Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
110/07.3GASPS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: VASQUES OSÓRIO
Descritores: FURTO
CONSUMAÇÃO
PRESSUPOSTOS DA PENA RELATIVAMENTE INDETERMINADA
Data do Acordão: 11/27/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE – TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE SÃO PEDRO DO SUL
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 83º Nº 1, 203º, Nº 1 E 204º, Nº 2, E) CP
Sumário: 1.- O furto é um crime de consumação instantânea. Torna-se perfeito logo que a coisa entra na esfera patrimonial do agente, ficando à sua disposição ou seja, logo que o agente passa a controlá-la, passa a tê-la sob o seu domínio, não se exigindo que este domínio se exerça com sossego e tranquilidade;

2.- Tendo o arguido já retirado do interior da casa de habitação e colocado num terreno distante cerca de cinquenta metros, e para depois os transportar para o veículo onde se encontrava a arguida, um número considerável de objetos pertencentes ao ofendido, quando foi avistado e abordado pelos militares da GNR, é inquestionável que o arguido já controlava de facto as coisas, já as tinha sob o seu domínio durante um mínimo de tempo e de estabilidade pelo que se deve entender que o furto se consumou.

3.- São pressupostos da aplicação de uma pena relativamente indeterminada:

- Que o agente pratique crime doloso a que deva aplicar-se, em concreto, prisão efetiva por mais de dois anos;

- Que o agente tenha cometido anteriormente dois ou mais crimes dolosos, cada um punido ou a punir com prisão efetiva por mais de dois anos;

- Que a avaliação conjunta dos factos e a personalidade do agente revelem uma acentuada inclinação para o crime, que ainda persista no momento da condenação.

Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra

 
I. RELATÓRIO


No Tribunal Judicial da comarca de São Pedro do Sul foram submetidos a julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, os arguidos A... e B..., ambos com os demais sinais nos autos, a quem era imputada a prática:
- A ambos os arguidos, um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 204º, nº 2, e), por referência ao art. 202º, e), do C. Penal, e um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 22º, nºs 1 e 2, a), e 204º, nº 2, e), por referência ao art. 202º, e), do C. Penal;
- Ao arguido, um crime de falsidade de depoimento ou declaração, p. e p. pelo art. 359º, nº 2, do C. Penal;
- Incorrendo ainda o arguido em condenação em pena relativamente indeterminada, nos termos do art. 83º, nº 1, do C. Penal; 
- À arguida, um crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo art. 360º, nº 1, do C. Penal, e um crime de favorecimento pessoal, p. e p. pelo art. 367º, nº 2, do C. Penal.

Na audiência de julgamento foi comunicada aos arguidos uma alteração da qualificação jurídica relativamente ao acusado crime de furto qualificado na forma tentada, que passou a ser qualificado como crime de furto qualificado consumado. 

Por acórdão de 16 de Maio de 2013 foram os arguidos absolvidos da prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº 1 e 204º, nº 2, e), do C. Penal.
Foi o arguido condenado, pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº 1 e 204º, nº 2, e), do C. Penal, na pena relativamente indeterminada correspondente ao mínimo de 2 anos de prisão e ao máximo de 9 anos de prisão, pela prática de um crime de falsas declarações, p. e p. pelo art. 359º, nº 2, do C. Penal, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão, e em cúmulo, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão a cumprir sucessiva e autonomamente com a pena relativamente indeterminada de mínimo de 2 anos de prisão e de máximo de 9 anos de prisão.
Foi a arguida condenada, pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº 1 e 204º, nº 2, e), do C. Penal, na pena de 2 anos e 8 meses de prisão, pela prática de um crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo art. 360º, nº 1, do C. Penal, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão e, em cúmulo, na pena única de 3 anos de prisão.

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            Inconformado com a decisão, recorreu o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões:
            “ (…).
            1º. O arguido cometeu um crime de furto qualificado na forma tentada e não na forma consumada como considerou o tribunal "a quo".
2º. Considera o recorrente incorretamente julgado o facto de ter feito seus os bens retirados da habitação e consequentemente se ter apropriado de bens alheios, sendo esse elemento do tipo de crime pelo qual se mostrou acusado, uma vez que os bens foram recuperados tal como confirmado pelas testemunhas e pelo ofendido.
3º. O arguido decidiu cometer um crime de furto, que não chegou a consumar-se, tendo praticado sim, um conjunto de atos de execução, designadamente ter deslocado os objetos para um terreno vizinho, que são idóneos a produzir o resultado típico, a subtração de coisa móvel.
4º. De harmonia com o disposto no art.º 22.º n.º 2 alínea a) os atas praticados pelo arguido são de execução e constituem – em relação ao crime de furto – uma tentativa; o arguido praticou aqueles atos de execução do crime que decidira cometer sem este se consumar.
5º. Apenas foi criado um perigo para os bens. Em bom rigor, o perigo sofrido pelos bens jurídicos protegidos é aqui relativo, o que se coaduna com a natureza tentada da correspondente infração.
6º. Não foi o ofendido lesado no seu património, uma vez que todos os bens foram recuperados e restituídos à situação em que se encontravam antes da intervenção do arguido.
7º. Ao ora recorrente deve ser aplicada uma pena concreta mais próxima do limite mínimo da moldura penal prevista no art.º 204º nº 2 CP, especialmente atenuada em consequência dos artigos 22º, 23º, 72º e 73º CP.
                Nestes termos e, sobretudo, nos que serão objeto do douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento ao recurso, revogada a decisão recorrida E SER APLICADA AO ARGUIDO UMA PENA EM CONFORMIDADE COM O CRIME PRATICADO, COM O QUE VªS. ExªS FARÃO COMO SEMPRE JUSTIÇA.
            (…)”.

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            Respondeu ao recurso o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões:
            “ (…).
            1. Como o recorrente não sindicou a matéria de facto dada como assente na douta decisão recorrida nem se verifica nenhum dos vícios previstos no artº 410, nº 2, do Código de Processo Penal, deve ter-se por definitivamente assente essa matéria de facto.
2. Ora, na decisão recorrida deu-se como assente que o recorrente fez seus os bens que retirou da residência do ofendido, pelo que estamos perante um crime de furto qualificado consumado e não tentado.
3. Para além disso, afigura-se-nos líquido que a conduta do recorrente integra a prática de uma infracção consumada e não meramente tentada.
4. Com efeito, depois de penetrar na residência do ofendido, o recorrente retirou do seu interior diversos artigos e transportou-os para um terreno sito a cerca de 50 metros da mesma, para depois os colocar num veículo automóvel onde a co-arguida se encontrava à sua espera.
5. Ao assim proceder, o recorrente retirou por completo da esfera de disponibilidade do ofendido os bens em causa e passou-os para a sua, o que implica a consumação do furto.
6. Na realidade, para que o crime de furto se consume basta a transferência da disponibilidade da coisa do seu titular legítimo para o agente, não sendo necessário que este último detenha a coisa de forma pacífica ou em tranquilidade ou sossego.
7. Este tem sido claramente o entendimento maioritário da nossa doutrina e da nossa jurisprudência, como se pode constatar no recente Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 06 de Fevereiro de 2013, processo n°. 623/12.sPPPRT.P1, consultado no sítio da D.G.S.I.
8. Pelo exposto, afigura-se-nos líquido que os factos pelos quais o arguido veio a ser condenado integram a prática de um crime de furto qualificado, sob a forma consumada e não sob a forma tentada.
9. O raciocínio que conduziu à pena concreta aplicada ao recorrente encontra-se correctamente desenvolvido na douta decisão recorrida e não nos oferece qualquer censura, sendo de realçar o vasto rol de antecedentes criminais do recorrente.
TERMOS EM QUE, E NOS QUAIS V.AS EX.AS SUPERIORMENTE SUPRIRÃO, DEVERÁ O RECURSO INERPOSTO PELO RECORRENTE A (...) NÃO MERECER PROVIMENTO, DEVENDO A DOUTA DECISÃO RECORRIDA SER CONFIRMADA E MANTIDA NA ÍNTEGRA, ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA.
(…)”.
 
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            Igualmente inconformada com a decisão, recorreu a arguida, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões:
            “ (…).
            1 – Entende a recorrente que quanto à matéria de facto, foram incorrectamente julgados os pontos 1; 2; 4 e 19 da Matéria de Facto Provada constante do douto acórdão,
                quanto ao ponto 1 no que se refere às expressões "…no cumprimento do acordo prévio firmado entre ambos, dirigiram-se … a uma casa de habitação sita na Rua (...)em (...), … com o propósito de a assaltar";
                quanto ao ponto 2 às expressões, "ali chegados ... " e a partir de "… enquanto a arguida se manteve no interior do veiculo x (...), nas proximidades do referido local …" até final;
quanto ao ponto 4 na referência " … onde se encontrava a arguida à sua espera"
e quanto ao ponto 19 em todas as referências que faz à recorrente.
2 – discordância da recorrente que não se baseia nas "concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida", (artigo 412° n.º 3 do CP.P.) mas na total e absoluta ausência de provas que justifiquem se dê como provada esta matéria e fundamentem a condenação da recorrente por este crime,
3 – o que isenta a recorrente de indicar as concretas passagens dos depoimentos que impõem decisão diversa, porquanto o que se questiona, quanto à matéria de facto, é que a convicção expressa pelo Tribunal "a quo" não tem suporte razoável e bastante em toda a prova produzida, e o que se questiona são os limites do principio da livre apreciação da prova.
4 – A alegada prova indiciária da comparticipação dos arguidos para que remete o Tribunal "a quo" de página 13 a páginas 16 do douto acórdão não é de "per si", suficiente para dar como provados os factos supra impugnados, impondo-se assim que se dêem como não provados e que a recorrente seja absolvida deste crime.
5 – Os indícios probatórios da alegada comparticipação são tão desligados dos factos em si (a ausência de trabalho certo e regular da arguida e relacionamento pessoal próximo entre os arguidos e os antecedentes criminais da recorrente) sendo o único facto concreto e relacionado directamente com os acontecimentos desse dia o aparecimento da recorrente no local, após o furto, que, ainda que numa visão alargada e ampla do principio da livre apreciação da prova, não constituem base suficiente para sustentar o raciocínio lógico – dedutivo formulado pelo Tribunal "a quo" no sentido de concluir pela comparticipação da recorrente no crime de furto.
6 – Tendo no ponto 3 dos factos provados o Tribunal "a quo" dado como provado que o arguido A (...) retirou e levou consigo os objectos " … com o intuito de os levar para parte incerta, assim os fazendo seus …" facto ou matéria contraditória com a dada como provada no ponto 19, impõe-se se dê como não provado o ponto 19 quanto às referências à recorrente e concluir pela absolvição da recorrente.
Foram violados, entre outros, os artigos 127º do C.P.P. e  204°, n.º 2 alínea e) do C.P.
Termos em que julgando procedente por provado o presente recurso e absolvendo-se a recorrente do crime de furto qualificado farão V.as Ex.as a costumada justiça.
(…)”.

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            Respondeu ao recurso o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões:
            “ (…).
            1. A reapreciação da matéria de facto não é um novo julgamento que incida sobre a totalidade da decisão, mas uma reavaliação dos pontos concretos da matéria de facto que sejam indicados, pelo que o recorrente tem o ónus de os especificar com clareza e de mencionar quais as provas que impõem decisão diversa da recorrida, por referência aos suportes técnicos.
2. Por este motivo, para impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto, e para que a decisão recorrida seja nessa matéria modificável nos termos do disposto na alínea b) do artigo 431.° do Código de Processo Penal, os n.ºs 3 e 4 do artigo 412.° do mesmo diploma impõem ao recorrente um ónus de especificação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e das concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida (ou aquelas que devem ser renovadas).
3. Este dever legal não tem natureza puramente formal, nele se concretizando a finalidade de permitir ao recorrente apontar ao Tribunal ad quem o que na sua perspectiva foi mal julgado e oferecer uma proposta de correcção para que o órgão judiciário a possa avaliar;
4. Pelo que o seu incumprimento tem a importante consequência jurídica de impossibilitar o conhecimento da matéria de facto por parte do tribunal superior e acarretar a rejeição do recurso por manifesta improcedência.
5. Ora, a recorrente, na sua manifestação de discordância quanto ao entendimento alcançado pelo Tribunal a quo quanto à substância fáctica do acórdão recorrido, não indica as provas concretas que devem ser renovadas ou que impunham decisão diversa da recorrida, optando sempre por uma formulação genérica que culmina numa discordância quanto à decisão recorrida.
6. Consequentemente deverão V.ªs Ex.ªs ter tal impugnação como manifestamente improcedente.
7. Não obstante, mesmo que assim não se entenda, não assiste ainda razão à recorrente na sua pretensão, uma vez que o princípio da livre apreciação da prova (art. 127º do C.P.P.) e o dever de fundamentação estão intimamente conexionados, na medida em que a circunstância de, em regra, valer a convicção íntima do julgador na valoração da prova não o libera, antes o obriga, a justificar-se.
8. Não se trata, pois, de plasmar a arbitrariedade ou a pura subjectividade na valoração da prova, aliás objecto de motivação lógica e objectiva, mas de tornar sindicável a livre convicção formada pelo julgador, alicerçada nas regras de experiência comum, quando respeitadora das normas de prova vinculada.
9. O recurso não serve, ou não deve servir, por isso, para fazer vencer as teses nascidas de convicções interiores do Recorrente, não coincidentes com o que foi a convicção do Tribunal a quo, ou para afirmar apreciações genéricas sobre a apreciação da prova, sem lograr pôr objectivamente em crise a decisão recorrida, apontando-lhe a violação dos passos objectivos que levaram à decisão sobre a matéria de facto, seja porque tais dados não existem, resultaram de violação das regras de aquisição dos mesmos ou porque não houve liberdade na formação da convicção.
10. No caso em apreço, o Tribunal a quo iniciou a fundamentação fáctica enunciando os meios de prova determinantes para a formação da convicção do Tribunal, percorrendo-os, de acordo com os factos que no seu entender permitiam dar como assentes.
11. E serviu-se, na sua análise da prova, de factos instrumentais, e das regras da experiência comum, o que explanou de modo convincente.
12. A versão que a recorrente e o co-arguido apresentaram ao Tribunal foi frontal e flagrantemente desmentida pela generalidade dos elementos de prova produzidos que apontam, outrossim, de forma evidente, no sentido de a recorrente ter participado no assalto à residência do ofendido, cabendo-lhe a ela a condução do veículo automóvel e a vigilância no exterior da residência.
                13. Isso é demonstrado pelo facto de a recorrente, de forma espontânea, ter comparecido naquele local pouco tempo depois da intercepção do co-arguido, conduzindo o veículo automóvel em causa e ter identificado o co-arguido como sendo um seu filho chamado E (...), numa clara tentativa de o ilibar daquela situação, sem apresentar qualquer explicação válida para o efeito.
14. Em suma, afigura-se-nos que a matéria de facto dada como provada e não provada na decisão recorrida resulta de uma correcta e ponderada análise de todos os elementos de prova produzidos e não merece qualquer censura.
TERMOS EM QUE, E NOS QUAIS V.AS EX.AS SUPERIORMENTE SUPRIRÃO, DEVERÁ O RECURSO INERPOSTO PELA RECORRENTE B (...) NÃO MERECER PROVIMENTO, DEVENDO A DOUTA DECISÃO RECORRIDA SER CONFIRMADA E MANTIDA NA ÍNTEGRA, ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA.
            (…)”.

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Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, acompanhando a posição do Ministério Público junto da 1ª instância, e concluiu pela improcedência de ambos os recursos.

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            Foi cumprido o art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal.
 
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

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II. FUNDAMENTAÇÃO


            Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. As conclusões constituem pois, o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.
            Assim, atentas as conclusões formuladas pelos recorrentes, as questões a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, são:
           
A) Recurso da arguida B... 
- A contradição entre os pontos 3 e 19 dos factos provados;
- A incorrecta decisão sobre a matéria de facto [pontos 1, 2, 4 e 19 dos factos provados] e consequente absolvição pela prática do crime de furto qualificado.

B) Recurso do arguido A (...)
            - A incorrecta qualificação jurídica dos factos;
            - As incorrectas escolha e medida da pena quanto ao crime de furto.    
             
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            Para a resolução destas questões, importa ter presente o que, de relevante, consta do acórdão recorrido. Assim:

            A) Nele foram considerados provados os seguintes factos:
            “ (…).
            1. No dia 21 de Abril de 2007, cerca das 05horas, os arguidos, que ao tempo viviam numa casa de turismo rural sita na Fraguinha – São Pedro do Sul, no cumprimento do acordo prévio firmado entre ambos, dirigiram-se no interior de um veículo automóvel de matrícula x (...), conduzido pela arguida, a uma casa de habitação sita na Rua (...) em (...), freguesia e concelho de São Pedro do Sul, pertença de C (...), com o propósito de a assaltar.
2. Ali chegados, o arguido deslocou-se sozinho para a dita residência, enquanto a arguida se manteve no interior do veículo x (...), nas proximidades do referido local, à espera do arguido com o intuito de posteriormente o transportar com os objectos que viesse a retirar do interior da dita habitação, mantendo-se vigilante e alertando se necessário fosse.
3. Entretanto o arguido aproximou-se de uma janela da cozinha daquela habitação, que dava acesso ao interior da mesma, e que se encontrava a uma distância do solo de cerca de 1,20 metros, e, em acto contínuo, alcandorou-se à mesma, assim penetrando no interior da dita habitação tendo de seguida retirado e levado consigo, com o intuito de os levar para parte incerta, assim os fazendo seus, os seguintes objectos pertença daquele C (...), no valor total não inferior a €1.693:
- um computador portátil de marca Fujitsu Siemens, com o n.º de série YK3T075845, bem como uma mala de computador de cor preta que tinha no seu interior diversos CD´s e DVD´s respeitantes à instalação de programas naquele computador, um carregador de bateria daquele computador, um rato óptico de marca Microsoft, um porta chaves com 4 chaves do cine teatro e quatro pilhas de marca Panasonic, tudo no valor de €1300;
- uma carteira pessoal em cabedal de cor preta, no valor de €10,00 contendo no seu interior os seguintes documentos: dois cartões de utente, quatro cartões da segurança social, um cartão da firma “multiopticas”, dois cartões de contribuinte, um cartão do “Intermarchê”, um cartão de eleitor e um cartão da “Vodafone”.
- uma máquina fotográfica de marca “Sony”, modelo “Cybershot”, de cor preta, no valor de €300,00;
- um isqueiro de cor preta, €1,00;
- um leitor de cartões de memória que tinha no seu interior um cartão Smart Media com 128 MB e um cabo USB, no valor de €60,00;
- dois porta chaves da Caixa de Crédito Agrícola, sem valor comercial;
- uma agenda com dados de contactos, sem valor comercial;
- um cheque da Caixa de Crédito Agrícola com o n.º 3843706296, sem valor comercial;
- um manual de um equalizador de som, sem valor comercial;
- uma bateria de telemóvel marca “Nokia”, sem valor comercial;
- um CD com capa do Grupo  de Cantares de Manhouce, no valor de €15,00;
- uma bolsa de transporte de CD`s de cor preta contendo 16 CD e 2 DVD, no valor de €7,00.
4. Ressalvados os referidos documentos que abandonou no terreno vizinho da residência assaltada, o arguido levou consigo os restantes objectos para um terreno agrícola situado a cerca de 50 metros daquela casa de habitação do referido C (...), aí os depositando para posteriormente os transportar para o veículo com o n.º de matrícula x (...), onde se encontrava a arguida à sua espera.
5. Contudo, como G..., que pernoitava com a família na sua residência, se apercebesse de uma luz acesa da cozinha e da sala da habitação bem assim da presença de um estranho na sua habitação, logo entrou em contacto com as autoridades policiais.
6. Perante o referido contacto, C (...), H...e I..., militares da GNR a prestar serviço no posto territorial da GNR em São Pedro do Sul, deslocaram-se à habitação supra referida daquele C (...) e avistaram o arguido nas imediações daquela habitação.
7. Ao abordarem o arguido, aquele inicialmente negou a prática dos factos, afirmando que ali se encontrava para apanhar “limões”.
8. Contudo, confrontado com os indícios que apontavam para que o mesmo houvesse entrado ilicitamente naquela habitação e dali retirado objectos, o arguido acabou por confessar os factos e identificou-se como “ E (...)”.
9. Entretanto, encontrando-se o arguido com os militares da GNR e o ofendido C (...) na rua, junto da casa deste, surge a arguida sozinha ao volante da dita viatura, imobilizando-a e dizendo aos militares que o arguido era seu filho. 
10. Uma vez que o arguido não era portador de qualquer documento de identificação, foi o mesmo identificado pela arguida B (...), que afirmou ser mãe do arguido e que identificou o arguido como sendo E (...), filho de F (...)e de B (...), natural da Freguesia de (...), Aveiro, nascido a 22/05/1980, desempregado, residente na (...)Aveiro, tudo conforme auto de identificação de fls.82 que aqui se dá por inteiramente reproduzido.
11. Uma vez que o arguido não se fazia acompanhar por qualquer documento identificativo, aqueles militares da GNR assumiram como verdadeiros aqueles elementos identificativos indicados pela arguida, elementos esses corroborados pelo arguido e, consequentemente, o militar H... fez constar do auto de identificação constante de fls. 82, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido, os elementos de identificação supra referidos na convicção de que os mesmos correspondiam à verdade, sendo que a arguida atestou tal identificação através da assinatura do auto de identificação constante de fls. 82, ao mesmo tempo que o arguido assinou o referido auto como “ E (...)”.
12. Dos factos anteriormente descritos foi lavrado o auto de notícia de fls.78 a 79, o arguido constituído nessa qualidade, sob a advertência de que devia responder com verdade às perguntas sobre a sua identidade, tendo prestado termo de identidade e residência, tudo conforme termos de fls.83 e 89 que aqui se dão por inteiramente reproduzidos.
13. Todavia, não obstante devidamente ciente da obrigação que se lhe impunha de falar com verdade relativamente à sua identidade, o arguido identificou-se nesses actos como filho da arguida “ E (...)”, assinando com o mesmo nome.
14. Após, nesse mesmo dia 21 de Abril de 2007, pelas 7h20m, inquirida como testemunha naquele Inquérito nº115/07.4GASPS, tendo-lhe sido perguntado se tinha alguma relação de parentesco ou afinidade com o arguido, a arguida afirmou “ser mãe do arguido”.
15. Informada de que tinha a faculdade de se recusar a prestar depoimento, sendo certo que caso pretendesse prestar depoimento ficaria obrigada a falar com verdade sob pena de incorrer em responsabilidade penal, a arguida respondeu “pretender prestar declarações”.
16. Perante perguntas feitas por aquele militar C (...) para esclarecimento dos factos constantes do auto de notícia de fls.78 e 79, pela arguida foi prestado o depoimento constante de fls. 89 e 89-v,cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido, afirmando, nomeadamente, “que se deslocou a este concelho, mais propriamente à localidade da Fraguinha acompanhada do seu filho E (...)(…)”, “que esporadicamente se desloca ao parque da Fraguinha, local onde pode descansar e passar alguns momentos de lazer, mas desta vez fê-lo pelo seu filho, (…)”, “que quando procurava o seu filho e arguido nos autos” e onde confirmou a identidade do arguido que havia indicado anteriormente aos referidos militares.
17. Contudo, bem sabia a arguida que o depoimento que prestava sobre a identidade do arguido em nada correspondia à verdade, posto que não se chamava E (...), nem era seu filho.
18. Contudo, em consequência dessa falsa identidade, ainda nesse dia o arguido foi restituído à liberdade.
19. Ao actuarem na forma sobredita os arguidos agiram em comunhão de esforços e de vontades nas circunstâncias de tempo e lugar acima descritas, bem sabendo e querendo fazer seus na forma sobredita os referidos objectos, apesar de saberem que o mesmos não lhes pertenciam e que ao apoderarem-se deles, tal como ao entrarem na referida casa de habitação, o faziam contra a vontade do legítimo dono, bem sabendo que não tinham qualquer direito sobre os mesmos.
20. O arguido sabia que transmitia dados de identificação relativos à sua pessoa que não correspondiam à realidade, que induzia em erro os referidos militares da GNR e sabia que estava obrigado a transmitir de forma verdadeira os dados relativos à sua identificação, mantendo o propósito de transmitir aquela identificação falsa apesar de este ter sido advertido de que estava obrigado na qualidade de arguido a responder com verdade às questões relativas à sua identidade perante autoridade competente.
21. A arguida agiu nas circunstâncias atrás descritas sabendo e querendo transmitir àqueles militares da GNR dados de identificação relativos à identificação do arguido A (...) que não correspondiam à realidade, assim como sabia que não tinha qualquer relação de parentesco ou afinidade com o mesmo e que ao assim actuar induzia em erro os referidos militares da GNR, apesar de estar ciente de que estava obrigada a falar com verdade durante a sua inquirição como testemunha, mas, não obstante isso, indicou factos no sobredito depoimento que sabia não corresponderem à realidade.
22. Ao identificar o arguido de forma não correspondente com a realidade, a arguida agiu sempre com intenção de induzir em erro aqueles militares da GNR, para que o mesmos não tivessem acesso à verdadeira identidade do arguido e, dessa forma, impedir que o arguido fosse responsabilizado criminalmente pelo assalto que acabara de cometer e fosse de imediato conduzido ao estabelecimento prisional para cumprimento de pena de prisão, visto que se encontrava evadido do estabelecimento prisional, facto que a arguida conhecia (evasão pela qual foi posteriormente condenado no PCS 1268/07./TAAVR, 2º Jz Criminal de Aveiro).
23. Agiram os arguidos, em todas as circunstâncias atrás descritas, livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
24. O arguido A (...) tem o 9º ano de escolaridade.
25. À data dos factos era toxidependente.
26. Quando foi preso encontrava-se desempregado.
27. O arguido A (...) tem as seguintes condenações constantes do CRC de fls.673-687 que aqui se dá por inteiramente reproduzido, transitadas em julgado, a saber:
1.-em 15-07-1997, foi condenado, por um crime de furto qualificado, cometido em 08-09-1986, na pena de 18 meses de prisão, suspensa na sua execução por 3 anos;
2.-em 09-02-1998, foi condenado, por um crime de furto qualificado, cometido em 13-03-1997, na pena de 8 meses de prisão;
3.- em 17-04-1998, foi condenado, por um crime de furto qualificado, cometido em 29-01-1997, na pena de 18 meses de prisão;
4.- em 17-05-1999, foi condenado, por um crime de furto qualificado, cometido em 29-12-1996, na pena de 7 meses de prisão;
5.- por sentença proferida no processo sumário 52/00 do 2.º Juízo de Ovar em 03-04-2000, foi condenado, por um crime de condução sem habilitação legal, cometido em 03-04-2000, na pena de 120 dias de multa, à razão diária de € 3,00, depois convertida em 80 dias de prisão;
6.- em 09-10-2000, foi condenado, por um crime de furto qualificado, cometido em 26-02-1997, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos (depois revogada tal suspensão);
7.- Por Acórdão proferido no âmbito do PCC n.º 13/01.5GBETR (ex-123/01), 1º Jz Estarreja, em 17-10-2001, foi condenado, por um crime de furto qualificado, cometido em data indeterminada, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão;
8.- por sentença proferida pelo 3.º Juízo de Instância Criminal da Comarca de Vila Nova de Gaia, no PCS nº 57/01.7GAVNG, no dia 24 de Março de 2003, já transitado em julgado, o arguido foi condenado, por factos praticados em 14 de Janeiro de 2001, como autor de um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 203º, nº1 e 204º, nº2, al. e), ambos do Código Penal, na pena de dois anos e seis meses de prisão;
9.-por Acórdão proferido no âmbito do PCC nº 992/06.6PEAVR, do Juízo de Média Instância Criminal de Aveiro, no dia 14 de Março de 2007, já transitado em julgado, o arguido foi condenado, por factos praticados em 31 de Maio de 2006 e 27 de Junho de 2006, como autor de dois crimes de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos art. 204.º, n.º 2, alínea e), do C.P., na penas parcelares de 3 anos de prisão por cada crime; em cúmulo foi condenado na pena única de 4 anos de prisão.
10.-por Acórdão proferido pelo Juízo de Média Instância Criminal de Aveiro, no PCC nº 178/07.2PBAVR, no dia 30 de Abril de 2008, já transitado em julgado, o arguido foi condenado, por factos praticados em 26 de Janeiro de 2007, como autor de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 204º, nº2, al. e) do Código Penal, na pena de três anos e três meses de prisão. 
11.-por Acórdão proferido pela 2.ª Vara Mista do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, no PCC nº 636/06.6GAVNG, no dia 28 de Maio de 2008, já transitado em julgado, o arguido foi condenado, por factos praticados em 20 de Junho de 2006, como autor material, na forma consumada e como reincidente, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 75.º, 706.º, 202.º, al. e), 203.º, n.º 1, e 204º, nº2, al. e) do Código Penal, na pena de quatro anos de prisão e dez meses de prisão. 
12.- por sentença proferida no PCS 1268/07./TAAVR, 2º Jz Criminal de Aveiro, em 16.06.2008, foi condenado, por crime de evasão, cometido até 12.04.2007, na pena de 14 meses de prisão.
13.-por sentença proferida pelo Juízo de Instância Criminal de Ovar, no PCS nº 28/06.6 GAOVR, no dia 17 de Junho de 2008, já transitado em julgado, o arguido foi condenado, como autor de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº1 e 204º, nº2, al. e), ambos do Código Penal, cometido em 19.08.2006, na pena de dois anos e seis meses de prisão, e por um crime de falsas declarações p. e p. pelo art.359º, nº2, do C.Penal, cometido em  19.08.2006, 4 meses de prisão; em cúmulo foi condenado na pena única de 2 anos e 8 meses de prisão.
14.-por Acórdão proferido no âmbito do PCC nº 521/07.4 PEAVR, do 1º Juízo de Média Instância Criminal, Aveiro, Comarca do Baixo Vouga, no dia 25 de Fevereiro de 2009, já transitado em julgado, o arguido foi condenado, por factos praticados em 22 de Março de 2007, como autor de um crime de roubo agravado, na forma consumada, p. e p. pelos art. 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), com referência ao art. 204.º, n.º 2, alínea e), do C.P., na pena de 4 anos e seis meses de prisão; e como autor de um crime de furto qualificado, nas forma consumada, com violência após a subtracção, p. e p. pelos arts. 30.º, 203º, 204º, nº2, al. e), 210.º 211.º todos do Código Penal, na pena de quatro anos de prisão.               
28. O arguido esteve privado da liberdade, à ordem daquele PCC n.º 13/01.5GBETR, a título de detenção, desde 18 de Janeiro de 2001 até 10 de Maio de 2001, data em que foi ligado ao processo sumário 52/00 do 2.º Juízo de Ovar para cumprimento de pena.
29. O arguido esteve ainda privado de liberdade, à ordem do mesmo processo, e a título de prisão preventiva, desde 30 de Julho de 2001 até 7 de Novembro de 2001, passando depois a cumprir pena, assim se mantendo até 8 de Outubro de 2003.
30. O arguido esteve privado de liberdade, em cumprimento de pena, à ordem do PCS supra referido com o n.º 57/01.7GAVNG, desde 8 de Janeiro de 2005 até 2 de Abril de 2006, data em que foi colocado em liberdade condicional, entretanto revogada.
31. O arguido encontrou-se privado de liberdade à ordem do PCC nº 521/07.4 PEAVR, desde o dia 22 de Março de 2007 até ao dia 1 de Junho de 2007, com excepção do período em compreendido entre 12 de Abril de 2007 e 25 de Abril de 2007 em que se manteve evadido.
32. O arguido encontrou-se privado de liberdade à ordem do PCC nº 992/06.6PEAVR, desde o dia 1 de Junho de 2007 até ao dia 11 de Maio de 2010.
33. O arguido encontra-se privado de liberdade à ordem do PCC nº 521/07.4PEAVR, desde o dia 11 de Maio de 2010 até à presente data, em cumprimento de pena, cujo término ocorre 1/04/2016.
34. Como facilmente se alcança do que ficou exposto, entre os dias 31 de Maio de 2006 e 22 de Março de 2007 o arguido praticou 6 crimes de furto qualificado, com condenação transitada em julgado.
35. Como facilmente se alcança do que ficou exposto, entre a prática do crime de furto qualificado praticado pelo arguido nos dia 21 de Janeiro de 2001, os supra mencionados e aqueles objectos dos presentes autos, descontado o tempo de detenção e prisão que o arguido efectivamente cumpriu, medeiam menos de cinco anos.
36. Atentos os seus antecedentes criminais e modo de vida, o arguido revela  acentuada propensão para a prática de crimes especialmente contra o património, bem patente na circunstância de nos últimos anos ter vindo sucessivamente a cometer crimes deste género, não conhecendo outra forma de vida.
37. Antes da ocorrência dos factos objectos destes autos, o arguido já tinha sido condenado por diversas vezes pela prática, para além do mais, de crimes contra o património, em penas de diversa natureza, nomeadamente de multa e de prisão.
38. As condenações anteriores sofridas pelo arguido não foram suficientes para o afastar da criminalidade e conseguir a sua recuperação social, dado que este se mostrou totalmente insensível à advertência ínsita nessas condenações, revelando que as penas de prisão anteriormente aplicadas não produziram os seus efeitos preventivos de ressocialização, de reintegração na comunidade e como forma de prevenção da prática de novos crimes, continuando este arguido a revelar no presente uma acentuada propensão para a prática de crimes contra o património.
39. Apesar do arguido apenas ter permanecido em liberdade condicional no curto período de 02 de Abril de 2006 até ao dia 22 de Março de 2007, altura em que voltou a estar preso, o arguido cometeu, para além de outros crimes de diferente natureza, 6 crimes de furto qualificado,
40. O arguido esteve ainda em liberdade entre 12/04/2007 e 25 /04/2007 por se ter evadido, altura em que praticou os crimes aqui imputados.
41. O arguido revela, no passado e presente, uma acentuada inclinação para a prática dos crimes.
                42. A arguida frequentou curso de marketing e publicidade.
43. Presa desde Dezembro de 2011, ao tempo prestava, às empresas que lho solicitassem, serviços de formação profissional na área comercial.
44. A arguida B... tem as seguintes condenações constantes do CRC de fls.688-694 que aqui se dá por inteiramente reproduzido, transitadas em julgado, a saber:
1 - no PCC 318/99 do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, onde foi condenada, por acórdão de 03.05.2000, pela prática do crime de burla agravada, por factos ocorridos em 27.08.1997, na pena de 2 anos e oito meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 3 anos; em 31.03.2005 (já com o processo rebaptizado para 1793/99.1 TBAVR) foi decidido prorrogar tal período de suspensão por mais um ano e meio; em 09.01.2006 foi declarada extinta a pena;
2 - no PCC 74/02.0GBAND do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Anadia, onde foi condenada, por acórdão de 08.07.2004, pela prática dos crimes de falsificação de documento, furto simples e falsidade de depoimento e receptação, por factos ocorridos em 11.01.2001, na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão efectiva; em 23.02.2005 foi-lhe concedida a liberdade definitiva reportada à data do fim da pena em 16.01.2005;
3 - no PCC 3136/05.8TAMTS do 4º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Matosinhos, onde foi condenada, por acórdão de 13.11.2006, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, por factos ocorridos em 16.10.2005, na pena de 1 ano e 2 meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 2 anos; em 04.12.2008 foi declarada extinta a pena.
4 - no PCC 232/07.0JAAVR, da Comarca de Baixo Vouga (Vagos – Juízo de Média Instancia Criminal), foi condenada por acórdão de 25.11.2009, pela prática de um crime de roubo cometido em 6.07.2007, na pena de 3 anos de prisão.
5 - no PCS 79/08.7PCFAR, 1º Jz criminal de Faro, foi condenada por sentença 13.12.2010, pela prática de um crime de abuso de confiança cometido em 23.06.2008, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão suspensa sob condição de indemnizar a ofendida.
(…)”.

B) Nele foram considerados não provados os seguintes factos:
“ (…).
            a) no dia 16 de Abril de 2007, entre as 13H00 e as 20H30, os arguidos, no cumprimento do acordo prévio firmado entre ambos, dirigiram-se a uma casa de habitação sita no lugar de (...), concelho de São Pedro do Sul, pertença de P..., com o propósito de a assaltar;
b) ali chegados, os arguidos aproximaram-se de uma janela do escritório situada nas traseiras daquela habitação, que se encontra a uma distância do solo não concretamente apurada, mas superior a 1 metro, e, em acto contínuo, alcandoraram-se à mesma, assim penetrando no interior da habitação.
c) após, os arguidos retiraram e levaram consigo objectos pertença da dita P (...);
d) na noite de 20 para 21.04.2007 a arguida deixou o arguido na Rua Serpa Pinto, São Pedro do Sul, e seguiu para Viseu com a testemunha D (...), tendo combinado encontrar-se com o primeiro cerca das 4.30 horas no local onde o deixara;
e) nessa noite a arguida tentou, sem sucesso, contactar o arguido, através do telemóvel, tendo permanecido, à sua espera, no lugar combinado;
f) passados cerca de 15 minutos a arguida recebeu uma chamada no seu telemóvel, de um numero desconhecido, pedindo-lhe o arguido que se fosse encontrar com ele; junto da patrulha, o arguido pediu à arguida que o identificasse como seu filho, 
g) ao identificar o arguido como seu filho, a arguida não tinha consciência da ilicitude criminal desse acto e não teve intenção de iludir a actividade probatória;
h) a arguida possui licenciatura em economia;
i) quando foi presa residia com a sua mãe que se encontrava e encontra acamada, provendo a arguida às despesas necessárias ao seu quotidiano.
(…)”.

C) Dele consta a seguinte motivação de facto:
            “ (…).
            Quanto às condições de vida dos arguidos o tribunal baseou-se nas declarações dos próprios a esse respeito conjugadas com o teor das certidões de outras condenações dos mesmos arguidos.
Já sobre a autoria dos factos típicos, tendo os arguidos negado qualquer participação no assalto do dia 16 de Abril de 2007 na residência de P (...), nenhuma outra prova foi produzida a esse respeito que lhes permita imputar tal incriminação.
Quanto ao outro assalto, praticado na madrugada do dia 21.04.2007 na residência de C (...), cuja autoria a arguida também negou, o tribunal formou convicção desde logo a partir da confissão parcial do arguido A (...).
Com efeito, nesta parte, ressalvado o meio como conseguiu entrar na residência e a comparticipação da arguida, no mais o arguido confessou no essencial os factos que acima lhe são imputados.
Assim, encontrando-se evadido ao tempo dos factos, mais explicou de forma circunstanciada o modo como cometeu o assalto, descrevendo a sua dinâmica e respectivas circunstâncias de tempo e lugar, bem como os objectos subtraídos que deixou nos terrenos vizinhos onde foram encontrados e apreendidos, tudo nos moldes que relatou e descritos na factualidade provada.
Confirmou ter sido a arguida que na noite em causa o transportou na viatura dela para São Pedro do Sul, acabando por deixá-lo na cidade, como relatou, vivendo nesses dias com ela, o que foi corroborado pela própria.
Mas, se o arguido convenceu nesta parte e ainda que, como referiu, se tivesse deslocado sozinho para a residência assaltada, onde entrou, já não conseguiu persuadir quanto ao alegado desconhecimento do assalto pela arguida.
Como não convenceu quanto ao modo como disse ter entrado na habitação, afirmando tê-lo feito pela porta exterior da cozinha (fechada apenas no trinco).
Relativamente ao modo como o assaltante entrou na casa depôs convincentemente o ofendido, como adiante se descreverá.
Já a respeito da comparticipação dos arguidos temos a prova indiciária baseada na ausência de trabalho certo e regular de ambos ao tempo dos factos, os seus antecedentes criminais, o relacionamento pessoal próximo entre si, confirmado pelo arguido e verso da foto de fls.51, e as circunstâncias em que a arguida apareceu no local instantes depois do arguido ser interceptado, confessando ambos que nessa noite se faziam transportar no carro que ela conduzia.
Ora, sendo a prática de furtos congruente com o modo de vida e os antecedentes criminais da arguida, não tendo ela explicado de forma convincente o seu inusitado aparecimento no local do assalto, instantes depois da sua ocorrência, deslocando-se ambos na identificada viatura da arguida, temos reunidos elementos que tornam fortemente verosímil a prática concertada deste assalto por parte dos dois arguidos.
De resto, à luz da experiência comum, é bastante plausível no referido contexto que aquando do assalto a arguida aguardasse, ali próxima, dentro do carro para vigiar o exterior e depois arrancarem rapidamente com os objectos subtraídos pelo A (...).
Conjugados todos estes factores, em especial a proximidade temporal dessa inusitada aparição da arguida com a ocorrência, a falta de qualquer explicação para o efeito e a circunstância de se fazerem acompanhar nessa noite, temos reunidos elementos que na sua interligação com as regras da experiência permitem concluir para além de qualquer dúvida razoável terem estes dois arguidos participado no assalto em referência.
Conjugadas estas corroborações periféricas objectivas, à luz das regras da experiência e da lógica, temos demonstrada a verosimilhança da incriminação, sem que desta convicção baseada na conjugação de vários elementos de prova indirecta resulte sacrifício para o princípio do in dúbio pro reo [(1) Não é uma qualquer dúvida em matéria de facto que obriga à aplicação deste princípio, mas apenas a dúvida “razoável”, após a produção de todas as provas e sua avaliação de acordo com a lei e as regras da experiência comum. Se após a ponderação da prova – toda a prova – o julgador se convenceu, com base numa análise objectiva e racional, de acordo com os critérios legais e doutrinais de valoração da prova sem que no seu espírito se tenha instalado a dúvida consistente ou razoável, não se verifica a violação de tal princípio], tanto mais que durante a discussão da causa não surgiu qualquer outra hipótese plausível que pudesse levar a conclusão diversa.
As circunstâncias concretas em que a arguida surge no local do assalto, durante aquela madrugada, são de molde a confirmar, na base de uma análise racional e crítica, a inferência ou conclusão segura da imputação a estes dois arguidos da autoria do crime de furto cometido no interior desta residência.
Tanto mais que os arguidos apresentaram versões contraditórias entre si quanto à explicação aventada por ambos para a sua presença em São Pedro do Sul naquela data.
Prosseguindo, o arguido acrescentou que após ter sido surpreendido, nas imediações da casa assaltada, pelos militares da GNR que o abordaram, negando inicialmente o cometimento do assalto, acabou minutos depois por confessá-lo e indicar o lugar onde deixara os objectos subtraídos.
Todavia, disse, não era portador de qualquer documento de identificação e identificou-se como “ E (...)”, vindo depois a ser identificado pela arguida nos termos descritos e conforme auto de identificação de fls.82, circunstância corroborada pela própria, tendo o arguido confessado a assinatura por si aposta no auto e termo de fls. 83 e 89, ciente da obrigação que se lhe impunha de falar com verdade, como ali se diz, relativamente à sua identidade.
Já a arguida, que prestou declarações no final do julgamento, quis convencer – como referiu – não saber da evasão do arguido A (...) ao tempo dos factos, o que nenhuma credibilidade merece já que afirmou saber da situação prisional do mesmo, tanto mais que, conforme cartão de fls.51, o visitou algumas vezes enquanto preso designadamente entre Fevereiro e Março de 2007 e, portanto, data próxima da evasão.
Afirmou ter aparecido no local do assalto porque nessa noite tinha ido com a testemunha D...para uma discoteca de Viseu e, durante a madrugada, recebeu um telefonema de um número anónimo, de alguém que se identificou como militar da GNR, dizendo-lhe que o seu filho tinha sido detido, razão pela qual foi ter com eles.
Contudo, o ofendido C (...), 48 anos, e as testemunhas J..., 38 anos, H..., 39 anos, I..., 35 anos, e G (...), 37 anos, estes militares da GNR que nessa madrugada se deslocaram para o local imediatamente após a comunicação da ocorrência, negaram ter havido qualquer telefonema para a arguida, explicando a forma espontânea e inesperada como esta se movimentava e surgiu no local à referida hora, dizendo que era mãe do arguido.
Acrescentaram todos eles que em momento algum os arguidos tiveram oportunidade de contactar entre si de modo a que, explicaram, o arguido pudesse pedir à arguida para o identificar como seu filho E (...).
Mais descreveram o modo e circunstâncias em que o arguido ali foi encontrado, logo dizendo chamar-se E (...) e que a namorada (e não sua mãe) o vinha buscar de carro pois estaria ali por perto, surgindo depois a arguida que o identificou, na ausência de qualquer documento de identificação, conforme auto de identificação de fls.82.
Confirmaram ainda a localização dos bens subtraídos dessa casa e posteriormente recuperados e apreendidos.
A testemunha, ofendido C (...), mais relatou as circunstâncias em que se apercebeu da movimentação de alguém no interior da sua casa, logo telefonando para a GNR.
Explicou ainda que nesse momento verificou que a porta da cozinha estava fechada por dentro com corrente, ao invés da janela, cuja altura descreveu, que se encontrava aberta, a revelar que o acesso ao interior foi efectuado por esta abertura, tanto mais que quando se deitou estava fechada.
A testemunha D (...) 39 anos, que revelou conhecer a arguida, desmentiu a versão desta, negando ter estado com ela naquela noite designadamente em Viseu.
No tocante aos elementos subjectivos dos crimes, a par da confissão dos arguidos, foram consideradas as regras da experiência comum em face do contexto e condições em que os factos foram praticados e da actuação do agente, alicerçando-se ainda a consciência da ilicitude da arguida quanto à falsidade do depoimento, com favorecimento pessoal, na circunstância de anteriormente, por diversas vezes, já ter sido constituída como arguida e, aliás, condenada por crime de falsidade de depoimento.
Por fim, o tribunal assentou ainda a sua convicção no exame em audiência do auto de noticia de fls.78-9 (exclusivamente quanto aos dados ali referidos como directa e objectivamente percepcionados pelo autuante), do cartão de visita e foto de fls.51, termo de entrega de detido de fls.69-70, auto de identificação de fls.82, termos de fls.83-4, auto de apreensão de fls.85, auto de reconhecimento e exame/avaliação de objectos de fls.86-7, auto de declarações de fls.89, print de registo automóvel de fls.90, relatório de inspecção e reportagem fotográfica de fls.91-9, certidões de fls.171-368, 372-380, 386-394, 428-501, 509-534, 539-547 e certificados de registo criminal de fls.673-694.
Quanto aos factos não provados a convicção do tribunal alicerçou-se na falta de consistência da prova sobre os mesmos produzida, em resultado, nomeadamente, de não terem sido carreados para os autos outros elementos probatórios credíveis e com força bastante para os sustentar.
O tribunal baseou ainda na análise critica e ausência de prova a este respeito nomeadamente testemunhal, já que os inquiridos revelaram nesta parte menor coerência, espontaneidade, segurança e consistência no seu testemunho, sendo certo que os documentos juntos tão pouco atestam por si só a matéria não provada.      
(…)”

D) A seguinte fundamentação de direito quanto aos crimes de furto:
“ (…).
Quanto ao furto na residência de C (...), na madrugada do dia 21 de Abril de 2007, resulta claro do elenco factual provado que nas circunstâncias descritas os arguidos, em concertação de esforços e intentos, assaltaram esta moradia, sita na Rua (...)em (...)- São Pedro do Sul, onde o arguido logrou entrar após ter escalado a janela da cozinha.
Uma vez no interior, concertado com a arguida, o arguido retirou, levou consigo e fez seus, como era propósito de ambos, diversos objectos que ali se encontravam, no valor total não inferior a €1.693.
Provado ficou também que em toda a relatada actuação os assaltantes agiram com consciência e vontade da factualidade descritiva do tipo legal em apreço, bem assim da sua qualificativa referente à penetração em espaço fechado mediante escalamento.
No mais, representando o tipo de ilícito em todos os seus contornos objectivos, os arguidos actuaram com intenção de conseguir o resultado típico.
Posto isto, a conduta dos arguidos enquadra inequivocamente a prática, sob a forma de co-autoria material, de um crime de furto qualificado, na forma consumada, previsto pelas disposições conjugadas dos artigos 202º, al. d), 203.°, n.° 1 e 204.°, nº 2, al. e), todos do Código Penal.
A questão da consumação deste crime impõe uma tomada de posição sobre o momento em que, do ponto de vista jurídico-penal, se deve considerar consumado o crime de furto, com particular relevância para a delimitação da tentativa, da desistência ou do arrependimento activo, e da legitima defesa.
Tal como sufragado por boa parte da jurisprudência e doutrina estamos em crer que, entre as posições jurídicas plausíveis (consumação instantânea no momento em que se verifica o acto material da tomada da coisa pelo agente; consumação só quando a coisa entra, de uma maneira minimamente estável, no domínio de facto do agente; ou consumação apenas quando esse domínio do facto possa exercer-se plenamente, com suficiente sossego), só a exigência de um mínimo de estabilidade na entrada da coisa no domínio de facto do agente permite encontrar, na multiplicidade das realidades fácticas integráveis no tipo incriminador, as soluções mais equilibradas e consentâneas com os diversos valores em que assentam as figuras da tentativa, da desistência ou do arrependimento activo, e da legitima defesa [(2) CFR. neste sentido STJ 1.03.2000, CJ, t.2, 212; Faria Costa in Comentário Conimbricense do Código Penal – Parte Especial, Tomo II, pg. 48 a 51 e Paulo Pinto de Albuquerque in C. Penal anotado, 2ª ed., anotação ao art. 203, pg.632].
Aplicando tal ensinamento ao caso concreto, considerando que durante a referida madrugada o arguido já tinha retirado os objectos do interior da habitação e deslocado os mesmos para os terrenos vizinhos, apenas ele sabendo onde os deixara, o crime de furto estava consumado. O domínio de facto conseguido pelo arguido sobre esses bens até à sua apreensão pela GNR pode reputar-se minimamente estável e consequentemente o crime consumado.
Já quanto ao assalto no dia 16 de Abril de 2007, na residência de P (...), nenhuma prova foi lograda quanto à autoria do mesmo por parte dos arguidos, razão pela qual se impõe a respectiva absolvição.
(…)”.

E) E a seguinte fundamentação de direito quanto à pena relativamente indeterminada e quanto à medida das penas, parcelares e única:
“ (…).
Da pena relativamente indeterminada: arguido A (...)
Como adiante se concluirá a pena aqui aplicada ao crime de furto será de prisão efectiva superior a 2 anos.
Como se alcança dos antecedentes criminais do arguido A (...), o mesmo foi, por diversas vezes, condenado em pesadas penas de prisão efectiva, superiores a 2 anos, pela prática de crimes contra o património, sem que alguma dessas condenações tivesse sido suficiente para o afastar do cometimento de novos crimes e conseguir a sua recuperação social.
Entre a prática de vários desses crimes e aquele que nos ocupa decorreram menos de 5 anos se descontado o tempo durante o qual esteve preso, não podendo olvidar-se que aquando do assalto aqui tratado o arguido estava evadido.
Os factos que praticou (objecto dos presentes autos) durante esse período de evasão, aliados ao seu modo de vida, sem inserção profissional e social equilibrada, revelam acentuada disposição para o cometimento de crimes.
É também o que ressalta da gravidade global dos factos cometidos, do conjunto dos seus antecedentes criminais, a clara insensibilidade às sucessivas condenações anteriores, a despreocupação em relação às consequências penais e reais dos seus actos, a ausência de projecto e expectativa de inserção profissional e social.
Em suma, revela uma personalidade com acentuada propensão, que ainda hoje se mantém, para a prática de crimes especialmente contra o património e conexos.
Estão, pois, verificados exclusivamente quanto ao crime de furto os pressupostos formais e materiais da pena relativamente indeterminada que vem imputada ao arguido A (...) (art.83º, nº1 e 3, do C. Penal), com o mínimo correspondente a 2/3 da pena de prisão que concretamente caberia ao crime cometido e o máximo correspondente a esta pena, acrescida de 6 anos – art.83º, nº2, do C. Penal.
2.4.2. Da Escolha e Medida Concreta da Pena
Quanto à escolha da pena principal (prisão ou multa) a aplicar aos arguidos pelos crimes de falsidade de declarações/testemunho, o tribunal deve, em abstracto, dar preferência a uma pena não privativa de liberdade nos termos do art.70º do C.Penal.
Contudo, o critério geral de escolha da pena radica exclusivamente em exigências de prevenção (geral e/ou especial), motivo pelo qual a pena não privativa da liberdade só deverá ser aplicada quando realize de forma adequada e suficiente essas finalidades, centrando-se, agora, a função da culpa na determinação da medida da pena. 
Não obstante se reconhecerem os efeitos perniciosos das penas privativas da liberdade, sobretudo quando de curta duração, no caso dos autos, em face da elevada taxa de comportamentos típicos semelhantes aos que nos ocupam, ninguém duvidará da imperiosa necessidade de lhes pôr termo de forma eficaz.
Acresce que, na hipótese aqui tratada, as necessidades de prevenção especial são de tal modo acentuadas que desvirtuam na pena de multa, ainda que cumprida fosse, qualquer prognose social favorável.
Isto porque é conhecida aos arguidos uma pluralidade de crimes de natureza vária, sem que nenhuma das condenações anteriores tivesse sido suficientemente dissuasora do cometimento de novos crimes.
A personalidade destes arguidos evidenciada nos factos e nos respectivos antecedentes criminais, associada à reiteração do seu comportamento delinquente, justifica o afastamento da pena pecuniária.
Em suma, deve ser aplicada a pena privativa da liberdade.
Quanto à medida concreta das penas de prisão aplicar aos arguidos, nos termos do art.71º do Código Penal, levar-se-á em consideração a culpa, mas também as necessidades de prevenção geral e especial que se fazem sentir e as demais circunstâncias atípicas que deponham a favor e contra os arguidos.
Por se reflectir na pena, através da culpa, antes de mais, há que considerar como factor de graduação daquela, a ilicitude típica que, no caso concreto, se afigura moderada no quadro da gravidade suposta pela moldura abstracta do crime de furto qualificado, sendo mais acentuada no crime de falsidade de declarações/testemunho.
Com efeito, o prejuízo efectivamente ocasionado à vítima do assalto não foi elevado e os objectos subtraídos foram imediatamente recuperados.
Contra os arguidos depõe a hora do assalto, durante a madrugada, quando o proprietário ali pernoitava, circunstância que cria eleva perturbação emocional.
Ainda quanto ao furto o modus operandi da actuação dos arguidos não denota particular sofisticação no quadro da acção suposta pelo tipo qualificado (escalamento), depondo contra os arguidos a actuação sob a forma de co-autoria.
Em qualquer dos crimes o dolo dos arguidos foi directo e intenso.
Os arguidos revelam uma personalidade fortemente censurável, como os factos e os seus antecedentes criminais o ilustram.
Não colaboraram para a descoberta da verdade, confessando apenas aquilo que facilmente podia ser demonstrado, a revelar falta de consciência critica relativamente aos factos em apreço.
Do percurso de vida dos arguidos sobressai, enquanto principal factor de risco, a dificuldade em aderir a um projecto construtivo, considerando os seus antecedentes criminais, ambos com cumprimento anterior de penas de prisão efectiva.
Avultando as exigências de prevenção geral no tocante ao tipo de crimes em apreço, também no plano da prevenção especial, atentos os respectivos antecedentes criminais, mostra-se necessária uma importante resposta punitiva que previna a prática de comportamentos da mesma natureza, fazendo-lhes sentir a antijuridicidade e gravidade das suas condutas.
Neste quadro impõe-se concluir que as penas concretas a fixar devem ter na moldura abstracta importante gradação relativamente ao seu limite mínimo.
Por tudo isto, temos por ajustada aos critérios do art.71º e às finalidades da punição:
a) o arguido A (...), pela prática do crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelo art. 204.º, n.º 2, al. e), do C. Penal, a pena de 3 (três) anos de prisão, punido com pena relativamente indeterminada a que correspondente o mínimo de 2 (dois) anos de prisão e o máximo de 9 (nove) anos de prisão;
b) a arguida B..., pela prática do crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelo art. 204.º, n.º 2, al. e), do C. Penal, a pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão;
c) o arguido A (...), pela prática do crime de falsas declarações, p. e p. pelo art.359.º, n.2, do C.Penal, na pena de 1(um) ano e 3(três) meses de prisão;
d) a arguida B..., pela prática do crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo art.360º, nº1, do C.Penal, na pena de 1(um) ano e 3(três) meses de prisão.
Cúmulo jurídico/pena relativamente indeterminada
Quanto à arguida B..., estando estes crimes numa relação de concurso, há que fixar uma pena conjunta, nos termos do disposto no art.77º, nº 1 do C. Penal.
Considerando a conjugação dos factos sobreditos a propósito da medida concreta da pena e a personalidade da arguida revelada, sobressaindo a tendência delituosa desta e a concentração temporal dos factos em concurso, nos termos do disposto no art.77º do C. Penal, afigura-se equilibrada em cúmulo jurídico destas penas parcelares, a pena única de 3 (três) anos de prisão para a arguida B....
Quanto ao arguido A (...) deverá cumprir sucessivamente a pena aplicada pelo crime de falsidade de declarações com a pena relativamente indeterminada em que vai condenado pelo crime de furto qualificado [(6) Não há cúmulo jurídico entre uma pena de prisão simples e uma pena relativamente indeterminada (Dá Mesquita, in O Concurso de Penas, 1997, pg. 29-30; Maria João Antunes, in RPCC VI, 2, pg. 317 (anotação discordante ao Ac. STJ 19.04.95, CJ, t2, 168) e Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do Código Penal”, anotação ao art. 83º, pg. 298, defendendo o sistema da absorção puro].
(…)”.

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A) Recurso da arguida B...


Da contradição entre os pontos 3 e 19 dos factos provados [conclusão 6]

            1. Alega a arguida que constando do ponto 3 dos factos provados que o arguido retirou e levou consigo os objectos com o intuito de os levar para parte incerta, assim os fazendo seus, esta factualidade é contraditória com a que consta do ponto 19 dos mesmos factos, pelo que se impõe que, quanto a si, se considere como não provado este último.
            Não obstante os termos equívocos da alegação, a invocação de contradições na factualidade provada pode significar a existência do vício da decisão previsto na alínea b), do nº 2, do art. 410º, do C. Processo Penal. Vejamos pois, se assim é.

            A contradição insanável da fundamentação ou entre esta e a decisão é um vício da sentença que, como todos os demais previstos no art. 410º, nº 2, do C. Processo Penal, tem que resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo admissível o recurso a elementos a ela alheios, ainda que constem do processo, para a respectiva demonstração.
Na sua manifestação mais evidente, o vício ocorre quando existe oposição na matéria de facto dada como provada [v.g., dão-se como provados dois factos que estão entre si, em oposição por se excluírem mutuamente], ou entre a matéria de facto provada e a matéria de facto não provada [v.g., dá-se como provado e como não provado o mesmo facto]. E existe também quando ocorre contradição entre a fundamentação probatória da matéria de facto [v.g., quando se dá como provado um determinado facto e da motivação da convicção resulta que, face à valoração probatória e ao raciocínio dedutivo exposto, seria outra a decisão de facto correcta], ou quando existe oposição entre a fundamentação e a decisão [v.g., quando a fundamentação de facto e de direito apontam para uma determinada decisão final, e no dispositivo da sentença consta decisão de sentido inverso]. 

Na perspectiva da recorrente a contradição existe entre dois factos provados que, por isso, se excluem reciprocamente. São eles:
- [3] Entretanto o arguido aproximou-se de uma janela da cozinha daquela habitação, que dava acesso ao interior da mesma, e que se encontrava a uma distância do solo de cerca de 1,20 metros, e, em acto contínuo, alcandorou-se à mesma, assim penetrando no interior da dita habitação tendo de seguida retirado e levado consigo, com o intuito de os levar para parte incerta, assim os fazendo seus, os seguintes objectos pertença daquele C (...), no valor total não inferior a €1.693:
- um computador portátil de marca Fujitsu Siemens, com o n.º de série YK3T075845, bem como uma mala de computador de cor preta que tinha no seu interior diversos CD´s e DVD´s respeitantes à instalação de programas naquele computador, um carregador de bateria daquele computador, um rato óptico de marca Microsoft, um porta chaves com 4 chaves do cine teatro e quatro pilhas de marca Panasonic, tudo no valor de €1300;
- uma carteira pessoal em cabedal de cor preta, no valor de €10,00 contendo no seu interior os seguintes documentos: dois cartões de utente, quatro cartões da segurança social, um cartão da firma “multiopticas”, dois cartões de contribuinte, um cartão do “Intermarchê”, um cartão de eleitor e um cartão da “Vodafone”.
- uma máquina fotográfica de marca “Sony”, modelo “Cybershot”, de cor preta, no valor de €300,00;
- um isqueiro de cor preta, €1,00;
- um leitor de cartões de memória que tinha no seu interior um cartão Smart Media com 128 MB e um cabo USB, no valor de €60,00;
- dois porta chaves da Caixa de Crédito Agrícola, sem valor comercial;
- uma agenda com dados de contactos, sem valor comercial;
- um cheque da Caixa de Crédito Agrícola com o n.º 3843706296, sem valor comercial;
- um manual de um equalizador de som, sem valor comercial;
- uma bateria de telemóvel marca “Nokia”, sem valor comercial;
- um CD com capa do Grupo  de Cantares de Manhouce, no valor de €15,00;
- uma bolsa de transporte de CD`s de cor preta contendo 16 CD e 2 DVD, no valor de €7,00;
- [19] Ao actuarem na forma sobredita os arguidos agiram em comunhão de esforços e de vontades nas circunstâncias de tempo e lugar acima descritas, bem sabendo e querendo fazer seus na forma sobredita os referidos objectos, apesar de saberem que o mesmos não lhes pertenciam e que ao apoderarem-se deles, tal como ao entrarem na referida casa de habitação, o faziam contra a vontade do legítimo dono, bem sabendo que não tinham qualquer direito sobre os mesmos.

Para além da afirmada contradição, a arguida, nada mais alegou, designadamente, não explicou as razões pelas quais, em seu entender, estes dois factos estavam em oposição.
Sucede que também não conseguimos descortinar qualquer contradição entre eles. Com efeito, no ponto 3 descreve-se a conduta do arguido pela qual o mesmo logrou introduzir-se numa casa de habitação e de lá retirar, levando-os consigo, diversos bens pertencentes ao ofendido, fazendo-os seus. Mas este facto provado não pode ser dissociado dos factos provados 1 e 2 onde, em síntese, se deu como provado que o arguido e a arguida, de comum acordo, foram numa viatura conduzida pela arguida, até junto da dita casa de habitação, com o propósito de a assaltar, e uma vez aí, o arguido dirigiu-se à casa, enquanto a arguida permaneceu no interior da viatura, nas proximidades, vigiando e aguardando o arguido para depois transportarem os objectos subtraídos. E por isso, no ponto 19 dos factos provados se descreve o dolo do crime de furto, relativamente a ambos os arguidos, posto que seus co-autores.  

Não existe pois, qualquer oposição entre os dois factos provados pelo que o acórdão não enferma do vício da contradição insanável da fundamentação ou entre esta e a decisão, não se evidenciando nele, por outro lado, qualquer outro dos vícios previstos no nº 2, do art. 410º, do C. Processo Penal. 

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Da incorrecta decisão sobre a matéria de facto e consequente absolvição pela prática do crime de furto qualificado [conclusões 1 a 5]

2. Alega a arguida que foram incorrectamente julgados os pontos 1, 2, 4 e 19 dos factos provados, no que a si respeitam, não se fundando a discordância em concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, mas na absoluta ausência de provas que justifiquem a decisão proferida, pois a convicção expressa pelo tribunal colectivo não tem suporte razoável e bastante na prova produzida, assim ficando igualmente justificada a falta de indicação das concretas passagens dos depoimentos fundamentadores da impugnação. É que, continua, ninguém a viu no local, antes ou durante o furto, ninguém afirmou que ela se tivesse dirigido a (...), ninguém referiu qualquer acordo entre os arguidos e por isso, não se provou que tivesse penetrado na habitação e tivesse de lá retirado bens, tendo o tribunal recorrido formado a convicção com base em indícios de comparticipação completamente desligados dos acontecimentos, a não ser a circunstância de ter aparecido no local após o furto, o que é manifestamente insuficiente para fundamentar o raciocínio dedutivo feito. Vejamos.

O recurso da matéria de facto regulado, essencialmente, no art. 412º, nºs 3 e 4, do C. Processo Penal, e que designaremos por impugnação ampla da matéria de facto, impõe ao recorrente a observância de um triplo ónus de especificação, a saber: a especificação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; a especificação das concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; as provas que devem ser renovadas [no caso previsto no art. 430º, nº 1, do C. Processo Penal]. Por outro lado, quando a prova tenha sido gravada, as duas últimas especificações fazem-se por referência ao consignado na acta e com a indicação das concretas passagens em que se funda a impugnação.  
A recorrente especificou os concretos pontos de facto, todos pertencendo ao elenco dos factos provados da sentença, mas entendeu não ser possível a indicação das provas que impõem decisão diversa e, por arrastamento, não ser possível a indicação das concretas passagens em que se funda a impugnação, com o argumento da absoluta ausência de provas que justifiquem a decisão proferida.
É certo que a exigência da especificação das concretas provas que impõem decisão diversa deve, em certas situações, ser entendida com alguma flexibilidade, designadamente quando as provas são precisamente aquelas que levaram o tribunal recorrido a decidir num certo sentido que agora se sindica. Neste caso, nada mais resta ao recorrente do que, através de uma análise argumentativa dos meios de prova em questão – normalmente, tratar-se-á de prova por declarações – tentar a demonstração de que o tribunal não podia decidido como decidiu, antes devia ter decidido noutro sentido.
Todavia, não foi este o procedimento da arguida. Com efeito, sem referência a qualquer concreto meio de prova, limitou-se a divergir da convicção do tribunal colectivo, alegando que a prova indiciária de que este se socorreu, e não tendo sido produzida prova objectiva da sua co-autoria, não poderia ter sido condenada. Discutir, analisar, desconstruir, argumentando, o raciocínio expresso pelo tribunal colectivo na motivação de facto do acórdão, com vista à demonstração de uma errada apreciação probatória, foi o que a arguida não fez. E assim, inviabilizou o conhecimento da impugnação ampla da matéria de facto.

Ainda assim, tendo em conta a motivação de facto expressa no acórdão em crise, sempre diremos o que segue, relativamente à co-autoria da arguida.
  É verdade que o arguido não afirmou a comparticipação da arguida no furto, e nenhuma testemunha afirmou tê-la visto no local antes ou durante o furto, tê-la visto entrar ou sair da habitação, ou ter presenciado a formação do acordo de procederem ao assalto. Não existe pois prova, por declarações, directa dos factos.
Mas a prova por declarações directa não é a única prova de que o julgador se pode servir para formar a sua convicção, que pode fundar-se em prova indirecta ou circunstancial e foi precisamente esta prova que o tribunal colectivo analisou, conjugando congruentemente todos os elementos objectivos de que dispunha, para proferir a decisão de facto.
O raciocínio seguido nesta operação encontra-se exposto de forma clara, lógica e perceptível, nele tendo sido considerados vários meios de prova, cuja valoração conjugada conduziu o tribunal colectivo, acertadamente, adiantamos já, à conclusão de que também a recorrente participou no furto. Explicando.

Como é evidente, a comparticipação da arguida na prática do furto não resultou da ausência de trabalho certo, do seu relacionamento próximo com o arguido e dos seus antecedentes criminais. Ela resultou da conjugação destes elementos de facto, com a circunstância de ter comparecido no local onde a GNR abordou o arguido, conduzindo um veículo automóvel. E a questão essencial prende-se com as razões de a arguida aí se encontrar, nesse preciso momento. A arguida, em audiência, justificou a sua presença, dizendo que vivia com o arguido e que nessa noite, depois de o deixar em S. Pedro do Sul [o arguido, nesta parte, proferiu declarações concordantes], foi para uma discoteca, em Viseu, com a testemunha D (...). Sucede que a testemunha desmentiu esta versão, negando ter estado com a arguida. Depois, a arguida afirmou que, de madrugada, recebeu um telefonema de um número anónimo, de alguém que se identificou como militar da GNR, dizendo que o seu filho tinha sido detido, razão pela qual se deslocou para o local. Acontece que os militares da GNR e testemunhas, J..., H..., I... e C (...) afirmaram, de forma concordante, que se deslocaram para o local logo após a comunicação da ocorrência, que não foi feito qualquer telefonema para a arguida, que esta surgiu no local inesperadamente e dizendo que era a mãe do arguido, que não houve então qualquer contacto entre a arguida e o arguido, de forma a combinarem que ela o identificasse como seu filho, e que o arguido, quando foi abordado, disse chamar-se E (...) e que a namorada, que estava ali perto, o vinha buscar de carro.
Perante isto, é evidente que a versão da arguida não podia merecer credibilidade, sendo a única justificação razoável para se encontrar, àquela hora e naquele local, o seu conhecimento sobre o que o arguido fazia, e a necessidade de dali o retirar, juntamente com os objectos subtraídos, com rapidez.

Em conclusão, a decisão proferida sobre a matéria de facto mostra-se plenamente suportada pela prova produzida na audiência de julgamento a qual foi apreciada pelo tribunal colectivo com estrita observância do disposto no art. 127º do C. Processo Penal, pelo que se mantém a matéria de facto provada nos exactos termos em que foi fixada pela 1ª instância.

3. Os factos provados preenchem o tipo objectivo e subjectivo do crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº 1 e 204º, nº 2, e), do C. Penal, por cuja prática, em co-autoria, foi a arguida condenada.
A pena mostra-se determinada em estrita obediência aos critérios estabelecidos nos arts. 40º e 71º, do C. Penal.

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Improcedem pois, todas as conclusões do recurso.

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B) Recurso do arguido A (...)
           

Da incorrecta qualificação jurídica dos factos

4. Alega o arguido que apenas cometeu um crime de furto na forma tentada pois, se bem que ao retirar os bens para um terreno vizinho, tenha entrado na sua detenção, ao ser de imediato abordado pela GNR, não decorreu o mínimo de tempo necessário para a estabilização daquela detenção, buscando em apoio desta posição, doutrina do Prof. Faria Costa.
Vejamos se lhe assiste ou não razão.

É sabido não existir unanimidade de opiniões quanto ao momento da consumação do crime de furto.
Para a posição maioritária, o furto é um crime de consumação instantânea. Torna-se perfeito logo que a coisa entra na esfera patrimonial do agente, ficando à sua disposição ou seja, logo que o agente passa a controlá-la, passa a tê-la sob o seu domínio, não se exigindo que este domínio se exerça com sossego e tranquilidade (cfr. Acs. do STJ de 27 de Março de 2003, CJ, S, XI, I, pág. 237, de 25 de Outubro de 2000, RLJ, Ano 134, pág. 250, de 30 de Março de 2000, CJ, S, VIII, I, pág, 243, de 22 de Setembro de 1999, proc. nº 99P755, de 3 de Junho de 1998, proc. nº 98P455, de 1 de Abril de 1998, proc. nº 98P116, todos in www.dgsi.pt, e de 12 de Fevereiro de 1998, CJ, S, V, II, pág. 224, entre muitos outros).
Para a posição minoritária, o furto só se consuma quando a coisa subtraída entra e permanece no domínio do agente, com sossego e tranquilidade (cfr. Ac. do STJ de 23 de Novembro de 1982, BMJ 321, pág. 316).
Para outros ainda – refutando a exigência de que a consumação do furto depende de o agente adquirir um tranquilo domínio de facto sobre a coisa subtraída, por entenderem que assim se não protegem devidamente os bens jurídicos em causa, qualificando a tese maioritária da consumação instantânea como excessivamente formal, e tendo em vista soluções mais razoáveis para as situações de fronteira, em que a problemática da consumação do furto pode conflituar com institutos como a desistência e a legítima defesa – a consumação do furto pressupõe um mínimo de tempo, de estabilidade na entrada da coisa no domínio de facto do agente (cfr. Prof. Faria Costa, RLJ, Ano 134, pág. 253).

Revertendo para a questão sub judice, começaremos por dizer que, ressalvado sempre o devido respeito por diversa opinião, é de afastar a posição que qualificámos de minoritária.
Está provado que o arguido havia já retirado do interior da casa de habitação e colocado num terreno distante cerca de cinquenta metros, e para depois os transportar para o veículo onde se encontrava a arguida, um número considerável de objectos pertencentes ao ofendido, quando foi avistado e abordado pelos militares da GNR. É pois inquestionável que o arguido já controlava de facto as coisas, já as tinha sob o seu domínio durante um mínimo de tempo e de estabilidade pelo que se deve entender, quer na esteira da posição dominante, quer na posição do Prof. Faria Costa, que o furto se consumou.

Portanto, nada há a censurar ao acórdão recorrido que, neste aspecto, concluiu pela consumação do furto, e consequente qualificação da conduta do arguido como integrando a prática de um crime de furto qualificado consumado, p. e p. pelos arts. 203º, nº 1 e 204º, nº 2, e), do C. Penal.  
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            Das incorrectas escolha e medida da pena quanto ao crime de furto   

            5. Entende o arguido que, face à confissão e entrega dos objectos que tentou furtar, impunha-se a aplicação de uma pena concreta, fixada próximo do limite mínimo da moldura abstracta, e não a pena relativamente indeterminada que lhe foi fixada pela 1ª instância, devendo aquela pena, atenta a sua qualidade de toxicodependente, ao invés de cumprida em meio prisional, ser acompanhada de tratamento prolongado em comunidade terapêutica adequada.
            Vejamos.

            5.1. A questão da tentativa ou da consumação do crime de furto foi já conhecida no ponto que antecede, onde se entendeu que o arguido praticou, em co-autoria, um crime consumado de furto qualificado. 
            A confissão do arguido, enquanto facto, consta do ponto 8 dos factos provados, mas da leitura de todos estes resulta que se trata de uma confissão parcial, e isso mesmo o afirma o tribunal colectivo na motivação de facto do acórdão, a fls. 723 dos autos, confissão que contribuiu de forma muito limitada para a descoberta da verdade.
            Por outro lado, o arguido não procedeu à restituição dos bens subtraídos, à sua entrega voluntária ao ofendido. O que aconteceu é que tais bens, pura e simplesmente, foram recuperados por intervenção da autoridade policial e depois devolvidos ao dono.
Finalmente, a dependência do arguido do consumo de estupefacientes consta do ponto 25 dos factos provados, mas esta circunstância está longe de ter valor atenuativo da pena.

Assim, as razões aduzidas pelo arguido não têm aptidão para afastar a aplicação da pena relativamente indeterminada. Questão diversa, e que o arguido verdadeiramente não coloca, é a de saber se estão ou não verificados os respectivos pressupostos de aplicação.
5.2. A pena relativamente indeterminada, com assento legal nos arts. 83º a 90º do C. Penal, tem por alvo a delinquência especialmente perigosa, aqui se incluindo as categorias dos delinquentes por tendência e dos delinquentes alcoólicos e equiparados. Funda-se a sua justificação político-criminal na acentuada inclinação do agente para o crime ou seja, na habitualidade. Trata-se, portanto, de uma sanção de natureza mista, executada como pena até ao momento do cumprimento da pena que concretamente caberia ao crime, e como medida de segurança, a partir daqui e até ser atingido o seu limite máximo (cfr. Maria João Antunes, Consequências Jurídicas do Crime, Lições, 2013, pág. 112).    
Nos autos, a questão coloca-se apenas na perspectiva da delinquência por tendência, pelo que apenas dela cuidaremos.

Nesta perspectiva, são pressupostos da aplicação de uma pena relativamente indeterminada (art. 83º, nº 1, do C. Penal):
- Que o agente pratique crime doloso a que deva aplicar-se, em concreto, prisão efectiva por mais de dois anos;
- Que o agente tenha cometido anteriormente dois ou mais crimes dolosos, cada um punido ou a punir com prisão efectiva por mais de dois anos;
- Que a avaliação conjunta dos factos e a personalidade do agente revelem uma acentuada inclinação para o crime, que ainda persista no momento da condenação.  

Nos termos do nº 2, do art. 83º do C. Penal, a pena relativamente indeterminada tem como limite mínimo o correspondente a dois terços da pena de prisão que concretamente caberia ao crime cometido, e como limite máximo o correspondente a esta pena concreta acrescida de seis anos, sem que possa exceder os vinte e cinco anos. Assim, em caso de condenação em pena relativamente indeterminada, a primeira operação a efectuar consiste na determinação da medida concreta da pena que caberia ao crime, com observância dos critérios estabelecidos nos arts. 40º e 71º do C. Penal, para depois, a partir deste quantum, e de acordo com a regra supra indicada, serem fixados os limites, mínimo e máximo, daquela outra.

O crime de furto qualificado praticado pelo arguido é punível com prisão de dois a oito anos. O grau de ilicitude do facto e a intensidade do dolo sobrelevam à confissão parcial e às relativamente pouco graves consequências da sua conduta.
São no entanto, prementes as necessidades de prevenção geral e notórias as necessidades de prevenção especial.
Por isso, a fixação da pena concreta em três anos de prisão, determinada pelo tribunal colectivo, é perfeitamente suportada pela culpa do arguido, e se algum reparo pode merecer, é apenas relativo à sua benevolência.
Está portanto verificado o primeiro pressuposto indicado.

Como consta dos factos provados do acórdão recorrido, o arguido havia já sofrido seis condenações, pela prática de crimes de furto qualificado, em penas superiores a dois anos de prisão efectiva, e uma condenação pela prática de crime de roubo, em pena superior a dois anos de prisão efectiva.      
 Está pois verificado o segundo pressuposto indicado.

Consta ainda dos mesmos factos provados que o arguido, para além daquelas condenações, havia já sofrido outras cinco condenações, pela prática de crimes de furto qualificado, em penas de prisão suspensas na respectiva execução e em penas de prisão inferiores a dois anos, como resulta que o arguido tem tido sucessivos contactos com o meio prisional sem que os períodos de reclusão sofridos lhe tenham interiorizado a conveniência de adequar o seu padrão de conduta às normas sociais, revelando desta forma uma personalidade com manifesta propensão para a prática de crimes, em especial, contra o património, já insensível aos valores tutelados pelas normas penais e à ameaça das respectivas sanções.
Assim, está também verificado o terceiro pressuposto indicado.

Nestes termos, verificados que estão os pressupostos previsto no art. 83º, nº 1, do C. Penal, tendo a determinação da pena concreta que deveria ser aplicada ao crime de furto qualificado praticado pelo arguido obedecido aos critérios estabelecidos nos arts. 40º e 70º, do C. Penal, e tendo os limites mínimo e máximo da pena relativamente indeterminada aplicada ao arguido respeitado o critério estabelecido no art. 83º, nº 2, do C. Penal, nenhuma censura merece, nesta parte, o acórdão quando condenou o recorrente na pena relativamente indeterminada correspondente ao mínimo de 2 anos de prisão e ao máximo de 9 anos de prisão.

Finalmente, porque o crime de falsas declarações pelo qual foi também o arguido condenado não poderia ser sancionado com uma pena relativamente indeterminada, desde logo, por não se verificar o primeiro pressuposto desta, não há lugar a cúmulo jurídico desta pena, com a pena relativamente indeterminada, havendo lugar ao seu cumprimento sucessivo, como se decidiu no acórdão.      

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Improcedem pois, todas as conclusões do recurso.

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            III. DECISÃO


Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação em negar provimento aos recursos e, em consequência, confirmam o acórdão recorrido.

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            Custas de cada recurso, pelo recorrente respectivo, fixando-se a taxa de justiça em 3 UCS. (art. 513º, nºs 1 e 3, do C. Processo Penal, art. 8º, nº 9, do R. Custas Processuais e Tabela III, anexa).

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Coimbra, 27 de Novembro de 2013


 (Heitor Vasques Osório - Relator)

 (Fernando Chaves)