. – Das nulidades arguidas

Pretendem os recorrentes que, como a matéria com que foi ampliada a Base Instrutória contém factos, designadamente os levados aos artºs. 15º, 16º e 17º da ampliação, que se reportam directamente à questão da existência ou inexistência do Contrato de Mútuo, e a sentença é um todo, declarando-se a mesma nula, essa nulidade é abrangente, incidindo sobre a globalidade da decisão proferida em Primeira Instância, entendendo que a sentença ora proferida deveria, nesta sede, pronunciar-se sobre o Contrato de Mútuo, até porque há matéria bastante nos Autos, nomeadamente com a prova agora produzida, que indicia a existência daquele contrato de mútuo … Não o fazendo, a decisão ora objecto de recurso está ferida de nulidade, por omissão de pronúncia, quanto à questão da existência, ou inexistência do contrato de mútuo [artº. 668º nº. 1 al. d) do C.P.C.].

Porém, não lhes assiste qualquer razão na invocada nulidade.

Efectivamente, dispõe o referido preceito legal, sob a epígrafe “Causas de nulidade da sentença”, que:

“É nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.

Esta causa de nulidade da sentença consiste, portanto, na omissão de pronúncia, sobre as questões que o tribunal devia conhecer; ou na pronúncia indevida, quanto a questões de que não podia tomar conhecimento[4].

É entendimento pacífico que esta nulidade está em correspondência directa com o preceituado no artigo 660.º, n.º 2, do CPC, que impõe ao juiz a resolução de todas as questões que as partes submeteram à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras, não podendo, porém ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes (salvo as de conhecimento oficioso), constituindo, portanto, a sanção prevista na lei processual para a violação do estabelecido no referido artigo[5].

É também pacífico o entendimento de que as questões a que alude o preceito não se confundem com todas as considerações ou argumentos expendidos pelas partes em defesa da orientação preconizada[6].

“São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para a sua pretensão”[7].

“O dever imposto no artigo 660.º, n.º 2 do CPC diz respeito ao conhecimento, na sentença, de todas as questões de fundo ou de mérito que a apreciação do pedido e causa de pedir apresentadas pelo autor (ou, eventualmente, pelo réu reconvinte) suscitam, quanto à procedência ou improcedência do pedido formulado. E para que este dever seja cumprido, é preciso que haja identidade entre a causa petendi e a causa judicandi, entre a questão posta pelas partes (sujeitos), e identificada pelos sujeitos, pedido e causa de pedir, e a questão resolvida pelo juiz, identificada por estes mesmos elementos. Só estas questões é que são essenciais à solução do pleito. E é por isto mesmo, que já não o são os argumentos, razões, juízos de valor ou interpretação e aplicação da lei aos factos”[8].

Ora, os autores intentaram a presente acção formulando dois pedidos: o de restituição com base na nulidade do invocado contrato de mútuo; e de restituição com base no enriquecimento sem causa, sendo o segundo, quer processual quer substantivamente, subsidiário do primeiro. Significa isto que o pedido de restituição com base no enriquecimento sem causa, atenta a natureza também ela subsidiária do instituto (artigo 474.º do Código Civil[9]), foi apresentado ao tribunal para ser conhecido apenas no caso de não proceder o pedido anterior (artigo 469.º do Código de Processo Civil[10]).

Portanto, trata-se manifestamente de pedidos independentes um do outro, tanto assim que a oposição entre pedido principal e subsidiário nem sequer obsta à dedução de pedidos nestes termos (n.º 2 do citado artigo 469.º).

No caso dos autos, foi precisamente porque o Mm.º Juiz a quo, apesar de ter julgado improcedente o pedido principal, não se pronunciou sequer implicitamente sobre o pedido subsidiário formulado quanto tinha que o ter tido então em consideração, que no primeiro Acórdão proferido por este Tribunal da Relação, foi considerada a existência de nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

Porém, esse Acórdão, foi claro ao apreciar concretamente a matéria relativa ao contrato de mútuo que havia sido tratada na sentença recorrida, para afirmar que “ficou por provar a factualidade que permitiria a subsunção da mesma ao direito invocado, que permitiria dar por preenchido o mencionado artigo 1142º, e assim concluir que tinha havido um empréstimo ou mútuo dos AA aos RR, com a inerente obrigação de restituição”, acrescentando ainda que “todos os quesitos relevantes para demonstrar o invocado mútuo, mereceram resposta de não provado. Não é possível, desta maneira, tornear tais respostas, ignorá-las, pura e simplesmente, para, apelando às ditas presunções judiciais, considerar, agora, como verificado um empréstimo dos AA aos RR, que aqueles não lograram comprovar existir”.

Seguidamente, afirmando que apesar da nulidade da sentença recorrida, atrás verificada, o tribunal de recurso deve conhecer do objecto da apelação, sempre que disponha dos elementos necessários (art. 715º, nº 1 e 2, do CPC), avançou para o conhecimento da questão do enriquecimento sem causa.

Porém, detectando que havia matéria factual alegada por ambas as partes relacionada com a suposta doação, que não foi levada em consideração, não tendo sido seleccionada para a base instrutória, apesar de controvertida e essencial para uma justa e acertada decisão do pleito, terminando a ordenar a ampliação da respectiva matéria de facto, nos termos em que foi ali precisada, “por ser indispensável a uma correcta apreciação e decisão da presente questão, ou seja, saber se existe ou não enriquecimento sem causa por parte dos recorridos (art. 712º, nº 4, 1ª parte, do CPC, sem prejuízo do disposto na 2ª parte do mesmo número)”.

Em conformidade, no dispositivo julgou-se, “parcialmente, procedente o recurso, declarando-se nula a decisão recorrida, por omissão de pronúncia, relativamente à questão do enriquecimento sem causa, e assim se ordenando a ampliação da matéria de facto, nos termos precisados em III-4”.

Transcreveu-se esta parte do acórdão proferido nestes autos para agora se afirmar, com toda a clareza que aquele encerra, que a questão relativa ao pedido principal foi decidida naquele acórdão, com força atribuída ao caso julgado nos artigos 671.º e 673.º do CPC, restringindo-se a anulação apenas ao apuramento do pedido subsidiário, único que se curará agora de apreciar.

Pelo exposto, a sentença recorrida não enferma de nulidade por omissão de pronúncia relativamente ao contrato de mútuo, porquanto se limitou a respeitar os referidos preceitos legais.

Diga-se ainda que, à semelhança do que já haviam feito no anterior recurso e apesar da decisão ali proferida, os autores voltam a insistir que “o Tribunal “A Quo” não deu cumprimento ao disposto no artº. 659º nº. 3 e extravasou dos limites impostos pelo disposto no artº. 660º nº. 2, que violou … E o Meritíssimo Juiz “A Quo” deixou de pronunciar-se sobre questões que deveria ter apreciado, tendo, por outro lado, conhecido de questões de que não podia tomar conhecimento … O que tudo determina a nulidade da Sentença nos termos do artº. 668º nº. 1 als. c) e d) do C. P. Civil, com as consequências do disposto no artº. 712º nº. 1 als. a) e b), 2, 3, 4 e 5 do C. P. Civil”.

Fazem-no, porém, quanto às demais nulidades, de forma absolutamente genérica e até incompreensível. Quais as questões de que juiz conheceu e não podia tomar conhecimento? Não existem, pois se até os recorrentes dizem que o mesmo omitiu pronúncia, como é que conheceu do que não podia conhecer? E como é que extravasou dos limites impostos pelo 660.º, n.º 2, do CPC? Pois, não o fez, sendo manifestamente improcedentes e carecendo de fundamento qualquer outra das nulidades invocadas.


*****

III.2.2. – Alteração da matéria de facto

(…)

Na verdade, a fundamentação da matéria de facto nos termos sobreditos, omite totalmente a valorização dos depoimentos de parte prestados quanto à matéria impugnada pelos RR.

Efectivamente, a Ré SM (…), conforme decorre da assentada constante da acta de audiência de julgamento de fls. 831, confessou os pontos 15, 16 e 17 da base instrutória decorrente da ampliação da matéria de facto determinada por este Tribunal da Relação, pelo que importa, antes de mais apreciar qual o valor que tal confissão pode encerrar na economia dos presentes autos, uma vez que o co-réu, FM (…), negou o seu teor (cfr. fls. 832).

Nos termos do artigo 352.º do Código Civil, a “[c]onfissão é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária”, sendo certo que tal reconhecimento aconteceu no depoimento de parte prestado pela ré.

Porém, nos termos do artigo 353.º da mesma codificação:

“1. A confissão só é eficaz quando feita por pessoa com capacidade e poder para dispor do direito a que o facto confessado se refira.

2. A confissão feita pelo litisconsorte é eficaz, se o litisconsórcio for voluntário, embora o seu efeito se restrinja ao interesse do confitente; mas não o é, se o litisconsórcio for necessário”.

Estabelece este preceito legal, os requisitos relativos à pessoa do confitente para que a confissão possa ser considerada eficaz. Assim, exige-se que o confitente tenha não só a plena capacidade de exercício de direitos – o que no caso em apreço não está em causa[11] -; mas também que esteja legitimado para o fazer.

Na verdade, “porque a confissão do facto pode envolver o risco de perda do direito a que o facto se refere, torna-se necessário para a eficácia da confissão que esta seja feita por quem tenha o poder de disposição do direito a que o facto confessado se refere. (…)

No caso especial do litisconsorte, há que distinguir entre o litisconsórcio voluntário e o litisconsórcio necessário, de harmonia com a distinta natureza que revestem um e outro (artigo 29.º): no 1.º caso, a confissão do litisconsorte é eficaz, embora circunscrita à posição singular do confitente; no 2.º caso, dada a unicidade da acção, a confissão não é eficaz”[12].

Assim, no caso em apreço, pretendendo os autores que os RR., casados entre si à data da propositura da acção (cfr. pontos 1. e 17. da matéria de facto), no regime da comunhão de adquiridos[13], procedessem à restituição da quantia que alegadamente lhes haviam emprestado e que ingressou no património do casal para exercício da actividade profissional do R. marido, nos termos do artigo 28.º-A, n.º 3, do CPC intentaram a presente acção contra ambos os cônjuges.

Na verdade, tendo os autores configurado a acção como emergente de facto praticado por ambos os cônjuges - recebimento de quantia com vista a determinado fim, com obrigação de restituição – as obrigações decorrentes deste contrato responsabilizam ambos, nos termos prevenidos no artigo 1691.º, n.º 1, alínea a), e o mesmo aconteceria nos termos da alínea c), e tal mantém-se nestes termos apesar de entretanto ter sido decretado o divórcio entre ambos.

Trata-se, portanto, de uma única acção com pluralidade de sujeitos interessados na relação controvertida, cuja intervenção é imposta por lei, donde a falta de qualquer um deles ser motivo de ilegitimidade do outro, uma vez que não têm na causa posições independentes. Estamos, como é evidente, no domínio do litisconsórcio necessário referido nos artigos 28.º e 30.º do CPC.

  Desta sorte, a confissão da ré não tem a força probatória prevista no artigo 358.º, n.º 1, do CC, não tendo força probatória plena nem contra a confitente, nem evidentemente contra o co-réu que não confessou.

Porém, não deve confundir-se entre depoimento de parte e confissão, já que aquele é apenas uma das vias através das quais se pode obter a confissão, mostrando-se, porém, “ultrapassada a concepção restrita de tal depoimento vocacionado exclusivamente àquela obtenção, já que o mesmo tem um campo de aplicação muito mais vasto”[14].

Efectivamente, o depoimento de parte a que se referem os artigos 552.º a 554.º do CPC e o artigo 356.º, n.º 2 do Código Civil, destina-se primacialmente à obtenção da confissão judicial provocada, isto é, à admissão por uma das partes de um facto que lhe é desfavorável e que favorece a parte contrária.

Daí que, em princípio, tudo quanto para além de tal matéria constar de um depoimento de parte, não possa ser valorado como confissão.

Assim, prestado o depoimento, há que distinguir:

- ou este conduz à confissão de factos que são desfavoráveis ao depoente, devendo, então, ser-lhe atribuído o valor probatório previsto no artigo 358.º, n.º 1, do CC;

- ou o mesmo não conduz a confissão, ou a confissão eficaz, sendo, nesse caso, o respectivo valor probatório apreciado livremente pelo tribunal nos termos do artigo 655.º do CPC.

Na verdade, mesmo o depoimento de parte que não redunde em confissão, por exemplo, por respeitar apenas a factos favoráveis ao depoente, pode ser livremente apreciado pelo tribunal, constituindo um simples elemento probatório a atender segundo o prudente critério do julgador, ou seja, uma prova livre à qual o juiz atenderá se entender que dali pode colher elementos para a boa decisão da causa[15].

Ora, ouvido o depoimento prestado pela ré verificamos que o mesmo se nos afigura, tanto quanto é possível aferir apenas pela gravação do seu tom de voz, um depoimento espontâneo, tanto assim que a mesma começa logo por dizer que os pais lhes emprestaram o dinheiro, afirmando depois, a instâncias do Mm.º Juiz, que nunca tiveram a intenção de lhes doar o que quer que fosse, nem um apartamento, nem o preço das máquinas, porque eram poupanças de uma vida inteira e os pais nunca iriam prejudicar a minha irmã, tendo depois aduzido, na sequência de nova pergunta formulada, que nunca foi alguma vez falado pelos pais que lhes iam doar algum apartamento.

Ora, as declarações prestadas pela ré, afiguram-se-nos desde logo verosímeis, no confronto das declarações prestadas pelo próprio réu.

De facto, este declarou que o sogro, com quem então se dava bem e acompanhavam muito um com o outro, numa conversa em que estavam só os dois, disse-lhe que tinham (os ora autores) a intenção de lhes doar um apartamento; esta conversa ocorreu pouco tempo depois de os réus se casarem; então o depoente, disse-lhe que gostaria de mais tarde fazer uma casa e disse-lhe “eu preciso de uma giratória, se você não se importa, então em vez do apartamento, dê a máquina”, explicando que isto era porque fazia trabalhos de terraplanagem e precisava da mesma para expandir a actividade, ao que o sogro acedeu, comprando-lhe a máquina giratória e depois o tractor porque a máquina foi mais barata do que ele pensava e assim ficava mais próximo do valor do apartamento.

Perguntado a razão desta confiança em tão pouco tempo de casamento – os réus casaram em 17-05-2003; no dia 07-07-2003 o autor entregou o cheque para pagamento da máquina; e no dia 25-07-2003, entregou o cheque para pagamento do tractor – o réu respondeu que tinha começado a frequentar a casa deles mais ou menos 3 a 4 meses depois de iniciar o namoro que durou cerca de um ano e meio antes do casamento e que criaram amizade nesse período.

Porém, estranha-se que, dando-se o réu nessa altura bem com a ré, sua mulher, perguntado sobre se alguma vez entre ele e a mulher tinha havido conversa sobre a doação do apartamento ao casal, o mesmo tenha respondido que a mulher nunca lhe disse que o pai falou com ela sobre isso.

Ora, considerando que os ora réus viviam então na casa dos ora autores, considerando a importância avultada que configura a aquisição duma casa, o facto de nunca tal conversa ter ocorrido em família, e apenas tenha existido entre os dois, o réu e o sogro, é uma situação que contraria frontalmente as regras da experiência comum, porquanto nunca o réu afirmou que existissem quaisquer problemas de relacionamento entre o ora autor, a mulher e as filhas, que levassem a que ele, o mais recente membro da família, fosse o escolhido pelo sogro para uma liberalidade, da qual a própria filha não tinha conhecimento.

Estranha-se ainda que, querendo os autores doar um apartamento ao casal, e considerando que o casamento era então muito recente, não o tivessem feito imediatamente antes do casamento para que o jovem casal pudesse ir habitar para uma casa separada da dos pais da ré. Tal seria seguramente o mais comum, caso os pais da noiva quisessem efectuar tal liberalidade.

Mas, estranha-se mais ainda tal intenção dos ora autores, se tivermos em conta que o montante em questão – quer fosse para pagar um apartamento ou as máquinas -, correspondia integralmente ao valor que aqueles tinham em depósito a prazo à época, não se nos afigurando credível que o ora autor, por si só e sem conhecimento de mais nenhum elemento da família, dispusesse de montante tão significativo das poupanças do casal.

De facto, também a prova documental junta aos autos torna credível o depoimento prestado pela ré.

Efectivamente, com a petição inicial, os autores haviam procedido à junção do extracto da Caixa K (...) que faz fls. 19, do qual decorre que, efectivamente nesta conta à ordem os ora AA. ficaram com um saldo à ordem de 6.336,68€ após o desconto do cheque de 59.500,00€, e de 1.742,53€ após o desconto do cheque de 25.523,12€, mas também resulta que antes do movimento a crédito de 59.000,00€ ocorrido em 07/07/2003, discriminado como sendo uma liquidação parcial de um depósito a prazo ali identificado, a conta à ordem tinha um saldo de 7.943,68€, e que também antes da emissão do segundo cheque existiu um movimento a crédito de 18.313,67€, proveniente de nova liquidação do referido depósito a prazo, pelo que este documento seria insuficiente para afirmar sequer que os ora AA. não tivessem outros depósitos na mesma instituição bancária, quanto mais, que não tivessem outras poupanças.

Porém, com o requerimento de prova apresentado aquando do aditamento da base instrutória, vieram os AA. peticionar para prova do referido artigo 15.º que o Banco de Portugal fosse notificado para informar se detinham qualquer outra conta e os respectivos saldos; solicitando ainda que a Caixa K (...) fosse notificada para informar quais os depósitos a prazo que detinham, se os mesmos foram liquidados e o saldo remanescente após o levantamento dos dois cheques em questão nos autos.

Deferido tal requerimento, todas as instituições bancárias identificadas nos ofícios de fls. 740 a 757, 762 a 783, 785 e 787, vieram informar que os autores não eram seus clientes, com excepção do Santander Totta que, por ofício de fls. 784, informou que os autores são titulares duma conta com o saldo actual de 1,91€.

Por serem as únicas respostas positivas com algum valor substancial, revestem interesse apenas as informações bancárias de fls. 735 – em que a Caixa K (...)confirma o que já resultava do referido extracto quanto a valores, adiantando que após estes levantamentos, a conta a prazo ficou com saldo 0, e que posteriormente àquela data os ora autores constituíram outros depósitos a prazo -; e de fls. 803, esta proveniente da Caixa W (...) certificando que em 01 de Julho de 2003, a autora era cliente depositante co-titular de uma conta que então apresentava o saldo de 21.474,43€, não sendo o autor marido cliente da instituição.

Nessa sequência, vieram os autores informar que esta conta da Caixa W (...) tem como principais titulares os pais da autora (…) constando a autora e a irmã, (…), como co-titulares da conta, porque os pais assim o desejaram, de modo a precaver qualquer ocorrência àqueles que pudesse impedir a movimentação do dinheiro existente, mas que as quantias depositadas pertencem aos pais da autora.

Juntaram cópia do Bilhete de Identidade da autora da qual consta que a mesma é filha dos indicados (…) (fls. 812), e cópia da ficha inicial da conta, da qual resulta que a mesma foi aberta em 04/03/2002, e tem efectivamente como primeiro e segundo titulares os referidos pais da autora, como terceira titular (…) e como quarta titular, a ora autora, sendo uma conta solidária (fls. 814 a 817).

O réu FM (…) veio impugnar o alegado no requerimento com excepção do parentesco, entendendo não se poder concluir do documento que o dinheiro ali depositado não pertence aos autores.

Em audiência de julgamento não foi produzida prova quanto a esta matéria.

Porém, a pretensão do réu no sentido invocado de que o dinheiro ali depositado não pertence aos autores não pode proceder nos referidos termos.

De facto, o depósito bancário é o contrato pelo qual uma pessoa entrega determinada importância em dinheiro a um banco, que se obriga a restitui-lo no fim do prazo convencionado ou a pedido do depositante.

Sendo um contrato real que só fica perfeito com a entrega das quantias monetárias, o depósito bancário não se constrói a partir do pressuposto de que a propriedade do dinheiro pertence ao depositante, porquanto este pode actuar como mandatário ou como simples manuseador de dinheiros alheios[16].

A conta bancária solidária pode ser movimentada por qualquer dos respectivos titulares, indistinta ou isoladamente, ou seja, qualquer um deles, quer tenha sido o depositante ou seja apenas titular, tem a faculdade de exigir, por si só, a totalidade da quantia depositada, podendo fazer também, individualmente os depósitos.

Este é o regime que resulta da respectiva abertura de conta. Portanto, naquilo que for omisso, caberá recorrer às regras gerais sobre obrigações solidárias, verificando-se, caso a caso, as adaptações que se mostrem necessárias[17].

Das regras gerais previstas nos artigos 512.º e seguintes do Código Civil resulta desde logo que se algum dos depositantes solicitar a entrega da totalidade da quantia, a prestação efectuada pelo Banco libera-o da respectiva obrigação de restituição para com todos eles (cfr. art. 512.º do CC).

Consequentemente, a solidariedade das contas bancárias tem lugar, em regra, apenas para assegurar o interesse dos titulares das respectivas contas, precisamente pela possibilidade de cada um dos titulares poder receber a totalidade do saldo.

Deste regime decorre que a titularidade da conta pode nada ter a ver com a propriedade do montante monetário nela depositado[18].

 Por isso, o que acontece nas contas solidárias é que se o dinheiro que ali é depositado for exclusivamente de um dos titulares, tal não impede que qualquer outro titular possa proceder ao seu levantamento, isto sem que o Banco tenha qualquer obrigação para obstar a esse levantamento, sob pena de estar a incumprir o contrato de depósito.

Assim, a propriedade do dinheiro depositado releva apenas nas relações internas entre os contitulares da conta, mas não para com o banco em causa[19].

O mesmo acontece para com terceiros, porquanto, estando a conta bancária solidária sujeita ao regime estabelecido nos referidos artigos 512.º e seguintes do CC, nos termos do artigo 516.º do CC, presume-se que os seus contitulares são credores solidários, comparticipando em partes iguais no crédito.

De facto, “nas relações entre os titulares, neste tipo de conta, vale a presunção do art. 516.º do CC na repartição do saldo, existindo, pois, uma presunção juris tantum de que todos os contitulares são donos do montante depositado em partes iguais”, sendo que “esta presunção tem-se por ilidida no caso de se provar que o dinheiro é propriedade exclusiva de um dos contitulares (art. 350.º, n.º 2, do CC)”[20].

Na verdade, “há que distinguir entre titularidade da conta e propriedade das quantias depositadas mas pela presunção “tantum iuris”, aplicável às contas solidárias do artigo 516.º do Código Civil, na relação interna, os depositantes participam no crédito em partes iguais.

O regime da compropriedade é aplicável à comunhão de outros direitos, “ex vi” do artigo 1404.º do Código Civil (sem prejuízo do especialmente disposto para cada tipo de comunhão) sendo de o considerar para todas as situações de contitularidade de contas bancárias, razão porque também lhes é extensível a presunção de participação quantitativa igual ao que se refere o n.º 2 do artigo 1403.º”[21].

Revertendo ao caso dos autos, em face do regime legal aplicável, não tendo os autores demonstrado cabalmente que da quantia depositada na Caixa W (...) na referida conta solidária, nenhum montante pertencia à autora, funciona a referida presunção de que lhe pertencia ¼ da quantia depositada, ou seja, 5.368,61€.

            Portanto, em face da prova documental produzida podemos concluir que em face do levantamento dos valores dos cheques entregues aos fornecedores para pagamento da máquina giratória e do tractor, os autores ficaram na sua conta conjunta com um saldo de 0€ a prazo e de 1.742,53€ à ordem, presumindo-se que a autora era proprietária do referido montante de 5.368,61€.

            Ora, à data dos factos os autores tinham, respectivamente, 57 e 52 anos de idade, tendo disponível conjuntamente àquela data em instituições bancárias a referida quantia.

            Pergunta-se: é razoável supor que, como pretende o réu, queriam efectuar uma liberalidade a uma das filhas e genro, correspondente ao total do montante que haviam amealhado e detinham em depósito a prazo, ficando para si com uma quantia de valor diminuto na comparação com aquela?

            Afigura-se-nos que não.

            De facto, ao invés do afirmado na fundamentação da sentença recorrida, pensamos que da prova documental produzida – obtida, note-se, a pedido dos autores que autorizaram a averiguação da sua situação económica em todos os Bancos, demonstrando, portanto, um grande à vontade quanto ao que afirmavam quanto ao valor daquele montante no confronto com as suas poupanças -, é lícito presumir, em face da prova por depoimento de parte e testemunhal produzida nesse sentido pelas demais testemunhas supra referidas, que os autores não pretenderam doar o montante em questão aos RR.

Na verdade, “[a]s presunções judiciais ou de facto constituem meios de prova mediata retirados dos factos provados, através dos quais o julgador, guiado por regras práticas e da experiencia, retira ilações lógicas de certos factos conhecidos para chegar ao conhecimento de outros desconhecidos, mediante um percurso intelectual, lógico, sem soluções de continuidade, mas sem uma relação demasiado longínqua entre o facto conhecido e o facto adquirido, cuja força probatória é apreciada, livremente, pelas instâncias”[22].

Efectivamente, de entre os poderes da Relação na apreciação da matéria de facto, nem sequer se exclui o uso de presunções judiciais, razão pela qual o uso deste meio de prova pode ser, quer sindicado, quer directamente utilizado pela Relação em sede de reapreciação da matéria de facto[23], nomeadamente, fazendo uso do preceituado no artigo 659.º, n.º 3, tomando em consideração factos provados por documentos, e concluir, ainda em sede de matéria de facto, lançando mão de presunções judiciais[24].

Na verdade, apesar de se tratar de um facto negativo, ou sobretudo por isso, atenta a maior dificuldade que a prova dos mesmos encerra que se tem considerado como uma “prova diabólica”, o Mm.º Juiz a quo, também podia efectivamente ter recorrido às presunções judiciais para o determinar, em face do que dispõem os artigos 349.º e 351.º do CC, porquanto os factos em referência podem ser provados por testemunha, sendo as presunções as ilações que o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.

Ora, no caso dos autos, os factos conhecidos são: a existência do pagamento pelos autores da máquina giratória e tractor que ingressaram no património dos RR., cujo montante foi superior ao depósito a prazo que os autores então detinham; a idade dos autores; o facto de terem outra filha; e sobretudo, o facto de aquando da compra do tractor, o réu ter dado autorização para que o cheque correspondente ao valor da retoma, no montante de 3.000,00€ fosse entregue ao autor. Como é que se explicaria esta situação, se os autores quisessem doar aos réus os quase 85.000,00€? Diremos, não se explica, razão pela qual, tem todo o fundamento o uso da presunção judicial para, em face das regras da experiência comum, considerar assente que os autores não quiseram doar aos réus os montantes correspondentes ao valor dos cheques entregues para pagamento da máquina giratória e do tractor.

Mas, para além da prova por presunção judicial, na verdade, quer a ré SM (…), quer as referidas testemunhas, nomeadamente a sua irmã, (…)afirmaram efectivamente o que, em síntese, é reproduzido nas alegações produzidas pelos AA.

Quanto às indicadas testemunhas, umas referiram ter ouvido conversas no café ou em casa dos autores essencialmente imputadas aos ora réus, onde estes diziam que as referidas máquina e tractor tinham sido adquiridas com o dinheiro que os ora AA. lhes haviam emprestado, e para si concluíram que assim seria tanto mais que os mesmos tinham outra filha, não se lhes afigurava que tivessem igual montante para lhe ofertar e que os mesmos nunca prejudicariam a filha (…) dando como exemplo o facto de os pais de ambas, e ora Recorrentes, terem oferecido simultaneamente um carro a ambas.

Ora, se estes depoimentos são, diga-se em abono da verdade, genericamente compatíveis com as regras da experiência comum, a credibilidade dos mesmos não pode esbarrar com o facto de as testemunhas não conseguirem precisar o momento temporal em que relatam ter ouvido os mesmos – eram conversas casuais, que respeitam à vida de terceiros, amigos que fosse, e como tal, estranho seria se soubessem indicar o dia e hora em que tais conversas tiveram lugar.

Por fim diga-se que estas afirmações das testemunhas não são incompatíveis com o facto de se encontrar já demonstrando que os AA afirmaram publicamente que tinham oferecido uma máquina e um tractor ao seu genro para ele fazer pela vida, e só após as desavenças entre os RR, tivessem começado a afirmar que haviam emprestado o dinheiro para as máquinas com obrigação de restituição do montante[25].

Na verdade, não sabemos em que circunstâncias foram produzidas tais afirmações, mas sabemos que as que foram produzidas pelas referidas testemunhas nestes autos no sentido de que os autores não pretenderam doar o valor da máquina e tractor aos réus, foram efectuadas em condições que se reputam como normais em meios pequenos: em conversas no café dos autores e na casa destes, dirigidas a pessoas que lhes são próximas.

Por fim, já não se compreende porque razão os AA. não fizeram prova cabal do alegado na parte em que seria documentalmente atestável quanto ao facto de os réus terem pretendido obter um empréstimo bancário de tal quantia que não lograram conseguir. Bastava terem solicitado tal documento à instituição bancária, caso existisse.

Portanto, os meros depoimentos de parte e testemunhais não podem ter a virtualidade de o provar, apesar das afirmações nesse sentido.

Daí que, impendendo sobre os autores o ónus da prova de tais factos, a dúvida sobre a realidade do facto controvertido, se deva resolver em seu desfavor, em face do que estabelece o artigo 516.º do CPC.

Concluindo, nos termos sobreditos, este tribunal decide alterar as respostas dadas aos artigos 15.º a 17.º da base instrutória nos seguintes termos:


Artigo 15.º

                   Provado que para o levantamento da sua conta bancária dos cheques referidos nas alíneas b) e c) dos factos assentes, os autores liquidaram totalmente o único depósito a prazo que possuíam, em conjunto, em instituições bancárias, ficando a sua conta à ordem com o saldo de 1.742,53€.

Artigo 16.º

                  Provado que os autores nunca tiveram intenção de doar aos réus um apartamento ou o preço da máquina giratória e tractor.

Artigo 17.º

                Não se responde por se tratar de matéria conclusiva – artigo 646.º, n.º 4, por analogia.

*****

III.2.2. – Decisão de direito

Pretendem os Apelantes que não obtendo a restituição do capital mutuado, por força da nulidade do contrato de mútuo, ou por não se provar a existência do contrato de mútuo e sua consequente nulidade, sempre teriam direito a haver dos réus a referida quantia com base no instituto do enriquecimento sem causa, pedindo consequentemente a revogação da sentença recorrida.

Vejamos, então, se lhes assiste razão.

Em primeiro lugar, cabe afirmar que, em face do disposto no artigo 474.º do CC, a obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa tem natureza subsidiária, ou seja, apenas há lugar à restituição com este fundamento, quando a lei não facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído, ou seja quando não tiver outros meios de reacção[26].

Como vimos, no caso dos autos, os autores peticionaram, a título principal, a restituição do montante em causa, com base na nulidade do contrato de mútuo celebrado entre as partes.

Não tendo os autores provado, pelas razões já expendidas, a existência de tal mútuo, que originariamente impediria o recurso à acção de enriquecimento sem causa em virtude de os interessados disporem desse meio para reporem o direito que invocaram possuir, nada impede que em sede de pedido subsidiário, por sua natureza a apreciar apenas na improcedência do pedido principal, como acontece no caso que nos ocupa, possam agora ver apreciado o seu pedido fundado no enriquecimento sem causa, precisamente porque passaram a não ter qualquer outro meio para fazer valer o seu direito[27].

De facto, a restituição de quantias emprestadas por via de contrato de mútuo ferido de nulidade por falta de forma – artigo 1143.º do CC - deve ser feita directamente com base na estatuição do artigo 289.º do CC e não com fundamento no enriquecimento sem causa, por este ser de natureza subsidiária[28].

Porém, discutindo-se nos autos se houve um mútuo (tese dos autores) ou uma doação (tese do réu) e não se tendo provado qualquer uma dessas causas motivadoras da deslocação patrimonial demonstrada nos autos, efectuada directamente da conta dos autores para aquisição de bens que ingressaram no património dos réus, devem então os autos ser apreciados à luz do instituto do enriquecimento sem causa subsidiariamente invocado, uma vez que não existe outra forma para que os autores possam fazer valer o seu direito[29].

Vejamos, pois, quais os requisitos em que assenta este instituto.

Dispõe o artigo 473.º, nº 1, do CC, que aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou, adiantando o n.º 2 do mesmo preceito que a obrigação de restituir, fundada no enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.

Em face do normativo em apreço, a obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa, pressupõe a verificação cumulativa de três requisitos: a) a existência de um enriquecimento patrimonial; b) que esse enriquecimento não tenha causa justificativa; c) e que tal enriquecimento tenha sido obtido à custa do empobrecimento de quem pede a restituição[30].

O «enriquecimento» consiste na obtenção de uma vantagem que, em princípio, reveste carácter patrimonial, isto qualquer que seja a forma que a mesma apresente: quer seja por via do aumento do activo do património, quer por diminuição do passivo, quer ainda pelo uso ou consumo de coisa alheia ou exercício de direito alheio[31].

No caso dos autos, mostra-se provado que no dia 07.07.2003 o Autor entregou à C (…), Ldª o cheque nº 6059447441, sacado sobre a Caixa K (...), datado de 07.07.2003, com o valor de € 59.500,00, e a Certivias, emitiu a factura nº 47, datada de 31.07.2003, em nome de FM (…) referente à compra da máquina giratória de rastos de marca Samsung, modelo Se 210LC 3, série FCY 1467 pelo montante de € 59.500,00, IVA incluído; e que o Autor entregou à AT (…), Lda., o cheque nº 335944744, sacado sobre a Caixa K (...), datado de 25.07.2003, com o valor de € 25.523,12, e esta empresa emitiu a factura nº 003739, datada de 25.07.2003, em nome de FM (…), referente à compra do tractor de marca Scania, com a matrícula nº (...)VH, com o quadro nº VLDR4X20009032647 pelo montante de € 24.523,12.

Mais se provou que a máquina e o tractor destinavam-se a ser utilizados pelo réu no exercício da sua actividade profissional de demolições e terraplanagens; que o Réu passou efectivamente a utilizar a máquina e o tractor na sua actividade profissional, expandindo-a com o uso dos mesmos, o que trouxe aos Réus um acréscimo patrimonial.

Provando-se ainda que a Ré sempre deu o seu consentimento e apoio ao réu na sua actividade e nas dívidas que contraía, sendo da sua actividade profissional que o Réu sustentava o seu agregado familiar, dúvidas não podem ocorrer que efectivamente os RR. enriqueceram o respectivo património com o ingresso no mesmo da máquina giratória e tractor cujo pagamento foi efectuado pelo autor, verificando-se, portanto, o primeiro requisito a que alude o princípio geral relativo ao locupletamento à custa alheia, o que nos remete desde já para o terceiro requisito.

Efectivamente, a obrigação de restituir pressupõe que o enriquecimento tenha sido obtido à custa de quem requer a restituição. “A correlação exigida por lei entre a situação dos dois sujeitos traduz-se, em regra, no facto de a vantagem patrimonial alcançada por um deles resultar do sacrifício económico correspondente suportado pelo outro. Ao enriquecimento injusto de uma pessoa corresponde o empobrecimento de outra”[32].

Em face da sobredita factualidade, dúvidas não existem também de que o valor correspondente ao custo das máquinas suportado pelos autores saiu da esfera económica dos mesmos para incrementar o património dos réus que adquiriram a respectiva propriedade e passaram a utilizar todas as suas potencialidades.

Portanto, verifica-se também o segundo requisito de empobrecimento do património dos autores com o correspondente aumento do património dos réus, ou seja, o destes aumentou à custa da diminuição patrimonial daqueles.

A questão mais sensível em apreço no caso dos autos, e no fundo aquela em que as partes verdadeiramente dissentem, prende-se com o segundo requisito, referente à ausência de causa justificativa para tal enriquecimento do património dos réus à custa do empobrecimento dos autores.

Como vimos, os autores invocaram a existência de uma causa justificativa que era o primeiro fundamento desta acção: que emprestaram estes montantes aos réus, tendo-se estes obrigado a restituir esse valor. Por seu turno, o réu invocou que a causa para esta deslocação patrimonial havia sido a vontade dos autores em doar aquele valor aos réus.

Tal matéria controvertida foi levada inicialmente à base instrutória sob os artigos 1.º, 3.º, 4.º e 6.º a 12.º, onde se perguntava, em síntese, se os RR. haviam pedido aos autores que lhes entregassem uma quantia monetária para compra de uma máquina giratória e de um tractor, e que mais tarde a restituiriam, tendo os autores assentido, e acordado que quando os RR. tivessem escolhido o equipamento o autor entregaria o dinheiro logo ao vendedor, sendo a restituição do montante efectuada por fases, até ao mês de Julho de 2004, e tendo os RR. efectuado ainda o pagamento parcial de várias quantias que discriminaram, em dinheiro e em cheques. Ora, submetida tal matéria a julgamento, foram declarados não provados os artigos 1.º, 3.º, 4.º, 6.º, 7.º, 10.º a 12.º e parcialmente provado o artigo 9.º apenas quanto à existência dum depósito de 3.000,00€, no dia 22-07-2003, na conta dos autores, mas não que tal depósito foi efectuado pelos RR.  

Por essa razão, na primeira sentença proferida nos autos e já transitada em julgado nessa parte - impondo-se tal julgamento entre as partes e a este Tribunal conforme referido supra -, foi julgado improcedente o pedido de restituição dos valores correspondentes aos pagamentos da máquina e tractor com base na nulidade do contrato de mútuo invocado, que não se provou.

Portanto, os autores não lograram provar a causa que haviam invocado para o pagamento da máquina e tractor que ingressaram no património dos RR.

Em face do acórdão proferido por este Tribunal, foi determinada a ampliação da base instrutória para apreciação da matéria relativa à invocada doação de tal quantia ou, à sua inexistência.

Os factos relativos à existência duma doação foram levados a julgamento sob os pontos 1.º a 4.º, 6.º e 8.º a 14.º da matéria de facto ampliada, tendo os pontos 1.º a 4.º, e 8.º a 12.º merecido as respostas de “não provado”, e nos demais apenas se provaram os factos simples ali referidos, ou seja que o autor pagou e entregou a máquina e o tractor ao réu, mas não que, nessa ocasião, o autor marido ofereceu ao réu os referidos equipamentos.

Ora, conforme se afirmou no anterior acórdão desta Relação, “perante a posição das partes, e a matéria factual por elas alegada, em função do que vier a provar-se, três situações podem vir a ocorrer: ou o réu FM (…), conforme alegou, prova que houve doação, e a presente questão fica desde logo arrumada; ou o réu não faz essa prova mas os AA também não fazem prova de que não houve doação; ou os AA fazem prova de que inexistiu doação.

Nestas duas últimas hipóteses, terão de ser, então, ponderadas e avaliadas as regras legais advenientes do ónus probandi, à luz da sua interpretação doutrinal e jurisprudencial”.

Em face das respostas dadas a esta matéria, no que concerne à alegação efectuada pelo réu, é evidente que o mesmo não demonstrou a causa que havia invocado para a deslocação patrimonial ocorrida em favor do património dos réus, ou seja, não provou, conforme alegara, que os autores lhe haviam oferecido o montante em questão para aquisição da máquina e do tractor.

Efectivamente, o facto de os Autores terem afirmado em público que tinham oferecido uma máquina e um tractor ao seu genro para ele fazer pela vida, e só após as desavenças conjugais entre os Réus, terem começado a afirmar que tinham entregue dinheiro ao Réu para comprar as máquinas, mas que este se vinculou a restituir-lhes o montante, não significa que os Autores tivessem realmente querido efectuar a liberalidade que terão anunciado, porquanto “se não se provaram factos integrantes da vontade de enriquecer o património alheio, não pode haver doação”[33].

Portanto, cumpre apreciar qual a consequência dessa ausência de prova, o que significa que cabe qualificar o tipo de defesa que configuram estes factos alegados pelo réu na economia dos autos, já que na contestação cabe tanto a defesa por impugnação como por excepção – cfr. artigo 487.º, n.º 1, do CPC.

Ora, de acordo com o preceituado no n.º 2 deste normativo, o réu defende-se por impugnação quando contradiz os factos articulados na petição inicial ou quando afirma que esses factos não podem produzir o efeito jurídico pretendido pelo autor; e defende-se por excepção, para o que ora importa, quando alega factos que servindo de causa extintiva do direito invocado pelo autor, determinam a improcedência total ou parcial do pedido.

A defesa por impugnação, ensina Manuel de Andrade[34] “é toda a defesa directa, toda aquela que ataca de frente o pedido, contradizendo os factos aduzidos pelo Autor como constitutivos do seu direito, ou o efeito jurídico que deles pretende tirar o Autor”, podendo fazer-se por negação directa ou por negação indirecta ou motivada. “Esta traduz-se na afirmação de que as coisas se passaram de modo parcialmente diverso e com outra significação jurídica; numa versão diferente do facto visado – aceitando-se porém algum elemento dele – e tal que daí não pode ter resultado o efeito jurídico pretendido pelo autor; numa contraversão ou contra-exposição do mesmo facto. (…) Ex.: o Réu declara ter recebido a título de liberalidade ou de pagamento e não de empréstimo a soma pedida pelo Autor”.

Portanto, a defesa apresentada pelo réu FM (...), ao impugnar os factos alegados pelos autores que fundaram o seu direito à restituição, prima facie, na existência de um mútuo concedido aos ora Réus, configura uma negação indirecta ou motivada dos factos invocados em fundamento do pedido de restituição, porquanto o réu aceitou ter recebido as aludidas quantias, não a título de empréstimo, mas sim por liberalidade dos mesmos, na sequência do casamento havido entre os RR., e entretanto, dissolvido por divórcio[35].

Daí que - ao contrário do que os Apelantes sustentam -, o facto de o Réu não ter provado a existência de tal liberalidade, não resolva, por si só, a presente acção porquanto tal ocorreria apenas se tivesse alcançado sucesso, o que determinava que a questão fosse decidida contra os autores, nos termos do artigo 346.º do CC.

Na verdade, constitui doutrina e jurisprudência absolutamente pacífica, a afirmação de que na acção fundada em enriquecimento sem causa, é ao autor que pede a restituição que incumbe o ónus da alegação e prova da falta de causa para a prestação efectuada, não bastando para esse efeito que não se prove a existência da causa de atribuição alegada pelo réu. É o autor que tem que convencer o tribunal da falta de causa, devendo “in dubio” considerar-se que a deslocação patrimonial teve justa causa[36].

Efectivamente, no plano da interpretação e aplicação do direito envolvido na repartição do ónus da prova não relevam as dificuldades probatórias dos factos negativos, cabendo àquele que pretende subsidiariamente beneficiar do instituto do enriquecimento sem causa a alegação e prova dos factos, quer positivos (enriquecimento suportado por outrem e respectivo nexo causal), quer negativos (ausência de causa legítima, e de outro meio para obter a restituição), que integram os respectivos requisitos.[37]

Desta sorte, cabe agora apreciar se os autores lograram ou não demonstrar a ausência de causa para a atribuição monetária que beneficiou o património dos réus.

Como supra já se expendeu a propósito da alteração da matéria de facto, a resposta não pode deixar de ser afirmativa.

Na verdade, tendo-se provado a existência da deslocação patrimonial em favor dos réus, que a mesma foi suportada pelos autores, e que estes não quiseram proceder à doação de tal montante, dúvidas não restam de que inexiste um suporte legal ou convencional que, à luz dos princípios aceites no sistema legitime o provado enriquecimento do património dos réus, à custa do correspondente empobrecimento do património dos autores, concluindo-se portanto que tal enriquecimento não tem qualquer causa justificativa[38], irrelevando para tal efeito que o Autor tenha acompanhado o réu no momento da aquisição da máquina e do tractor e tenha sido ele a emitir os cheques para o respectivo pagamento.

Assim sendo, e provado que o réu FM (…) casou no dia 17.05.2003 com a ré SM (…), filha dos autores, que a máquina e o tractor pagos pelos autores, destinavam-se a ser utilizados pelo réu no exercício da sua actividade profissional de demolições e terraplanagens e que efectivamente passaram a ser utilizados em tal actividade, e que a Ré sempre deu o seu consentimento e apoio ao réu na sua actividade e nas dívidas que contraía, sendo da sua actividade profissional que o Réu sustentava o seu agregado familiar, verifica-se a existência de proveito comum do casal com a referida atribuição patrimonial, impondo-se, consequentemente, que ambos os RR. restituam aos autores a quantia com que injustamente se locupletaram à custa daqueles.

“A obrigação de restituição encontra-se submetida a um duplo limite: o do enriquecimento e do empobrecimento. Em primeiro lugar, o beneficiado deve apenas restituir aquilo com que efectivamente se acha enriquecido, deve restituir na medida do respectivo locupletamento, isto é, atendendo-se ao seu enriquecimento patrimonial ou efectivo e actual, correspondente à diferença entre a situação real e actual do beneficiado e a situação (hipotética) em que ele se encontraria, se não fosse a deslocação patrimonial operada. Em segundo lugar, o objecto da obrigação de restituir deve compreender tudo quanto se tenha obtido à custa do empobrecido; este não pode receber mais do que a valorização do património do enriquecido, nem mais do que a desvalorização sofrida no seu património”[39].

Nestes termos, tendo-se provado que os AA. suportaram o custo da máquina giratória e do tractor que ingressaram no património dos RR., emitindo cheques para o seu pagamento no valor de 59.500,00€ e de 25.523,12€, e que o Réu, aquando do acordo para aquisição do tractor, transmitiu à AT (…), Lda. um seu tractor mediante o pagamento por esta, em contrapartida, de € 3.000,00,  montante que o Autor, com autorização do Réu, recebeu por via da entrega pela referida empresa dum cheque de € 3.000,00, o que a prova dos autos espelha é que os RR. se locupletaram à custa dos AA. com a quantia de 82.023,12€.

Porém, como os AA. haviam alegado que os RR. procederam a algumas entregas de dinheiro que diminuíram a sua dívida para com eles, apenas peticionaram a restituição da quantia de 78.523,12€, razão pela qual, apesar de não terem demonstrado tais entregas pelos RR., não poder o tribunal condenar os mesmos para além do pedido – artigo 661.º, n.º 1, do CPC.

Na verdade, a verdadeira função do instituto do enriquecimento sem causa é a de reprimir o enriquecimento injustificado, quando o valor patrimonial em questão não deve pertencer àquele que dele beneficia mas ao prejudicado, conduzindo a soluções que chocam o comum sentimento de justiça, mas não o de compensar os eventuais danos sofridos pelo empobrecido[40], pelo que, tendo os autores fixado no referido valor a diminuição do seu património é a esta que o tribunal tem de atender por força dos limites da condenação previstos no citado preceito legal.

Peticionaram ainda os AA. que os RR. fossem condenados a restituir tal montante acrescido de juros moratórios que contabilizaram como devidos desde Julho de 2004, data em que deveriam ter efectuado a restituição.

Porém, os AA. não provaram que haviam acordado com os RR. a restituição nessa data, razão pela qual os juros de mora são os civis, devidos à taxa prevista pela remissão do artigo 559.º, n.º 1, do CC, e apenas desde a data da citação dos RR. para a presente acção, em face do que dispõe o artigo 805.º, n.º 1, da mesma codificação, uma vez que os AA. não demonstraram qualquer prévia interpelação dos RR. para o efeito[41].

Procede, pois, nos termos expostos, o presente recurso.


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III.2.3. - Síntese conclusiva

I – Em caso de litisconsórcio necessário a confissão efectuada pela co-ré em depoimento de parte de factos que são desfavoráveis aos réus não tem força probatória plena, valendo como elemento probatório que o tribunal apreciará livremente.

II – Em sede de reapreciação da prova produzida, o tribunal da Relação pode recorrer a presunções judiciais para dar como provado um facto negativo, sempre que existam factos simples dos quais o mesmo seja a respectiva consequência lógica.

III – Em acção fundada no instituto do enriquecimento sem causa, a alegação pelo réu de que a deslocação patrimonial que aceita existir do património dos autores para o seu, teve como causa uma doação, constitui defesa por impugnação (por negação directa ou motivada), pelo que, o facto de o réu não demonstrar os factos que invocou não determina, por si só, a procedência da acção.

IV – Aos autores que pretendem a restituição por via do instituto subsidiário do enriquecimento sem causa, incumbe o ónus da alegação e prova dos requisitos, positivos e negativos, vertidos no artigo 473.º, n.º 1, do CC, mormente da falta de causa justificativa para o enriquecimento.


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IV - Decisão

Face ao exposto, acorda-se em julgar procedente o recurso de apelação interposto pelos Autores, revogando-se a sentença recorrida, e condenando-se os Réus a restituírem aos Autores a quantia de 78.523,12€ (setenta e oito mil, quinhentos e vinte e três euros e doze cêntimos), acrescida de juros civis às sucessivas taxas legais, desde a citação e até integral pagamento.

Custas do recurso a cargo dos réus/apelados.

Notifique.


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 Albertina Pedroso (Relatora)

Virgílio Mateus

Carvalho Martins


[1] Com base nas disposições conjugadas dos artigos 660.º, 661.º, 664.º, 684.º, n.º 3, 685.º-A, n.º 1, e 713.º, n.º 2, todos do CPC, é pacífico que o objecto do recurso se limita pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo evidentemente daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
[2] Os quais se mantêm inalterados, em face do Acórdão proferido por este Tribunal da Relação supra referido.
[3] Facto aditado nos termos do artigo 659.º, n.º 3, do CPC, aplicável ao julgamento no Tribunal da Relação, ex vi do disposto no artigo 713.º, n.º 3, do mesmo Código.
[4] Cfr. José Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil, Anotado, vol. V, págs. 142 e ss; e Ac. STJ de 19-04-2012, processo n.º 9870/05.5TBBRG.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[5] Cfr. neste sentido, exemplificativamente, Ac. STJ de 12-01-2010, processo n.º 630/09.5YFLSB; Ac. TRL de 20-12-2010, processo n.º 1650/10.2TBOER-A.L1-1; e Ac. TRC de 29-02-2012, processo n.º 144732/10.9YIPRT.C1, todos disponíveis em www.dgsi.pt. Este entendimento jurisprudencial pacífico estriba-se na doutrina já defendida por José Alberto dos Reis, na obra e local citados, que a propósito do correspondente normativo, afirmava que se impõe ao juiz o dever de resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, resultando a nulidade, precisamente, da infracção pelo juiz desse dever que lhe está legalmente cometido. Mais recentemente, cfr. no mesmo sentido, Jorge Augusto Pais de Amaral, in Direito Processual Civil, 7.ª edição, Almedina 2008, pág. 391.

[6] Cfr. Jorge Augusto Pais de Amaral, ob. e loc. cit., pág. 392; e Acs. STJ, de 09-02-2012, processo n..º 47/07.6TBSTB-A.E1.S1; e de 24-04-2012, processo n.º 497/07.8TBODM-A.E1.S1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
[7] Cfr. José Alberto dos Reis, ob. e loc. cit., pág. 143.
[8] Ac. STJ de 24-04-2012, processo n.º 497/07.8TBODM-A.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[9] Doravante abreviadamente designado CC.
[10] Doravante abreviadamente designado CPC.
[11] De facto, a necessidade da presença de ambos os cônjuges advém apenas do facto de um deles não ter, por si só, poderes bastantes para dispor do processo. “Trata-se assim de uma questão de legitimidade, e não de capacidade judiciária” - Cfr. Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, 1985, pág. 173.
[12] Cfr. Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, 1985, págs. 546 e 547.
[13] Cfr. documento de fls. 109 dos autos, sendo tal regime de bens o que decorre do preceituado no artigo 1717.º do Código Civil, atenta a data da celebração do casamento – 17 de Maio de 2003 – e ter sido celebrado sem convenção antenupcial.
[14] Cfr. Ac STJ de 16-03-2011, Revista n.º 237/04.3TCGMR.S1; seguindo entendimento já anteriormente vertido, por exemplo, nos Acs. STJ de 02-07-1987, processo 074593; de 23-02-1995, processo 085939; de 27-04-1999, processo 99A186; de 02-10-2003, processo 03B1909.
[15] Cfr. neste sentido os recentes Acs. STJ de 10-05-2012, processo 5579/06.0TVLSB, e de 16-03-2011, Revista n.º 237/04.3TCGMR.S1, na esteira de jurisprudência há muito consolidada, tendo já decidido nos mesmos termos, por exemplo, os Acs. STJ de 10-12-1991, processo 080778; de 21-10-1993, processo n.º 083335; de 13-03-1997, processo n.º 96B386; de 13-11-1997, processo n.º 97B623; e de 02-10-2003, processo n.º 03B1909, todos disponíveis no referido sítio da internet. 
[16] Cfr. Ac. STJ de 27-04-2006, Revista n.º 647/06 - 1.ª Secção, disponível em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[17] Cfr. Ac. STJ de 09-06-2009, Revista n.º 662/09 - 1.ª Secção, disponível em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[18] Cfr. Ac. STJ de 05-06-2008, Revista n.º 1361/08 - 1.ª Secção, disponível em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[19] Cfr. Ac. STJ de 14-10-2008, Revista n.º 1803/08 - 6.ª Secção, disponível em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[20] Cfr. Ac. STJ de 22-06-2006, Revista n.º 3697/05 - 7.ª Secção. No mesmo sentido, Ac. STJ de 03-04-2008, Revista n.º 492/08 - 2.ª Secção, disponível no mesmo sítio.

[21] Cfr. Ac. STJ de 22-02-2011, Revista n.º 1561/07.9TBLRA.C1.S1 - 1.ª Secção, disponível em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[22] Cfr. Ac. STJ de 05-05-2011, Revista n.º 396/04.5TBBCL.G1.S1 - 1.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt, a título meramente exemplificativo da jurisprudência firmada sobre esta matéria.
[23] Cfr. neste sentido, Abrantes Geraldes, Ob. cit., pág. 314.
[24] Cfr. Ac. STJ de 14-04-2011, Revista n.º 3840/06.3TBVCD.P1.S1 – 2.ª Secção, disponível em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[25] Note-se que os autores haviam pedido a reapreciação desta matéria de facto e que a mesma não foi objecto de decisão no anterior Acórdão, mas, pelas sobreditas razões, tem que considerar assente neste momento para todos os efeitos legais, em face do trânsito em julgado do mesmo.
[26] Cfr., neste sentido, Ac. STJ de 09-10-2003, Revista n.º 2535/03 – 7.ª Secção e de 20-01-2010, Revista n.º 239/2002.S1 – 7.ª secção, disponíveis em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[27] Cfr. neste sentido, na doutrina, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Coimbra Editora 1982, vol. I, pág. 433, referindo-se, a título de exemplo à questão da caducidade do direito; e na jurisprudência, Acs. STJ de 02-07-2009, Revista n.º 123/07.5TJVNF, de 20-01-2010, Revista n.º 239/2002.S1 – 7.ª Secção; de 13-04-2010, Revista n.º 368/2002.P1.S1. – 1.ª Secção; e de 12-07-2011, Revista n.º 1343/04.0TCSNT.L1.S1 – 1.ª Secção, todos disponíveis em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[28] Cfr. neste sentido, Acs. STJ de 18-09-2003, Revista n.º 2325/03 – 2.ª secção; de 07-10-2003, Revista n.º 2345/03 – 1.ª secção; de 22-01-2004, Revista n.º 4095/03 – 2.ª secção; de 18-01-2007, Revista n.º 4633/06 – 7.ª secção; de 25-01-2007, Revista n.º 4414/06 – 2.ª secção, todos disponíveis em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[29] Cfr. neste preciso sentido em casos em que a restituição foi pedida com base no enriquecimento sem causa por não se ter provado o alegado contrato de mútuo, Acs. STJ de 11-12-2003, Revista n.º 3489/03 – 1.ª secção e de 02-07-2009, Revista n.º 123/07.5TJVNF – 2.ª secção; e Acs. STJ de 27-11-2008, Revista n.º 3546/07 – 7.ª secção, e de 19-02-2009, Revista n.º 4794/07 – 7.ª secção, estes não admitindo a restituição por esta via em caso de haver sido alegado e não provado o contrato de mútuo, só por não ter sido pedida a restituição com tal fundamento, todos disponíveis no local referido.
[30] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Coimbra Editora 1982, vol. I, págs. 427 a 430.
[31] Cfr. autores e obra citada, pág. 427.
[32] Cfr. autores e obra citada, pág. 429.

[33] Cfr. Ac. STJ de 31-03-2009, Revista n.º 652/09 – 2.ª secção, disponível em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[34] In Noções elementares de Processo Civil, págs. 127 e 128.
[35] Cfr., neste sentido, Acs. STJ de 22-01-2004, de 18-01-2007, Revista n.º 4633/06 – 7.ª secção; de 18-01-2007, Revista n.º 1815/03 – 2.ª Secção; de 16-09-2008, Revista n.º 1644/08 – 2.ª Secção; e de 14-10-2010, Revista n.º 5938/04.3TCLRS.L1.S1 – 7.ª Secção, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[36] Cfr., na doutrina, Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, vol. I, pág. 467, e Menezes Leitão, in Direito das Obrigações, vol. I, p. 381 e seguintes; e na jurisprudência, a título meramente exemplificativo, os Acs. STJ de 04-07-2002, Revista n.º 1924/02 – 7.ª Secção; de 08-10-2002, Revista n.º 2376/02 – 1.ª Secção; de 09-10-2003, Revista n.º 2535/03 – 7.ª Secção; de 22-01-2004, Revista n.º 1815/03 – 2.ª Secção; de 17-10-2006, Revista n.º 2741/06 – 6.ª secção; de 05-02-2006, Revista n.º 3902/06 – 6.ª secção; de 18-01-2007, Revista n.º 4633/06 – 7.ª secção; de 29-05-2007, Revista n.º 1302/07 – 6.ª secção; de 16-09-2008, Revista n.º 1644/08 – 2.ª secção; de 16-10-2008, Revista n.º 2709/08 – 1.ª Secção; de 18-06-2009, Revista n.º 1120/03.5TBALQ – 2.ª secção; de 14-10-2010, Revista n.º 5938/04.3TCLRS.L1.S1 – 7.ª Secção; de 08-02-2011, Revista n.º 1272/09.0TVLSB.S1 – 6.ª Secção; de 14-04-2011, Revista n.º 3840/06.3TBVCD.P1.S1 – 2.ª Secção; de 28-06-2011, Revista n.º 3189/08.7TVLSB.L1.S1 – 1.ª secção; de 23-11-2011, Revista n.º 750/08.3TBALM.L1.S1 – 1.ª Secção, todos disponíveis em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos. 
[37] Cfr. Acs. STJ de 22-01-2004, Revista n.º 1815/03 - 2.ª Secção; de 11-10-2005, Revista n.º 3035/05 - 7.ª Secção; de 03-05-2007, Revista n.º 1362/06 - 2.ª Secção; de 08-05-2008, Revista n.º 251/08 - 7.ª Secção; de 25-11-2008, Revista n.º 3501/08 – 1.ª Secção; de 09-02-2011, Revista n.º 2058/2001.L1.S1 - 2.ª Secção, todos disponíveis no referido sítio.
[38] Cfr. Acs. STJ de 13-04-2010, Revista n.º 368/2002.P1.S1 – 1.ª Secção; e de 23-11-2011, Revista n.º 750/08.3TBALM.L1 – 1.ª Secção, ambos disponíveis no referido sítio.
[39] Cfr. Ac. STJ de 14-07-2009, Revista n.º 370/09.5YFLSB – 1.ª Secção, disponível em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[40] Cfr. Acs. STJ de 16-11-2006, Revista n.º 3568/06 – 7.ª Secção; de 03-05-2007, Revista n.º 1362/06 – 2.ª Secção; e de 30-09-2010, Revista n.º 5124/06.8TVLSB.L1.S1 – 7.ª Secção, todos disponíveis em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[41] Cfr. neste sentido, Acs. STJ de 18-09-2003, Revista n.º 2325/03 – 2.ª Secção; e de 25-01-2007, Revista n.º 4414/06 – 2.ª Secção; e de 18-09-2007, Revista n.º 1842/07 – 1.ª Secção, todos disponíveis no indicado sítio.