Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1647/17.1T8GRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FELIZARDO PAIVA
Descritores: DESPEDIMENTO ILÍCITO
OPÇÃO DO TRABALHADOR PELA INDEMNIZAÇÃO
FASE PROCESSUAL PARA O EFEITO
INDEMNIZAÇÃO POR DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 03/15/2019
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA – JUÍZO DO TRABALHO DA GUARDA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 98.º-J DO CPT; 391º CÓDIGO DO TRABALHO.
Sumário: I - O trabalhador pode optar pela indemnização até ao termo da discussão em audiência – artº 391º C. Trabalho -, pelo que deve ter conhecimento ou deve ser-lhe dado conhecimento se essa audiência vai ou não ser realizada.

II - O trabalhador não está obrigado no formulário do artº 98º-J do CPC a optar pela indemnização. Aliás, este formulário nem local tem onde a opção pela indemnização possa ser expressa.

III - A simples cessação de um contrato de trabalho, ainda que legalmente fundada, é susceptível de causar desgosto ao trabalhador, que se vê privado de uma fonte de rendimento eventualmente exclusiva, e ansiedade pela incerteza do futuro, designadamente nos casos em que a possibilidade de encontrar novo emprego se mostra particularmente incerta pela idade ou pelas reduzidas qualificações.

IV - Se, à partida, a cessação do contrato de trabalho importa tais consequências, a atribuição de uma indemnização por danos não patrimoniais, fruto de um despedimento ilícito e/ou irregular, impõe necessariamente um quadro agravado.

Decisão Texto Integral:





Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra:

I – M... apresentou o competente formulário, mediante o qual deduziu oposição ao despedimento promovido pelo «CENTRO PAROQUIAL E SOCIAL ...».

Citado o Empregador, realizou-se audiência de partes, na qual se malogrou a conciliação, tendo o Empregador sido notificado para, no prazo de quinze dias, ao abrigo do disposto no artigo n.º 98º-I do Código de Processo de Trabalho, proceder à apresentação do articulado motivador do despedimento, à junção de procedimento disciplinar, caso tenha existido, e demais documentos e meios de prova previstos no artigo 98º-I, alínea a) e, nos termos do disposto no artigo 98º-J, ambos do Código do Processo de Trabalho, foi advertido que, caso não apresente o referido articulado, será declarada a ilicitude do despedimento da trabalhadora - artigo 98º-J, alíneas a) e b) do Código do Processo de Trabalho;

II. Decorrido o prazo legal para o efeito, sem que o empregador tivesse dado cumprimento a qualquer uma das citadas exigências, foi o despedimento julgado ilícito e, na medida em que a Trabalhadora não optou pela indemnização prevista no artigo 391º do Código do Trabalho, foi proferida seguinte decisão:

“Em face do exposto decide o Tribunal:

I. Declarar a ilicitude do despedimento da Trabalhadora ..., promovido pelo Empregador «Centro Social Paroquial ...» e, em consequência, condenar o Empregador:

i. A reintegrar a Trabalhadora ... no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade”.

III. Notificada a Trabalhadora para, querendo, no prazo de 15 dias, apresentar articulado no qual peticione créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, veio esta sustentar a tempestividade do pedido de substituição da reintegração pela indemnização, liquidar as retribuições entretanto vencidas e alegar haver sofrido danos não patrimoniais, concluindo pedindo a condenação do Empregador a pagar as seguintes quantias:

1. €13.776,48 a título de indemnização aludida no artigo 391º, nº 1, do Código do Trabalho;

2. €1.722,06 referentes às retribuições que deixou de auferir desde o despedimento ilícito (17 de Novembro de 2017) até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal que declarou a ilicitude do despedimento (30 de Janeiro de 2018), ou seja os meses de Dezembro de 2017 e Janeiro de 2018;

3. €1.076,29 a título de créditos salariais referidos no artigo 16º, ou seja proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal;

4. €2.500,00 a título de danos morais sofridos pela Trabalhadora;

V. Os juros de mora, à taxa legal, sobre todas as quantias em divida, no montante global de €19.074,83, desde a data de vencimento até efectivo e integral pagamento.

O Empregador contestou alegando a inadmissibilidade substituição da reintegração pela indemnização e impugnou os montantes dos créditos peticionados pela Trabalhadora, bem como a existência dos danos não patrimoniais.

IV- Realizou-se audiência prévia, após a qual o Tribunal, em sede de despacho saneador, julgando verificada excepção dilatória inominada, decidiu julgar “verificada excepção dilatória inominada, absolver o Empregador «Centro Social Paroquial ...» da instância, no que concerne aos pedidos identificados sob os números I a III do articulado com a referência ..., bem como a parte do pedido identificado sob o número IV, no que respeita aos juros de mora sobre as quantias descritas naqueles outros pedidos”.

V. Julgada válida e regular a restante instância, o Tribunal enunciou o objecto do litígio e o tema da prova.

Tendo a Trabalhadora interposto e motivado recurso da decisão que julgou verificada a descrita excepção dilatória, o Tribunal não admitiu o recurso.

VI -Instruído o processo, realizou-se audiência de discussão, tendo o tribunal dado como assente a seguinte matéria de facto:

a).A Trabalhadora foi acusada de comportamento violento e agressivo e de maltratar os demais funcionários do Empregador.

b).É do conhecimento da generalidade das pessoas, designadamente das ligadas às instituições particulares de solidariedade social e artífices o facto de a Trabalhadora ter sido disciplinarmente sancionada com o despedimento.

c) A Trabalhadora é uma profissional competente, séria, zelosa que nutre muito carinho, afecto e ternura pelos utentes sendo correspondida por estes, é uma pessoa admirada, considerada e respeitada no Empregador, designadamente pelos familiares dos utentes e por estes, que sempre reconheceram que a Trabalhadora tratava os utentes de forma carinhosa e afectuosa.

E proferido, seguidamente, decisão que julgou “improcedente o pedido de condenação do Empregador «Centro Paroquial e Social ...» no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais à Trabalhadora ..., dele absolver o Empregador”.

VII – Inconformada veio a trabalhadora apelar, alegando e concluindo:

...

Contra-alegou a empregadora, alegando:

...

O Exmo. Magistrado do Ministério Público em fundamentado parecer entende que a apelação no que respeita à excepção dilatória atípica ou inominada, deve ser julgada procedente.

Quanto aos danos morais, atenta a fundamentação da sentença, deve a apelação ser julgada improcedente.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

VIII – A matéria a considerar é a narrada no relatório do presente acórdão

IV - As conclusões da alegação delimitam o objecto do recurso.

As questões a decidir residem, assim, em saber:

1. Se se verifica a excepção inominada e, não se verificando, se a ré deve ser condenada no pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua cessação peticionados pela autora acima referidos em III nºs 1, 2, e 3).

2. Se o trabalhadora recorrente tem direito a ser indemnizada por danos não patrimoniais.

Da excepção inominada:

Para sustentar a decisão ora recorrida o tribunal a quo alinhou a seguinte argumentação: “notificada nos termos do disposto no artigo 98º-J, nº 3, do Código de Processo do Trabalho, a Trabalhadora M..., além de peticionar créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação, veio declarar optar pela indemnização em substituição da reintegração.

De acordo com o artigo 98º-J, nº 3, alíneas a), b), do Código de Processo do Trabalho:

“3 – Se o empregador não apresentar o articulado referido no número anterior, ou não juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, o juiz declara a ilicitude do despedimento do trabalhador, e:

a) Condena o empregador a reintegrar o trabalhador, ou, caso este tenha optado por uma indemnização em substituição da reintegração, a pagar ao trabalhador, no mínimo, uma indemnização correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, sem prejuízo dos nos 2 e 3 do artigo 391.º do Código do Trabalho;

b) Condena ainda o empregador no pagamento das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento até trânsito em julgado”.

Na medida em que, como consequência da ilicitude do despedimento verificada no destacado momento processual, a lei determina a condenação do empregador na reintegração do trabalhador, ressalvando unicamente os casos em que o trabalhador haja já optado pela indemnização[1], este Tribunal condenou o Empregador nos precisos termos da alínea a) do nº 3 do artigo 98º-J do Código de Processo do Trabalho.

E a verdade é que a posição sustentada pela Trabalhadora, pretendendo exercer o direito a posteriori, não merece a nossa adesão.

Porém, nesta fase, mais relevante do que a questão substantiva que a Trabalhadora coloca, bem como o posicionamento do Tribunal a esse respeito, é, neste momento, o imperativo formal, isto é, de ordem processual que se impõe no caso.

Ainda que, neste momento, consideremos que o despacho em questão não transitou em julgado[2], haverá que considerar a previsão do artigo 613º, nos 1 e 2, do Código de Processo Civil, segundo a qual:

“1 – Proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa.

2 – É lícito, porém, ao juiz rectificar erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença, nos termos dos artigos seguintes”.

Não está em causa um erro material susceptível de rectificação, não tendo, por outro lado, sido arguida qualquer nulidade do despacho.

Também não se mostram verificados os pressupostos de que depende a reforma do despacho.

Assim, tendo o Tribunal proferido a decisão de condenação na reintegração da Trabalhadora, essa decisão não é passível de modificação nesta fase.

Ora, a nosso ver, a situação ora exposta enquadra-se ao nível de excepção dilatória atípica ou inominada, conducente à absolvição do Empregador da instância”.

Efectivamente, tendo a Trabalhadora formulado, como pedido, a indemnização em substituição da reintegração, tendo ainda formulado pedidos no pressuposto da cessação do contrato de trabalho, o Tribunal de 1ª instância está inibido de apreciar e decidir essa questão, ou seja, não pode proferir uma decisão de mérito sobre os ditos pedidos (artigo 576º, nº 2, do Código de Processo Civil)”.

Decidindo:

Sob a epígrafe “articulado do empregador” dispõe o artigo 98.º-J do CPT:

1 – (…)

2 – (….)

3 - Se o empregador não apresentar o articulado referido no número anterior, ou não juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, o juiz declara a ilicitude do despedimento do trabalhador, e: a) Condena o empregador a reintegrar o trabalhador, ou, caso este tenha optado por uma indemnização em substituição da reintegração, a pagar ao trabalhador, no mínimo, uma indemnização correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, sem prejuízo dos n.os 2 e 3 do artigo 391.º do Código do Trabalho; b) Condena ainda o empregador no pagamento das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento até trânsito em julgado; c) Ordena a notificação do trabalhador para, querendo, no prazo de 15 dias, apresentar articulado no qual peticione créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação. 4 - Na mesma data, o empregador é notificado da sentença quanto ao referido nas alíneas a) e b) do número anterior.

Este preceito deve ser interpretado e conjugado com o disposto no artº 391º do Cód. Trabalho que sob a epígrafe “indemnização em substituição de reintegração a pedido do trabalhador” preceitua:

1 - Em substituição da reintegração, o trabalhador pode optar por uma indemnização, até ao termo da discussão em audiência final de julgamento, cabendo ao tribunal determinar o seu montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.º

2 - Para efeitos do número anterior, o tribunal deve atender ao tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial.

3 - A indemnização prevista no n.º 1 não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.

Ora, se o trabalhador pode optar pela indemnização até ao termo da discussão em audiência, deve ter conhecimento ou deve ser-lhe dado conhecimento se essa audiência vai ou não ser realizada.

No caso, o trabalhador não estava obrigado no formulário a optar pela indemnização.

Aliás, este formulário nem local tem onde a opção pela indemnização possa ser expressa.

É verdade que a referida opção podia ser manifestada na audiência de partes.

Contudo, a isso o trabalhador não estava legalmente obrigado, nem essa audiência se destina a esse fim - artºs 55º e 56º do CPT.

Após a realização desta audiência em 21.12.2017, onde a empregadora foi notificada pessoalmente para os efeitos do disposto na alínea a) do nº 4 do artº 98º-I do CPT, a trabalhadora recorrente só voltou a ter contacto com o processo quando foi notificada da decisão proferida, em 18.01.2018, ao abrigo do disposto no nº 3 do artº 98-J do CPT que declarou a ilicitude do despedimento.

Até esta data, desconhecia a trabalhadora se o empregador tinha ou não apresentado o articulado motivador (não lhe foi dado conhecimento ou notificada deste facto), ou seja, se havia lugar à prolação da decisão nos termos nº 3 do artº 98-J do CPT ou se os autos correriam os seus normais termos até à audiência final de discussão e julgamento.

A recorrente foi apanhada por uma decisão que, embora pudesse ser juridicamente possível, não podia, em face das circunstâncias, ser por si razoavelmente prevista ou configurada. E à parte não se lhe exigem dons advinhatórios.

Esta decisão configura-se como decisão surpresa, a qual é proibida atento o disposto no nº 3 do artº 3º do CPC (“o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”).

Na verdade, no contexto processual descrito, pedia-se ao tribunal que, levando ainda em conta o princípio da cooperação ínsito no artº 7º do CPC, antes de proferir decisão, tivesse ouvido a trabalhadora no sentido desta poder exercer o seu direito de opção (pela reintegração ou pela indemnização).

Aliás, assim o recomenda ou aconselha uma boa prática processual de maneira a evitar que no processo sejam proferidas várias decisões (uma a ordenar a reintegração e outra proferida no seguimento da notificação a que alude a al. c) do nº 3 do artº 98-J do CPT).

Configurando-se a denominada decisão surpresa como violação do contraditório inclui-se essa violação na cláusula geral sobre as nulidades processuais constante do artº 195º, nº 1 do Código do Processo Civil - a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influenciar a decisão da causa.

E dada a importância do contraditório é indiscutível que, no caso, a sua inobservância pelo tribunal é susceptível de influir no exame ou decisão da causa na medida em que impossibilitou a trabalhadora de poder optar pela indemnização por despedimento ilícito.

Por outro lado como também determina a lei “quando um acto tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente; a nulidade de uma parte de um acto não prejudica as outras partes que dela sejam independentes” – nº 2 do artº 195º do CPC.

Em conformidade com este normativo, a nulidade cometida apenas afectará a parte da decisão que decidiu não conhecer dos pedidos de condenação da empregadora em €13.776,48 a título de indemnização aludida no artigo 391º, nº 1, do Código do Trabalho; €1.722,06 referentes às retribuições que deixou de auferir desde o despedimento ilícito (17 de Novembro de 2017) até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal que declarou a ilicitude do despedimento e €1.076,29 a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal;

Mas já não afectará a decisão na parte em que esta se pronunciou pela condenação da empregadora no pagamento de uma indemnização a título de danos não patrimoniais.

Uma última palavra para o argumento invocado pela recorrida de que a decisão que declarou a ilicitude do despedimento e ordenou a reintegração da trabalhadora transitou em julgado e, por isso, é inatacável.

Com efeito, desta decisão cabia apelação a subir imediatamente e em separado nos termos dos artº 79º -A, nº 2, al. e) do CPT; e a trabalhadora não impugnou esta decisão.

Contudo, não se pode olvidar que anteriormente a esta decisão ocorreu uma nulidade cujos efeitos inquinaram aquela decisão, a qual para todos os efeitos é como se não tivesse existido.

Daí que não tenha ocorrido qualquer trânsito em julgado.

Da indemnização por danos não patrimoniais:

O tribunal a quo entendeu não ser devida qualquer indemnização relativa a danos não patrimoniais sofridos, lendo-se na sentença o seguinte: “assim, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25/01/2012, in http://www.dgsi.pt, acentuou-se esta exigência, aí se consignando:

“I. Em direito laboral, para se reconhecer direito ao trabalhador a indemnização com fundamento em danos não patrimoniais, terá aquele de provar que houve violação culposa dos seus direitos por parte do empregador, causadora de danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, o que se verificará, em termos gerais, naqueles casos em que a culpa do empregador seja manifesta, os danos sofridos pelo trabalhador se configurem como objectivamente graves e o nexo de causalidade não mereça discussão razoável.

II. No que concerne ao despedimento promovido pelo empregador que se venha a caracterizar de ilícito, para se aferir se o mesmo justifica, ou não, a condenação daquele por danos não patrimoniais é necessário tomar em consideração, antes de mais, que é inerente à cessação da relação laboral, indesejada pelo trabalhador, que esta cessação comporte para o mesmo a lesão de bens de natureza não patrimonial, traduzida em sofrimento, inquietação, angústia, preocupação pelo futuro, etc.

III. Por outro lado, sempre será necessário atentar em que os danos sofridos pelo trabalhador devem integrar uma lesão grave, que vá para além daquela que sempre acontece em situações similares de despedimento, porque o direito a indemnização com fundamento em danos não patrimoniais não é de admitir como regra, mas apenas no caso singular de haver uma justificação segura, que leve a concluir pela necessidade de reparar uma lesão que restaria apodicticamente não satisfeita.

IV. Assim, se se verificar que esses danos não patrimoniais não têm especial relevo por se traduzirem nos que, comummente, se verificam em idênticas situações, como os do desgosto, da angústia e da injustiça, não se legitima a tutela do direito justificadora da condenação por aqueles danos.

V. O facto de no caso se ter provado que o processo disciplinar provocou sofrimento e angústia ao trabalhador e agravou o seu estado de saúde, não oferece motivo bastante para fundamentar uma condenação em indemnização por danos não patrimoniais, por não se terem provado elementos concretos para aferir do relevo do sofrimento, da angústia e do agravamento da doença”.

Esta posição foi recentemente reafirmada no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 24/01/2018, in http://www.dgsi.pt, segundo o qual:

“Em direito laboral para haver direito à indemnização com fundamento em danos não patrimoniais, terá o trabalhador que provar que houve violação culposa dos seus direitos, causadora de danos que, pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, o que se verificará, em termos gerais, naqueles casos em que a culpa do empregador seja manifesta, os danos sofridos pelo trabalhador se configurem como objectivamente graves e o nexo de causalidade não mereça discussão razoável”.

Esta posição merece o nosso acolhimento.

Na verdade, não podemos olvidar que a simples cessação de um contrato de trabalho, ainda que legalmente fundada[3], é susceptível de causar desgosto ao trabalhador, que se vê privado de uma fonte de rendimento eventualmente exclusivamente, e ansiedade pela incerteza do futuro, designadamente nos casos em que a possibilidade de encontrar novo emprego se mostra particularmente incerta pela idade ou pelas reduzidas qualificações.

Se, à partida, a cessação do contrato de trabalho importa tais consequências, a atribuição de uma indemnização por danos não patrimoniais, fruto de um despedimento ilícito e/ou irregular, impõe necessariamente um quadro agravado.

Ora, no caso vertente a materialidade provada pela Trabalhadora reduziu-se à demonstração do vexame e inquietação que lhe foi provocado no seu meio local.

Não estão alegadas e demonstradas outras circunstâncias, de modo que, a nosso ver, o quadro de facto é insuficiente para gerar uma obrigação de indemnização.

Improcede pois a pretensão da Trabalhadora.”

Este enquadramento merece a nossa integral concordância, nada mais havendo adiantar.

O pedido de condenação no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais tem, assim, que improceder.

VI – Termos em que se delibera julgar a apelação parcialmente procedente em função do que se decide:

1. Dar por verificada a nulidade processual traduzida em não se ter facultado à recorrente, logo que decorrido o prazo para o empregador apresentar o articulado motivador do despedimento, a possibilidade de optar pela reintegração ou pela indemnização por despedimento ilícito.

2. Anular todos os actos posteriores à audiência de parte, com excepção dos actos relativos a decisão proferida sobre a indemnização por danos não patrimoniais, devendo a 1ª instância proferir decisão sobre os pedidos formulados pela recorrente/trabalhadora relativos à indemnização por despedimento ilícito, salários intercalares e proporcionais de férias e de subsídios de férias e de Natal.

3. Confirmar a decisão recorrida no que concerne ao pedido de pagamento em indemnização por danos não patrimoniais.

Custas por ambas as partes na proporção de 1/6 para a recorrente e 5/6 para a recorrida.


Coimbra, 15 de Março de 2018

(Joaquim José Felizardo Paiva)

(Jorge Manuel da Silva Loureiro)

(Paula Maria Mendes Ferreira Roberto)



[1] Não havendo qualquer impedimento a que já o tenha feito, designadamente em sede de audiência de partes.
[2] Opinião exposta em sede de audiência prévia, não se afigurando relevante neste momento.
[3] Por exemplo, em caso de despedimento lícito e regular por extinção do posto de trabalho.