Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1339/11.5TBTMR.A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARVALHO MARTINS
Descritores: ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES
FUNDO DE GARANTIA
Data do Acordão: 11/05/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TOMAR 1º J
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: LEI Nº 75/98 DE 19/11, DL Nº 164/99 DE 11/5, ART. 181, 189 OTM
Sumário: 1. A medida da prestação alimentar determina-se pelo binómio: possibilidades do devedor e necessidade do credor, devendo aquelas possibilidades e outras necessidades serem actuais. Na fixação dos alimentos há que ter em conta em cada caso concreto, não só as necessidades primárias do alimentado, mas também as exigências decorrentes do nível de vida e posição social correspondentes à sua situação familiar.

2. A falta de possibilidades, perfila uma excepção, cuja prova incumbe ao devedor de alimentos.

3. O Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores (FGADM) assegura o pagamento das prestações de alimentos, em substituição do pai/mãe faltoso(a), no caso de incumprimento desta obrigação, assim configurada como condição procedimental, porventura excessivamente restritiva, mas com tal estipulado alcance.

4. A prestação de alimentos a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores em caso de incumprimento, pelo progenitor, da obrigação previamente fixada judicialmente, não pode ser estabelecida em montante superior a esta.

Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:



I - A Causa:


Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, interveniente acidental nos autos à margem referenciados, na qualidade de Gestor do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores (FGADM), notificado do despacho de fls. de 27 de Maio de 2013 e com o mesmo não se conformando, veio dele interpor recurso de apelação com efeito suspensivo para o Tribunal da Relação de Coimbra, nos termos e para os efeitos dos artigos 691º, n° 2 alínea d) e 692° n° 3 alínea e), ambos do CPC, alegando e concluindo que

1.
Vem o presente recurso interposto do douto despacho supra referenciado que decide pela manutenção da prestação de alimentos a assegurar pelo FGADM nos autos em apreço, que salvo o devido respeito, não pode o ora recorrente concordar com a douta decisão recorrida.
2.
O FGADM considera que não se encontra preenchido o pressuposto legal essencial e exigido subjacente à atribuição da prestação de alimentos impossibilidade coerciva do devedor
3.
Com efeito, nos termos do preceituado no art.1.° da Lei n.° 75/98, de 19 de Novembro e no art. 3.° do DL n.° 164/99 de 11 de Maio (com a redacção introduzida, respectivamente, pela Lei n.° 66-B/2012 de 31 de Dezembro e pela Lei nº 64/2012 de 20 de Dezembro), os pressupostos para que o FGADM seja chamado a assegurar as prestações de alimentos atribuídas a menores residentes no território nacional são os seguintes:
- Que o progenitor esteja judicialmente obrigado a alimentos;
- A impossibilidade de cobrança das prestações em divida nos termos do art. 189° da OTM;
- Que o alimentado não tenha rendimento ilíquido superior ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS), nem beneficie de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, superiores ao valor do IAS;
4.
No que à situação em causa releva, não consta do douto despacho recorrido a verificação de um dos requisitos cumulativos que a Lei n.° 75/98 de 19 de Novembro (com a redacção introduzida pela Lei n.° 66-B/20]2 de 31 de Dezembro) em conjugação com o DL 164199 de 13 de Maio (com a redacção introduzida, pela Lei n.° 64/2012 de 20 de Dezembro), exige para que as prestações de alimentos possam ser atribuídas nos termos que preconiza.
5.
Quanto à impossibilidade coerciva do progenitor obrigado à prestação, prevista nos termos e para os efeitos do art. 189° OTM, nada é mencionado.
6.
A verdade é que, acentua a douta decisão que cite-se “nos autos a fls. 57, já consta uma decisão de incumprírnento que condenou o requerido e progenitor da menor B (…), nascida em 0.10.2008, chamado por sua vez de P (…) a pagar a título de alimentos a quantia em atraso de 125 € (até ao mês de Março de 2012), porque se, provou o não pagamento por este o valor devido a titulo de alimentos à sua filha”.
7.                  .
Contudo o simples facto daquele reconhecimento da existência do incumprimento não determina que exista uma impossibilidade coerciva, delimitando-se apenas o incumprimento do devedor nada mais.
8.
O simples facto de ser declarado o incumprimento do devedor, do mesmo não advém inequivocamente a impossibilidade coerciva.
9.
A verdade é que o incumprimento da prestação por si só não é suficiente para que o FGADM assuma a prestação em regime de sub-rogação.
10. Exige a Lei, e bem, que do incumprimento seja declarada igualmente a impossibilidade coerciva prevista nos termos e para os efeitos do art. 189° da OTM.
11.
Admitir o contrário, face ao que anteriormente foi referido, seria iludir o espírito da Lei, abrindo a porta à desresponsabilização dos obrigados a prestar alimentos, por saberem, a priori, que o Estado supriria as suas faltas.
12.
A douta decisão com o respeito que possa merecer, não menciona o facto, de estar previsto o requisito legalmente exigido para que o FGADM assuma a prestação, certo é que desconhece o IGFSS, IP, se o progenitor/devedor se encontra a trabalhar, ou até mesmo a cumprir algumas das prestações.
13.
Afirmação esta subjacente, no facto de na douta decisão se referenciar “quantia em atraso” no valor de €125,00. No entanto o valor da prestação alimentícia fixada é de E 80,00, como poderá o pai estar em divida no montante de €125,00?
14
Terá o devedor efectuado o pagamento de algumas prestações? Ou por mera hipótese terá sido fixado um valor superior ao FGADM, diferente do fixado ao progenitor/devedor?
15.
Com a devida vénia, da leitura da douta decisão o interprete/ destinatário não poderá deter dúvidas na interpretação. Sendo por essa razão lícito ao FGADM deduzir que certamente o valor da prestação fixado é superior ao do devedor originário.
16.
No entanto, indubitável é que a letra da lei aponta no sentido de que o FGADM apenas garante o pagamento dos alimentos judicialmente fixados e somente se substitui ao obrigado enquanto este não iniciar ou reiniciar o cumprimento da sua obrigação e pelo valor fixado para esta.
17.
Até porque a obrigação de prestação de alimentos pelo FGADM, autónoma da prestação alimentícia decorrente do poder paternal, não decorre automaticamente da lei, sendo necessária uma decisão judicial que a imponha, ou seja, até essa decisão não existe qualquer obrigação
18.
A este propósito cumpre esclarecer que a responsabilidade do FGADM é, residual, uma vez que a satisfação do pagamento das prestações alimentícias incumbe em primeira mão aos pais e só quando tal é inviável é que intervém o Estado, assumindo tal pagamento e desde que preenchidos os requisitos cumulativos exigidos por Lei.
19.
Admitir o contrário, face ao que anteriormente foi referido, seria iludir o espírito da Lei, abrindo a porta à desresponsabilização dos obrigados a prestar alimentos, por saberem, a priori que o Estado supriria as suas faltas. Essa, não foi, certamente, a intenção do legislador.
20.   
Na verdade, não só seria incomportável para o Estado colmatar carências pretéritas dos menores, como seria inadequado substituir o obrigado originário a alimentos, no seu inalienável dever de prover ao sustento é educação daqueles.
21.
Esta prestação é autónoma relativamente à do obrigado a alimentos, e, para a sua fixação, é necessária a verificação do incumprimento e da impossibilidade da sua satisfação por este último.
22.
Parece ter sido intenção do legislador acudir a uma situação de necessidade do menor, necessidade presente, decorrente do incumprimento do obrigado principal. Evitar que se repitam situações, que podem ser irremediáveis, de o menor não ter alimentos. Fazer com que, verificado o incumprimento do principal obrigado, o menor tenha assegurado o seu sustento.
23.
O momento da verificação da impossibilidade de o progenitor satisfazer a obrigação a que estava vinculado é assim, o da decisão judicial que julgue procedente o incidente de fixação da obrigação do Estado em substituição do devedor originário.
24.
O legislador não sentiu necessidade de as incluir na garantia prestada. Pelas mesmas razões, que não sentiu necessidade de garantir a totalidade da prestação a que o requerido esta obrigado. A diferença — se houver — entre a prestação a cargo do requerido e o valor da prestação a cargo do FGADM também terá de continuar a ser exigida do primeiro.
25.
Temos, necessariamente, de concluir que a entidade subrogada, quando procede ao pagamento da prestação de alimentos, o faz no cumprimento de uma obrigação própria e não alheia, e, assim sendo, o Fundo deve substituir-se ao devedor originário apenas desde a notificação da decisão que determina a sub-rogação.
26.
Sobre esta mesma matéria decidiu recentemente, e bem, Tribunal da Relação de Coimbra — Proc. 3819/04 — 2ª secção cível acórdão de 19/02/2013; assim corno Tribunal da Relação do Porto Proc. 30/09— 5ª secçâo acórdão de 25/02/2013.
27.
Com efeito, a intervenção do FGADM reveste natureza subsidiária, visto que é a não realização coactiva da prestação alimentícia já fixada, que a legitima.
28.
Depois de pagar, o FGADM fica sub-rogado em todos os direitos do menor credor dos alimentos, sendo-lhe, pois, licito exigir do devedor de alimentos uma prestação igual ou equivalente àquela com que tiver sido satisfeito o interesse do menor (credor), incluindo o direito de requerer execução judicial para reembolso das importâncias pagas.
29.
Tal significa que o FGADM é apenas um substituto do devedor dos alimentos, pelo que a sua prestação não pode exceder a fixada para o mesmo.
30. A sub-rogação não pode exceder a medida da sub-rogação total, porquanto, se o terceiro paga mais do que ao devedor competia pagar, ele não tem o direito de exigir do devedor o reembolso pelo excesso e só poderá exigir do credor a restituição do que este recebeu indevidamente.
31.
Se o terceiro pagou mais do que era devido pelo devedor, no excesso não opera a sub-rogação e portanto o direito ao reembolso.
32.   
Acresce que se a prestação social pudesse ser fixada em valor superior não se justificaria racionalmente que a lei a fizesse depender do incumprimento pelo obrigado, antes deveria depender apenas e tão só as necessidades actuais do menor.
33.
Aceitar que a prestação fosse superior seria instituir-se, sem apoio normativo, uma prestação social em parte não reembolsável e ainda por cima sem que o credor a tenha de restituir como “indevida” no sentido do art. 10º do Decreto-lei, 164/99 8com a redacção introduzida respectivamente, pela Lei nº 66-B/2012 de 31 de Dezembro e pela Lei nº 64/2012 de 20 de Dezembro).
34.
Pelo que não tem, qualquer suporte legal fixar-se uma prestação alimentícia a cargo do FGADM superior à fixada ao progenitor pai ora devedor, logo o FGADM apenas se deverá considerar obrigado a assumir essa mesma prestação em substituição do progenitor em incumprimento.
35.
Ao que não se entende o decidido pelo Tribunal “a quo”, com o devido respeito que possa merecer.
36.
É que a não verificação da existência de um dos requisitos (in casu a impossibilidade coerciva) determina o não preenchimento de todos os pressupostos necessários para que o Estado, por intermédio do FGADM assegure e suporte as prestações de alimentos devidas aos menores.
37.
Salvo melhor opinião, e com o devido respeito que nos possa merecer, o simples facto de não ter sido verificado que o devedor se encontrava empregado, ou se detêm rendimentos determina que não estão reunidas todas as diligencias necessárias para que se possa determinar que os pressupostos legalmente e para a sub-rogação estão reunidos.
38.
A hipótese de ao devedor se poder proceder à cobrança coerciva da obrigação legal, nomeadamente através das vias previstas nos termos e para o preceituado no art. 189° da OTM, poderá ser viável, por essa razão deverá ser apurada nesse sentido.
39.
Não é sequer mencionado, na douta decisão que o devedor se encontra a desenvolver uma actividade profissional, e que dessa actividade aufere um vencimento, ou até mesmo que se tenha sido sequer determinado à entidade patronal o cumprimento de uma ordem judicial por forma a poder ser decretada a impossibilidade coerciva.
40.
Pelo que, encontra-se subjacente o facto de não se encontrarem esgotados todos os meios legais que determinam a impossibilidade coerciva.
41
Em face à escassez de elementos, o FGADM deveria presumir, sem mais, que se encontram preenchidos os pressupostos legais pata assegurar a prestação de alimentos fixada.
42.
Salvo o devido respeito, a actuação do FGADM não poderá basear-se numa mera presunção de correcção e justeza das decisões judiciais.
43.
A douta decisão incide sobre o mérito da causa, motivo pelo qual deveria ter sido fundamentada mediante subsunção dos factos de direito em harmonia com os artigos 158ºe 668º nº 1 ambos do CPC.
44.
Pelo que se invoca a sua nulidade, por omissão nos termos e para os efeitos do artigo 201º, nº1, 2ª parte do CPC.
45.
Em conformidade com art. 668°, 1, b), a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito em que se alicerça a decisão.
46.   
E de acordo com o preceituado nos arts. 205° n°. da CRP, e 158° n°. 1 do CPC, todas as decisões dos tribunais, que não sejam de mero expediente, incluindo, obviamente, as sentenças, têm de ser fundamentadas, sob pena de nulidade.
47.
Não se entendendo como fundamentação a remissão para o teor de outras peças processuais, nem com a simples adesão aos fundamentos alegados pelas partes.
48.
Face ao que se entende que a douta decisão recorrida violou o disposto nos artigos 158° n°. 1 e 2 e 668° no. 1 alínea b) ambos do CPC por falta insuprível de fundamentação.
49.
Ignora o FGADM de igual forma, se o doutamente decidido teve por base o Decreto-Lei n.° 70/20 10, de 16 de Junho, alterado pela Lei n.° 15/2011, de 3 de Maio, e pelos Decretos-Lei n.°s 113/2011, de 29 de Novembro, e 133/2012, de 27 de Junho, no que concerne ao conceito de agregado familiar, aos rendimentos a considerar e à forma de ponderação de cada elemento do mesmo para efeitos de capitação de rendimentos.
50.
Bem como desconhece se foram esgotadas todos os meios legais que determinam a impossibilidade coerciva prevista nos termos e para os efeitos do art. 189° OTM.
51.
Desconhecendo igualmente, se a decisão teve presente as alterações introduzidas aos diplomas que regulamentam o FGADM, isto é, ao DL n.° 164/99 de 11 de Maio, pela Lei n.° 64/2012 de 20 de Dezembro, e à Lei n.° 75/98 de 19 de Novembro, pela Lei n.° 66-B/2012 de 31 de Dezembro.

O Ministério Público veio, nos termos do disposto no artigo 698.°, n.° 2 do Código de Processo Civil, apresentar a sua resposta ao recurso interposto pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social-Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores (FGADM), por sua vez concluindo que


1. Ao contrário do que é afirmado pelo recorrente, antes de proferir a decisão recorrida, o Tribunal procedeu à recolha exaustiva de meios de prova acerca da situação pessoal, familiar e sócio-económica dos progenitores da menor.
2. E dos resultados dessas diligências concluiu, e bem, que todos os pressupostos.da aplicação do FGADM, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.° 164/99, de 13 de Maio estão reunidos no caso vertente. Daí o sentido da decisão proferida.
3. Todos os requisitos de que o legislador faz depender o accionamento do FGADM estão preenchidos no caso vertente.
4. O requerido foi condenado, por sentença transitada em julgado, a pagar a quantia de €50,00, a título de pensão de alimentos devida à sua filha Beatriz, que é menor de idade e que reside em Portugal.
5. A menor reside com a mãe, que aufere o vencimento de €1.334,64, o que traduz um rendimento per capita de €325,52, não beneficiando a menor de qualquer outra fonte de rendimentos.
6. O pai da menor não tem procedido ao pagamento da pensão de alimentos devida à filha menor, tendo sido proferida decisão que julgou verificado tal incumprimento.
7. Por último, não é viável, in casu, o recurso às formas de pagamento previstas no artigo 189.° da OTM, na justa medida em que, esgotadas todas as diligências de recolha de prova, apurou-se que aquele não tem bens, nem fontes de rendimentos que sejam conhecidos, susceptíveis de penhora.
8. Ao contrário do que refere o recorrente, tal pressuposto está efectivamente preenchido in casu, na justa medida em que se apurou que não são conhecidos ao pai da menor, obrigado a alimentos, quaisquer bens, nem rendimentos susceptíveis de penhora.
9. Por esse motivo, não é possível o recurso aos mecanismos consagrados no artigo 189.° da Organização Tutelar de Menores.
10. Na sua motivação de recurso, o recorrente insurge-se, ainda, contra o facto de a decisão recorrida ter fixado a cargo do FGADM um valor superior ao da pensão de alimentos que foi fixada para o requerido P (...).
11. E, nesta sede, entendemos que lhe assiste razão.
12. Na verdade, aderimos ao entendimento defendido pela Jurisprudência mais recente, de acordo com a qual a prestação a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores (FGADM), prevista no artigo 1º, da Lei n.° 75/98, de 19 de Novembro não pode ser superior à prestação colocada a cargo do devedor de alimentos.



II. Os Fundamentos:

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

São ocorrências materiais, com interesse para a decisão da causa, as que se revelam em decorrência do elemento narrativo intraprocessual expresso nos Autos, designadamente os que constam da(s) decisão(ões) proferida(s), no seguinte referencial assinalado:

(fls. 2)
 “Notificado o réu P (…), do incidente para pagar os alimentos em atraso e devidos à sua filha menor B (…), à ordem de 50 €/mês (enquanto estiver na situação de desempregado), encontrando-se em atraso a quantia total de 125 € (relativa a 25 € quanto ao mês de Janeiro, 50 € quanto ao mês de Fevereiro e 50 € quanto ao mês de Março de 2012), o mesmo a fls. 31, confirma tal situação afirmando que não tem trabalho certo continua desempregado.
Determina o artigo 181°/1 da OTM que, relativamente à situação do menor, se um dos progenitores não cumprir o que tiver sido acordado ou decidido, pode o outro requerer ao tribunal as diligências necessárias para o cumprimento coercivo e a condenação do remisso em multa até 249,90 € em indemnização a favor do menor ou do requerente ou de ambos.
Por seu turno, dispõe o artigo 1878°,nº 1 do CC que, compete aos pais no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los ainda que nascituros e administrar os seus bens.
Julgo pois verificado e provado o referido incidente, cumprindo condenar o Réu P (…), a pagar a quantia de 125 €  (cento e vinte e cinco euros), por conta de alimentos em atraso vencidos até o passado mês de Março do ano de 2012, inclusive, acrescidos os juros de mora, à taxa para as relações civis, a contar da notificação desta decisão, valor a entregar à mãe da menor, C (…)”.

(fls. 6-7)
“Concordando com o requerido doutamente, pela Sra. Procuradora-Adjunta junto deste tribunal, e porque nos autos a fls. já consta uma decisão de incumprimento que condenou o requerido e progenitor da menor B (…)  nascida em 0.10.2008, chamado por sua vez de P (…), a pagar a título de alimentos a quantia em atraso de 125 € (até o mês de Março de 2012), porque se provou o não pagamento por este do valor devido a título de alimentos à sua filha.


Junto o relatório social que averigua das condições de vida e financeiras do agregado em que se insere a menor supra citada, conforme fls. 75 a 79, conclui-se, que o agregado composto pela mãe, o avô da menor e outros menores atinge o valor global de 1.334,64 €.
Ponderada a condição de aceder ao recurso pelo Fundo de Garantia e ao abrigo do disposto no DL n° 70/2010 de 16.06, verifica-se que o rendimento per capita deste agregado é de 325,52 €, pelo que reúne as condições para que lhe seja atribuída a prestação alimentícia a cargo do Fundo de Garantia Devidos a Menor.
Nos termos do disposto nos artigos 1º e 2° da Lei n° 75/98 de 19.11 e 3° do DL n° 164/99 de 13.05, que veio regulamentar aquela lei, o Estado, através do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores (Fundo), assegura o pagamento das prestações de alimentos devidas a menor, desde que verificados e cumulativamente dois pressupostos fundamentais, a saber, que as mesmas tenham sido fixadas judicialmente e a pessoa obrigada a prestá-las não satisfaça a importância em dívida, mesmo através do mecanismos previstos no artigo 189° do DL n° 314/78 de 27.10 (OTM) e ainda que a criança a quem são devidos os alimentos não pode ter rendimentos líquidos de montai superior ao do salário mínimo nacional, o mesmo acontecendo com a pessoa à guarda de quem ficou confiada:
Verificados que sejam estes requisitos, o tribunal fixa o montante da prestação cuja satisfação o Estado irá garantir, até inicio do efectivo cumprimento da prestação, com o limite máximo de 4 UCs e ponderando, para o efeito a capacidade económica do agregado famiiar, o montante da prestação judicialmente já fixado e as necessidades específicas do menor, artigos 2°/ 2da Lei n°75/98 de 19.11 e 3° e 4º do DL n° 164/99 de 13.05.
Quanto a este último aspecto, tomar-se-á em atenção as novas regras de cálculo previstas no DL n° 70/20 10 de 16.06, nomeadamente no artigo 2°/4 onde aí se determina que, o direito às prestações e aos apoios sociais previstos na lei depende de o valor do património mobiliário do requerente e do seu agregado familiar, à data do requerimento e do seu pedido de apoio social não ser superior a 240 vezes o valor do indexante dos apoios sociais (IAS).
Refira-se que a obrigação alimentar se destina a salvaguardar o direito à vida e à integridade física do alimentando, conforme prevêem os artigos 25° e 26° da Constituição da Repúública Portuguesa (CRP) e 70° do CC.
Trata-se dum direito indisponível, nos termos do artigo 2008° do CC.
Assim, encontram-se reunidos os pressupostos para que de imediato o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menor, pague um valor mensal relativo aos alimentos que o requerido está obrigado a suportar, no termos da Lei n° 75/98 de 19.11, artigos 1°, 2° e 3°/2 e o DLn° 164/99 de 13.05, artigo 3°.
Atendendo a que a menor B (…) irá perfazer 5 anos de idade ainda este ano e a carestia geral do custo de vida associado à austeridade, então determino que o Estado através do Fundo de Garantia dos Alimentos, pague a quantia mensal de 80 € (oitenta euros), à mãe desta menor, nos termos do artigo 3°/2 da Lei n° 75/9 8 de 19.11, até que o pai aufira condições de ele suportar este encargo”.



Nos termos do art. 684°, n°3, e 690°,n°1, do CPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n°2, do art. 660°, do mesmo Código.

Das conclusões -

(das quais haverá de dizer-se - em nome do rigor que sempre há que colocar na hipótese de trabalho judiciário sub judice -, que desenvolvem - de forma profusa e tautológica pontos de apreciação, em desrespeito pelo disposto no art. 690º, CPC sem levar em devida conta que, justamente, por conclusões se entendem “as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação” (Alberto dos Reis, CPC Anot, 5º.359) E, sobretudo, que «as conclusões consistem na enunciação, em forma abreviada, dos fundamentos ou razões jurídicas com que se pretende obter o provimento do recurso. Com mais frequência do que seria para desejar vê-se, na prática, os recorrentes indicarem como conclusões, o efeito jurídico que pretendem obter com o provimento do recurso, e, às vezes, até com a procedência da acção. Mas o erro é tão manifesto que não merece a pena insistir neste assunto. Se as conclusões se destinam a resumir, para o tribunal ad quem, o âmbito do recurso e os seus fundamentos, pela elaboração de um quadro sintético das questões a decidir e das razões porque devem ser decididas em determinado sentido, é claro que tudo o que fique para aquém ou para além deste objectivo é deficiente ou impertinente (Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, 30, 299), -

ressaltam - no eu importa discernir - as seguintes questões elencadas, na sua formulação originária, de parte, a considerar na sua própria matriz:

I.
2.
O FGADM considera que não se encontra preenchido o pressuposto legal essencial e exigido subjacente à atribuição da prestação de alimentos impossibilidade coerciva do devedor.
9.
A verdade é que o incumprimento da prestação por si só não é suficiente para que o FGADM assuma a prestação em regime de sub-rogação.
10. Exige a Lei, e bem, que do incumprimento seja declarada igualmente a impossibilidade coerciva prevista nos termos e para os efeitos do art. 189° da OTM.
11.
Admitir o contrário, face ao que anteriormente foi referido, seria iludir o espírito da Lei, abrindo a porta à desresponsabilização dos obrigados a prestar alimentos, por saberem, a priori, que o Estado supriria as suas faltas.


Apreciando, diga-se que - funcionando como elemento pressuponente e, simultaneamente, obsidiante - na vinculação do disposto no art. 2004º Código Civil -,  para a resolução do presente problema a circunstância de, a pretexto de débito de alimentos, nas condições em causa, em equação com a modificação das circunstâncias que estiveram na base da sua fixação, poder operar-se aumento ou redução do respectivo quantitativo (Ac. STJ, 13-1-1981: BMJ, 303.°-240). Assim, a medida da prestação alimentar destina-se pelo binómio: possibilidades do devedor e necessidade do credor, devendo aquelas possibilidades e outras necessidades serem actuais. Na fixação dos alimentos há que ter em conta em cada caso concreto, não só as necessidades primárias do alimentado, mas também as exigências decorrentes do nível de vida e posição social correspondentes à sua situação familiar. A fixação do quantitativo de alimentos é, pois, nesta dimensão, uma questão de direito (Ac. STJ, 7-5-1980: BMJ, 297.°-342).

Com tal tessitura de vinculação conceitual, a potenciar a asserção firmada, configuram-se como inarredáveis os seguintes elementos destacados como tópica probatória eleita como elemento referencial. A saber:

- O requerido foi condenado, por sentença transitada em julgado, a pagar a quantia de €50,00, a título de pensão de alimentos devida à sua filha Beatriz, que é menor de idade e que reside em Portugal.
- A menor reside com a mãe, que aufere o vencimento de €1.334,64, o que traduz um rendimento per capita de €325,52, não beneficiando a menor de qualquer outra fonte de rendimentos.
- O pai da menor não tem procedido ao pagamento da pensão de alimentos devida à filha menor, tendo sido proferida decisão que julgou verificado tal incumprimento.
- Por último, não é viável, in casu, o recurso às formas de pagamento previstas no artigo 189.° da OTM, na justa medida em que, esgotadas todas as diligências de recolha de prova, apurou-se que aquele não tem bens, nem fontes de rendimentos que sejam conhecidos, susceptíveis de penhora.
- Ao contrário do que refere o recorrente, tal pressuposto está efectivamente preenchido in casu, na justa medida em que se apurou que não são conhecidos ao pai da menor, obrigado a alimentos, quaisquer bens, nem rendimentos susceptíveis de penhora.

Assim revelando, e a tal a pretexto, que as possibilidades do obrigado saem, efectivamente, condicionadas por tal (possível) revelação constante dos Autos.
 Do mesmo modo, também se não consegue ultrapassar que a falta de possibilidades, perfila uma excepção, cuja prova incumbe ao devedor de alimentos (Cf. L. P. Moitinho de Almeida, Os Alimentos no Código Civil de 1966, na ROA, 1968, 101).
 Em todo o caso, o que resulta provado é substancialmente diferente, havendo de insistir:

na justa medida em que, esgotadas todas as diligências de recolha de prova, apurou-se que aquele não tem bens, nem fontes de rendimentos que sejam conhecidos, susceptíveis de penhora.

Ora, tal não equivale a “falta de possibilidades” que ao referenciado devedor de alimentos se imporá demonstrar, o que, até ao momento, e do mesmo modo, não saiu evidenciado.
Isto porque, com efeito, o ónus consiste - na referência do art. 342°,1, do CCivil - na necessidade de observância de determinado comportamento, não para satisfação do interesse de outrem, mas como pressuposto da obtenção de uma vantagem para o próprio, a qual pode inclusivamente cifrar-se em evitar a perda de um beneficio antes adquirido (Antunes Varela, Obrigações, 35); traduz-se, para a parte a quem compete, no encargo de fornecer a prova do facto visado, incorrendo nas desvantajosas consequências de se ter como liquido o facto contrário, quando omitiu ou não logrou realizar essa prova; ou na necessidade de, em todo o caso, sofrer tais consequências se os autos não contiverem prova bastante desse facto (trazida ou não pela mesma parte) (Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1956, pág. 184).
O ónus da prova traduz-se, pois, para a parte a quem compete, no dever de fornecer a prova do facto visado, sob pena de sofrer as desvantajosas consequências da sua falta (Ac. RC, 17-11-1987: CJ 1987, 50-80).

Com este enquadramento, ainda que se entenda, em abstracto, que os recursos económicos a afectar à educação, saúde, bem-estar e desenvolvimento integral dos menores, são sempre escassos, o certo é que, revertendo ao caso concreto, o prestador dessas contribuições se depara com os constrangimentos específicos aludidos.

Claro que, nas possibilidades do obrigado, se impõe olhar à sua idade, ao seu sexo, ao seu estado de saúde, à sua situação social, ao ter ou não filhos a sustentar, ao poder ou não trabalhar, ao ter ou não um lucro que lhe permita ganhar a vida, aos rendimentos dos seus bens e a quaisquer outros proventos. Mas não se deve exigir ao obrigado que, para prestar alimentos, ponha em perigo a sua própria manutenção de acordo com a sua condição, embora já não haja que atender, à necessidade que possa ter de sacrificar o próprio capital, pois a tal é obrigado, na medida do razoável assim como há que exigir-se que o obrigado trabalhe, se não puder, de outro modo, prestar alimentos; apenas haverá que fazer-se tal exigência dentro do que for razoável.

Compreendem-se, assim, os constrangimentos fácticos, que o mesmo é dizer os limites imanentes condicionadores da (e na) decisão proferida.

Como, igualmente, se entendem as preocupações de curadoria expressos pelo MP, designadamente que “por esse motivo, não ser possível o recurso aos mecanismos consagrados no artigo 189° da Organização Tutelar de Menores.

Inquestionavelmente (em emergência, também, do que se expressou na lei nº 75/98, de 19 de Novembro e do DL nº 164/99, de 13 de Maio) o Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores (FGADM) assegura o pagamento das prestações de alimentos, em substituição do pai/mãe faltoso(a), no caso de incumprimento desta obrigação. Posicionar tal exigência dentro do que for razoável passa, necessariamente, por verificar se o obrigado efectiva, ou não, prestação de alimentos no quadro factual e interpretativo descrito e sempre como já referenciado, considerando que a fixação do quantitativo de alimentos não pode deixar de se configurar (já se disse), neste horizonte problemático, como questão de direito.

Em tal referencial, no entanto, ao contrário do que refere o recorrente, tal pressuposto está efectivamente preenchido in casu, na justa medida em que se apurou que não são conhecidos ao pai da menor, obrigado a alimentos, quaisquer bens, nem rendimentos susceptíveis de penhora.

Por esse motivo, e exactamente a seu pretexto, prático e legal, haverá de conceder-se não ser possível o recurso aos mecanismos consagrados no artigo 189.° da Organização Tutelar de Menores (meios de tornar efectiva a prestação de alimentos).

O que responde negativamente às questões em I.

II.
23.
O momento da verificação da impossibilidade de o progenitor satisfazer a obrigação a que estava vinculado é assim, o da decisão judicial que julgue procedente o incidente de fixação da obrigação do Estado em substituição do devedor originário.
25.
Temos, necessariamente, de concluir que a entidade subrogada, quando procede ao pagamento da prestação de alimentos, o faz no cumprimento de uma obrigação própria e não alheia, e, assim sendo, o Fundo deve substituir-se ao devedor originário apenas desde a notificação da decisão que determina a sub-rogação.

Assinalando, muito embora, a recorrência temática, volta a impor-se aderir, conceitualmente, também em função da matéria probatória fixada, que para que o FGADM assegure o pagamento, em substituição do devedor, de uma prestação alimentar ao menor, ser necessário, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 1.° e 2.° do Decreto-Lei n.° 75/98 de 19 de Novembro e do artigo 3.°, n.° 3 do Decreto-Lei n.° 164/99, de 13 de Maio que se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:

-   existência de sentença que fixe os alimentos devidos a menor
-   residência do menor em território nacional;
- inexistência de rendimentos liquidos do alimentando superiores ao salário mínimo nacional;
-  que o alimentado não beneficiei na mesma quantidade, de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre;
-  não pagamento por parte do devedor, das quantias em dívida através de uma das formas previstas no artigo 189° da OTM”.

O que, por mera observação directa, leva a concluir que todos eles se mostram, efectivamente, preenchidos. Fazendo ressumar que o requerido foi condenado, por sentença transitada em julgado, a pagar a quantia de €50,00, a título de pensão de alimentos devida à sua filha B (…), que é menor de idade e que reside em Portugal; a menor reside com a mãe, que aufere o vencimento de €1.334,64, o que traduz um rendimento per capita de €325,52; não beneficiando a menor de qualquer outra fonte de rendimentos.            Sendo que o pai da menor não tem procedido ao pagamento da pensão de alimentos devida à filha menor, tendo sido por decisão que julgou verificado tal incumprimento.

Depois, com a relevância de que o pressuposto da impossibilidade da cobrança das quantias em dívida através de uma das formas previstas no artigo 189.° da OTM está efectivamente preenchido uma vez que se apurou - o que faz toda a diferença - não serem conhecidos ao pai da menor, obrigado a alimentos, quaisquer bens, nem rendimentos susceptíveis de penhora.

Com esta abrangência, pois que, não obstante - de forma intransponível -, se consagra no art. 69º CRP (infância)

 “um direito das crianças à protecção, impondo-se os correlativos deveres de prestação ou de actividade ao Estado e à sociedade (i. é, aos cidadãos e às instituições sociais). Trata-se de um típico «direito social», que envolve deveres de legislação e de acção administrativa para a sua realização e concretização, mas que supõe, naturalmente, um direito «negativo» das crianças a não serem abandonadas, discriminadas ou oprimidas (n° 1, 2° parte). Por outro lado, este direito não tem por sujeitos passivos apenas o Estado e os poderes públicos, em geral, mas também a «sociedade» (n° 1), a começar pela própria família (incluindo os progenitores) e pelas demais instituições (creches, escolas, igrejas, instituições de tutela de menores, etc.) (n° 1, in fine), o que configura uma clara expressão de direitos fundamentais nas relações entre particulares. Além disso, as crianças têm, em relação aos progenitores um direito geral de manutenção e educação, a que corresponde o dever daqueles de assegurarem tal direito” (cfr. art. 36°- 5) (J. J. Gomes Canotilho / Vital Moreira Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume 1, 4ª edição revista, 2007, p. 869).

Do mesmo modo, como emergência do que se consagra no art. 36º CRP (família, casamento e filiação)

“o direito e o dever dos pais de educação e manutenção dos filhos (n° 5) são um verdadeiro direito-dever subjectivo e não uma simples garantia institucional ou uma simples norma programática, integrando o chamado poder paternal (que é uma constelação de direitos e deveres, dos pais e dos filhos, e não um simples direito subjectivo dos pais perante o Estado e os filhos). A natureza de direito-dever subjectivo dos pais traduz-se, na linguagem actual, na compreensão do poder paternal como obrigação de cuidado parental. É evidente, porém, que ele não exclui a colaboração do Estado na educação dos filhos, como, aliás, estabelece a própria Constituição (arts. 67°-2/c e 68°-i), nem, muito menos, o direito do Estado a garantir o direito ao ensino através de um sistema público de ensino, incluindo o ensino básico obrigatório (art. 74°-2/a). Aliás, «educação» tem aqui um sentido distinto e bastante mais amplo do que «ensino»: abrange designadamente todo o processo global de socialização e aculturação, na medida em que ele é realizável dentro da família. Quanto ao direito e dever de manutenção, ele envolve especialmente o dever de prover ao sustento dos filhos, dentro das capacidades económicas dos pais, até que eles estejam em condições (ou tenham obrigação) de o fazer. Daí o fundamento da obrigação de alimentos por parte do progenitor que não viva com os filhos.
O dever de educação e manutenção dos filhos, além de um dever ético-social, é um dever jurídico, nos termos estabelecidos na lei civil (arts. 1877° e ss.) e em convenções internacionais” (cfr. Protocolo n° 7 à CEDH, art. 5°)” (J. J. Gomes Canotilho / Vital Moreira Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume 1, 4ª edição revista, 2007, pp. 565-566).

Tudo na compatibilidade ao demais alcance normativo como o que precipuamente decorre do art. 2003.° (noção), segundo o qual (1) por alimentos entende tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário; (2) compreendendo os alimentos também a instrução e educação do alimentado no caso de este ser menor. É assim que a obrigação de prestar alimentos, que a lei impõe aos presentes, é uma obrigação conjunta e não uma obrigação indivisível e solidária, porque o devedor só responde na medida das suas possibilidades (L. P. Moitinho de Almeida, Os Alimentos no Código Civil de 1966, na ROA, 1968, pág. 118). Do mesmo modo, na compatibilidade ao alcance do art. 2004.° (medida dos alimentos) ao determinar que estes serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los. E sempre a levar em consideração que a fixação do quantitativo dos alimentos configura, pois, questão de direito, resultando claro ser questão de facto o apuramento das condições (sobretudo económicas) de que depende essa fixação (cfr. v.g., STJ, 16 de Outubro de 1962, Bol. Min. Just., n.° 120, 354) (Pereira Coelho, Família, 1969. 2.°-361), equacionada nos termos expressos.

Assim acolhendo, também, entendimento segundo o qual o critério de proporcionalidade a que alude o artigo 2004.° do Código Civil releva para efeitos de fixação do montante de alimentos, mas não para se excluir o respectivo pagamento.” Ac. TRL de 09.11.20 10, in processo 6140/07.8 TBAMD.L1-I, www.dgsi.pt.. Acrescendo que, estando o acesso ao FGADM dependente da prévia fixação de alimentos a favor do menor (art. 1º e 3° da Lei 75/98 de 19/11), a não condenação do requerido impedirá o menor de beneficiar do Fundo (Cf. Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 06.12.2012, Processo n° 677/07.6 TBTNV-A.C 1).

De outro modo - neste contexto -, sempre sairiam violadas as disposições constantes do art. 69.° da Constituição da República Portuguesa, do art. 2003.° e 2004.° do Código Civil e, ainda, do art. 1.° da Lei n° 75/98, de 19 de Novembro.

O que, do mesmo modo, determina ser negativa a resposta às questões em II.


III.
29.
O FGADM é apenas um substituto do devedor dos alimentos, pelo que a sua prestação não pode exceder a fixada para o mesmo.
34.
Pelo que não tem, qualquer suporte legal fixar-se uma prestação alimentícia a cargo do FGADM superior à fixada ao progenitor pai ora devedor, logo o FGADM apenas se deverá considerar obrigado a assumir essa mesma prestação em substituição do progenitor em incumprimento.

Nesta vertente, tudo visto, também se faz coro com a posição que travejada com a apreciação segundo a qual a prestação a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores (FGADM), prevista no artigo 1.°, da Lei n.° 75/98, de 19 de Novembro não pode ser superior à prestação colocada a cargo do devedor de alimentos, sufragando a validade da invocação e remissão expressas para os invocados Ac.s da Relação de Coimbra de 19 de Fevereiro de 2013, proferido no processo n.° 3819/04.0TBLRA-C.C1, em www.dgsLpt) e do Tribunal da Relação de Lisboa, no seu Acórdão de 8 de Novembro de 2012, proferido no processo n.° 1529/03.4 TCLRS.AC2.6, in www.dgsi.pt, em particular quando neste se decidiu que

“a prestação de alimentos a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores em caso de incumprimento, pelo progenitor, da obrigação previamente fixada judicialmente não pode ser estabelecida em montante superior a esta”.

Na verdade, o FGADM só fica obrigado na justa medida em que está obrigado o devedor de alimentos: Só este entendimento é consentâneo com o espírito da lei. E quando se verifiquem os pressupostos de intervenção subsidiária do Estado este assume a obrigação de prestar alimentos ao menor, substituindo-se ao obrigado a alimentos e suportando o pagamento da prestação que tiver sido previamente estabelecida (assinalando que, inclusivamente, foi este o sentido da promoção do Ministério Público, que promoveu que o FGADM pague, em substituição do devedor P (…), o valor de €50,00, que é o valor da pensão de alimentos a que este ficou obrigado.

Assim, exactamente, pois que interpretar uma lei não é mais do que fixar o seu sentido e o alcance com que ela deve valer, ou seja, determinar o seu sentido e alcance decisivos; o escopo final a que converge todo o processo interpretativo é o de pôr a claro o verdadeiro sentido e alcance da lei (Manuel de Andrade, Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, págs. 21 e 26).
Interpretar, em matéria de leis, quer dizer não só descobrir o sentido que está por detrás da expressão, como também, dentro das várias significações que estão cobertas pela expressão, eleger a verdadeira e decisiva (P. de Lima e A. Varela, Noções Fundamentais, II, 5. ed., pag. 130).
Ou como diz Baptista Machado (Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 1987, págs. 182 e 189), o texto ou letra da lei é o ponto de partida da interpretação e, como tal, cabe-lhe desde logo uma função negativa: a de eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio, ou pelo menos uma qualquer correspondência ou ressonância nas palavras da lei. A letra, o enunciado linguístico, é, assim, um ponto de partida. Mas não só, pois exerce também a função de um limite, nos termos do art. 9º, n.° 2 CC: não pode ser considerado como compreendido entre os sentidos possíveis da lei aquele pensamento legislativo (espírito, sentido) «que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso».
No mesmo sentido, Oliveira Ascensão escreve: a letra é não só o ponto de partida mas também um elemento irremovível de toda a interpretação, funcionando também o texto como limite da busca do espírito (O Direito, 6.° ed., 1991, pág. 368).

O que impõe, aqui, em particular, resposta afirmativa às questões formuladas em III.

IV.

43.
A decisão incide sobre o mérito da causa, motivo pelo qual deveria ter sido fundamentada mediante subsunção dos factos de direito em harmonia com os artigos 158ºe 668º nº 1 ambos do CPC.
45.
Em conformidade com art. 668°, 1, b), a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito em que se alicerça a decisão.

46.   
E de acordo com o preceituado nos arts. 205° n°. da CRP, e 158° n°. 1 do CPC, todas as decisões dos tribunais, que não sejam de mero expediente, incluindo, obviamente, as sentenças, têm de ser fundamentadas, sob pena de nulidade.

Depois do que anteriormente se apreciou, é bem de ver a completa inconsequência de tal tipo de objecções. Com efeito, para que exista a nulidade da sentença prevista no art. 668.°, n.° 1, al. c), de CPC é necessário que a fundamentação da decisão aponte num sentido e que esta siga caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente (Ac. STJ, de 19.2.1991: AJ, 15.°/16.°-31). O que, no presente caso, não acontece.
Com efeito, as causas de nulidade de sentença ou de acórdão taxativamente enumeradas no art. 668.° do Cód. Proc. Civil não incluem no seu elenco o erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável. A lei só considera nulidade a falta absoluta de motivação ou seja a sua ausência completa. A insuficiência ou mediocridade da motivação constitui uma espécie diferente que não contende com o valor legal da sentença. Para que ocorra nulidade prevista na al. c) do n.° 1 do art. 668.° do Cód. Proc. Civil é necessário que exista uma real contradição entre os fundamentos e a decisão apontando a fundamentação num sentido e a decisão num sentido diferente (Ac. STJ, de 20.6.2000: Sumários, 42.°-21). O que, igualmente, se não ocorre.
Verificando-se que na sentença recorrida constam os factos e as razões de direito em que o tribunal alicerçou a sua decisão e esta é consequência lógica daquela fundamentação, é evidente que aquela peça processual não está inquinada de qualquer nulidade (art. 668.°, n.° 1, alíneas b), c) e e) do Cód. Proc. Civil) (Ac. RE, de 22.5.1997: Col. Jur., 1997, 3.°-265).

Ex abundante, mais se diga que a fundamentação permite, ainda, quer pelas próprias partes, quer, o que é de realçar, pelos tribunais de recurso [Michele Taruffo, «Note sulla garanzia costituzionale della motivazione» in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, vol. LV (1979), pp. 31-32], fazer, como escreve Marques Ferreira, «intraprocessualmente, o reexame do processo lógico ou racional que lhe subjaz, pela via do recurso.
Mais importante, todavia, é a circunstância de a obrigação de fundamentar as decisões judiciais constituir um verdadeiro factor de legitimação do poder jurisdicional, contribuindo para a congruência entre o exercício desse poder e a base sobre a qual repousa: o dever de dizer o direito no caso concreto (iuris dicere). E, nessa medida, é garantia de respeito pelos princípios da legalidade, da independência do juiz e da imparcialidade das suas decisões (v. Michele Taruffo, op. cit., pp. 34-35, que escreve: «a garantia constitucional do dever de fundamentação ocupa um lugar central no sistema de valores nos quais deve inspirar-se a administração da justiça no Estado democrático moderno»).
É indiscutível que «o princípio da motivação das decisões judiciais Constitui uma das garantias fundamentais do cidadão no Estado de direito e no Estado social de direito contra o arbítrio do poder judiciário», v. Pessoa Vaz, Direito Processual Civil — Do Antigo ao Novo Código, Coimbra, 1998, p. 211. Repetindo que a motivação das decisões judiciais é uma garantia da possibilidade de controlo democrático do exercício do poder judicial em face dos cidadãos e do próprio Estado, exigência do princípio do Estado de direito (artigo 2.° da Constituição).
O dever de fundamentar as decisões, consignado no art. 158.° do Cód. Proc. Civil, pelo que respeita ao direito, não implica que o julgador aprecie todas as razões invocadas pelas partes, mas apenas que indique a razão jurídica que serve de fundamento à decisão, podendo esta indicação ser feita de forma sucinta (Ac. STJ, de 28.10.1999: Col.Jur., 1999, 3.°-66). O que, também, não deixou de ser cumprido.

O que atribui resposta negativa às questões em IV.

Podendo, assim, concluir-se, sumariando, que:


1. A medida da prestação alimentar destina-se pelo binómio: possibilidades do devedor e necessidade do credor, devendo aquelas possibilidades e outras necessidades serem actuais. Na fixação dos alimentos há que ter em conta em cada caso concreto, não só as necessidades primárias do alimentado, mas também as exigências decorrentes do nível de vida e posição social correspondentes à sua situação familiar. A fixação do quantitativo de alimentos é uma questão de direito.
2.
A falta de possibilidades, perfila uma excepção, cuja prova incumbe ao devedor de alimentos. Com o ónus a consistir - na referência do art. 342°,1, do CCivil - na necessidade de observância de determinado comportamento, não para satisfação do interesse de outrem, mas como pressuposto da obtenção de uma vantagem para o próprio, a qual pode inclusivamente cifrar-se em evitar a perda de um beneficio antes adquirido; traduz-se, para a parte a quem compete, no encargo de fornecer a prova do facto visado, incorrendo nas desvantajosas consequências de se ter como liquido o facto contrário, quando omitiu ou não logrou realizar essa prova; ou na necessidade de, em todo o caso, sofrer tais consequências se os autos não contiverem prova bastante desse facto (trazida ou não pela mesma parte).
3.
Inquestionavelmente (em emergência, também, do que se expressou na lei nº 75/98, de 19 de Novembro e do DL nº 164/99, de 13 de Maio) o Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores (FGADM) assegura o pagamento das prestações de alimentos, em substituição do pai/mãe faltoso(a), no caso de incumprimento desta obrigação, assim configurada como condição procedimental, porventura excessivamente restritiva, mas com tal estipulado alcance.
4.
Com esta abrangência, pois que se consagra no art. 69º CRP (infância) “um direito das crianças à protecção, impondo-se os correlativos deveres de prestação ou de actividade ao Estado e à sociedade (i. é, aos cidadãos e às instituições sociais). Trata-se de um típico «direito social», que envolve deveres de legislação e de acção administrativa para a sua realização e concretização, mas que supõe, naturalmente, um direito «negativo» das crianças a não serem abandonadas, discriminadas ou oprimidas (n° 1, 2° parte).





5.
Este direito não tem por sujeitos passivos apenas o Estado e os poderes públicos, em geral, mas também a «sociedade» (n° 1), a começar pela própria família (incluindo os progenitores) e pelas demais instituições (creches, escolas, igrejas, instituições de tutela de menores, etc.) (n° 1, in fine), o que configura uma clara expressão de direitos fundamentais nas relações entre particulares.
6.
Além disso, as crianças têm, em relação aos progenitores um direito geral de manutenção e educação, a que corresponde o dever daqueles de assegurarem tal direito (cfr. art. 36°- 5 CRP). Do mesmo modo, como emergência do que se consagra no art. 36º CRP (família, casamento e filiação), “o direito e o dever dos pais de educação e manutenção dos filhos (n° 5) são um verdadeiro direito-dever subjectivo e não uma simples garantia institucional ou uma simples norma programática, integrando o chamado poder paternal (que é uma constelação de direitos e deveres, dos pais e dos filhos, e não um simples direito subjectivo dos pais perante o Estado e os filhos).
 7.
Quanto ao direito e dever de manutenção, ele envolve especialmente o dever de prover ao sustento dos filhos, dentro das capacidades económicas dos pais, até que eles estejam em condições (ou tenham obrigação) de o fazer. Daí o fundamento da obrigação de alimentos por parte do progenitor que não viva com os filhos.
8.
O dever de educação e manutenção dos filhos, além de um dever ético-social, é um dever jurídico, nos termos estabelecidos na lei civil (arts. 1877° e ss.) e em convenções internacionais (cfr. Protocolo n° 7 à CEDH, art. 5°)”.
9.
Tudo na compatibilidade ao demais alcance normativo como o que precipuamente decorre do art. 2003.° Código Civil (noção), considerando que a obrigação de prestar alimentos, que a lei impõe aos presentes, é uma obrigação conjunta e não uma obrigação indivisível e solidária, porque o devedor só responde na medida das suas possibilidades.
10.
Do mesmo modo, na compatibilidade ao alcance do art. 2004.° Código Civil (medida dos alimentos) ao determinar que estes serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los. E sempre a levar em consideração que a fixação do quantitativo dos alimentos configura, pois, questão de direito, resultando claro ser questão de facto o apuramento das condições (sobretudo económicas) de que depende essa fixação, equacionada nos termos expressos.
11.
Assim acolhendo, também, entendimento segundo o qual o critério de proporcionalidade a que alude o artigo 2004.° do Código Civil releva para efeitos de fixação do montante de alimentos, mas não para se excluir o respectivo pagamento. Acrescendo que estando o acesso ao FGADM dependente da prévia fixação de alimentos a favor do menor (art. 1º e 3° da Lei 75/98 de 19/11), a não condenação do requerido impedirá o menor de beneficiar do Fundo.
12.
Sendo que nos Autos, como se evidenciou, saem demonstrados elementos que se revelam determinantes para - nos termos provados e de acordo com o que se expendeu em decisório - provocar alterações pretendidas por adequação à prova produzida, tão só no que respeita à circunstância segundo a qual a prestação a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores (FGADM), prevista no artigo 1.°, da Lei n.° 75/98, de 19 de Novembro não pode ser superior à prestação colocada a cargo do devedor de alimentos. Ou seja, a prestação de alimentos a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores em caso de incumprimento, pelo progenitor, da obrigação previamente fixada judicialmente, não pode ser estabelecida em montante superior a esta.


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III. A Decisão:

Pelas razões expostas, concede-se parcial provimento ao recurso interposto, revogando-se a decisão recorrida - no que respeita à consideração dos alimentos devidos -, antes se impondo que o FGADM pague, em substituição do devedor P (...), o valor de €50,00, que é o valor da pensão de alimentos a que este ficou obrigado, no mais se mantendo o decidido.

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António Carvalho Martins - Relator
Carlos Moreira - 1º Adjunto
 Anabela Luna de Carvalho- 2º  Adjunto