Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
68/10.1PBLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BRÍZIDA MARTINS
Descritores: DOCUMENTAÇÃO DA PROVA
GRAVAÇÃO DEFICIENTE
PRAZO DE ARGUIÇÃO
CRIME DE GRAVAÇÕES E FOTOGRAFIAS ILÍCITAS
PROVA PROIBIDA
Data do Acordão: 01/26/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA – 3º J
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 199º CP. 105º,1,120º, 1,121º, 123º,2,167º363º, 379º CPP
Sumário: 1. Quer se trate de julgamento com uma ou mais sessões, o prazo de 10 para arguição da nulidade só poderá ter início após a leitura da sentença.
2. O prazo de 10 dias para a arguição da nulidade apenas se inicia a partir do dia em que os suportes técnicos são disponibilizados pelo tribunal ao sujeito processual requerente, uma vez que só nessa data o mesmo poderá tomar conhecimento de omissão ou deficiência do registo de gravação da prova.
3. As normas de um ramo do direito que estabelecem a licitude de uma conduta têm reflexo no direito criminal, a ponto de, por exemplo, nunca poder haver responsabilidade penal por factos que sejam considerados lícitos do ponto de vista civil.
4. Não constitui crime a obtenção de imagens, mesmo sem consentimento do visado, sempre que exista justa causa para tal procedimento, designadamente quando sejam enquadradas em lugares públicos, visem a protecção de interesses públicos ou hajam ocorrido publicamente.
Decisão Texto Integral: I – Relatório.

1.1. D..., já com os demais sinais nos autos, foi submetido a julgamento, sob a aludida forma de processo comum colectivo, porquanto acusado pelo Ministério Público da prática indiciária de factualidade consubstanciadora, em autoria material e concurso real de infracções, de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido através das disposições conjugadas dos artigos 22.º; 23.º; 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas h), i) e j) do Código Penal, e, de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea m); 4.º, n.º 1 e 86.º, n.º 1, alínea d), todos da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, redacção introduzida pela Lei n.º 17/2009, de 6 de Maio.

O Hospital W..., E.P.E. deduziu pedido de indemnização civil contra o aludido arguido, peticionando o pagamento das despesas médicas decorrentes da assistência hospitalar prestada ao ofendido P..., no valor de € 18.114,91, acrescido de juros vincendos até efectivo reembolso.

Ofendido este que, por seu turno, visando obter a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, em consequência da agressão sobre si perpetrada pelo arguido, conforme alegado, formulou igual pedido de indemnização civil peticionando a sua condenação a solver-lhe, a tal título, a quantia de € 38.000,00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até efectivo pagamento.

Todavia, ao abrigo do regime consignado no artigo 82.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, determinou-se a remessa das partes para os tribunais civis no que concerne ao apuramento da responsabilidade civil assim reclamada.

Realizado o contraditório, proferiu-se Acórdão, datado de 20 de Setembro de 2010, decretando, ao ora relevante:

- A absolvição do arguido pela prática do assacado crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea m); 4.º, nº 1 e 86.º, n.º 1, alínea d), todos da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, redacção decorrente da Lei n.º 17/2009, de 6 de Maio;

- A absolvição do arguido pela prática do imputado crime de homicídio qualificado, na forma tentada mas, porém, a sua condenação pela prática de um crime de homicídio simples, na forma tentada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 22.º; 23.º e 131.º do Código Penal, na pena de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão.

1.2. Em 15 de Outubro de 2010, o arguido, pretextando estar impossibilitado de se socorrer do mecanismo facultado pelo artigo 412.º, n.ºs 3 e 4, do Código de Processo Penal, uma vez que os depoimentos orais coligidos no decurso da audiência de julgamento [concretamente do próprio; do ofendido P... e das testemunhas T...; J...; S... e M...] se mostravam deficientemente gravados, por parcialmente imperceptíveis, invocou a respectiva nulidade.

Sobre a pretensão recaiu o despacho judicial de fls. 871, proferido nessa mesma data, relegando o seu conhecimento para esta instância, visto o entendimento de que se encontrava já esgotado o poder jurisdicional do Tribunal a quo.

1.3. O arguido, notificado, interpôs então o presente recurso, sendo que do requerimento apresentado extraiu a formulação das conclusões seguintes: 

1.3.1. A fls. 364-A dos autos encontra-se uma informação da Comissão Nacional de Protecção de Dados [CNPD] no sentido de não ter sido encontrada qualquer notificação de tratamento em nome de BV..., Lda. (proprietária do ZZ...) e, consequentemente, não estar o sistema de vigilância desse estabelecimento comercial (local da ocorrência dos factos em análise) autorizado por tal organismo.

1.3.2. Também não consta dos autos existir no ZZ... qualquer aviso a informar os utentes do estabelecimento de que no mesmo estava instalado um sistema de videovigilância.

1.3.3. Não obstante, o Tribunal a quo inquiriu as testemunhas com recurso à exibição dos fotogramas de fls. 64 a 83, como resulta da própria acta de julgamento, e decidiu, no aresto que prolatou não constituírem tais fotogramas prova proibida.

1.3.4. Ora, fazendo-o, socorrendo-se do DVD constante de fls. 121 e dos fotogramas dele retirados inserta nas mencionadas fls. 64 a 83, incorreu em preterição às disposições conjugadas dos artigos 32.º, n.º 8, da Constituição da República Portuguesa; 4.º, n.º 4; 7.º, n.º 2; 8.º, n.º 2 e 28.º, n.º 1, alínea a), todos da Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro, e, artigos 126.º; 127.º e 167.º, estes todos do Código de Processo Penal.

1.3.5. No presente recurso, o arguido pretendia impugnar amplamente a matéria de facto. Sucede estar impedido de o fazer, pois que parte dos depoimentos produzidos em audiência se mostram imperceptíveis em variadíssimos segmentos, atenta a sua deficiente gravação.

1.3.6. Ocorre tal circunstância, e mormente aos que ora relevam, na perspectiva da sua defesa, com as suas próprias declarações e com os depoimentos do ofendido P... e das testemunhas T...; J...; S... e M....

1.3.6. Conforme artigos 363.º e 364.º, ambos do Código de Processo Penal, verifica-se, pois, uma nulidade porquanto mostra-se vedado ao arguido sindicar a matéria de facto e, forma de suprir tal vício, será a repetição dessa prova e actos posteriores que dela dependam.

1.3.7. Concedendo o não conhecimento nesta instância das conclusões antecedentes ou, quiçá, da sua improcedência, relativamente à intenção de matar acolhida no aresto sob censura nos itens tidos por provados n.ºs 3, 9 e 19, sempre urgirá dizer-se que se verifica, no que concerne, o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e de erro notório na apreciação da prova, tal como definidos pelo artigo 410.º, n.º 2, alíneas a) e c), do Código de Processo Penal, já que,

1.3.8. Se mencionou nessa peça processual, em B) de fls. 16, ter o Tribunal a quo alicerçado essa convicção após análise e apreciação crítica das declarações do arguido no confronto com as das testemunhas inquiridas, cotejando-as com os documentos juntos aos autos.

1.3.9. Sucede não ter sido atingido nenhum órgão vital da vítima e nem sequer se haver logrado apurar que o comprimento da lâmina da faca utilizada se mostrasse adequado e suficiente para alcançar algum desses órgãos.

1.3.10. Igualmente foi a decisão recorrida prolatada ao arrepio do relatório pericial de fls. 316 a 318, já que aí apenas se afirma conclusivamente que o ofendido esteve em perigo de vida (última conclusão).

1.3.11. Pese embora tivesse considerado como assentes os factos elencados sob os itens n.ºs 12, 13, 21 e 23, certo é não ter o Tribunal recorrido concluído que os mesmos integravam uma desistência tal como configurada no artigo 24.º, do Código Penal.

1.3.12. Sucede que ao pedir de imediato a chamada de uma ambulância o recorrente impediu a consumação do hipotético homicídio esforçando-se seriamente para o evitar.

1.3.13. Existindo desistência relevante, a tentativa não é punível, como resulta do disposto no citado artigo 24.º, n.ºs 1 e 2, normativo que, assim, se mostra violado pela dita decisão.

1.3.14. A fls. 19 [por lapso manifesto, refere-se “16”, nas conclusões], § 2.º do aresto impugnado, mencionou-se que o ofendido não corroborou a entrega pelo arguido, através de cheque bancário, da quantia ressarcitória de € 2.500,00.

1.3.15. Sendo correcto que á data em que decorreu a audiência de julgamento (10 de Setembro de 2010) o mesmo se não encontrava cobrado, mas apenas emitido pelo mandatário do recorrente (com data de 3 de Setembro de 2010), certo é que ocorreu tal cobrança no dia 16 de Setembro de 2010, e, logo, à data da prolação do aresto impugnado (20 de Setembro de 2010), já o recorrido se mostrava ressarcido ao menos nesse montante.

1.3.16. Donde que a junção do documento quirógrafo desse pagamento apenas nesta fase processual (fls. 933) não deva considerar-se como extemporânea, sob pena de preterição aos artigos 32.º, n.ºs 1, 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa, e 6.º, § 1 e 2, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. 

1.3.17. Comprovada a reparação parcial do ofendido, impunha-se a atenuação especial da pena devida ao arguido, atento o estatuído pelo artigo 72.º, n.ºs 1 e 2, alínea c), do Código Penal.

1.3.18. Acaso se não entenda ser devida essa atenuação, sempre a pena cominada é excessiva, pois como se sufragou no aresto em causa, a fls. 46, in fine, e início de fls. 47, “No entanto, ponderou-se em benefício do arguido;

O arrependimento demonstrado;

O facto do arguido, após, ter pedido para chamarem uma ambulância;

As condições sociais que se provaram, donde decorre que o arguido se encontra socialmente integrado, sendo pessoa considerada no meio em que trabalhava e vivia.”

1.3.19. O que antes justificava a aplicação apenas de uma pena entre o mínimo de um ano e sete meses de prisão e o máximo de dois anos de prisão. 

Terminou pedindo que seja decidido em conformidade com todo o expendido.

1.4. Cumprido o disposto pelo artigo 413.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, seguiu-se resposta do Ministério Público pugnando pela manutenção do decidido e, logo, pelo improvimento do recurso.

1.5. Proferido despacho admitindo-o, foram os autos remetidos a esta instância.

1.6. Aqui, com vista respectiva, nos termos do artigo 416.º, do Código de Processo Penal, o Ex.mo Procurador-geral Adjunto emitiu parecer conducente a idêntica manutenção do veredicto da 1.ª instância.

Deu-se cumprimento ao estatuído no n.º 2 do subsequente artigo 417.º.

1.7. Por sua vez, no exame preliminar a que alude o n.º 6 deste mesmo inciso, consignou-se não ocorrerem pressupostos determinantes á apreciação sumária do recurso, além de nada obstar ao seu conhecimento de meritis.

Daí que fosse ordenado o respectivo prosseguimento, com recolha de vistos e submissão à presente conferência.

Urge, pois, ponderar e decidir.


*

II – Fundamentação de facto.

2.1. A decisão recorrida teve por provada a seguinte matéria de facto:

1. No dia 26 de Janeiro de 2010, o arguido D... dirigiu-se ao estabelecimento comercial de discoteca denominado «ZZ...», na Rua…, em X...,

2. Estabelecimento onde entrou cerca das 0 horas e 50 minutos,

3. Munido de uma navalha (com uma lâmina dobrável manualmente até ocultar o fio no cabo) com uma lâmina de comprimento concretamente não apurado mas não inferior a 8 cm, que trazia no bolso direito das calças.

4. Ao entrar no hall de entrada do «ZZ...», já no seu interior, o arguido localizou o ofendido P... e de imediato dirigiu-se a ele.

5. Após o que e de imediato, o arguido agarrou o P... por baixo dos braços e pelas costas e arrastou-o para o hall de entrada e posteriormente para um outro hall (exterior) que dá acesso ao «ZZ...», momento em que lhe desferiu vários murros e pontapés.

6. Perante tal, já no referido hall exterior, os seguranças do referido estabelecimento, tentaram pôr fim à acção do arguido, separando-o do ofendido.

7. No decurso do que, o arguido retirou a referida navalha do bolso e empunhando-a, erguendo o braço por cima dos circundantes, desferiu um golpe, com cerca de 14 cm de comprimento, na face esquerda do P....

8. Após o P... logrou fugir para o exterior do estabelecimento, tendo sido perseguido pelo arguido sempre de navalha em punho.

9. O arguido alcançou o P... ainda no passeio onde se encontra o referido estabelecimento e com a referida navalha desferiu-lhe um golpe de baixo para cima e da direita para a esquerda, no abdómen, atingindo-o no sétimo espaço intercostal esquerdo, perfurando a parede torácica, a pleura, o diafragma e o estômago.

10. Na sequência do que o ofendido atravessou a estrada e veio a tombar já na berma da estrada, do lado oposto ao estabelecimento,

11. Onde ficou a agonizar, com abundantes hemorragias.

12. Enquanto isso o arguido pediu que chamassem uma ambulância e abandonou o local conduzindo o veículo da marca ...

13. Foram então accionados de imediato os serviços de emergência médica, tendo o P... sido prontamente assistido no local.

14. O P... foi posteriormente encaminhado de urgência para o Hospital W..., tendo ali sido sujeito a intervenção cirúrgica, designadamente tendo-lhe sido efectuada uma reparação do diafragma, do estômago e lavagem peritoneal e torácica,

15. Após o que foi directamente para a UCIP (unidade de cuidados intensivos permanentes), onde ficou ventilado por vários dias,

16. E aí permaneceu até ao dia 11 de Fevereiro de 2010,

17. Após o que foi transferido para o Serviço de Cirurgia 2, onde permaneceu até ao dia 17 de Fevereiro de 2010, data em que teve alta clínica.

18. Em consequência do supra descrito, P... sofreu uma cicatriz linear com 14 cm que percorre a hemi-face direita até à região mentoniana; cicatriz em V invertido na face anterior do abdómen e na linha média vertical com 12 cm e oblíqua para a esquerda com 16,5 cm, sendo que o ponto de entrada da lâmina dista 12 cm para a esquerda do umbigo, na mesma linha e tem 1,1x0,5cm, com auréola acastanhada de 2x1cm, tendo as lesões sofridas sido causa directa e necessária de 59 dias de doença, todos com afectação da capacidade para o trabalho em geral e profissional.

19. Ao desferir o referido golpe no abdómen do P..., o arguido quis matá-lo, sabendo que na zona que escolheu para desferir tal golpe se alojavam órgãos vitais do corpo e essenciais à vida, o que só não conseguiu por aquele ter sido rapidamente assistido no local.

20. O arguido agiu sempre consciente, livre e deliberadamente.

21. O arguido revelou arrependimento.

22. Os cuidados de saúde prestados a P... no Hospital W..., em consequência da supra descrita conduta do arguido, ascenderam ao montante de € 18.114,91.

23. Posteriormente o arguido procurou saber do estado de saúde do P....

24. No dia 19 de Setembro de 2006, na sequência de um desentendimento gerado entre ambos, num bar do qual era gerente, P... acabou por esfaquear o arguido causando-lhe uma ferida perfurante da região dorsal esquerda.

25. Na sequência do que o arguido foi assistido no Hospital W..., tendo sido constatada a existência de um pneumotorax associado a hemotorax, pelo que lhe foi colocado um dreno torácico à esquerda tendo ficado internado, tendo tido alta clínica em 22/09/2006.

26. O arguido não apresentou qualquer queixa-crime contra o P... pelos factos ocorridos em 19 de Setembro de 2006.

27. Na sequência do ocorrido em 19 de Setembro de 2006, o arguido e P... ficaram desavindos.

28. O arguido é o mais velho de três irmãos (um falecido aos 15 anos de idade). O seu processo de socialização ocorreu num contexto familiar algo disfuncional devido ao facto de apenas o pai ser de etnia cigana e a mãe nunca se ter habituado aos costumes e tradições da etnia. Assim, procurou incutir nos filhos os valores e regras comuns à sociedade em geral, atitude educativa que era contrariada pelo pai. O arguido sempre tomou o partido da mãe, por quem nutre uma forte ligação afectiva.

29. Os pais do arguido separaram-se quando este tinha cerca de 20 anos de idade, ficando o arguido a viver com a mãe, não mantendo, desde então, contactos com o pai.

30. Natural de ..., o arguido viveu com a família nesta cidade até à adolescência, altura em que a família mudou de residência para a zona de ..., onde o arguido permaneceu com a mãe e a irmã (esta entretanto autonomizou-se constituído sua própria família), após a separação do casal.

31. O arguido frequentou a escola até à conclusão do 6.º ano de escolaridade. Mais tarde, retomou os estudos, tendo concluído o 9.º ano. Desde cedo começou a trabalhar, ajudando a mãe na sua actividade de comerciante (vendia artigos de vestuário, por catálogo).

32. O arguido, há alguns anos integrou a empresa de segurança “LX...”, com sede em X..., exercendo a actividade de segurança em vários estabelecimentos nocturnos, localizados na zona centro do país. Esta actividade permitia-lhe dispor de uma situação económica confortável, auferindo mensalmente cerca de €2500/€3000. Concomitantemente, durante o dia trabalhava como comerciante, fazendo revenda de roupa a outros comerciantes que vendem nas feiras e mercados.

33. Até à sua reclusão, o arguido residia com a mãe, no ..., num imóvel a título de arrendamento, há mais de um ano e meio (apartamento de construção recente, com condomínio privado, cujas condições oferecem um bom nível de habitabilidade).

34. Em 26 de Janeiro de 2010, o arguido vivia sozinho, porquanto a sua mãe se encontrava a efectuar tratamento em Barcelona. Pouco depois da prisão do arguido, a mãe terminou os tratamentos, passando a residir sozinha no apartamento.

35. A mãe do arguido sofre de doença grave do foro neurológico, apresentando sequelas de lesão vertebro-medular, apresentando um quadro de tetraparésia com origem em mielopatia cervical. Desde que ficou nesta situação, necessita de apoio constante para as necessidades básicas do quotidiano, (alimentação, higiene, vestuário), tarefas que o arguido sempre assumiu, assegurando que nada lhe faltasse.

36. O arguido, como trabalhava essencialmente à noite, conseguia compatibilizar o seu trabalho com os cuidados à mãe, sendo que, durante o horário laboral, contratou uma senhora que para além de fazer companhia à mãe, colaborava nas tarefas domésticas.

37. Com a prisão do arguido, a mãe deixou de ter condições para pagar a prestação de cuidados, passando a viver sozinha, contando apenas com a ajuda gratuita de uma vizinha. A filha vive em X..., com o companheiro e dois filhos, alegadamente sem condições económicas para se deslocar com frequência a casa da mãe, sendo o seu apoio à mesma, pontual.

38. O arguido mantinha uma relação de namoro, tendo equacionado a hipótese da namorada cuidar da mãe. Tal não se concretizou porque, entretanto, a namorada terminou a relação.

39. O arguido é pessoa considerada no meio em que vive e trabalha, sendo destacada a sua dedicação à situação de saúde da mãe e às actividades profissionais.

40. O arguido foi condenado por decisão proferida em 13/10/2008, já transitada em julgado, pela prática, em 26/11/2006, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 180 dias de multa.

2.2. Já no que concerne a factos não provados, precisou-se na dita peça recorrida o seguinte:

Discutida a causa e com relevância para a boa decisão (abstraindo dos factos conclusivos e/ou reportando-se a conceitos de direito) não se provou que:

a) O arguido se tenha deslocado ao «ZZ...», inicialmente, com intenção de matar o P..., sem prejuízo do que se provou em 19).

b) O arguido tenha agarrado o P... pelo pescoço quando o arrastou para o hall.

c) O ofendido não mais cessou de ameaçar o arguido de que terminaria o que começou, de forma a destabilizá-lo e causar-lhe, como causou, permanente receio.

d) Sempre que passava ou encontrava o arguido, P… dirigia-lhe ameaças de morte, designadamente dizendo-lhe “eu acabo de fazer o que comecei” e “hei-de tirar-te a vida”.

e) O arguido tenha ultrapassado a agressão de que foi alvo por parte de P... em Setembro de 2006.

f) No dia 26 de Janeiro de 2010, o P... fez notar ao arguido a sua presença e frente a quantos ali estavam e dirigindo-se-lhe tivesse proferido as seguintes expressões: “palhaço, eu mato-te”, “acabo contigo”; “tiro-te a vida”.

g) Após proferir tais expressões P... tivesse tirado uma faca do bolso, exibindo-a ao arguido, tendo este último sido ainda alertado em voz alta por alguns dos que ali estavam para o facto de aquele ter a referida faca na mão.

h) Confrontado com a rapidez daquele momento e a actuação de P..., o arguido, sobressaltado, receoso e emocionalmente destabilizado, tivesse agido com vista a afastar o P... das restantes pessoas e tentado desarmá-lo.

i) Os seguranças do bar tentaram desarmar P... no hall do bar ao vê-lo empunhar e manejar a faca com o propósito de atacar o arguido.

j) Após ter logrado sair para a rua, o P... tivesse esperado pelo arguido e tivesse barrado o caminho a este, colocando-se à sua frente e proferindo as seguintes expressões: “daqui não sais vivo” e “eu mato-te”, atacando-o com a faca que ainda empunhava na mão.

k) O arguido tivesse agido com a intenção de se defender do P..., descontrolado emocionalmente e com receio deste.

l) O arguido soubesse que estava proibido de transportar a navalha que trazia consigo.

2.3 Por último, tem o teor seguinte a motivação probatória constante da decisão em causa:

A) Da questão suscitada quanto à não admissibilidade do DVD e fotogramas como meios de prova.

Como atrás se referiu, o arguido pugnou pela não admissibilidade do DVD constante de fls. 121 e os fotogramas constantes de fls. 22 a 29 e 348 a 352 como meios de prova, por se tratar de prova proibida.

Alicerçando a sua posição na circunstância de tais meios de prova se consubstanciarem em imagens recolhidas pelo sistema de vigilância do estabelecimento onde ocorreram os factos, estando tal captação de imagens dependente da prévia notificação e autorização por parte da Comissão Nacional de Protecção de Dados, de harmonia com o que se encontra estabelecido na Lei n.º 67/98 de 26 de Outubro.

Nos termos do disposto no artigo 125.º do Código de Processo Penal, são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei.

Compulsados os autos constata-se que a fls. 364-A existe uma informação da Comissão Nacional de Protecção de Dados no sentido de não ter sido encontrada qualquer notificação de tratamento em nome de BV..., Lda. (proprietária do “ZZ...”) e consequentemente não estar o sistema de vigilância autorizado pela CNPD.

A Lei n.º 67/98 de 26 de Outubro transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 95/46/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de Outubro de 1995, relativa à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados, diploma igualmente aplicável à videovigilância e outras formas de captação, tratamento e difusão de sons e imagens que permitam identificar pessoas (artigo 4.º n.º 4 do referido diploma legal).

Resulta da conjugação do disposto nos artigos 7.º, 8.º, 27.º e 28.º da Lei n.º 67/98 de 26 de Outubro que o tratamento de dados sensíveis implica sempre um controlo prévio por parte da CNPD, através da notificação e autorização ali previstas, considerando-se dados sensíveis, entre outros, os que se refiram à vida privada do titular dos dados.

Por outro lado, nos termos do disposto no artigo 126.º n.º 3 do Código de Processo Penal, ressalvados os casos previstos na lei, são nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações sem o consentimento do respectivo titular. 

Dispondo o artigo 167.º n.º 1 do Código de Processo Penal, que as reproduções fotográficas, cinematográficas, fonográficas ou por meio de processo electrónico e, de um modo geral, quaisquer reproduções mecânicas só valem como prova dos factos ou coisas reproduzidas se não forem ilícitas, nos termos da lei penal.

Resultando do disposto nos artigos 37.º e 43.º da mencionada Lei n.º 67/98 de 26 de Outubro que só o não cumprimento intencional das obrigações relativas à protecção de dados, designadamente a omissão das notificações ou os pedidos de autorização a que se referem os artigos 27.º e 28.º constituem crime, pois tratando-se de uma conduta negligente, consumar-se-á apenas uma contra-ordenação.

Sendo certo que não se apurou nos autos que tivesse existido qualquer incumprimento intencional por parte do responsável pelo tratamento dos dados (dado que nenhum facto foi invocado nesse sentido e/ou provado), excluída ficará a subsunção da sua conduta ao crime previsto no artigo 43.º da referida lei e consequentemente excluída ficará igualmente a impossibilidade das imagens captadas não poderem vir a ser valoradas como meio de prova por tal razão.

 Por outro lado, impõe-se ainda considerar se a actuação dos representantes da entidade responsável pela recolha será susceptível de ser enquadrada na prática do crime tipificado no artigo 199.º do Código Penal, o que de igual forma afastaria a possibilidade da utilização dos referidos meios de prova, por aplicação do referido artigo 167.º do Código de Processo Penal.

O referido artigo 199.º n.º 2 do Código Penal tutela o direito à imagem (em concretização do principio constitucional previsto no artigo 26.º da Constituição da Republica Portuguesa) e pune criminalmente todo aquele que, sem consentimento, fotografe ou filme outra pessoa, utilize ou permita que se utilizem tais fotografias ou filmes, mesmo que licitamente obtidos.

Como se deixou expresso no acórdão do tribunal da Relação de Lisboa, datado de 04/03/2010 (base de dados da DGSI, processo 1630/08.8 PFSXL.L1-9) “Tem sido entendimento da jurisprudência que não constitui crime a obtenção de imagens, mesmo sem consentimento do visado, sempre que exista justa causa para tal procedimento, designadamente quando sejam enquadradas em lugares públicos, visem a protecção de interesses públicos, ou hajam ocorrido publicamente.

Será, por isso, considerada criminalmente atípica, a obtenção de fotografias ou de filmagens, mesmo sem consentimento do visado, sempre que exista justa causa nesse procedimento, designadamente quando as mesmas estejam enquadradas em lugares públicos, visem a realização de interesses públicos ou que hajam ocorrido publicamente” (no mesmo sentido, entre outros, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26/06/2001, CJ STJ, tomo II, p. 221 e acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 03/02/2010 e 14/10/2009, base de dados da DGSI, processos n.ºs 371/06.5 GBVNF.P1 e 103/05.5 GCETR.C1.P1).

Havendo que ponderar ainda, nos termos do disposto no artigo 79.º n.º 2 do Código Civil, que não é necessário o consentimento da pessoa retratada quando assim o justifiquem a sua notoriedade, o cargo que desempenhe, exigências de polícia ou de justiça, finalidades científicas, didácticas ou culturais, ou quando a reprodução da imagem vier enquadrada na de lugares públicos, ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente.

Não devendo de se deixar de entender que o facto não será punível criminalmente quando a sua ilicitude for excluída pela ordem jurídica considerada na sua totalidade (artigo 31.º n.º 1 do Código Penal).

Por outro lado, importa ainda ter presente que o arguido foi filmado numa discoteca e como tal num local público, sendo reconhecido pela generalidade das pessoas aí existirem câmaras de filmar como meio de dissuasão e com a finalidade de proteger a vida, a integridade física ou o património (não podendo o arguido fugir à regra atenta a sua profissão de segurança).

Como tal, não contendendo as imagens captadas com factos relativos à esfera intima privada do arguido (o que determinaria a sua nulidade por violação do artigo 32.º n.º 8 da Constituição da Republica Portuguesa) e não existindo qualquer compressão (consentida pelo disposto no artigo 18.º n.º 2 da Constituição da Republica Portuguesa) intolerável, desproporcionada ou desnecessária do direito à imagem consagrado no artigo 26.º da Constituição da Republica Portuguesa, impõe-se considerar que a sua utilização não consubstancia qualquer meio de prova proibido, nos termos do disposto no artigo 126.º n.º 3 do Código de Processo Penal.

Como se deixou expresso no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 04/03/2010 (CJ, tomo II, p. 137), deverá entender-se que “a obtenção dos fotogramas através do sistema de videovigilância existente num estabelecimento comercial, para protecção dos seus bens e da integridade física de quem aí se encontre, mesmo que se desconheça se esse sistema foi comunicado à CNPD, não corresponde a qualquer método proibitivo de prova, desde que exista uma justa causa para a sua obtenção, como é o caso de documentar a prática de uma infracção criminal, e não diga respeito ao núcleo duro da visa privada da pessoa visionada”.

Tudo para concluir que nada obstará a que o tribunal valore as imagens recolhidas nos autos, não assistindo razão ao arguido quanto à invocada nulidade.


*

B) O tribunal alicerçou a sua convicção fazendo uma análise e apreciação crítica das declarações do próprio arguido no confronto com as declarações das testemunhas inquiridas, cotejando-as com os documentos juntos aos autos.

O arguido reconheceu efectivamente ter-se deslocado ao estabelecimento comercial de discoteca denominado «ZZ...» nas circunstância de tempo descritas na acusação e que nessa altura o fez munido de uma navalha (guardada no bolso) com uma lâmina com o comprimento de 8 cm, que segundo alegou, utilizava habitualmente para vários fins no desempenho da sua actividade de comerciante.

No entanto apresentou uma versão distinta da descrita na acusação e surpreendentemente da descrita na própria contestação.

Segundo o arguido, ao chegar à referida discoteca (já no seu interior) foi informado por um dos seguranças (testemunha T... ) que se encontrava no referido estabelecimento alguém munido de uma faca e que havia referido que o voltaria a esfaquear.

Viu então o P... e que quando este por sua vez o viu lhe chamou palhaço e começou a ameaçá-lo, designadamente dizendo que o matava.

O arguido sustentou que então chegou ao pé do P... para não dar oportunidade a este de o esfaquear, agarrou-o e que se envolveram então numa luta, tendo ambos ido a lutar até ao hall de entrada da discoteca.

O arguido explicou que, há cerca de 4 anos, o P..., na sequência de uma “barafunda” num bar deste último, acabou por esfaqueá-lo pelas costas, tendo então estado internado no hospital.

O arguido referiu ainda que não chegou a apresentar queixa contra aquele e que na sequência do descrito episódio, o P... começou a ameaçá-lo, tendo sempre evitado o mesmo.

Ainda no que concerne à agressão de que está acusado, o arguido explicou que posteriormente foram separados pelos seguranças da discoteca e que quando estava a ser agarrado, viu que o P...pôs a mão no bolso.

Pensou então que aquele o fosse esfaquear, momento em que retirou do bolso a navalha que trazia no bolso das calças e fez um movimento de que não se recorda bem.

O arguido referiu ainda que o P... lhe disse que lhe daria um tiro (no que acreditou) e que acabou por ir atrás do mesmo por pensar que o ofendido teria uma arma no carro.

Tendo-o alcançado na rua, o arguido referiu que, ao que pensa dado não recordar-se bem do que aconteceu nesse momento, desferiu um golpe com a navalha no P..., tendo este ficado a sangrar.

O arguido precisou todavia que não se apercebeu se o tinha atingido (não deixando de ser de estranhar que tivesse então pedido uma ambulância) e ainda que pediu ao segurança da discoteca para chamar uma ambulância, tendo então abandonado o local no seu veículo ( ..).

O arguido foi peremptório em afirmar que nunca chegou a ver qualquer faca ou pistola nas mãos do ofendido.

Referiu ainda que posteriormente procurou saber do estado de saúde do ofendido, preocupado com o ferimento e que daria tudo para que tal não tivesse sucedido.

O arguido referiu ainda que não se chegou a entregar (como era sua intenção) por ter sido aconselhado por um advogado a esperar.

Por sua vez, o ofendido P... referiu que na noite em questão se deslocou à mencionada discoteca a convite de um seu amigo (A...), tendo tudo sucedido pouco depois de ter entrado com este no referido estabelecimento (5/10 minutos depois).

Explicou ainda que a dado momento foi agarrado debaixo dos braços e pelas costas e levado para o exterior (hall de entrada da discoteca) pelo mesmo, tendo então sido atingido pelo arguido com murros e pontapés.

Precisou ainda não se recordar de ter sido agarrado pelo pescoço.

Mais referiu que quando um dos seguranças os procurava separar foi atingido pelo arguido na face do lado direito com uma facada, que apenas sentiu quando já estava a subir as escadas.

Precisou ainda que subiu as escadas e fugiu para a rua, tendo sido seguido pelo arguido e que nesse momento o arguido lhe desferiu uma facada de baixo para cima e da direita para a esquerda (atenta a posição do arguido).

Sendo que posteriormente atravessou a estrada e acabou por cair no chão já do outro lado da rua, a perder muito sangue.

O ofendido negou ter alguma vez dito que daria uma facada ao arguido ou ter alguma faca na sua posse.

Questionado quanto à explicação que dava para a agressão, o ofendido inicialmente sustentou não encontrar qualquer explicação para tal facto, dado que não tinha qualquer problema com o arguido, o qual apenas conhecia de vista.

No entanto quando pressionado acabou por admitir que, há cerca de 4 anos, teve uma altercação com o arguido (porque este se recusou a pagar) e que na sequência de uma luta (para se defender dado que estava a ser espancado) acabou por “picá-lo” com uma “pequena navalha”.

Tendo explicado que o arguido acabou por levar consigo dinheiro seu, tendo então existido um acordo entre conhecidos de ambos no sentido de não serem apresentadas quaisquer queixas.

O ofendido explicou ainda que nos 4 anos que passaram, apenas se encontrou com o arguido em duas ocasiões, sendo que a última, numa discoteca, poucos dias antes de ter sido agredido pelo arguido.

O ofendido não confirmou a entrega pelo arguido de € 2.500 para o ressarcir.

Pela testemunha T... foi dito ser segurança da discoteca .. à data dos factos e afirmou que um indivíduo de nome S...lhe disse que um outro individuo tinha uma faca e que lhe dissera que era para o arguido.

Na sequência do que avisou o arguido.

Tal testemunha referiu ainda que existiu uma troca de olhares entre o arguido e o ofendido e que este último começou a perguntar àquele o que queria.

A testemunha referiu ainda que então o arguido foi tentar falar com o P..., este último lhe disse “o que é que tu queres palhaço” e que quando aquele chegou ao pé do ofendido começaram a agarrar-se, estando ambos de frente um para o outro.

A referida testemunha referiu ainda que não viu o arguido a agarrar o ofendido pelas costas e ainda que não viu qualquer navalha nas mãos deste último.

Precisou ainda que posteriormente quando o P... começou a fugir disse ao arguido que lhe dava um tiro e que o matava, tendo este último ido atrás do ofendido.

Explicitou ainda que o P... não chegou a ameaçar o arguido dentro da discoteca.

E que, quando chegou à rua já viu o P... a tombar para o lado a escorrer sangue.

A referida testemunha declarou ainda que trabalha para uma empresa chamada LX... e que o arguido, à data, também trabalhava para tal empresa.

Bem como que no local também se encontrava um seu colega de nome V... e o A....

Pela testemunha A... (amigo do ofendido há 8 anos) foi dito que na noite em questão entrou na discoteca com o ofendido (tendo este sido por si convidado para lá ir) e que passados cerca de 20 minutos após terem entrado, estando no bar a pedir uma bebida, olhou e viu uma grande confusão.

Tendo visto o arguido e o ofendido agarrados na entrada da discoteca, que posteriormente viu o P... a fugir para a rua e que o mesmo tinha sangue na cara.

Precisou ainda que, no momento em que fugiu para a rua, o ofendido não disse nada ao arguido e que quando chegou perto do P... o arguido ainda estava junto deste.

A referida testemunha explicou ainda que esteve sempre perto do ofendido, com excepção do momento em que se deslocou ao bar para ir buscar uma bebida (local onde já se encontrava há cerca de 3/4 minutos).

E que quando se deslocou para o bar, o P... ficou a conversar com uma outra pessoa de nome R....

Bem como que não se apercebeu de qualquer conversa, nem viu que o ofendido tivesse uma faca e/ou que o mesmo lhe tivesse dito que a tinha consigo.

Tal testemunha referiu ainda que o arguido pediu para chamarem uma ambulância.

Por outro lado foi ainda inquirido J..., que afirmou trabalhar para a LX... e ser à data dos factos segurança na discoteca .

Referiu que o P... entrou primeiro no estabelecimento com o A...e que o arguido entrou depois.

Mais referiu que estava junto à porta no momento em que o arguido entrou, que o ofendido estava junto da máquina de tabaco a conversar e que não sabe como viu depois que estavam agarrados.

Tal testemunha precisou ainda que o P... saiu primeiro para a rua (e que não o ouviu a dizer nada quando saiu pelas escadas) e que depois o arguido também saiu.

Sendo que, quando chegou à rua constatou que o P...já estava a sangrar abundantemente.

Esta testemunha precisou ainda que viu uma navalha nas mãos do arguido (ainda no hall exterior) que dá acesso à discoteca.

Foi ainda ouvida E… (que se identificou como empregada de balcão na discoteca, à data dos factos).

Tal testemunha afirmou que, no momento em que se encontrava a trabalhar (a tirar uma imperial), viu o ofendido P... a conversar com um seu conhecido de nome S...(que trabalha para a LX...) e que então viu, numa fracção de segundos, aquele mostrar a este um objecto que lhe pareceu ser uma navalha (pese embora não tenha a certeza se o era).

Precisou que ambos estavam sozinhos, que quando os viu conversar eram cerca de meia-noite e meia, que o estabelecimento ainda estava vazio e que estava sozinha no bar.

Quando questionada para a circunstância de não ter ido avisar um segurança do que tinha visto, afirmou que não o fez porque não tinha a certeza de se tratar de uma faca, porque estava sozinha no bar e porque deixou entretanto de os ver.

E que depois, mais tarde (passado uma semana), o S...lhe confirmou que tinha sido efectivamente uma navalha.

A testemunha afirmou ainda que não viu qualquer confusão na discoteca.

Por outro lado, a testemunha S... afirmou que quando chegou à discoteca se cruzou com o ofendido (que lhe disse que tinha acabado de chegar) e que estiveram cerca de 3/5 minutos a conversar.

E que na sequência de tal conversa o P... pôs a mão no bolso, mostrou-lhe uma navalha de ponta e mola e lhe disse: “esta é para ele” e “quando o apanhar é para ele”, referindo-se ao arguido.

Sendo que, nesse momento, o P... estava acompanhado de um amigo.

Na sequência do que viu o T...e disse-lhe, após o que se deslocou à casa de banho, ali tendo permanecido cerca de dois minutos.

Sendo que foi alertado posteriormente (decorridos cerca de 5 minutos) do que sucedia, tendo então ido à porta da discoteca e visto o P... do outro lado da rua (quando atravessou a estrada).

Esta testemunha afirmou ainda conhecer a testemunha N...e tê-la visto no local.

Por sua vez, pela testemunha N... foi dito que se dirigiu ao BT... com uma amiga e que quando chegou viu dois homens a “brigar”.

Precisando que viu o P... a sair do “BT...” à frente do arguido e a ameaçar este (já na rua) de que ia buscar uma arma e que o matava (enquanto atravessava a estrada).

Vindo mais pessoas atrás deles, pensa que os seguranças.

E que depois só viu a outra pessoa ( P..) a ficar caída (já no outro lado da rua junto aos carros) porque devia estar magoado e que depois já não viu mais nada (porque ficou em choque) e foi para casa.

Precisou ainda que estava no passeio oposto à discoteca e que o arguido e o ofendido estavam a atravessar a rua (a gritar um com o outro) e ainda que viu o P...a cair já do outro lado da estrada.

E que depois só viu o arguido a pedir uma ambulância.

Pela testemunha M... foi dito ser sócia gerente da empresa LX..., para a qual o arguido trabalhou como segurança até Janeiro de 2010.

A referida testemunha referiu que o arguido é amigo de infância do seu marido e que o mesmo sempre foi considerado um funcionário empenhado e bom profissional.

Referiu ainda ter-lhe sido dito por outros funcionários da empresa não saberem até que ponto o arguido ia aguentar ser gozado pelo P..., pessoa que há uns anos lhe tinha dado uma facada e que se gabava disso mesmo.

A mesma testemunha confrontada com o cheque no valor de € 2.500,00 junto na audiência de julgamento afirmou ainda saber pelo mandatário do arguido que tal cheque foi entregue ao mandatário do ofendido.

Explicou ainda que os seus funcionários têm ordens no sentido de não deixarem entrar nos estabelecimentos que seguram quaisquer armas e para agirem caso constatem que tal sucedeu.

A testemunha O... (inspector da Policia Judiciária) limitou-se a descrever em que termos procederam à investigação do crime.

Confrontando as versões apresentadas pelo arguido e pelo ofendido, resulta evidente que o arguido atingiu o ofendido no abdómen com um golpe de navalha nas circunstâncias que se deram como provadas.

Tais versões apenas diferem quanto às concretas circunstâncias que terão determinado tal acto, em especial quanto à circunstância de previamente a tal agressão o arguido ter ou não sido provocado e ameaçado pelo arguido.

O arguido alegou na sua contestação que foi surpreendido com a presença do P... no bar “ZZ...” e que este dirigindo-se-lhe proferiu as seguintes expressões: “Palhaço, eu mato-te!”; “Acabo contigo”; “Tiro-te a vida”.

E ainda que, acto contínuo, P... tirou uma faca do bolso exibindo-a ao arguido, mais sendo este alertado em voz alta por alguns dos que ali estavam para o facto daquele ter uma faca na mão.

E que confrontado com tal acto do P..., reagiu afastando-o das pessoas e tentando desarmá-lo, sendo que os próprios seguranças do bar tentaram segurar e desarmar o ofendido P... no hall do bar ao vê-lo empunhar e manejar faca com o propósito de efectivamente o atacar novamente.

O arguido sustentou ainda na sua contestação, já fora do bar, que o ofendido esperou por si e barrou-lhe o caminho, colocando-se à sua frente e dizendo-lhe “daqui não sais vivo” e “eu mato-te”, atacando-o com a faca que ainda empunhava na mão.

E que nas referidas circunstâncias se limitou a defender-se, estando emocionalmente destabilizado face à situação e ao receio maior que o ofendido lhe tinha e vinha a incutir, nunca tendo sido sua intenção magoar e muito menos matar aquele.

Tal versão, no entanto, não se provou manifestamente.

Desde logo atento o teor da versão apresentada pelo próprio arguido em sede de julgamento, que infirma tal versão.

Com efeito, o arguido foi peremptório, desde logo, em afirmar que nunca chegou a ver qualquer faca ou pistola nas mãos do ofendido, donde resulta claramente infirmado que o arguido se tenha aproximado do ofendido com vista a desarmá-lo ou que este estivesse armado no momento em que foi atingido no abdómen.

O arguido referiu ainda nas suas declarações que agarrou o ofendido e que se envolveram então numa luta, tendo ambos ido a lutar até ao hall de entrada da discoteca.

Analisados os fotogramas constantes de fls. 44 e 64 a 83 constata-se que o arguido entrou na discoteca, ficou cerca de 30 segundos a falar com a testemunha T..., estando a testemunha J... imediatamente atrás e o ofendido a conversar junto à máquina do tabaco com uma outra pessoa.

Após o que o arguido se dirigiu para o local onde se encontrava o ofendido, passou por este e agarrou-o pelas costas, o que fez no espaço de cerca de 4 segundos.

Constata-se ainda que o arguido agarrou o P... pelas costas e arrastou-o para o exterior da discoteca, designadamente para um hall de entrada existente, antes de umas escadas que dão acesso à rua, sem que este tivesse conseguido reagir.

Mais resulta dos referidos fotogramas, que já no referido hall de entrada, os seguranças da discoteca conseguiram afastar o arguido do ofendido e que o arguido acabou por retirar do seu bolso a navalha que trazia no bolso (o que o próprio arguido confirmou e a testemunha J…) atingindo o P... no rosto.

Sendo que o ofendido logrou então colocar-se em fuga, tendo de imediato sido seguido pelo arguido.

Ou seja, a dinâmica da agressão que resulta dos fotogramas é de todo incompatível com a versão apresentada na contestação e igualmente incompatível com a nova versão apresentada pelo arguido em sede de audiência de julgamento.

Sendo que o tribunal não conferiu qualquer credibilidade à versão apresentada pelo arguido de que terá sido ameaçado pelo ofendido e/ou credibilidade às testemunhas que a sustentaram.

Se não ofereceu dúvidas que o ofendido, em 2006, desferiu uma facada no arguido (o que foi confirmado pelo próprio ofendido, pelas testemunhas E... e K..., em conjugação com o documento constante de fls. 753 (relatório clínico) e que tal tivesse determinado que arguido e ofendido tivessem ficado incompatibilizados, duvidou-se já que o ofendido, previamente à chegada do arguido, tivesse exibido uma faca e dito que a mesma se destinaria àquele.

Não se ignora que a testemunha T... confirmou que avisou o arguido de que o ofendido estaria com uma faca no bolso e que pretenderia usá-la neste, o que lhe foi dito por um conhecido de nome S....

E também que a testemunha S... confirmou tal conversa com o ofendido, assim como o confirmou a testemunha E....

No entanto tais depoimentos, em si e no confronto com outros depoimentos recolhidos e prova documental junta aos autos (fotogramas) afiguraram-se-nos sem qualquer credibilidade e inquinados com inúmeras contradições e/ou incoerências.

Desde logo a testemunha T... não soube explicar com um mínimo de lógica porque é que, perante tal informação, nada fez, não obstante ser segurança do estabelecimento e ter ordens expressas no sentido de actuar (depoimento da testemunha M...), tendo-se limitado a informar o arguido.

Por outro lado, tal testemunha referiu ainda que existiu uma troca de olhares entre o arguido e o ofendido e que este último começou a perguntar àquele o que queria.

A testemunha referiu ainda que então o arguido foi tentar falar com o P..., que este último lhe disse “o que é que tu queres palhaço” e que quando aquele chegou ao pé do ofendido começaram a agarrar-se, estando ambos de frente um para o outro.

Tendo referido ainda que não viu o arguido a agarrar o ofendido pelas costas.

Tal versão mostra-se, no entanto, clara e totalmente infirmada pela análise dos fotogramas supra referidos.

Sem esquecer que a testemunha T.... explicitou ainda que o P... não chegou a ameaçar o arguido dentro da discoteca, o que se mostra incompatível com o declarado pelo arguido.

Sendo certo que a testemunha J... se encontrava junto ao arguido e ao T... (conforme resulta à exaustão dos fotogramas), tendo declarado que nada ouviu.

No que concerne à testemunha S..., resulta do seu depoimento que, quando encontrou o ofendido, este acabara de chegar, estando acompanhado por um amigo, tendo estado a conversar durante 3/5 minutos.

E que no decurso dessa conversa lhe mostrou então a faca.

Porém, resulta do depoimento da testemunha A... (que se revelou na sua essência um depoimento credível e compatível com o que resulta dos fotogramas) que na noite em questão entrou na discoteca BT... com o ofendido (o que foi igualmente confirmado pela testemunha J...) e que passados cerca de 20 minutos após terem entrado, estando no bar a pedir uma bebida, olhou e viu uma grande confusão, explicando que esteve sempre perto do ofendido, com excepção do momento em que se deslocou ao bar para ir buscar uma bebida (local onde já se encontrava há cerca de 3/4 minutos).

E que quando se deslocou para o bar o P... ficou a conversar com uma outra pessoa de nome R..., bem como que não se apercebeu de qualquer outra conversa, nem viu que o ofendido tivesse uma faca e/ou que o mesmo lhe tivesse dito que a tinha consigo.

No que respeita à testemunha E..., o seu testemunho também não se afigurou minimamente credível.

Desde logo, não se mostra verosímil que tal testemunha, estando a trabalhar como afirmou (a tirar uma imperial) tivesse visto, precisamente numa fracção de segundos, o ofendido a mostrar qualquer coisa que a mesma afirmou parecer uma navalha e que posteriormente não tivesse visto qualquer confusão.

Para além do mais, não deixa de se afigurar inverosímil a explicação dada pela testemunha para o facto, quando questionada para a circunstância de não ter ido avisar um segurança do que tinha visto, afirmando que não o fez porque não tinha a certeza de se tratar de uma faca, porque estava sozinha no bar e porque deixou entretanto de os ver.

Sendo certo que a referida testemunha declarou que o S...e o P... estavam sozinhos, que quando os viu conversar eram cerca de meia-noite e meia, que o estabelecimento ainda estava vazio e que estava sozinha no bar.

Todavia, resulta do depoimento do próprio S... que o ofendido estaria acompanhado de um amigo, que o estabelecimento não estava vazio e que a E... estava no bar com uma outra rapariga.

Sendo certo que não estando a discoteca vazia mais inverosímil se torna que a testemunha E...tivesse visto, numa fracção de segundos e enquanto trabalhava, o que afirma (em especial quando nada existia a chamar a sua atenção).

Por outro lado, também não se mostra crível ou lógico que, tendo o P... acabado de chegar à discoteca (para onde foi a convite do A... e como tal não premeditadamente à procura do arguido) tivesse gratuitamente exibido a suposta arma que traria consigo, com isso anunciando o que pretenderia fazer.

Sendo certo que estando o ofendido à espera do arguido com intenção de o matar (pese embora não deixe de ser surpreendente que tivesse escolhido um local publico para o efeito), também não se explica como se deixou agarrar por trás por este último, nas condições que resultam da análise dos fotogramas juntos aos autos, sem possibilidade de reagir.

E nem se explica porque razão, quando confrontado com a agressão do arguido, não tirou do bolso a suposta arma (que ninguém mais viu aliás, incluindo o próprio arguido).

Sendo certo que o tribunal não deixou de ter presente que as testemunhas S... e T.... trabalhavam e trabalham para a LX... (empresa para a qual trabalhava igualmente o arguido) e que a testemunha E... é namorada deste último, conforme declarações do primeiro.

No que concerne à testemunha JL... (vizinho e amigo do arguido) extraiu-se, com relevância, apenas que, o arguido lhe dissera que se andava a sentir ameaçado e que, em Dezembro de 2009, estando a jantar com o arguido num restaurante, uma pessoa chegou e disse a este último: “temos de acabar com isto”.

Sendo que a testemunha F... (amigo do arguido) também confirmou que estando a jantar com o arguido e com o JC... viu alguém aproximar-se (que não conhece), tendo existido um “burburinho” e tendo o arguido dito que andava a ser pressionado.

Depoimentos que também não permitem configurar qualquer ameaça propriamente dita (ainda que admitindo que se tratava do ofendido).

Não tendo sido credível o depoimento da testemunha JM..(colega do arguido) ao declarar que, estando a trabalhar como segurança numa discoteca, na passagem de ano de 2008/2009, constatou que o ofendido dirigiu sorrisos provocatórios ao arguido e que posteriormente quando ia sair (no momento em que lhe entregou o cartão e sem mais) lhe disse que iria acabar aquilo que começou.

Isto porque não é crível que o ofendido, gratuitamente, tivesse anunciado tal desígnio à testemunha, no momento em que abandonava a discoteca e sem qualquer explicação plausível.

Certo é que, conforme se expôs, resulta claro que foi o arguido quem, ao chegar se dirigiu ao ofendido, agarrando-o logo de seguida, sem que existisse qualquer troca de palavras e/ou agressão iminente que o justificasse.

O que, independentemente de arguido e ofendido estarem incompatibilizados, se mostra incompatível com o receio descrito pelo arguido.

Por outro lado, também se não afigurou credível a versão apresentada pelo arguido no que concerne ao facto de ter atingido o ofendido com a navalha no abdómen, designadamente porque este lhe disse que iria dar um tiro, tendo acreditado que o mesmo teria uma arma no carro.

Desde logo, resulta dos fotogramas em conjugação com o depoimento das testemunhas A... e J..., que o ofendido, após os seguranças terem conseguido afastar o arguido de si, se dirigiu em fuga para a rua, tendo sido seguido logo de seguida pelo arguido.

Não sendo verosímil que, após ter sido surpreendido pelo arguido no interior da discoteca, arrastado para o hall em poucos segundos, agredido a soco e a pontapé e encetado uma fuga para a rua, anunciasse novamente as suas intenções, dando oportunidade ao arguido de reagir.

Sendo certo que as referidas testemunhas A... e J..., cujo depoimento se nos afigurou credível e que se encontravam no hall juntamente com o arguido e com o T...., foram peremptórios em afirmar que o arguido quando fugiu nada disse.

Não se ignora que a testemunha N... também declarou ter ouvido o ofendido a dizer ao arguido que ia buscar uma arma e que o matava.

Todavia, tais declarações apresentaram-se descredibilizadas em face do teor dos restantes depoimentos e ponderando o seguinte.

Desde logo, pela testemunha foi dito que quando chegou à discoteca – estando na rua e do lado oposto da estrada relativamente ao “BT...” – viu dois homens a “brigar”, quando resulta de todos os depoimentos e dos fotogramas que, nesse momento, já o ofendido encetava a sua fuga.

Tendo tal testemunha precisado que viu o P... a ameaçar o arguido já na rua e enquanto atravessava a estrada (explicitando que ambos atravessavam a rua a gritar um com o outro), quando resulta dos restantes depoimentos, dos fotogramas e da reportagem fotográfica constante de fls. 24 a 29, que o ofendido foi agredido pelo arguido ainda no lado contrário, só tendo atravessado a rua depois de ter sido atingido pela navalha.

Não sendo lógico que o ofendido – estando a ser perseguido pelo arguido e munido este de uma navalha que trazia na mão e com a qual já o havia atingido na face – anunciasse placidamente que iria buscar uma pistola para o matar, a gritar com este e diga-se sem sequer se preocupar em defender com a faca que supostamente trazia consigo.

Tal testemunha referiu ainda que depois só viu a outra pessoa ( P..) a ficar caída (já no outro lado da rua junto aos carros) porque devia estar magoado e que depois já não viu mais nada (porque ficou em choque) e foi para casa.

Não tendo assim vislumbrado qualquer agressão por parte do arguido.

Deu-se como provado que posteriormente o arguido procurou saber do estado de saúde do P..., com base no depoimento da testemunha AM… que declarou que aquele lhe ligou por duas vezes, quando estava a fazer segurança no Hospital W..., para tal efeito.

Para dar como provadas as lesões sofridas pelo ofendido, bem como as circunstâncias em que o mesmo foi assistido no hospital W..., o tribunal louvou a sua convicção, para além das declarações do próprio ofendido, nos documentos de fls. 102, 342, 354, 348 a 352 e 428.

No que concerne às características da arma que o arguido trazia consigo, o tribunal para dar como provadas as características da mesma, louvou-se nas declarações do próprio arguido que reconheceu que entrou no “ZZ...” munido de uma navalha com uma lâmina com o comprimento de 8 cm, com base nas declarações da testemunha J..., que declarando que viu uma navalha nas mãos do arguido, precisou que tal faca estava dobrada, tendo o arguido tido necessidade de abrir a mesma com a mão e ponderando a dimensão das lesões sofridas pelo ofendido.

Sem que contudo, na ausência de qualquer apreensão ou exame à arma, se pudesse provar para além de qualquer dúvida que tal navalha tivesse uma lâmina com um comprimento superior a 10 cm, tendo a duvida sido valorada em benefício do arguido.

Sendo que a concreta intenção do arguido (enquanto elemento interior), se extraiu através da conjugação dos factos objectivos que se provaram e das circunstâncias em que o mesmo agiu com as regras da experiência comum e normalidade do acontecer, designadamente ponderando que o arguido seguiu o ofendido (que se encontrava em fuga) e que ao alcançá-lo o atingiu numa zona do corpo onde é comummente sabido existirem órgãos vitais para a vida, tendo-se ainda presente o grau das lesões efectivamente infligidas.

Não se tendo provado, no entanto, que o arguido inicialmente se tenha deslocado ao «ZZ...», com intenção de matar o P... (sem prejuízo de posteriormente ter tido intenção de o matar já na rua) porque o arguido o negou e porque nenhum dos depoimentos recolhidos ou qualquer prova documental permitiu sustentar tal conclusão, ainda que de forma indirecta.

Sendo certo que não se afigura verosímil que o arguido, sem mais, deliberada e reflectidamente, tivesse escolhido um local público para tal efeito (à vista de tanta gente) e sem que se tenha apurado um motivo que explicasse uma qualquer atitude desesperada ou irreflectida do mesmo.

As condições sociais do arguido resultaram do relatório social junto aos autos em conjugação com o depoimento das testemunhas JL..., M..., e BL…, que depuseram de forma abonatória, no sentido de que o arguido é pessoa considerada no meio em que vive e trabalha, bem como as condições de saúde da sua mãe (as quais resultaram provadas igualmente pela consideração das declarações clínicas juntas aos autos).


*

III – Fundamentação de Direito.

3.1. Como é consabido, o âmbito dos recursos define-se através das conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação[1], mas isto sem prejuízo do conhecimento, inclusive oficioso, dos vícios e nulidades previstos (as) nos n.ºs 2 e 3, do mesmo diploma adjectivo[2].

In casu, não emerge dos autos qualquer fundamento acarretando esta intervenção oficiosa.

Donde que o thema decidendum, a fixar-se únicamente em função das conclusões do recorrente, consista em verificarmos:

- Se ocorreu a invocada nulidade de deficiente gravação de parte dos depoimentos coligidos em audiência, determinante da repetição do julgamento.

- Acaso assim não suceda, se foram indevidamente considerados na decisão recorrida – porque integrando meio de prova proibida –, os fotogramas juntos aos autos.

- Decisão ademais afectada pelos vícios plasmados no artigo 410.º, n.º 2, alíneas a) e c), do Código de Processo Penal, concretamente no segmento em que teve por assente o elemento subjectivo do homicídio.

- Se os elementos decorrentes dos autos impunham a conclusão de se ter verificado uma desistência relevante relativamente ao tipo legal correspondente.

- Se deve ter-se por comprovada a reparação parcial do ofendido nos danos sofridos e ora objecto dos autos.

- Por fim, se pena a aplicar deve ser especialmente atenuada, ou, concedendo a improcedência dessa pretensão, sempre se justifica a sua redução, pois que a cominada o foi em medida excessiva.

Vejamos, salvo eventual prejudicialidade de alguma das questões relativamente às subsequentes.

3.2. Compulsados os autos, resulta assente com relevo para a ponderação da primeira questão suscitada, que:

[O Acórdão em crise foi proferido no dia 20 de Setembro de 2010.

No dia 24 seguinte, o arguido, por requerimento, manifestando vontade de o impugnar judicialmente, solicitou a transcrição para CD da totalidade das declarações e depoimentos oralmente produzidos no decurso da audiência de julgamento.

Anuindo à pretensão, em 27 ainda desse mês e ano, o Tribunal a quo remeteu ao respectivo mandatário tal CD.

Mandatário que por haver constatado que o CD não continha todas as transcrições mencionadas, no dia 4 de Outubro seguinte, telefonicamente, diligenciou no sentido de dar conhecimento do facto ao Tribunal recorrido.

Tribunal que, reconhecendo a omissão, em novo CD diligenciou pelo envio das transcrições pedidas, isto no imediato dia 6.

Auditando-as, verificou então o mesmo causídico que ao menos parte delas (do arguido; do ofendido e das testemunhas T...; S... e M...) se mostravam imperceptíveis em excertos significativos, acarretando a impossibilidade de dar acatamento ao estatuído pelo artigo 412.º, n.ºs 3 e 4, do Código de Processo Penal.

Motivo porque, com data de 15 de Outubro, suscitou perante o Tribunal a quo a nulidade que assim emergiria.

Tribunal que considerando mostrar-se esgotado o seu poder jurisdicional com a prolação do Acórdão indicado, relegou para esta instância a ponderação da questão invocada.]

O conhecimento, pelo Tribunal da Relação, da impugnação ampla em matéria de facto, pressupõe e exige que este tribunal de 2.ª instância tenha acesso à prova produzida em audiência de julgamento[3].

Efectivamente, com a gravação das declarações orais prestadas em julgamento e com a opção de facultar às partes cópia do respectivo registo, a lei pretendeu consagrar um efectivo 2.º grau de jurisdição em matéria de facto, a exercer junto do Tribunal da Relação.

Daí que, em resultado das alterações introduzidas à lei adjectiva penal pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, a redacção então introduzida ao artigo 363.º tivesse imposto, no âmbito do julgamento em processo comum com intervenção de tribunal colectivo, a documentação na acta das declarações orais naquele produzidas, excepto quando o tribunal não pudesse dispor dos respectivos meios técnicos idóneos.

Quanto ao processo comum singular, processo sumário e processo abreviado, outras eram as regras: no primeiro, haveria lugar à documentação, salvo se o Ministério Público, o defensor ou o advogado do assistente declarassem unanimemente para a acta que dela prescindiam (cfr. artigo 364.º); nos outros processos, a documentação dependia de requerimento (cfr. artigo 389.º, n.º 2, e 391.º-E, n.º 2).

Se o Acórdão do STJ n.º 5/2002[4] pôs termo às divergências jurisprudências até então havidas a propósito do concreto vício – e seu regime – decorrente da falta de documentação da prova oralmente produzida contra o disposto no artigo 363.º[5], o mesmo não sucedeu quanto à possibilidade de conhecimento oficioso pelo tribunal da irregularidade traduzida na gravação deficiente, ao abrigo do disposto no artigo 123.º, n.º 2, do Código de Processo Penal[6].

A alteração introduzida no artigo 363.º do Código de Processo Penal pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, consagrou a imperatividade da documentação da prova oralmente recolhida na audiência, alargada a todas as referidas formas de processo.

Dispõe esse normativo, inserido no Capítulo IV (Da documentação da audiência) do Título II do Livro VII do Código de Processo Penal: «As declarações prestadas oralmente na audiência são sempre documentadas na acta, sob pena de nulidade.»

Com esta alteração legislativa caducou a jurisprudência fixada no citado Acórdão de STJ n.º 5/2002.

Assim legalmente definido o vício previsto no artigo 363.º, a questão que de imediato se passou a colocar consistiu em apurar se a invalidade decorria apenas e tão só da falta absoluta do acto de documentação ou se era também configurável nos casos em que a documentação se revelava deficiente, ou seja, quando não permitia ou impossibilitava, porque inaudível ou incompreensível, a apreensão do sentido e alcance das palavras dos declarantes.

O texto da lei não era particularmente elucidativo neste contexto. Contudo, as amplas garantias de defesa do arguido, onde se inclui o exercício efectivo do recurso em matéria de facto – direito este a final também extensível ao Ministério Público e ao assistente –, não deixavam margem para grandes dúvidas.

Se a falta de documentação corta cerce a faculdade/direito de recorrer em matéria de facto, o mesmo não deixará de suceder com a deficiente gravação dos depoimentos/declarações, a qual, podendo afectar, quer qualitativa quer quantitativamente, a essencialidade da prova registada, do mesmo modo inviabiliza o recurso na vertente considerada[7].

Assim, passou a sustentar-se que a deficiente gravação das declarações constitui nulidade, sujeita ao regime de arguição e de sanação dos artigos 105.º, n.º 1, 120.º, n.º 1 e 121.º, todos do diploma adjectivo penal[8].

Efectivamente, este normativo consagra um sistema de nulidades taxativas. O princípio está enunciado de forma inequívoca – artigo 118.º – e é complementado por uma rigorosa delimitação geral e especial das causas de nulidade, sejam elas insanáveis ou dependentes de arguição.

Não sendo a nulidade em causa legalmente definida como insanável, tendo presente a disposição do citado artigo 120.º, n.º 1, só pode ser tida como nulidade dependente de arguição, perante o tribunal de 1.ª instância, no prazo previsto no artigo 105.º e, em geral, não na motivação do recurso interposto da sentença[9].

No recurso devem ser arguidas as nulidades de sentença previstas no n.º 1 do artigo 379.º do Código de Processo Penal, em conformidade com o disposto no n.º 2 do mesmo artigo, e bem assim, das nulidades dependentes de arguição que não devam considerar-se sanadas (cfr. n.º 3 do supra aludido artigo 410.º).

Sobre o prazo de 10 dias para arguição da nulidade, refere Paulo Pinto de Albuquerque que ele se inicia «a partir da audiência», havendo a acrescer «o tempo que mediou entre a entrega do suporte técnico pelo sujeito processual interessado ao funcionário e a entrega da cópia do suporte técnico ao sujeito processual que a tenha requerido». Acrescenta o referido autor: se a audiência de julgamento se prolongar por várias sessões, o prazo deve ser contado a partir de cada sessão da audiência, com acréscimo nos referidos termos.

Não obstante os sujeitos processuais puderem ter acesso, no termo de cada sessão de julgamento, e no prazo de 48 horas após requerimento para o efeito, aos suportes técnicos de gravação da prova oralmente produzida, nos termos do disposto no artigo 101.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, a posição acima exposta, quanto ao início do prazo reportado a cada sessão de julgamento, configura, afigura-se-nos, um ónus injustificado sobre o controlo da omissão ou deficiência da gravação.

Como referido no citado Ac. da Relação do Porto de 29-10-2008, deste modo «estar-se-ia a exigir ao sujeito processual, nos casos de audiências extensas e que ocupam o dia todo e várias semanas, senão meses, uma “super diligência” (na expressão do Ac. do STJ de 27/03/2006). Como ainda a coarctar de forma desproporcionada o direito ao duplo grau de jurisdição em sede de reapreciação da matéria de facto».

Além de que, na grande maioria das situações se revelaria um labor árduo mas desnecessário, porquanto o acesso ao registo de gravação só se justifica em função do recurso que se pretende interpor em matéria de facto.

Assim, sustentamos que, quer se trate de julgamento com uma ou mais sessões, o prazo de 10 para arguição da nulidade só poderá ter início após a leitura da sentença.

Porém, não impondo a lei processual penal, nomeadamente o artigo 101.º, um prazo determinado para que o sujeito processual, tendo em vista a interposição de recurso visando matéria de facto, requeira a entrega de cópia do registo das gravações, entendemos que o prazo de 10 dias para a arguição da nulidade apenas se inicia a partir do dia em que os suportes técnicos são disponibilizados pelo tribunal ao sujeito processual requerente, uma vez que só nessa data o mesmo poderá tomar conhecimento de omissão ou deficiência do registo de gravação da prova.

Na posse destes considerandos, vejamos do caso vertente.

E, primeira asserção, a de que o arguido suscitou em tempo a vislumbrada deficiência de documentação nas declarações prestadas, que identifica.

Segunda, a de que igualmente enquadrou nos termos adequados o vício detectado.

Já distinta se nos afigura, porém, a ilação a extrair da alegação apresentada.

Com efeito, ouvindo-se na íntegra as declarações e depoimentos a que alude, o que se pode concluir é que por forma alguma ficou afectado pela circunstância o exercício do direito de defesa do recorrente, já que algumas palavras, ou pequenas frases imperceptíveis, não comprometem a apreensão dos depoimentos ou declarações em causa, sendo o seu conteúdo, perfeitamente apreensível e compreensível. Aliás, sendo de pequena monta o hiato que se pode detectar entre declarações e/ou depoimentos devidamente documentados e não devidamente documentados, inclusive sem grande esforço acabam por se depreender muitas das expressões que o recorrente não transcreveu por ter na segunda forma. Reportamo-nos, concretamente: nas declarações do arguido, ao que é afirmado aos minutos 5.35; 8.40; 9.47; 10.18; 11.09; 11.34; 12.37; 12.50; 14.49; 16.25; 17.05; 17.4819.5025.45; 25.59; nas declarações do ofendido, ao que referiu aos minutos 4.22; 4.44; 5.05; 5.55; 8.23; 8.34; 9.00; 9.25; 11.20; 14.10; 15.05; 15.40; 15.50; 15.54; 16.03; 16.11; 16.23; 16.52; 21.00; 21.30; 24.17; 25.30; 25.56; 26.51; 27.06; 27.28 e 28.50; nas declarações da testemunha S..., ao que mencionou aos minutos 1.22; 2.24; 3.45; 4.24; 5.26; 6.32; 7.08; 11.37; 13.32, 13.48; 15.14; 16.0319.20; 19.36; 21.24; 21.54 e 23.05; nas declarações da testemunha M...àquilo que precisou aos minutos 0.24; 0.26; 1.22; 2.09; 2.49; 3.16; 3.35; 4.33; 5.28; 5.40; 5.47; 6.05; 6.40 e 15.39.

Por outro lado, no que se refere ao depoimento da testemunha T..., na circunstância de embora por vezes se não aquilatar exactamente do alcance de certos excertos, se verificar que os que estão transcritos surgem como patente resposta ao que lhe fora antes perguntado, por isso se esvaindo de sentido útil a omissão detectada.

Por fim, e no que concerne ao depoimento da testemunha JP…, acabar por ser o que mais correctamente se documentou entre os coligidos pelo recorrente, sendo de pequena monta as omissões encontradas e bastas vezes resultantes do diálogo simultâneo que se estabelecia entre os diversos intervenientes processuais, mas sempre em termos que fazem perceber cabalmente o conteúdo do depoimento prestado.

Donde a conclusão de improcedência desta arguição oposta pelo arguido.

3.3. Arguido que descortina uma outra nulidade, qual seja agora a de o Tribunal a quo haver considerado na sua decisão meios proibidos de prova, rectius, os fotogramas juntos aos autos.

A decisão recorrida, no segmento epigrafado Motivação Da Decisão De Facto, A), desenvolve argumentação pertinente e bastante á comprovação de idêntica improcedência da questão assim colocada. Daí que a sua nova menção de novo, apenas integrasse mera repetição sem qualquer conteúdo.

Em todo o caso, e à guisa de reforço do sufragado, limitar-nos-emos a reproduzir o expendido num dos arestos que, aliás, sustenta a decisão ora em crise, qual seja, o prolatado no âmbito do recurso n.º 371/06.5 GBVNF.P1, relatado pela Ex.ma Desembargadora Dr.ª Eduarda Lobo. Consignou:

“Defende o recorrente que a utilização do sistema de videovigilância fora dos casos previstos na lei, constitui intromissão manifesta na vida privada e na contrição inaceitável do direito à imagem, pelo que as provas assim obtidas são nulas, porque proibidas, nos termos dos art.ºs. 126.º n.º 3 do C.P.P. e 26.º da CRP.

Na esteira da doutrina alemã, as proibições de prova representam meios processuais de imposição da tutela de direitos materiais, constituindo limites à descoberta da verdade que têm em si subjacentes o fim de tutela de um direito.

Nesta perspectiva as proibições de prova representam, portanto, «meios processuais de imposição do direito material» que visam «prevenir determinadas manifestações de danosidade social» e garantem «a integridade de bens jurídicos prevalentemente pessoais», como entre nós tem sido defendido pelo Professor Manuel da Costa Andrade [3].

Significa isto que o regime da legalidade da prova, ao estabelecer proibições de produção ou valoração da mesma, comprime o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no art.º 127.º do Cód. Proc. Penal.

Dito de forma simples e sucinta: as proibições de prova assumem, na prática, um papel de tutela dos direitos fundamentais.

A nossa Constituição adoptou uma concepção dos direitos fundamentais diferente da concepção liberal que via naqueles direitos exclusivamente direitos subjectivos de defesa perante o Estado, considerando, nos termos do seu art.º 18.º/1, estes direitos relevantes não apenas nas relações entre os particulares e o Estado, como também nas relações entre os particulares [4].

Sem se pôr em causa a sua eficácia vinculativa abrangendo poderes públicos e entidades privadas, nem todas as normas constitucionais atinentes a direitos, liberdades e garantias são, porém, exequíveis por si mesmas. Exemplo de normas daquele tipo que não são exequíveis por si mesmas, podemos encontrar nos art.ºs 26.º/2 e 35.º da CRP [5], garantias contra a utilização abusiva de informações.

É frequente a necessidade de recurso às soluções assumidas pelo legislador ordinário em concretização dos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados para apreciar a conformidade da vinculação dos particulares aos mesmos.

Por outro lado, importa ainda reter que na vinculação das entidades privadas às normas constitucionais atinentes a direitos, liberdades e garantias não estão em causa «direitos que apenas podem ter por destinatário passivo o Estado, como as garantias de Direito e de processo penal» como ensina ainda o mesmo ilustra constitucionalista [6].

Transpondo estes ensinamentos para o processo penal («direito constitucional aplicado», como de há muito classificado), temos assim que as regras de proibição de prova constitucionalmente definidas ou concretizadas pelo legislador ordinário na legislação processual penal, mormente o CPP, servindo a tutela dos direitos fundamentais, dirigem-se em primeira mão às instâncias formais de controle, designadamente aos investigadores, ministério público e juiz de instrução. São eles, por exemplo, os destinatários expressamente eleitos das normas contidas no art.º 34.ª/4 da CRP e 187.º e 188.º do CPP. São também eles, os destinatários da norma contida no art.º 6.º da Lei 5/2002, de 11.1 que faz depender da prévia autorização judicial o registo de voz ou imagem sem consentimento do visado, para a investigação de determinados crimes.

No caso dos autos, as imagens recolhidas não o foram, porém, pelos órgãos de polícia criminal, antes por uma câmara de videovigilância particular.

Significará o que acima se deixou dito que os particulares não devem respeito pelo direito à imagem dos seus concidadãos? Certamente que não.

Simplesmente, os seus deveres de respeito pelos referidos direitos pessoais constitucionalmente consagrados (art.º 26.º da CRP) encontram-se concretizados na legislação ordinária, não decorrendo de nenhuma norma processual penal em particular. Estas visam disciplinar a investigação e o procedimento penal, indicando aos agentes de investigação e às autoridades judiciárias, bem como aos sujeitos processuais, os instrumentos de que se podem valer e os procedimentos que devem respeitar para sustentar a sua posição nos autos. Não regulam os direitos e deveres dos particulares.

Assim, ao prescrever a proibição de prova obtida mediante intromissão na vida privada sem o consentimento do respectivo titular, o art.º 126.º/3 do CPP indica o dever dos investigadores e autoridades judiciárias respeitarem normativos que, excepcionalmente, e para prossecução de outros direitos ou fins constitucionalmente contemplados, designadamente a perseguição penal, autorizam restrições aos direitos fundamentais. É o caso de normativos como os já acima referidos art.ºs 187.º CPP ou 6.º da Lei 5/2002, em concretização ainda do respeito pelos direitos fundamentais contemplados nos art.ºs 26.º e 34.º da CRP. No que respeita, por seu lado, a provas obtidas por particulares, o legislador remete-nos para a tipificação dos ilícitos penais previstos no Código Penal como tutela do referido direito fundamental à privacidade.

Bem ilustrativo desta linha de concretização legislativa se revela o normativo inserto no art.º 167.º do CPP ao fazer depender a validade da prova produzida por reproduções mecânicas da sua não ilicitude penal.

Aqui chegados cumpre verificar se a conduta traduzida na captação das imagens que o tribunal considerou, configura, ou não, um ilícito penal. É essa, com efeito, a apreciação que traz em si a resolução da questão suscitada neste recurso. A verificação da existência, ou não, de licença concedida pela CNPD para a colocação da (s) câmara (s) de videovigilância no estabelecimento comercial do denunciante, poderá, eventualmente, integrar desrespeito pela legislação de protecção de dados, designadamente a Lei n.º 67/98, aplicável à videovigilância nos termos do seu art.º 4.º n.º 4. Mas não define a licitude ou ilicitude penal da recolha ou utilização das imagens.

Com efeito, de acordo com o art.º 43º da citada lei, só o não cumprimento intencional das obrigações relativas à protecção de dados, designadamente a omissão das notificações ou os pedidos de autorização a que se referem os art.ºs 27.º e 28.º, é que constituem crime, já que uma conduta negligente traduzir-se-á apenas em contra-ordenação (prevista no art.º 37.º).

É o art.º 199.º do Cód. Penal que tipifica o crime de gravações ou fotografias ilícitas. Ora, nos termos deste preceito deve ser punido «quem, sem consentimento, gravar palavras proferidas por outra pessoa e não destinadas ao público, mesmo que lhe sejam dirigidas; ou utilizar ou permitir que se utilizem as gravações referidas (...) mesmo que licitamente produzidas». Nos termos do n.º 2 do referido artigo, no mesmo crime incorre ainda quem, «contra vontade fotografar ou filmar outra pessoa, mesmo em eventos em que tenha legitimamente participado; ou utilizar ou permitir que se utilizem fotografias ou filmes referidos na alínea anterior, mesmo que licitamente obtidos».

Tal como sublinhado por Costa Andrade [7] «o art. 199.º contém duas incriminações autónomas – a saber: gravações e fotografias ilícitas – preordenadas à tutela de dois bens jurídicos distintos: o direito à palavra e o direito à imagem. Trata-se de duas incriminações homólogas, mas não inteiramente sobreponíveis». E entre as diferenças que é possível encontrar nas duas incriminações em referência, destaca o ilustre Professor, desde logo, que a gravação da palavra é ilícita logo que obtida “sem consentimento”, enquanto que a fotografia só será ilícita desde que produzida “contra a vontade”, o que traduz uma redução significativa da dimensão da tutela penal do direito à imagem relativamente à dimensão conferida à tutela penal do direito à palavra, diferenciação que deve ser compreendida face à maior externalidade da imagem que torna este direito necessariamente mais incontornavelmente exposto à ofensa.

Ora, no caso em apreço, não é possível afirmar que a gravação da imagem do arguido foi efectuada contra a sua vontade, pois, como resulta da motivação de facto do acórdão recorrido (v. fls. 193), segundo declarações do respectivo proprietário, no interior do estabelecimento em causa, existe um aviso escrito advertindo o público da existência de sistema de videovigilância.

Por outro lado, como tem sido entendimento da jurisprudência não constitui crime a obtenção de imagens, mesmo sem consentimento do visado, sempre que exista justa causa para tal procedimento, designadamente quando sejam enquadradas em lugares públicos, visem a protecção de interesses públicos ou hajam ocorrido publicamente [8].

Aliás, o próprio art.º 79.º n.º 2 do Cód. Civil prevê a desnecessidade do consentimento da pessoa retratada quando assim justifiquem exigências de polícia ou de justiça, o que, naturalmente, também deverá ser considerado extensível ao direito penal, face à sua natureza fragmentária e ao seu princípio de intervenção mínima. Consagrando o princípio de que o ordenamento jurídico deve ser encarado no seu conjunto, dispõe o art.º 31º, n.º 1, do Cód. Penal, que o facto não é criminalmente punível quando a sua ilicitude for excluída pela ordem jurídica considerada na sua totalidade. Significa isto que as normas de um ramo do direito que estabelecem a licitude de uma conduta têm reflexo no direito criminal, a ponto de, por exemplo, nunca poder haver responsabilidade penal por factos que sejam considerados lícitos do ponto de vista civil.

Aquela justa causa apenas será afastada pela inviolabilidade dos direitos humanos, designadamente a inadmissibilidade de atentados intoleráveis à liberdade, dignidade e integridade moral das pessoas, como seja o direito ao respeito pela sua vida privada.

Ora, a citada norma do Cód. Civil não só afasta a ilicitude dos art.ºs 199.º do Cód. Penal e 167.º do Cód. Proc. Penal, como também não é inconstitucional, uma vez que, embora comprima o direito à reserva da vida privada, não o faz de uma forma de todo intolerável, como parece evidente à luz do mais elementar bom senso [9].

Assim, tem a jurisprudência, de um modo geral, entendido não ser proibida a prova obtida por sistemas de videovigilância colocados em locais públicos, com a finalidade de proteger a vida, a integridade física, o património dos respectivos proprietários ou dos próprios clientes perante furtos ou roubos, por as imagens não serem captadas em locais privados, total ou parcialmente restritos, nos quais, segundo as concepções morais vigentes, uma pessoa não deve ser retratada, justificando-se, pois, essa excepção aos métodos proibidos de prova por razões de polícia ou de justiça.

Como se refere no voto de vencido lavrado pelo Des. Mário B. Morgado no Ac. R.Lx. de 03.05.2006 [10] “Afigura-se-nos que a captação de imagens em causa não integra o crime p. e p. pelo art.º 199.º, n.º 2, a), CP: a captação de imagem dirigida a provar factos ilícitos em locais públicos ou no local de trabalho deve considerar-se desprovida de tipicidade (aquele tipo criminal deve sofrer uma redução da área de tutela de sentido vitimo dogmático) ou, pelo menos, de ilicitude (com base, segundo as diferentes posições doutrinárias, em “quase legítima defesa”, legítima defesa, direito de necessidade, prossecução de interesses legítimos ou num critério geral de interesses) – cfr. sobre esta problemática Costa Andrade, Comentário Conimbricense ao Código Penal, I, 834-840, e Sobre as proibições de prova em processo penal, 242-272. Também não se descortina no caso vertente qualquer violação da integridade física ou moral do arguido ou ofensa da sua dignidade/intimidade – como se sabe, nem toda a lesão de um direito de personalidade viola a dignidade humana”.

Por outro lado, a obtenção de imagens nas circunstâncias em apreço também não constitui qualquer crime de devassa contra a vida privada (previsto no art.º 192.º) ou de devassa por meio de informática (do art.º 193.º, ambos do Cód. Penal), uma vez que com estes ilícitos pretende-se tutelar apenas o núcleo duro da vida privada e mais sensível de cada pessoa, como seja a intimidade, a sexualidade, a saúde, a vida particular e familiar mais restrita, que se pretende reservada e fora do conhecimento das outras pessoas, o que não é manifestamente o caso da situação que nos ocupa. Com efeito, as imagens do arguido não foram registadas no contexto da esfera privada e íntima deste, nem foram captadas às ocultas, tanto mais que a existência das câmaras de videovigilância estava devidamente assinalada através da aposição dos competentes dísticos.

Conclui-se assim que as imagens captadas em circunstâncias e condições semelhantes àquelas em que foram recolhidos os fotogramas juntos aos autos e examinados em audiência, não correspondem a qualquer método proibido de prova, tanto mais que apenas foram obtidas com o fim de identificação, confinando-se, pois, à estrita ligação à identidade do titular do direito, o que exclui qualquer exposição arbitrária da imagem e muito menos qualquer manipulação da mesma.


*

……

[3] In “Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal”, Coimbra Editora, 1992, pág. 83.

[4] V. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2007, em anotação ao art.º 18.º.

[5] Neste sentido, v. Jorge Miranda, in Constituição da República Portuguesa Anotada, de Jorge Miranda e Rui de Medeiros, Coimbra Editora, 2005, em anotação ao art.º 18.º.

[6] Cfr., ob. cit, pág. 156.

[7] In Comentário Conimbricense do Código Penal, em anotação ao art.º 199.º.

[8] V. Ac. R.Coimbra de 17.04.2002, in CJ, Tomo III, pág. 40 e Ac. R.Lx de 28.11.2001, in CJ, Tomo V, pág. 138.

[9] Cfr., neste sentido, o Ac. desta Relação de 26.03.2008, relatado pelo Des. Joaquim Gomes, disponível em www.dgsi.pt, e que aqui seguiremos de perto, bem como o Ac. de 14.10.2009, também desta Relação, de que foi relator o Des. Ângelo Morais, citando decisão proferida pela 1.ª instância; v. ainda o Ac. do STJ de 20.06.2001, in CJAcs. STJ, Ano IX, Tomo II, pág. 226.

[10] Disponível no site www.dgsi.pt.”

3.4 Terceira crítica apontada à decisão recorrida a de ela padecer dos vícios plasmados no artigo 410.º, n.º 2, alíneas a) – de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada – e c) – de erro notório na apreciação da prova –, do Código de Processo Penal, concretamente no segmento em que teve por assente o elemento subjectivo do homicídio.

Mostra-se com o teor seguinte a argumentação do recorrente no sentido de justificar a emergência dos dois vícios aludidos:

Relativamente à intenção de matar, o Tribunal recorrido deu como provados os factos seguintes:

[3. Munido de uma navalha (com uma lâmina dobrável manualmente até ocultar o fio no cabo) com uma lâmina de comprimento concretamente não apurado mas não inferior a 8 cm, que trazia no bolso direito das calças.

9. O arguido alcançou o P... ainda no passeio onde se encontra o referido estabelecimento e com a referida navalha desferiu-lhe um golpe de baixo para cima e da direita para a esquerda, no abdómen, atingindo-o no sétimo espaço intercostal esquerdo, perfurando a parede torácica, a pleura, o diafragma e o estômago.

19. Ao desferir o referido golpe no abdómen do P..., o arguido quis matá-lo, sabendo que na zona que escolheu para desferir tal golpe se alojavam órgãos vitais do corpo e essenciais à vida, o que só não conseguiu por aquele ter sido rapidamente assistido no local.]

Por outro lado, mencionou o mesmo aresto na correspectiva motivação probatória, que [B) O tribunal alicerçou a sua convicção fazendo uma análise e apreciação crítica das declarações do próprio arguido no confronto com as declarações das testemunhas inquiridas, cotejando-as com os documentos juntos aos autos.]

Ora, incorreu desta forma em erro notório na apreciação da prova pois que considerou que o comprimento da lâmina e o local em que o ofendido foi atingido são suficientes para alicerçar tal elemento subjectivo. Todavia, sucede não ter sido atingido qualquer órgão vital da vítima ou sequer que o comprimento de tal objecto fosse adequado e suficiente para atingir tais órgãos.

Acresce ter sido a concreta decisão do Tribunal sindicado feita à revelia das conclusões do relatório pericial de fls. 317/318, o qual apenas menciona que o ofendido esteve em perigo de vida, isto menosprezando que esse perigo pode ter advindo de múltiplos factores, designadamente perda de sangue e não, necessariamente, do tipo de órgãos molestados, nenhum deles vital.

Quid iuris?

Como é consabido, os vícios do mencionado artigo 410.º, são vícios de lógica jurídica ao nível da matéria de facto, que tornam impossível uma decisão logicamente correcta e conforme à lei.

Vícios da decisão, não do julgamento, como se exprime Maria João Antunes[10] e se acentuou no acórdão do STJ, de 5 de Novembro de 1997[11].

E, vícios apenas compagináveis, conforme n.º 1 desse normativo, com o incontornável pressuposto de que hão de derivar do texto da decisão recorrida, sem recurso a quaisquer elementos externos.

Por outro lado, de lembrarmos que o primeiro deles – de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada – ocorre quando a matéria de facto é insuficiente para fundamentar a solução de direito encontrada, porque o tribunal não esgotou os seus poderes de indagação em matéria de facto; detecta-se quando da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem elementos que, podendo e devendo ser indagados, são necessários para que se possa formular um juízo seguro de condenação ou de absolvição.

A insuficiência prevista na alínea a) determina a formação incorrecta de um juízo porque a conclusão ultrapassa as premissas. A matéria de facto é insuficiente para fundamentar a solução de direito correcta, legal e justa.

Insuficiência em termos quantitativos, porque o tribunal não esgotou os seus poderes de indagação em matéria de facto.

A propósito do vício em referência é dado adquirido que a matéria de facto só é insuficiente para a decisão proferida quando se verifique uma lacuna no apuramento da matéria de facto necessária para a decisão de direito, quando os factos assentes não são substrato necessário e suficiente para justificar a decisão de direito assumida.

Tal vício só pode ter-se como evidente quando a factualidade provada não chega para justificar a decisão de direito, ou seja, para a subsunção na norma incriminadora, considerando todos os seus elementos típicos[12].

Ou, como se diz noutro aresto do nosso mais Alto Tribunal[13], está-se na presença de tal vício quando os factos colhidos, após o julgamento, não consentem, quer na sua objectividade quer na sua subjectividade, dar o ilícito como provado.

Ou ainda, na formulação do acórdão da mesma instância[14], o vício só pode considerar-se verificado “quando os factos apurados são insuficientes para se decidir sobre o preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos dos tipos legais de crimes verificáveis e dos demais requisitos necessários à decisão de direito e é de concluir que o tribunal a quo podia ter alargado a sua investigação a outro circunstancialismo fáctico suporte bastante dessa decisão.”

Noutra formulação, o vício consiste numa carência de factos que permitam suportar uma decisão dentro do quadro das soluções de direito plausíveis e que impede que sobre a matéria de facto seja proferida uma decisão de direito segura; a “insuficiência” relevante não pode ser considerada apenas em relação a uma concreta decisão que esteja em causa, devendo atender-se, para aferir a carência factual para uma decisão segura, ao quadro das várias soluções plausíveis da questão de direito[15].

Ainda de anotarmos o mencionado no recurso n.º 45829[16], em cujos termos não integra o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nem qualquer outro dos outros previstos no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, o facto de o recorrente pretender «contrapor às conclusões fácticas do tribunal a sua própria versão dos acontecimentos, o que desejaria ter visto provado e não o foi».

Já o segundo dos vícios mencionados – de erro notório na apreciação da prova – é aquele que é evidente, que não escapa ao homem comum, de que um observador médio se apercebe com facilidade, que é patente, só podendo relevar, como foi dito no acórdão do STJ de 1 de Outubro de 1997, in processo n.º 243/97-3.ª, se for ostensivo, inquestionável e perceptível pelo comum dos observadores ou pelas faculdades de apreciação do “homem médio”.

Ou, como se extrai do acórdão do mesmo Tribunal, de 1 de Outubro de 1997, in processo n.º 627/97-3.ª, tal vício existe quando se dão por provados factos que, face às regras de experiência comum e à lógica corrente, do homem médio, não se teriam podido verificar ou são contraditados por documentos que fazem prova plena e que não tenham sido arguidos de falsos. Trata-se de um vício do raciocínio na apreciação das provas, evidenciado pela simples leitura do texto da decisão; erro tão evidente que salta aos olhos do leitor médio, sem necessidade de particular exercício mental; as provas revelam claramente um sentido e a decisão recorrida extraiu ilação contrária, logicamente impossível, incluindo na matéria fáctica provada ou excluindo dela algum facto essencial.

O erro notório na apreciação da prova não pode resultar da mera divergência de qualquer dos sujeitos processuais relativamente ao decidido[17].

Nesta perspectiva, mostra-se patente a deficiente estruturação de ambos os vícios em causa levada a cabo pelo arguido.

Na verdade, o que verdadeiramente está em causa é a valoração das provas que o Colectivo do Tribunal a quo efectuou e com o que ele discorda, isto é, tudo se reconduz, então, à tentativa em esgrimir argumentos no campo da matéria de facto. Dir-se-ia estarmos face a uma “segunda via” de impugnação da matéria de facto, mas, surpreende-se, atento o estatuído pelo artigo 412.º, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Penal, completamente fora dos cânones aí previstos. Na realidade, o que afirma ao longo das pertinentes conclusões é uma outra maneira de dizer, mas procurando o mesmo objectivo, sindicar a matéria de facto, impugnar as provas, tentar demonstrar que não preencheu o elemento subjectivo do tipo do artigo 131.º do Código Penal.

Neste aspecto da valoração das provas, dir-se-á que na análise a efectuar não pode deixar de ter-se em conta que a fixação da matéria de facto teve na sua base uma apreciação da prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador, nos termos do artigo 127.º do Código de Processo Penal, o que agora se mostra vedado a este Tribunal, atenta a formulação seguida pelo recorrente.

Como inúmeras vezes tem sido frisado pelo STJ, na ponderação ao abrigo do regime estabelecido pelo aludido artigo 410.º, n.º 2, mostram-se totalmente irrelevantes as considerações que os recorrentes façam no sentido de pretenderem discutir a prova feita no julgamento e de solicitarem que o Tribunal de recurso modifique tal prova e passe a aceitar como realidade aquilo que o interessado pretende corresponder ao sentido do que teria resultado do julgamento. É que acaso assim não fora, estaria a instância de apelo
a invadir o campo da apreciação da matéria de facto que o tribunal sindicado fez de harmonia com o citado artigo 127.º do Código de Processo Penal.

Vendo-se a decisão recorrida e mormente os excertos probatórios convocados pelo recorrente, resulta à exuberância que os mesmos eram bastantes, como mais adiante escalpelizou a decisão sindicada, ao preenchimento do elemento subjectivo controvertido, donde que a não emergência do vício elencado pela alínea a).

Por outro lado, igualmente não decorre do texto da decisão impugnada – que não se ateve a qualquer prova tarifada, antes a prova submetido á livre ponderação –, a afronta a regras comuns da experiência, o ataque à lógica corrente, do homem médio. Não se deram por provados factos que se não teriam podido verificar ou que se mostram contraditados por documentos que fazem prova plena e que não tenham sido arguidos de falsos. Não sobressai, da simples leitura do texto da decisão um erro tão evidente que salta aos olhos do leitor médio, sem necessidade de particular exercício mental. Nada aponta em que as provas coligidas revelaram claramente um sentido e a decisão recorrida extraiu ilação contrária, logicamente impossível, incluindo na matéria fáctica provada ou excluindo dela algum facto essencial.

O instrumento utilizado pelo arguido; a forma como vibrou a segunda das facadas no ofendido e a região que atingiu do seu corpo, ao invés de fragilizarem o juízo conclusivo do Tribunal a quo, tornam perfeitamente conforme às regras da experiência o juízo conclusivo nele acolhido.

Donde a conclusão já exposta no sentido da improcedência também desta
arguição do recorrente.

3.5. Questão subsequente a dever dilucidar-se, segundo o arguido, a de que vindo provado que após desferir os golpes no ofendido pediu para que fosse chamada uma ambulância ao local dos factos e aí acabou o mesmo por ser prontamente assistido, obstando pois ao seu decesso, emergiriam os pressupostos conducentes à configuração de uma desistência relevante, tal como definida no artigo 24.º do Código Penal.

A argumentação do recorrente olvida, desde logo, que o que obstou ao decesso do ofendido foi a assistência médica prestada e não qualquer conduta que ele próprio haja assumido então. Daí que tal circunstância não tenha virtualidade bastante a integrar a previsão daquele normativo, mas apenas se cinja a um arrependimento posterior aos factos a valorar tão-somente, sendo o caso, na operação de determinação da medida concreta da pena.

Ainda de anotar-se, como bem acentuou o recorrido Ministério Público que, concluindo-se como pretende o arguido, se estaria a cominar a decisão recorrida com o vício de contradição insanável: com efeito, assente a intenção de matar, como simultâneamente uma desistência dessa intenção, manifestamente incompatível com os actos de execução do crime efectivamente praticados pelo agente?

Em síntese, igualmente do malogro das correspondentes conclusões do recurso.

3.6. Tarefa agora imposta, a de determinarmos se deve ter-se por comprovada a parcial reparação do ofendido nos danos sofridos por virtude da conduta delitiva do recorrente, ora objecto dos autos.

Alega para tanto que, pese embora a fls. 19, § 2.º do aresto impugnado, se encontre mencionado que o ofendido não corroborou a entrega pelo arguido, através de cheque bancário, da quantia ressarcitória de € 2.500,00, e sendo correcto que á data em que decorreu a audiência de julgamento (10 de Setembro de 2010) tal título se não encontrava cobrado, mas tão somente emitido pelo mandatário do recorrente (com data de 3 de Setembro de 2010), certo é porém haver ocorrido a respectiva cobrança no dia 16 de Setembro de 2010; isto é, à data da prolação do aresto impugnado (20 de Setembro de 2010), já o ofendido estava ressarcido ao menos nesse montante. Facto que deve, então, ter-se como provado, sob pena de preterição aos artigos 32.º, n.ºs 1, 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa, e 6.º, § 1 e 2, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Compulsando-se os autos, resulta com efeito comprovado que no decurso da audiência – no dia 8 de Setembro de 2010 –, o arguido requereu a junção de um cheque – datado de 3 de Setembro de 2010 – para prova de alegado pagamento efectuado ao ofendido (cfr. fls. 796 e 780). Ouvido, pronunciou-se o Ministério Público no sentido da irrelevância da junção requerida, pois que se trataria de simples fotocópia de um cheque emitido sobre uma conta da qual o arguido não era titular, além de que o ofendido, depondo, afirmara já nada ter recebido até então a título ressarcitório do arguido. Mais resulta que o Tribunal a quo admitiu a junção respectiva, sem prejuízo de posterior valoração (novamente fls. 796).

No dia 20 de Setembro de 2010 mostra-se proferido o Acórdão recorrido, sem que da acta elaborada conste ter algo sido requerido a propósito, antecedendo a leitura dessa peça processual.

Apenas com o requerimento de interposição do recurso juntou o arguido comprovativo de ter sido efectuado o levantamento da quantia atinente a tal cheque, isto no dia 16 de Setembro de 2010.

No âmbito do processo penal, a regra quanto á junção de documentos é, como flui do estatuído pelo artigo 165.º, n.º 1, respectivo, a de que devem ser juntos “no decurso do inquérito ou da instrução e, não sendo isso possível, deve sê-lo até ao encerramento da audiência.”

Assim, exige-se ao arguido a sua junção na fase da instrução – quando esta tem lugar e não na fase de inquérito, já que sobre si não recai o dever de colaborar com a investigação –; com a contestação (artigo 315.º, n.º 1, por identidade de razão) ou, acaso não se mostrasse a junção possível, excepcionalmente, até ao dito “encerramento da audiência”.

Esta ocorre, também conforme regra geral, e de acordo com o artigo 361.º, do mesmo diploma, findas as alegações orais e logo que facultada ao arguido a possibilidade de se pronunciar sobre a sua defesa, ele o tenha feito; excepcionalmente, determinando o tribunal a reabertura da audiência para efeito do consignado pelo subsequente artigo 371.º (para determinação da sanção), logo que finda a produção de prova complementar, os sujeitos processuais intervenientes tenham alegado “conclusivamente” (n.º 4 do mesmo preceito).

No caso presente, o arguido não juntou – quiçá porquanto o não podia já então fazer –, o cheque em causa com a contestação. Fê-lo no decurso da audiência, embora nessa altura sem a comprovação de se ter já procedido ao seu desconto bancário. Este mediou entre a data de encerramento da “discussão” da causa, sucedendo, ademais, que nada não se procedeu à “reabertura” nos termos do mencionado artigo 371.º, nem aquando da leitura do acórdão algo foi requerido, a propósito.

Num estrito rigor formal, impor-se-ia talvez olvidar tal facto – do desconto do cheque – e a ilação que o arguido quer daí extrair – comprovar a reparação parcial dos prejuízos que causou ao ofendido –.

O fim último do processo penal é, porém, a descoberta da verdade e a boa decisão da causa (cfr., v.g., o artigo 340.º, n.º 1, em cujos termos, “O tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa.”).

Ora, nesta perspectiva, entendemos não poder menosprezar-se o alegado, sequer controvertido pelo ofendido.

Donde que se passe a considerar como provado que “o arguido, para ressarcimento parcial dos danos causados ao ofendido, em virtude dos factos relatados e tidos por provados nos autos, pagou-lhe, em 16 de Setembro de 2010, a quantia de € 2.500,00.”

3.7. Última tarefa que nos é cometida, a de averiguarmos se deve atenuar-se especialmente a pena a cominar-se-lhe, ou, concedendo a improcedência dessa pretensão, sempre se impõe a redução do seu quantum concreto, pois que a aplicada na decisão recorrida se mostra em medida excessiva.

3.7.1. Nos termos do n.º 1 do artigo 72.º, do Código Penal, “O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.”

A pena pode/deve, assim, ser especialmente atenuada em função quer da diminuição de forma acentuada da ilicitude do facto ou da culpa do agente, como também da necessidade da pena, e, consequentemente, das exigências de prevenção.
A atenuação especial da pena só pode/deve ser decretada quando a imagem global do facto revele que a dimensão da moldura da pena prevista para o tipo de crime não poderá realizar adequadamente a justiça do caso concreto, quer pela menor dimensão e expressão da ilicitude ou pela diminuição da culpa, com a consequente atenuação da necessidade da pena – vista a necessidade no contexto e na realização dos fins das penas. Corresponde a uma válvula de segurança do sistema, que só deve ter lugar em casos extraordinários ou excepcionais, em que aquela imagem global do facto se apresenta com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estabeleceu os limites normais da moldura correspondente ao tipo
[18].

Circunstância invocada como de primacial importância pelo recorrente para justificar da atenuação que reclama, a de haver ele procedido entretanto à reparação parcial dos danos determinados ao ofendido.

Nos termos da alínea c), n.º 2, do encimado artigo 72.º, para efeitos do dever[19] aí previsto, deve considerar-se, inter allia, o “ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe for possível, dos danos causados.”

No caso vertente, as partes civis foram remetidas para os meios comuns quanto ao apuramento da responsabilidade respectiva, como se exarou no despacho prolatado a fls. 786/7, donde que se mostre pura conjectura apurar desde já da razoabilidade, do esforço do ressarcimento operado pelo arguido, neles demandado, relativamente aos danos (por enquanto processualmente indetermináveis) efectivamente sobrevindos ao ofendido, aí demandante.

Sucede, ainda, entendermos que o juízo de censura que merece o arguido tem de se revestir de alguma severidade, face à sua inopinada actuação, dirigindo-se ao ofendido que passou a agredir corporalmente, sem mais, e inclusive mesmo após a intervenção de terceiros que os tentaram separar, conduta reiterada já no exterior do estabelecimento.

Também a ilicitude da sua conduta se mostra consentânea com a punição nos quadros da moldura penal normal do artigo 131.º citado, face ao modo como o crime foi executado, com recurso a uma navalha de que estava préviamente munido.
As exigências de prevenção geral são patentes, se atentarmos na proliferação de condutas violentas, como a dos autos, sobretudo em meios ou proximidades de locais de diversão, como nos dão notícia ampla os meios de comunicação social.

A necessidade de reafirmar a validade da norma violada e o mais alto valor do bem jurídico violado, a vida, que parece estar a perder consideração, não se compadecem, por si, com a moldura especialmente atenuada, bem pelo contrário.

Consequentemente, improcede esta pretensão do recorrente.

3.7.2. A determinação da medida da pena faz-se com recurso ao critério geral estabelecido no artigo 71.º do diploma substantivo penal, tendo em vista as finalidades próprias das respostas punitivas em sede de Direito Penal, quais sejam a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade – artigo 40.º, n.º 1 –, sem esquecer, obviamente, que a culpa constitui um limite inultrapassável da medida da pena – seu n.º 2 –.

Com efeito, a partir da revisão operada em 1995 ao Código Penal, a pena passou a servir finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial, assumindo a culpa um papel meramente limitador da pena, no sentido de que, em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa, sendo que dentro desse limite máximo a pena é determinada dentro de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico, só então entrando considerações de prevenção especial, pelo que dentro da moldura de prevenção geral de integração, a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais.
É este o critério da lei fundamental – seu artigo 18.º, n.º 2 – e foi assumido pelo legislador penal de 1995
[20]

Como refere Anabela Rodrigues[21], o artigo 40.º, do Código Penal, após a revisão de 1995, condensa em três proposições fundamentais um programa político-criminal – a de que o direito penal é um direito de protecção dos bens jurídicos, de que a culpa é tão-só limite da pena, mas não seu fundamento, e a de que a socialização é a finalidade de aplicação da pena, de onde resulta que: «Em primeiro lugar, a medida da pena é fornecida pela medida da necessidade de tutela de bens jurídicos, isto é, pelas exigências de prevenção geral positiva (moldura de prevenção). Depois, no âmbito desta moldura, a medida concreta da pena é encontrada em função das necessidades de prevenção especial de socialização do agente ou, sendo estas inexistentes, das necessidades de intimidação e de segurança individuais. Finalmente, a culpa não fornece a medida da pena, mas indica o limite máximo da pena que em caso algum pode ser ultrapassado em nome de exigências preventivas».

Daqui decorre que o juiz pode impor qualquer pena que se situe dentro do limite máximo da culpa, isto é, que não ultrapasse a medida da culpa, elegendo em cada caso aquela pena que se lhe afigure mais conveniente, tendo em vista os fins das penas, com apelo primordial à tutela necessária dos bens jurídico-penais do caso concreto, tutela dos bens jurídicos não, obviamente, num sentido retrospectivo, face a um facto já verificado, mas com significado prospectivo, correctamente traduzido pela necessidade de tutela da confiança e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma violada; neste sentido sendo uma razoável forma de expressão afirmar-se como finalidade primária da pena o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime, finalidade que, deste modo, por inteiro se cobre com a ideia de prevenção geral positiva ou de prevenção de integração, dando-se assim conteúdo ao exacto princípio da necessidade da pena que o artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, consagra[22].

Quanto à pena adequada à culpabilidade, isto é, consonante com a culpa revelada – máximo inultrapassável –, certo é dever corresponder à sanção que o agente do crime merece, ou seja, deve corresponder à gravidade do crime. Só assim se consegue a finalidade político-social de restabelecimento da paz jurídica perturbada pelo crime e o fortalecimento da consciência jurídica da comunidade.
Há que ter em atenção, porém, que aquilo que é “merecido” não é algo preciso, resultante de uma concepção metafísica da culpabilidade, mas sim o resultado de um processo psicológico valorativo mutável, de uma valoração da comunidade que não pode determinar-se com uma certeza absoluta, mas antes a partir da realidade empírica e dentro de uma certa margem de liberdade, tendo em vista que a pena adequada à culpa não tem sentido em si mesma, mas sim como instrumento ao serviço de um fim político-social, pelo que a pena adequada à culpa é aquela que seja aceite pela comunidade como justa, contribuindo assim para a estabilização da consciência jurídica geral
[23]

Do quadro fáctico apurado verifica-se estarmos perante a prática tentada de um factos delituoso de gravidade acentuada: atentar contra o bem supremo vida.

Factos consubstanciadores perpetrados com dolo directo.

Prementes, consignámos já, as razões de prevenção geral que se fazem sentir no caso.

Sob o ponto de vista atenuativo, pese embora as circunstâncias invocadas pelo recorrente, nenhuma delas se mostra com força suficiente a mitigar a sua responsabilidade no sucedido e a antever que sem a medida da pena aplicada, se logrem atingir as finalidades ínsitas nas reacções criminais.

Donde a conclusão de manutenção, porque ajustada e proporcionada, da pena cominada em 1.ª instância.


*

IV – Decisão.
São termos em que se decide:

1) Dar agora como provado o facto seguinte:

 “O arguido, para ressarcimento parcial dos danos causados ao ofendido, em virtude dos factos relatados e tidos por provados nos autos, pagou-lhe, em 16 de Setembro de 2010, a quantia de € 2.500,00.”

2) Julgar improcedentes quer o pedido de nulidade, quer o recurso interposto pelo arguido.

3) Custas de ambos pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça devida em 5 UCs.

Notifique.


*
BRÍZIDA MARTINS (RELATOR)
ORLANDO GONÇALVES


[1] Cfr. artigos 412.º, n.º 1 e 403.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal.

[2] Cfr. Acórdão do STJ n.º 7/95, em interpretação obrigatória.

[3] Na posição a sufragar acompanharemos o expendido no aresto deste Tribunal, datado a 9 de Dezembro de 2009, pelo Ex.mo Relator Desembargador Dr. Alberto Mira, no recurso n.º 536/07.2 JACBR.C1.
[4] In Diário da República, I.ª Série-A, de 17 de Julho de 2002.
[5] Foi fixada jurisprudência no sentido de que essa omissão constituía irregularidade, sujeita ao regime estabelecido no artigo 123.º, pelo que, uma vez sanada, o tribunal já dela não podia conhecer.
[6] No sentido de que a imperceptibilidade do registo fonográfico constitui irregularidade dependente de arguição,
[7] No sentido em que nos manifestamos, vide Acórdãos da Relação do Porto de 29-10-2008, proc. n.º 0844934; e da Relação Coimbra de 02-06-2009, proc. 9/05.8TAAND.C1, e de 21-10-2009, proc. n.º 298/07.3TAPBL.C1, todos publicados em www.dgsi.pt.
[8] Cfr. Acórdãos da Relação de Coimbra de 02-06-2009, proc. 9/05.8TAAND.C1, e de 28-10-2009, proc. n.º 25/06.2GAFVN.C1. No mesmo sentido, vejam-se ainda os Acs. da Relação do Porto de 29-10-2008 e 01-04-2009 (procs. 0844934 e 531/07.1TAESP.P1), ambos publicados no sítio www.dgsi.pt.
[9] Neste último sentido, veja-se o Ac. da Relação de Coimbra de 21-10-2009, proc. 298/07.3TAPBL.C1, in www.dgsi.pt.

[10] In Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Janeiro/Março de 1994, pág. 121.
[11] Proferido no âmbito do recurso n.º 549/97-3.ª, e publicitado na CJ (STJ) 1997, tomo 3, pág. 222.
[12] – Cfr. acórdão do STJ de 13 de Janeiro de 1998, in processo n.º 877/97 - 3.ª, BMJ n.º 473, pág. 307.
[13] Cfr. acórdão do STJ, de 25 de Março de 1998, in processo n.º 53/98 - 3.ª, BMJ n.º 475, pág. 502,
[14] De 20-10-1999, processo n.º 1452/99-3.ª.
[15] Acórdãos do STJ: de 24 de Abril de 2006, in processo n.º 363/06; de 24 de Maio de 2006, in processo n.º 816/06; de 20 de Dezembro de 2006, in processo n.º 3379/06 - 3.ª; de 22 de Outubro de 1997, in processo n.º 612/97; de 12 de Março de 1998, in BMJ n.º 475, pág. 492; de 9 de Dezembro de 1998, in processo n.º 1165/98; de 13 de Janeiro de 1999, in BMJ n.º 483, pág. 49; e de 2 de Junho de 1999, in processo n.º 288/99.
[16] Constante na CJ (STJ) 1994, tomo 2, pág. 224 e no BMJ n.º 437, pág. 228.
[17] Acórdão de 18 de Dezembro de 97, in processo n.º 701/97-3.ª, Sumários Assessoria, pág. 220.
[18] Cfr., entre outros, os Acórdãos do STJ de 21 de Outubro de 2009, in processo n.º 360/08.5 GEPTM.S1, e de 9 de Junho de 2010, in processo n.º 449/09.3 JELSB.S1, ambos da 3.ª Secção.
[19] Cfr. Maia Gonçalves, in Código Penal Português anotado e Comentado – Legislação Complementar, Livraria Almedina, 16.ª edição, pág. 258.
[20] V. Figueiredo Dias, in Temas Básicos da Doutrina Penal (2001), págs. 104/111.
[21] In Revista Portuguesa de Ciência Criminal, “O modelo de prevenção na determinação da medida concreta da pena”, Ano 12, n.º 2 Abril/Junho de 2002, págs. 147/182.


[22] Cfr. Figueiredo Dias, ibidem, págs. 105/106.
[23] V. Claus Roxin, Culpabilidad Y Prevencion En Derecho Penal (tradução de Muñoz Conde – 1981), págs. 96/98.