Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
124/11.9PTLRA-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALICE SANTOS
Descritores: CONVERSÃO DA MULTA EM PRISÃO
DESPACHO
NOTIFICAÇÃO
Data do Acordão: 03/19/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 3º JUÍZO CRIMINAL DO TRIBUNAL JUDICIAL DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 49º Nº 1, 113º Nº 1 A) E C) E 214º Nº 1 E) CPP
Sumário: A notificação ao arguido do despacho que converteu a pena de multa em prisão subsidiária deve ser efetuada por contacto pessoal.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra


                                                                                                                                                                                                           O Mº Pº, não se conformando com o despacho que considerou o arguido regularmente notificado do despacho que converteu a multa aplicada ao arguido em prisão subsidiária, vem dele interpor recurso para este tribunal, sendo que na respectiva motivação formulou as seguintes conclusões:
1- O arguido A... foi condenado, por sentença transitada em julgado em 1-1-2012, na pena de 120 dias de multa.
2- Não pagou voluntariamente a multa nem requereu a sua substituição por dias de trabalho e não foram localizados bens penhoráveis que permitissem a execução patrimonial da pena.
3- O Tribunal, por despacho de 2-4-2013, determinou, nos termos do art. 49° n° 1 do C.Penal, a conversão da multa por 80 dias de prisão subsidiária.
            4- O arguido foi notificado através de carta simples com prova de depósito para a morada constante do TIR, prestado em 22-11-2011, na qual, aliás, conforme informações juntas aos autos, já não reside.
            5- O Tribunal considerou o arguido regularmente notificado e determinou a emissão e entrega de mandados de detenção para cumprimento da prisão subsidiária.
            6- A medida de coacção, termo de identidade e residência, que permitia a notificação do arguido por meio de carta postal simples e a que o arguido se encontrava sujeito, extinguiu-se com o trânsito em julgado da sentença condenatória (11-1-2012), de acordo com o disposto no art. 214° nº1 al. e) do C.P.Penal na redacção do D.L. 78/87
de 17-2.
7- Consequentemente, o arguido já não podia ser notificado do aludido despacho através daquele meio postal que, de acordo como disposto no art. 113° no 1 c) do C.P.Penal só pode ser utilizado “nos casos expressamente previstos”.
            8- O despacho que converte a pena de muita em prisão subsidiária altera a natureza da pena aplicada, que passa a ser detentiva, o que impõe que a notificação de tal despacho ao arguido lhe deva ser feita pessoalmente, conforme entendimento majoritário da jurisprudência.

9- O Tribunal a quo violou o disposto nos arts. 113° n° 1 al. a) e c) e 214° nº 1 al. e) na redacção do D.L. 78/87 de 17-2 todos do C.P.Penal.
            Nestes termos e nos mais que Vossas Excelências suprirão, deve ser dado provimento ao recurso e, consequentemente, revogado o despacho recorrido

O recurso foi admitido para subir imediatamente, em separado, com efeito suspensivo.

Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se manifesta no sentido da procedência do recurso.

Respondeu o arguido pugnando pela procedência do arguido.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

            O arguido, A..., foi condenado pela prática de um crime de condução sem carta, p. e p. pelo artº 3º, nº 1 e 2 do DL nº 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de multa de 120 dias, à taxa diária de € 5, num total de € 600.
            Não pagou voluntariamente a multa, nem requereu a sua substituição por dias de trabalho e não foram localizados bens penhoráveis que permitissem a execução patrimonial da pena.
            O tribunal, por despacho de 2/04/2013, determinou, nos termos do artº 49º, nº 1 do Cod. Penal, a conversão da multa por 80 dias de prisão subsidiária.
            O arguido foi notificado através de carta simples com prova de depósito para a morada constante do TIR, prestado em 22-11-2011.
            De acordo com as informações constantes dos autos o arguido já não reside na morada indicada no TIR.
            O Tribunal considerou o arguido regularmente notificado e determinou a emissão e entrega de mandados de detenção para cumprimento da prisão subsidiária.

            O Termo de Identidade e Residência é uma verdadeira medida de coacção. E como tal, perde a sua eficácia após o trânsito em julgado da condenação – art 214 nº 1 al e) do CPP (isto na redacção do DL nº 78/87 de 17/02).
            Como refere Germano Marques da Silva, as medidas de coacção extinguem-se de imediato nos casos previstos no artº 214º. nº 1 e 2.      Neste sentido já se pronunciou o Tribunal Constitucional, no acórdão nº 422/2005, no qual refere que “a partir do trânsito em julgado, é juridicamente insustentável que o condenado seja considerado como continuando a estar sujeito à medida de coacção de prestação de termo de identidade e residência”.
            Assim sendo, no caso vertente e uma vez que a decisão proferida já transitou em julgado, a medida de coacção de termo de identidade e residência já se extinguiu. Portanto, o arguido a partir do trânsito deixou de estar juridicamente sujeito às obrigações decorrentes da aplicação dessa medida de coacção, não tendo qualquer obrigação de comunicar nos autos a sua nova morada.
Assim sendo as notificações posteriores ao momento da cessação da eficácia do termo de identidade e residência deveriam ser realizadas através de via postal registada e se tal não for possível por notificação pessoal.
            O facto até de se notificar o defensor do arguido não equivale a que este seja considerado notificado através do seu defensor.
            Na verdade, está aqui em causa um valor superior e que respeita à liberdade do arguido devendo por isso, dar-se oportunidade ao mesmo de vir aos autos justificar as razões que o levaram a não cumprir com o ordenado.
            A notificação prevista no art 113º nº 1 al a) e c) do CPP e sendo o paradeiro do arguido desconhecido e uma vez que tal norma contende com a sua situação pessoal e põe em causa a sua liberdade deve ser efectuada por contacto pessoal.

Nestes termos e pelos fundamentos expostos acordam os juizes do Tribunal da Relação de Coimbra em julgar procedente o recurso e, em consequência revogar o despacho recorrido, o qual deverá ser substituído por outro que proceda às diligências necessárias no sentido de averiguar o paradeiro do arguido ou que proceda à sua notificação pessoal.

Sem custas.                          

                                   Alice Santos (Relatora)

                                   Belmiro Andrade