Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
531/15.8T8GRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JOSÉ EDUARDO MARTINS
Descritores: ADMOESTAÇÃO
FASE ADMINISTRATIVA
FASE JUDICIAL DO PROCESSO CONTRAORDENACIONAL
Data do Acordão: 12/02/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GUARDA (SECÇÃO CRIMINAL DA INSTÂNCIA LOCAL DA GUARDA - J1)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ART. 51.º DO RGCO
Sumário: Pese embora a inserção sistemática do artigo 51.º, n.º 1, do RGCO - no Capítulo III, daquele compêndio legislativo, com a epígrafe “Da aplicação da coima pelas autoridades administrativas” -, o segmento textual “entidade competente”, integrado na redacção da referida norma, determina que a medida de admoestação possa/deva ser aplicada, não só na fase administrativa, mas também na fase judicial do processo contra-ordenacional.
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 5ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

I. Relatório

No âmbito do processo de contraordenação n.º 792/2014, do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, a arguida “A... , S.A.” foi condenada, por decisão da entidade administrativa de 22/12/2014, a pagar uma coima de € 6.250,00, pela prática da contra-ordenação p. e p. pelo artigo 24.º, n.º 1, al. j), e n.º 4, al. b), do D.L. n.º 95/2011, de 8 de agosto, assim como nas respectivas custas.  

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A arguida, notificada da decisão administrativa, impugnou-a judicialmente, a 4/3/2015, ao abrigo do disposto nos artigos 59.º e seguintes do DL n.º 433/82, de 27 de Outubro, defendendo o arquivamento dos autos, ou, se assim não fosse entendido, a aplicação da sanção de admoestação em substituição da coima aplicada, ou, ainda, a condenação a título de negligência.

O recurso foi admitido, a 17/4/2015, já no âmbito do Processo de Recurso (Contra-Ordenação) n.º 531/15.8T8GRD, da Comarca da Guarda, Guarda – Instância Local – Secção Criminal - JUIZ 1, tendo sido designada data para audiência de julgamento que veio a ter lugar, a 11/5/2015, com observância do formalismo legal.

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Na sequência, foi, a 25/5/2015, proferida Sentença, cujo teor é o seguinte:

I. RELATÓRIO

A sociedade “ A... , SA”, arguida nos presentes autos de contraordenação, não se conformando com a decisão de fls. 40 e ss, que lhe aplicou uma coima no valor de € 6.250,00, pela prática dos factos referidos na aludida decisão, que aqui se dá por integralmente reproduzida, imputando-lhe uma contraordenação, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 9º, nº.2, 24º, nº.1, alínea j), 24º, nº.4, alínea b) do Decreto-Lei n.º /2011, de 21 de Agosto, sancionável com coima de € 2.500,00 a € 25.000,00, veio da mesma interpor recurso de impugnação judicial para este Tribunal, alegando, em síntese, que:

- não aceita a infração imputada, por não corresponder á verdade, nem a conduta preencher o tipo legal em causa

- a arguida, refere que o lote nº.165/2013 – Perímetro Florestal da Serra da Estrela, previa o corte extraordinário de árvore (tombadas e inclinadas) sem sintomas do Nemátofo, previamente marcadas/sinalizadas pelos funcionários do ICNF, feito de modo aleatório

- que compreendia poucas árvores, as quais se encontravam muito afastadas uma das outras, ou seja não era um corte seguido e contínuo

- a arguida através de terceiros, precedeu ao abate das árvores marcadas e aos tratamento e remoção dos sobrantes que exclusivamente resultaram da sua exploração florestal

- embora nenhuma responsabilidade adviesse dos demais sobrantes existentes, que não eram da sua responsabilidade

- contudo, resulta que o lote estava bastante sujo, devido à existência de muitos pinheiros caídos, que não estavam marcados como fazendo parte do lote, pelo que esses não seriam sua obrigação, ter de retira os ramos, pernadas e outros desperdícios lá existente, resultando de queda natural de arvores e também de venda a retalho e que os respetivos compradores não retiraram

-haviam no local sobrantes provenientes de outras explorações anteriores, nomeadamente da venda a retalho e a particulares que não providenciaram pelo tratamento sobrante e, bem assim, muito material lenhoso em estado avançado de deterioração, como giestas, carqueja e arvores

- refere a arguida que cumpriu todas as suas obrigações, retirando todos os sobrantes da sua exploração florestal, compradas por esta.

Juntou documentos e arrolou testemunhas.

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O recurso foi admitido por despacho proferido a fls. 101 e ss dos autos.

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Foi designada data para a realização da audiência de discussão e julgamento.

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Após o despacho que designou data para a realização da audiência não ocorreu qualquer nulidade.

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Procedeu-se a julgamento em estrito cumprimento do formalismo legal, conforme se afere da respetiva ata.

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II – Pressupostos Processuais

O Tribunal é competente em razão do território, da matéria e da hierarquia.

O Ministério Público tem legitimidade processual e a recorrente é também parte legítima, encontrando-se devidamente representada.

O processo é o próprio e inexistem nulidades ou quaisquer questões prévias que obstem ao conhecimento da causa.

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III – Da audiência de julgamento resultaram provados os seguintes factos:

1. No dia 22 de Agosto de 2013 a arguida assinou contrato com o ICNF de compra do Lote nº.165/2013, do Perímetro Florestal da Serra da Estrela – Núcleo da Guarda, o qual tinha como data para o términus da Exploração pelo Contrato o dia 22 de Novembro de 2013.

2. Esse contrato previa a alineação do material lenhoso e ainda dos sobrantes provenientes da exploração florestal.

3. No final do contrato verificou-se que a arguida procedeu à retirada do material lenhoso, não tendo, contudo, procedido á eliminação dos respetivos sobrantes, deixando-os espalhados pelo lote.

4. Verificando-se que depois de ter sido efetuado o abate de pinheiros bravos, espécie considerada hospedeira do nemátodo do pinheiro, e mesmo após ter sido advertida pelo ICNF para proceder à eliminação dos sobrantes da exploração florestal, conforme é obrigação legal, a arguida não o fez.

5. Nos tempos mais recentes, não houve qualquer alineação de material lenhoso e os sobrantes que estão em causa são apenas os resultantes dos pinheiros bravos cortado pela arguida e que há data em que foram eliminados por funcionários do ICNF, ainda se encontravam verdes.

6. A arguida agiu de forma voluntária e intencional, pois que apesar de ter sido notificada por diversas vezes para o fazer, não procedeu à eliminação dos sobrantes da exploração florestal, na sequência do corte de pinheiros bravos.

7. Os sobrantes não retirados pela arguida constituem um foco potencial de dispersão da doença do nemátodo do pinheiro, podendo prejudicar seriamente todos os povoamentos florestais resinosos existentes na zona, representando também um perigo potencial de deflagração e propagação dos incêndios florestais.

8. A arguida exerce, entre outras, a atividade de exploração e comercialização de madeira, tendo nessa sequência celebrado com o ICNF um contrato de alienação lenhoso em 21.08.2013 referente ao lote nº.165/DDNF/2013 – Perímetro Florestal da Serra da Estrela, onde foram estipulados os prazos e condições de corte e extração de material objeto do mencionado lote.

9. A execução dos trabalhos de corte e extração do material lenhoso, bem como a remoção dos sobrantes decorrentes daquela exploração florestal, decorreram com total normalidade, sem verificação de qualquer incidente à data da execução dos mesmos, tendo estes sido realizados por um subempreiteiro contratado para o efeito pela Adjudicatária, e em conformidade com as exigências constantes do caderno de encargos.

10. Foi instaurado contra a arguida o processo de contraordenação em apreço, com base na matéria de infração nº-5853/2014/DCNF-C/DAAF, de 19.02.2014, emitida pelo INCF.

11. O Lote nº.165/2013 – Perímetro Florestal da Serra da Estrela, previa o corte extraordinário de arvores (tombadas e inclinadas) sem sintomas do Nemátodo, previamente marcadas/sinalizadas pelos funcionários do ICNF, feito de modo aleatório, que compreendia poucas arvores, as quais se encontravam muito afastadas umas das outras, ou seja, não era um corte seguido e continuo, o que por si só dificultava os trabalhos.

12. O procedimento verificado do corte daquelas árvores, apenas abrangia as árvores marcadas, não sendo deixado ao critério da adjudicatária a escolha das mesmas, bem como não compreendia todas as árvores “tombadas e inclinadas” existentes no lote.

13. Resulta do nº.3 da cláusula 1ª do Caderno de Encargos, sob a epígrafe na Objeto, “A alienação dos bens compreende ainda os sobrantes provenientes da exploração florestal, com exceção do cepo”.

14. Resulta ainda das Condições Especificas do Caderno de Encargos, na alínea a), do nº.4 da cláusula 17ª, sob a epigrafe, Obrigações de Adquirente, “O adquirente obriga-se a executar a gestão dos sobrantes da exploração florestal até ao limite do corte e de extração referidos no ANEXO I a este caderno de encargos e em especial: a) Lotes constituídos pro coníferas hospedeiras do Nemátodo da Madeira de Pinheiro (NMP) – eliminação de toda a área de corte, de acordo com o especificado do Decreto Lei nº.95/2011, de 8 de Agosto…”.

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IV – Factos não provados:

- Após a conclusão do referido lote, em 30.01.2014 foi a A... , notificada via fax, através do ofício com a refª2302/2014/DCNF-C/DAAF, invocando o incumprimento do contrato, pela não eliminação dos sobrantes de material lenhoso resultante da exploração florestal, conforme contratualmente estipulado.

- A arguida, através dos funcionários que contratou para o efeito, limitou-se a cortar as árvores previamente marcadas e procedeu ao tratamento e remoção dos sobrantes que exclusivamente resultaram da sua exploração florestal.

- Existiam no local sobrantes provenientes de outras explorações anteriores, provenientes da venda a retalho a particulares que não providenciaram pelo tratamento dos sobrantes e muito material lenhoso em estado avançado de deterioração, nomeadamente, giestas, carquejas e árvores podres sem qualquer valor comercial.

- O lote objeto de alienação (lote 165 – PF da Serra da Estrela) e dada a sua localização apresenta um declive bastante acentuado do terreno, é de difícil acesso, e situado numa zona bastante acidentada, com a presença de muitas pedras e muito mato com mais de três metros de altura, com um povoamento muito denso.

- a arguida apenas teve conhecimento dos factos na sequência da notificação recebida do ofício com a refª2302/2014/DCNF-C/DAAF, de 30.01.2014.

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O demais alegado é meramente conclusivo ou repetição do já expresso ou ainda matéria de direito.

De notar que, pese embora alguma expurgação levada a cabo, a factualidade vertida na decisão administrativa confunde por vezes meios de prova e diligências de investigação com a factualidade que efetivamente releva.

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V – Motivação da decisão de facto

Fundou o Tribunal a sua convicção quer no conjunto da prova testemunhal e declarações produzidas em julgamento, quer nos documentos juntos aos autos, conjugados com regras de experiência comum (cfr. art.º 127º do C.P.P.).

Assim, e no que respeita aos documentos juntos aos autos, foram relevantes o auto de notícia de fls. 32; relatório de conclusão do lote de fls.3; estimativa do custo de tratamento de fls.34; fotografias de fls.35 a 39; contrato de fls.61 e ss; fotografias de fls. 126 e 132;

No que, em concreto, à prova testemunhal respeita, relevou, desde logo o depoimento da testemunha B..., 55 anos, casado, engenheiro silvicultor do Ministério do Ambiente, nacional de Portugal, NIF - (...) , BI - (...) , (...) Guarda.

Revelou conhecer a arguida e o circunstancialismo que norteou a compra do lote por parte da mesma.

Efetivamente, de forma minuciosa e esclarecedora, referiu que a sociedade arguida comprou um lote (no sentido de ter adquirido madeira e não um prédio), na qual teria que proceder ao corte de material lenhosa – devidamente identificado no local – e de acordo com as regras do caderno de encargos que foi assinado entre aquela e o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas; segundo o referido contrato, a arguida comprou a madeira do lote (apenas aquela que se encontrava devidamente marcada), teria que proceder ao corte, à retira e à limpeza de todo o material que fosse sobrante.

Tal modus operandi, impõe-se, com vista à proteção das florestas, como forma de mitigar e controlar a doença que assolou parte das matas, propriamente, a doença do pinheiro (a chamada Nemátofo); assim, teriam que retirar todos os sobrantes e encaminha-los para biomassa ou destrui-los, nunca os deixando ficar no local (acaso contrário, permitiria a propagação a doença).

Porém, tal não aconteceu, uma vez que a arguida levou consigo a madeira de maior porte, mas deixou junto aos caminhos (corta-fogos) e espalhados pela mata o restante da madeira.

Referiu que para esses sobrantes existem dois procedimentos possíveis: ou recolha dos sobrantes e encaminhá-los para centros de biomassa, ou então são queimados no local, ou triturados em partículas pequenas, que destrói inclusive a doença.

Tal não aconteceu, no caso em concreto, o que motivou que fossem os próprios serviços da contratante que tiveram que levar a cabo esse trabalho, implicando um custos quer de horas gastas quer de mão-de-obra e que ascenderam a cerca de €3.750 – conforme se constata de orçamento de fls.34 dos autos.

Ademais, referiu que a arguida foi devidamente interpelada para o efeito, mas que por si nunca acabou o trabalho em causa.

Mais explicou que todas as matas obedecem a um plano de corte que é feito de 5 em 5 anos e que as mesmas se dividem em lotes, com vista à contratação desse trabalho.

Assentiu que viu os sobrantes deixados pela arguida porque eram verdes e recentes e que os mesmos não diziam respeito a cortes anteriores porquanto se assim fosse já estariam velhos e podres, não perigando.

Ademais foram ouvidos e tidos em conta os depoimentos das testemunhas apresentadas pela arguida, C..., desempregado, casado, data de nascimento 10/08/1951, residente na Rua (...) Verdelho, sendo marido da gerente da arguida e D..., casado, data de nascimento 18/11/1973, operador e manobrador de máquinas, residente na Rua (...) Verdelhos, que aos costumes disse trabalhar para a recorrente/arguida.

A primeira das testemunhas referiu aos costumes ter sido madeireiro e atualmente marido da gerente da empresa subempreitada pela arguida. Não trabalha, mas tem por hábito, deslocar-se aos locais onde os funcionários da empresa da sua mulher trabalham.

Diz conhecer o local (lote) a que respeitam os autos, contudo, referiu que não entrou no mesmo, não sabendo, assim, os pormenores dos factos que são imputados à arguida.

Mostrou saber que atualmente a lei foi alterada, devida a uma doença que assolou as florestas e como forma de a proteger. Assim, sabe que meia volta a empresa contratante, no âmbito da legislação em vigor, contrata empresas especializadas para levar a cabo, determinados trabalhos nas florestas. Sabe, relativamente ao caso em concreto, que a empresa da sua mulher foi contratada pela empresa arguida para levar a cabo o corte de pinheiros num lote adquirido por esta (em Videmonte). O corte seria impetrado em árvores já marcadas e teriam que limpar os sobrantes. Não sabe que madeira foi retirada daquele lote. Refere que quem ali estava a trabalhar era o seu genro e um funcionário.

Referiu que o trabalho ficou bem feito, apenas tendo lá ficado lenha morta, aliás, tendo referido ter ido lá recentemente e não ter visto nada (o que outra coisa não seria de esperar, considerando que a anterior testemunha referiu, que tudo se encontra limpo, atualmente).

Questionada a testemunha, não soube dizer quando começaram os trabalhos no lote, nem quando finalizaram.

De todo o modo, lembra-se de ter visto os funcionários da empresa da sua mulher queimaram alguns dos sobrantes e até os espalharam junto aos caminhos.

Do depoimento da testemunha em crise, não resultou com a certeza absoluta que se impunha, que efetivamente a tese trazida pela recorrente aos autos, concretamente, limpeza dos sobrantes, após terem sido feitos os cortes, por parte da arguida, ocorreram; apenas resulta que a testemunha se deslocava ao local (ou perto do local) apenas a passear e a passar o seu tempo, resultando que não acompanhou diariamente os trabalhos em causa.

Também D... , conhece a A... , porque a empresa para quem trabalha foi contratada por aquela.

Diz que no âmbito de uma subempreitada teve acesso ao local a que se reporta os autos e procedeu ao corte de várias árvores (pinheiro) que se encontravam devidamente marcadas no local e de acordo com o contratado (embora não soubesse o teor das clausulas do contrato).

Referiu como forma de se justificar, que a acompanhá-los, andou sempre um senhor, funcionário do organismo público, que nunca lhes disse que que a limpeza estava mal feita.

Mais referiu que não tinha qualquer conhecimento de legislação, em vigor, que obrigasse à destruição ou remoção (tratamento) dos sobrantes em causa.

Diz que não andou qualquer funcionário da A... consigo, nos dias que ali andaram.

Foi confrontado com o teor das fotografias de fls.35 a 39, tendo confirmado o local.

Ademais, foi ouvido como testemunha E... , também ele funcionário da empresa subcontratada (a da D. F... ), referindo conhecer o local, porque ali andou a trabalhar.

Relatou que andou a cortar pinheiros (devidamente marcados), nos meses de Outubro/ Novembro, era Inverno e que terá sido há cerca de 2/3 anos.

Mais referiu que parte dos restos foram queimados no local e outros levaram consigo (os mais grossos) e foram depositados num Largo, na zona de Medronhais.

Também por esta testemunha foi referido que o local sujeito a intervenção era de mata vasto, de difícil acesso, e que os troncos foram retirados com um guincho.

Mais referiu que ninguém ali andava a acompanhar os trabalhos, da parte de quem fosse.

O depoimento destas últimas testemunhas, revelaram algumas fragilidades e incoerências demonstradas. Desde logo, quiseram fazer crer ao Tribunal – o que não lograram, que tudo foi feito dentro da lei, quando na verdade não sabiam da legislação em vigor, que obriga a que os sobrantes dos pinheiros sejam destruídos, para impossibilitar a propagação da doença. Note-se mesmo que esta ultima referiu que parte dos sobrantes até estão armazenados – nesta data – num largo da freguesia onde mora (demonstrando uma total falta de consciência do perigo que dali emana).

A produção destes últimos testemunhos, não abalou de qualquer forma a credibilidade que foi atribuída à primeira das testemunhas ouvidas, essa sim, que de forma circunstanciada, objetiva e clara, conhecedora da realidade dos factos, esclareceu e convenceu o Tribunal, sobre a sua versão dos factos, permitindo dar como provados os factos supra.

Perante todo este acervo probatório não restaram dúvidas ao Tribunal de que tudo se passou nos termos acima dados como provados, inexistindo qualquer prova no sentido de que a sociedade arguida não tivesse conhecimento daquilo que efetivamente autorizou.

Relativamente aos factos de índole subjetiva, perante o cotejo da prova acima elencado e analisado, não tem este Tribunal dúvidas de que as circunstâncias conhecidas e provadas permitem e impõem, mediante um raciocínio lógico, pelo método indutivo, concluir de forma firme, segura e sólida, no que concerne à prova dos factos de índole subjetiva, que os mesmos se passaram nos termos acima vertidos, sendo que tal é a necessária conclusão a retirar dos factos de índole objetiva comprovados in casu.

Com efeito, no que concerne aos factos atinentes à intenção e motivação dos arguidos, convém recordar a lição de Cavaleiro Ferreira (Curso de Processo Penal, vol. L 1981, pág. 292), quando refere que existem elementos do crime que, no caso da falta de confissão, só são suscetíveis de prova indireta como são todos os elementos de estrutura psicológica, aos quais apenas se poderá aceder através de prova indireta (presunções naturais não jurídicas), a extrair de factos materiais comuns e objetivos dados como provados, o que sucedeu in casu (cfr., a propósito, Malatesta “A Lógica das provas em matéria Criminal”, pág. 172 e ss.).

Quanto aos demais factos dados como não provados os mesmos resultaram da inexistência de qualquer meio probatório no seu sentido.

Nestes elementos assentou a convicção do Tribunal.

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VI- Enquadramento jurídico

A sociedade arguida vem acusada da prática de uma contraordenação p. e p. artigos 9º, nº.2, 24º, nº.1, alínea j), 24º, nº.4, alínea b) do Decreto-Lei n° 95/2011, de 21 de Agosto, sancionável com coima de € 2.500,00 a € 25.000,00.

O Decreto –lei nº.95/2011, de 21 de Agosto, tem por objeto a tomada de medidas extraordinárias de proteção fitossanitária indispensáveis ao controlo do nemátodo-da-madeira-do-pinheiro e do seu inseto vetor, com vista a evitar a dispersão da doença da murchidão do pinheiro e, quando possível, a sua erradicação, procedendo à implementação das medidas de proteção fitossanitária previstas na Decisão de Execução 2012/535/UE, da Comissão, de 26 de setembro de 2012. Estabelece, ainda, os termos da aplicação das medidas aprovadas pela Norma Internacional para as Medidas Fitossanitárias n.º 15 da FAO (Norma ISPM n.º 15), relativas a material de embalagem de madeira, as medidas fitossanitárias relativas a madeira de coníferas e as exigências relativas ao fabrico, tratamento e marcação do material de embalagem e ao tratamento da madeira, bem como o regime aplicável à sua circulação e expedição.

O Nemátodo da Madeira do Pinheiro (NMP), agente causal da doença da murchidão dos pinheiros, considerado um dos organismos com maior potencial destrutivo para a floresta de coníferas, particularmente para as do género Pinus sp foi detetado em Portugal, e pela primeira vez na Europa, em 1999. Trata-se de um organismo originário da América do Norte que atualmente se encontra no Japão, China, Coreia do Sul, Taiwan e Portugal, tendo sido recentemente detectado em Espanha, sendo claro a nível internacional, que a atividade humana é o fator mais importante para a sua dispersão, por via da circulação de material lenhoso infetado, razão pela qual é responsável por fortes limitações ao comércio internacional de madeira e classificado como organismo prejudicial para a União Europeia. Encontram-se, assim, definidas um conjunto de medidas e ações que, por imperativos fitossanitários mas também legais, decorrentes de várias decisões comunitárias e igualmente estabelecidas no Decreto-Lei n.º 95/2011, de 8 de Agosto, retificado pela Declaração de Retificação n.º 30- A/2011, de 7 de Outubro, têm que ser obrigatoriamente aplicadas no controlo do Nemátodo da Madeira do Pinheiro (NMP) e do seu inseto-vetor, com vista a evitar a dispersão da doença da murchidão do pinheiro e, quando possível, permitir a sua erradicação. É neste contexto que têm assim vindo a ser realizadas ações de controlo do NMP, cuja estratégia de atuação se centra essencialmente na realização de ações de prospeção, identificação e eliminação de árvores que apresentem sintomas de declínio, não só em áreas onde este se encontra presente, mas também noutras áreas como sejam as freguesias classificadas como Zona Tampão (20 km ao longo da fronteira com Espanha), com o objetivo de evitar a dispersão do NMP para esta região do país e bem assim para os restantes Estados-Membros. Para além destas acções, especial enfoque é igualmente dado ao controlo oficial e rastreabilidade do material lenhoso, um dos aspetos fundamentais para garantir o cumprimento das normas e exigências fitossanitárias e deste modo a minimização dos riscos associados ao transporte do material lenhoso. Do Decreto-Lei n.º 95/2011, de 8 de Agosto, retificado pela Declaração de Retificação n.º 30-A/2011, de 7 de Outubro, destacam-se os seguintes aspetos:

− A instituição da obrigatoriedade de inscrição em registo oficial de todos os operadores económicos envolvidos na exploração florestal de coníferas, bem como dos operadores económicos que procedam ao fabrico, tratamento e marcação de material de embalagem de madeira e ao tratamento de madeira de coníferas;

− A criação de um formulário eletrónico de manifestação de exploração florestal, instrumento indispensável para a rastreabilidade da madeira nas diversas etapas da cadeia económica – Manifesto de Exploração Florestal de Coníferas Hospedeiras do NMP − A introdução de um regime sancionatório que visa assegurar o cumprimento das regras constantes do Decreto-Lei e dissuadir a prática de eventuais infracções, também assim se reforçando a promoção de uma gestão activa e bem assim a credibilidade do sistema de tratamento e de controlo nacional;

− O estabelecimento de exigências específicas relativas ao abate, circulação e armazenamento de árvores e respetivos sobrantes (art.os 7.º a 11.º);

− A definição da Zona Tampão (ZT), que se pode definir como todas as freguesias localizadas nos 20 km ao longo da fronteira terrestre com Espanha;

− O estabelecimento de regras específicas sobre o tratamento de madeira e material de embalagem de madeira, bem como de restrições à sua circulação, comercialização, expedição e exportação. O Manifesto de exploração florestal de coníferas hospedeiras do nemátodo da madeira do pinheiro é, assim, um documento para Controlo Oficial, de preenchimento obrigatório em plataforma eletrónica, disponível no sítio da internet da AFN, conforme o disposto no decreto-lei acima mencionado e que permite garantir a rastreabilidade do material lenhoso através de um registo em tempo real das ações previstas, possibilitando a correta execução das acções de exploração florestal e bem assim uma maior eficácia nas ações de inspeção e fiscalização. Este procedimento, para além de permitir uma validação das medidas aplicáveis à exploração de árvores hospedeiras na ZR, impostas pelo Decreto-lei e assim garantir que o operador económico está a agir em conformidade com a legislação em vigor, tem a importante vantagem de permitir a obtenção de um documento oficial sem necessidade de se deslocar a um balcão da AFN. Este documento, depois de impresso e devidamente assinado, tem que acompanhar o transporte da madeira até ao destino final, sendo que as unidades industriais só poderão receber madeira se acompanhado de cópia do manifesto.

Ora, do cotejo de todo o diploma em causa, por reporte à factualidade apurada, verifica-se, conforme referido naquela decisão, que a arguida não levou a cabo, como lhe era exigido, no final do contrato (a que aludem os autos), a eliminação dos respetivos sobrantes, deixando-os espalhados pelo lote (ponto 3 dos factos provados).

Este circunstancialismo é claramente violador das normas e legislação invocada e impõe a condenação desta pela contraordenação em causa.

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VII - Da medida concreta da coima

Na decorrência do supra exposto, o presente recurso cingir-se-á, de ora em diante, à apreciação da medida da coima aplicada, porquanto se entende que tal pedido está abrangido no pedido de absolvição formulado.

Ora, como referimos, estabelece o supra referido art.º 24.°, n.º 4, uma coima a fixar de €2.500,00 a € 25.000,00.

Sucede que, conforme se prescreve no n.º4 do art.º 17º do RGCO “Em qualquer caso, se a lei, relativamente ao montante máximo, não distinguir o comportamento doloso do negligente, este só pode ser sancionado até metade daquele montante”.

Dispõe o artigo 18º, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro que a determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contraordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que se retirou da prática da contraordenação.

Apreciando tais fatores, deve considerar-se que:

-a contraordenação tem uma ilicitude que se pode reputar como normal;

-a negligência manifestada;

-a inexistência de antecedentes contraordenacionais;

Não se justifica, pois, assim, perante tal factualidade, a fixação de uma coima muito acima do limite mínimo legal acima previsto, pelo que se mostra suficiente e proporcional a aplicação à arguida de uma coima que se apura em € 2600,00.

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- Da Admoestação

No caso concreto, entende-se não estarem verificados os pressupostos para que à arguida, apenas resultasse uma admoestação.

Assim:

O art. 51º do RGCO prevê a aplicação pela entidade competente de uma admoestação ao arguido, em caso de reduzida gravidade da infração e da culpa do agente, a qual deverá ser proferida por escrito.

A admoestação, consiste numa solene censura feita ao agente, por escrito (artigo 51º, nº 2 do Decreto-Lei nº 433/82).

O artigo 51º do Decreto-Lei 433/82, de 27 de Outubro, prescreve “Quando a reduzida gravidade da infração e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação”.

Parece, no entanto, que a admoestação aí prevista tem apenas aplicação em sede administrativa, atento o seu regime.

Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa referem, a este propósito, que «...a admoestação escrita prevista neste art. 51.° é aplicável apenas na fase administrativa do processo contraordenacional, como resulta do seu enquadramento neste diploma. Por isso, se a admoestação relativa à contraordenação for decidida pelo tribunal, nos casos em que é este a decidir a condenação, será aplicável a admoestação oral, prevista naquele art. 60.º, n.º 4, do Código Penal, aplicável por força do preceituado no art. 32.° do R.G.C.O.» - “in” Contraordenações, Anotações ao Regime Geral, 2ª edição, 2002, Visilis Editores, pág. 317.

Ora, concordando com este entendimento, há que averiguar se estão reunidos os pressupostos de a que alude o art.º 60º do diploma citado. Nunca olvidando que conforme resulta do mecanismo legal ínsito naquele preceito, que primeiro se deve aplicar uma pena de multa (no caso em concreto de uma coima) e em substituição (na eventualidade dos requisitos estarem reunidos) dessa pena de multa, uma pena de admoestação.

Assim, nos termos do art.º 60º do Código Penal são os seguintes os pressupostos (a verificar no momento da decisão) de que a lei faz depender a possibilidade (e obrigatoriedade) da aplicação ao arguido da pena de admoestação:

- um pressuposto formal, ou seja, que a pena concreta aplicada seja de multa não superior a 240 dias;

- que haja reparação do dano;

- que decorrente de um favorável juízo de prognose, com a admoestação seja razoável concluir pela realização bastante das finalidades punitivas.

-inexistência, em princípio, de anterior condenação em qualquer pena.

Veja-se, nesse sentido, que os requisitos são cumulativos e que se exige que inexista anterior condenação em qualquer pena.

Ora, da análise dos pressupostos em causa, conjugado com a factualidade dada como provada, desde logo, é pacífico afirmar-se que não estão preenchidos os requisitos da aplicação da admoestação.

A infração em causa não é de gravidade reduzida, atento os interesses que estão em causa com a salvaguarda do património florestal.

Improcedendo, assim, a possibilidade de aplicação.

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VIII - DECISÃO

Nestes termos o Tribunal decide julgar parcialmente procedente o recurso interposto e, em consequência, alterar a decisão administrativa que condenou a arguida “ A... , SA”, pela prática de uma contraordenação, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 9º, nº.2, 24º, nº.1, alínea j), 24º, nº.4, alínea b) do Decreto-Lei n.º 95/2011, de 21 de Agosto, aplicando-lhe uma coima de € 2.600,00 (dois mil e seiscentos euros).

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Condena a arguida nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC´s, cfr. art.º 93º, nº 3, do D.L. 433/82, de 27/10 e tabela III do RCP.

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Notifique, sendo a arguida também para os termos do art.º 88º, nº 1, do mesmo diploma legal.

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Lida, vai a presente sentença ser depositada na secretaria deste Tribunal – cfr. artigos 372º, nº 5 e 373º nº 2 do C.P.P. ex vi art.º 41º do R.G.C.O.C..

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Comunique-se a decisão à autoridade administrativa, atento o disposto no artigo 70º, n.º 4 do Decreto-lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.”

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Inconformada com a decisão judicial, dela recorreu a arguida, a 5/6/2015, ao abrigo dos artigos 73.º e seguintes do RGCO, defendendo a sua revogação e substituição por outra que substitua a coima aplicada pela sanção de admoestação, a ser proferida por escrito ou, caso assim não seja entendido, por outra que condene a arguida, a título de negligência, com a consequente redução do montante da coima a metade, extraindo da Motivação as seguintes Conclusões:

A. (…).

            B. Impossibilitando a mesma de beneficiar de uma sanção de simples Admoestação e/ou da atenuação especial da coima a título de negligência, prevista nos termos do n.º 6 do artigo 24.º do mesmo diploma legal (DL 95/2011, de 11 de agosto), como requerido.

            C. A arguida não pode conformar-se com tal decisão, uma vez que entende que não resulta suficientemente provado que a mesma tenha agido de forma intencional e dolosa como lhe pretendem imputar, bem como considera como reduzida a gravidade da infração, não obstante esteja em causa a salvaguarda do património floresta.

            D. a V. (…).

            W. Dispõe o artigo 51.º do Regime Geral das Contraordenações, no seu n.º 1, que “quando a reduzida gravidade da infração e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação.

            X. Ora, a arguida não agiu de forma consciente nem com intenção de causar qualquer prejuízo a outrem nem mesmo com interesse em retirar qualquer benefício económico.

            Y. Perante os factos provados, consideramos estar perante uma infração de reduzida gravidade em termos práticos e é isso que deve ser determinante.

            Z. Ademais, a arguida não apresenta qualquer condenação anterior, sendo certo que não está, de igual modo, quantificado qualquer benefício económico, pelo que entendemos ser adequada à situação descrita, em vez da coima, uma admoestação, por proporcional e adequada e justa em função das circunstâncias em que ocorreram os factos.

            AA. (…).

            BB: Assim sendo, e perante a ausência de dolo e a manifesta negligência, não deveria ser a ora arguida punida no âmbito do n.º 4, b), do artigo 24.º, do DL n.º 95/2011, de 8 de agosto, porquanto não se encontram preenchidos todos os requisitos para a sua aplicação; quanto muito e no limite apenas a título de negligência, p. e p. pelo n.º 6, do artigo 24.º, do mesmo diploma legal.

            CC. Devendo a pena ser aplicada pelo limite mínimo previsto na lei, reduzindo-se para metade o montante da coima prevista, o que, desde já, se requer.    

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            O recurso, a 12/6/2015, foi admitido.

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Na sequência, a 2/7/2015, O Ministério Público respondeu ao recurso, defendendo, em resumo, nada ter a opor a que a arguida seja condenada em admoestação ou, caso assim se não entenda, a que a coima seja reduzida para metade, considerando-se ter incorrido a recorrente em conduta negligente.

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            Nesta Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, a 30/9/2015, emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso, “(…) uma vez que a pretensão formulada pela recorrente, de aplicação de uma admoestação por escrito não tem apoio legal na fase processual de impugnação judicial, (…).

            Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, a recorrente, a 20/10/2015, exerceu o direito de resposta, tendo mantido o alegado anteriormente

Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, teve lugar conferência, cumprindo apreciar e decidir.

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II. Apreciação do Recurso:

Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 119.º, n.º 1, 123.º, n.º 2, 410.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CPP, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242 e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).

Além disso, há que dizer que, em sede de contra-ordenações, o recurso é restrito à matéria de direito, visto o disposto nos artigos 75.º, n.º 1 e 41.º, n.º 1, ambos do DL n.º 433/82, de 27 de Outubro, sucessivamente alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 356/89, de 17 de Outubro, e 244/95, de 14 de Setembro, e pela Lei n.º 109/2001, de 24 de Dezembro - RGCOC, salvo verificação de qualquer dos vícios previstos no n.º 2, do artigo 410.º, do CPP - note-se que só o processamento e julgamento conjunto de crimes e contra-ordenações, previsto no artigo 78.º, do RGCOC, permite o conhecimento pela 2.ª instância, em sede de recurso, da matéria de facto.

É a seguinte a questão a decidir:

- Saber se a arguida deve ser condenada em simples Admoestação e/ou beneficiar da atenuação especial da coima.

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Dispõe o artigo 51.º, n.º 1, do RGCO, que, “Quando a reduzida gravidade da infração e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação”.

Tem sido entendido que, pese embora a inserção sistemática do preceito em causa no Capítulo III, do RGCO - “Da aplicação da coima pelas autoridades administrativas”, é de entender que a referência a “entidade competente”, usada na redação do referido normativo, leva a que a admoestação possa ser aplicada, quer na fase administrativa, quer na fase judicial, ou seja, na fase de recurso judicial da decisão administrativa.

A norma citada, salvo o devido respeito, é uma norma específica do processo contraordenacional, pelo que não há que recorrer ao disposto no artigo 60.º, do Código Penal, enquanto direito subsidiário.

A gravidade da contraordenação depende do bem ou interesse jurídico que a mesma visa tutelar e, ainda, do eventual benefício retirado pelo agente da prática daquela e do resultado ou prejuízo causado.

Além disso, a gravidade da contraordenação pode, também, depender ou aferir-se a partir diretamente da lei. É o caso, por exemplo, das contraordenações estradais em que o legislador as qualifica, em função da sua gravidade, como simples, graves e muito graves.

Pois bem, quanto à contraordenação ora em causa, o Decreto-Lei n.º 95/2011, de 21 de agosto não a qualifica pelo que há que analisar, no caso concreto, qual a sua gravidade.

Pois bem, não colocamos em causa que, no domínio da salvaguarda do património florestal, as contraordenações assumem, à partida, gravidade, uma vez que está em causa a preservação do ambiente.

No entanto, salvo o devido respeito, a gravidade de cada situação deve ser aferida em função, não só do modo de execução e da natureza dos deveres violados, mas também, e muito, das suas consequências.

Acontece que não decorre dos presentes autos, por força da infração detetada, que tenha acontecido qualquer dano efetivo, sendo certo que a decisão ora em crise reconhece que o respetivo grau de ilicitude deve ser reputado como normal, o que afasta uma dimensão acrescida daquela.

Mais, a execução dos trabalhos de corte e extração de material lenhoso, bem como a remoção dos sobrantes da exploração florestal em causa, decorreram com total normalidade, sem verificação de qualquer incidente à data de execução dos mesmos, pelo que nada existe que possa levar a pensar ser elevada a culpa do agente, sendo certo, também, que a arguida não apresenta qualquer condenação anterior.

Acresce que não está quantificado, na decisão judicial ora em crise, qualquer benefício económico por parte da recorrente e não foi apurada a sua situação económica.

Por conseguinte, consideramos que a infração agora em análise se reveste de reduzida gravidade, motivo pelo qual se encontram preenchidos os pressupostos para que seja aplicada a admoestação.

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IV. Decisão:

Desta sorte, acordam os Juízes da 5ª Secção deste Tribunal da Relação de Coimbra em conceder provimento ao recurso, indo, por consequência, condenada a arguida, pela prática da contraordenação referida nos autos, na sanção de admoestação, a ser proferida por escrito.

Sem tributação.

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(Texto processado e integralmente revisto pelo signatário – artigo 94.º,n.º 2, do CPP.)
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Coimbra, 2 de dezembro de 2015

(José Eduardo Martins

(Maria José Nogueira)