Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1953/08.6TBPBL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FALCÃO DE MAGALHÃES
Descritores: PRESCRIÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
SUB-ROGAÇÃO
CONTAGEM DOS PRAZOS
PRESTAÇÃO
SEGURANÇA SOCIAL
Data do Acordão: 05/27/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE POMBAL – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 498º, NºS 1, E 2 E 3 DO C. CIVIL.
Sumário: I – Nos termos do disposto no artº 498º do C. Civil, o direito (crédito) de indemnização prescreve no prazo de 3 anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso (nº1);

II - O prazo ordinário de prescrição previsto no artº 309º é residual, ou seja, só tem aplicabilidade aos casos em que a lei, expressamente, não tenha fixado prazo diverso, mas existe na lei norma expressa, que mais não é do que a contida no artº 498º, aplicável em termos de prescrição do direito à indemnização nos casos de responsabilidade civil extracontratual.

III - O artº 498º do C. Civil é também aplicável à sub-rogação, não obstante a sua expressa referência ao direito de regresso entre responsáveis.

IV - Não obstante intensa jurisprudência contraditória que durante algum tempo versou sobre a questão de saber se nos casos do direito de reembolso efectivado não pela via da constituição de um direito de regresso nas relações internas entre devedores solidários, mas pela via da sub-rogação legal, seria, ou não aplicável o nº 2 do artº 498º do CC, os mais recentes arestos, nomeadamente do STJ, têm sido praticamente unânimes no sentido da aplicabilidade do citado preceito aos referidos casos, pela via analógica, com o argumento de que também na sub-rogação só a contar do pagamento está quem paga nas condições de poder exercer contra o obrigado da prestação o respectivo direito.

V - A argumentação que se vem utilizando, associada ao teor do nº 1 do artº 498º do CC, leva-nos a concluir que o prazo prescricional aplicável se conta sobre o primeiro dos pagamentos efectuados no caso de prestações reiteradas no tempo, não sendo necessário aguardar pelo último deles.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A) - 1) - Para efectivação da responsabilidade civil emergente de acidente de viação ocorrido no dia 17/03/2001 e em resultado do qual - sem qualquer culpa sua, que seguia como ocupante do veículo sinistrado -, alegou ter sofrido danos patrimoniais e lesões que determinaram que ficasse portadora de invalidez absoluta e permanente, M…, nascida a 09/08/1965, residente em …, intentou, em 12 de Setembro de 2008, no Tribunal Judicial de Pombal, acção declarativa, de condenação, com processo ordinário, contra “A… - Companhia de Seguros Vida, S.A.”. e “A… - Companhia de Seguros, S.A.”, pedindo a condenação da 1ª a pagar-lhe a quantia de 25.000€, acrescida de juros moratórios legais até integral pagamento e a 2ª no pagamento da quantia de 50.000€, também ela acrescida de juros moratórios legais até integral pagamento.

Sustentou, em síntese, para justificar a demanda das Rés, que, tendo o acidente se materializado no despiste do veículo de marca “Fiat”, matrícula …-IO, em resultado de este ter resvalado na valeta, despiste esse seguido do capotamento da viatura, a 2ª Ré responde por ser a seguradora desse veículo, então conduzido pelo respectivo proprietário, enquanto que a 1ª Ré responde por força de contrato de seguro, de danos próprios, que com ela, Autora, celebrou.

2) - a) - Tendo as RR contestado e determinado que foi o cumprimento do disposto no DL 59/89 de 22.2, o ISS/IP - Centro Distrital de Coimbra, veio deduzir pedido de reembolso contra as RR. pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de 7.939,44€, acrescida de juros desde a data da sua notificação e até integral pagamento, correspondente ao montante pago à A., sua beneficiária, durante o período de baixa médica decorrido entre 17.3.2001 e 15.3.2004, em consequência do sinistro pela mesma invocado nos autos e suas consequências físicas.

b) - Também o ISS-IP - Centro Nacional de Pensões, veio deduzir pedido de reembolso contra as RR., visando a sua condenação no pagamento da quantia de 20.199,14€, acrescida dos juros moratórios à taxa legal desde a notificação e até integral pagamento, correspondente ao valor pago desde 23.8.2004, à mesma A., sua beneficiária a título de pensão de invalidez (com o valor actual mensal de 246,36€), em consequência do sinistro pela mesma invocado nos autos e suas consequências físicas que determinaram tal invalidez.

c) - Notificadas dos pedidos de reembolso, as RR. contestaram, alegando, entre o mais:

- Que do contrato de seguro facultativo firmado pela Autora com a 1ª Ré não decorre, para esta, qualquer dever de indemnizar as intervenientes;

 - A prescrição do eventual direito das intervenientes sobre a 2ª Ré, já que tendo sido citada para a acção em 29 de Setembro de 2008, foi notificada dos pedidos de reembolso decorridos mais de três e mesmo mais de cinco anos sobre a data do acidente, sendo que o interveniente ISS - Centro Distrital de Coimbra apenas deduziu o pedido de reembolso em 28/06/2010, decorridos mais de três anos e mesmo mais de cinco anos sobre a data em que efectuou o último pagamento (15/03/2004);

d) - Os intervenientes apresentaram articulados em que, entre o mais, pugnaram pela improcedência da excepcionada prescrição.

3) - Autora e Rés puseram fim ao litígio mediante transacção formalizada em documento particular e que foi homologada por sentença de 22/09/2011.

4) - O processo prosseguiu para conhecimento dos pedidos de reembolso, tendo o ISS-IP/CDSSC, em sede de audiência preliminar, desistido do pedido formulado contra a 1ª Ré, desistência essa que foi homologada por sentença proferida.

5) - No despacho saneador foi julgada procedente a excepção da ilegitimidade passiva da 1ª Ré, no que concerne ao pedido de reembolso formulado pelo “Instituto de Segurança Social, IP - Centro Nacional de Pensões”, tendo-se absolvido tal Ré da respectiva instância;

Foram fixados os factos já assentes e elaborou-se a base instrutória.

6) - Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, a que se seguiu a sentença, proferida em 28/10/2013, que, julgando procedente a prescrição invocada pela 2ª Ré (“A… - Companhia de Seguros, S.A.”) absolveu-a dos pedidos de reembolso formulados pelos intervenientes ISS-IP-CDC e ISS-IP-CNP.

B) - Inconformados com esta decisão, dela apelaram o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL/IP - CENTRO DISTRITAL DE COIMBRA e o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL/IP CENTRO NACIONAL DE PENSÕES, que, a findar a respectiva alegação de recurso, ofereceram as seguintes conclusões:

A Apelada, respondendo, pugnou pela confirmação da decisão sob recurso.

C) - Questões a resolver:

Em face do disposto nos art.ºs 635º, nºs 3 e 4, 639º, nº 1, ambos do novo Código de Processo Civil (NCPC), aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho[1], o objecto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 608º, n.º 2, “ex vi” do art.º 663º, nº 2, do mesmo diploma legal.

Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, com as “questões” a resolver se não confundem os argumentos que as partes esgrimam nas respectivas alegações e que o Tribunal pode ou não abordar, consoante a utilidade que veja nisso (Cfr., entre outros, na legislação pretérita correspondente, o Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e o Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B3586[2]).

Assim, a questão a solucionar no presente caso consiste em saber se às Apelantes assiste o direito a serem reembolsadas pela ora Apelada daquilo que pagaram à Autora, o que passa por saber se esse direito prescreveu, como se entendeu na sentença ora em apreciação.

II - Fundamentação:

A) - Na sentença considerou-se que os factos provados eram os seguintes:

B) - 1) - No presente caso não há dúvida que a responsabilidade do sinistro do qual resultaram as lesões gravíssimas da Autora, não podendo ser imputado a esta, só poderia, se reunidos os pressupostos legais necessários, ser assacada ao condutor e proprietário do veículo em que a Autora seguia como passageira, respondendo, no entanto, a ora (2ª) Ré, neste último caso, por força do contrato de seguro celebrado com o civilmente responsável.

Para aferir da correcção do entendimento seguido na sentença recorrida, importa, essencialmente, definir qual o prazo prescricional a ter em conta e qual o seu termo “a quo”.

A Mma. Juiz do Tribunal “a quo” concluiu pela prescrição do direito das ora Apelantes seguindo o entendimento que, no essencial, é retratado pelos trechos da sentença que ora se transcrevem:

«O prazo ordinário de prescrição, em conformidade com o estabelecido no artº 309º, é de 20 anos, havendo porém, ressalva legal de prescrições de curto prazo (cfr. v.g. artºs 310º, 311º, 316º, 317º e 498º)

Nos termos do disposto no artº 498º (que é aquele que se prende mais estreitamente com o caso dos autos), o direito (crédito) de indemnização prescreve no prazo de 3 anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso (nº1); prescreve igualmente, no prazo de três anos, a contar do cumprimento o direito de regresso entre os responsáveis (nº2), sendo que, se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável (nº 3).

(…) o prazo ordinário de prescrição previsto no artº 309º é residual, ou seja, só tem aplicabilidade aos casos em que a lei, expressamente, não tenha fixado prazo diverso e, em casos semelhantes ao dos presentes autos, independentemente da natureza da sub-rogação, existe na lei, norma expressa, que mais não é do que a contida no artº 498º aplicável em termos de prescrição do direito à indemnização, nos casos de responsabilidade civil extracontratual.

(…) o artº 498º é também aplicável à sub-rogação, não obstante a sua expressa referência ao direito de regresso entre responsáveis.

(…) não podemos deixar de considerar que ao caso concreto o prazo de prescrição aplicável é o previsto no artº 498º e não o ordinário estipulado no artº 309º.

Resolvida que está essa questão, resta saber qual o momento a partir do qual se conta o referido prazo, desde logo porque também as partes colocaram a questão de saber se tal contagem se faz da data do sinistro ou antes da data ou datas em que ocorreram as citações para a presente acção ao abrigo do imperativo legal supra citado.

(…) não obstante intensa jurisprudência contraditória que durante algum tempo versou sobre a questão de saber se nos casos do direito de reembolso efectivado não pela via da constituição de um direito de regresso nas relações internas entre devedores solidários, mas pela via da sub-rogação legal seria, ou não aplicável o nº 2 do artº 498º vindo de citar, os mais recentes arestos, nomeadamente do STJ, têm sido praticamente unânimes no sentido da aplicabilidade do citado preceito aos referidos casos, pela via analógica, com o argumento de que também na sub-rogação só a contar do pagamento está quem paga nas condições de poder exercer contra o obrigado da prestação o respectivo direito, não podendo pois, aceitar-se, numa perspectiva substancial do direito que se considere estar em curso um prazo prescricional, extintivo de um direito antes mesmo de se saber que ele existe (cfr. a este respeito, entre outros, mas aqui destacado pela clareza do raciocínio e abundância da doutrina e jurisprudência citada, nas quais nos louvamos, o Ac. do STJ de 25.3.2010, P. 2195/06.0TVLSB.S1, in www.dgsi.pt).

Com essa solução concordamos, em absoluto, motivo pelo qual se entende que o prazo prescricional no caso dos autos se conta não da data do acidente mas sim da data do pagamento.

E diz-se da data do pagamento e não da data da citação para a acção correspondente, na medida em que essa citação não atribui quaisquer efectivos direitos ao sub-rogado que apenas porque o é (porque existe o direito do originário beneficiário da indemnização existe e lhe foi transmitido) é citado e não adquire direito com aquela citação.

A mesma destina-se, na verdade, a permitir ao Estado, entidade geral e abstracta, saber da pendência de acções onde se discutam questões conexas com eventuais prestações que haja satisfeito, assim o eximindo de instaurar acções autónomas. É verdade que parte do pressuposto de que se não lhe for prestada a informação da existência do facto de terceiro gerador de responsabilidade o Estado poderá não conhecer, mas não é menos verdade que em momento algum o legislador instituiu em legislação especial um especial prazo de prescrição ou uma especial regra de contagem, derivada do conhecimento através da citação em apreço, ainda que por mera presunção do contrário.

(…) A argumentação que se vem utilizando, associada ao teor do nº 1 do artº 498º vindo de citar, leva-nos a concluir, contudo, que o prazo prescricional aplicável se conta sobre o primeiro dos pagamentos efectuados, no caso de prestações reiteradas no tempo, não sendo necessário aguardar pelo último deles, até porque a partir do momento em que o primeiro deles é feito, quem paga conhece o seu direito ao reembolso e está em condições de o exercer, independentemente da sua extensão integral (conforme expressamente previsto pela disposição supra citada), não fazendo, pois, qualquer sentido, que se conceda a terceiro sub-rogado - mesmo que ele seja o Estado - mais direitos que aqueles que a lei especificamente prevê para o lesado, a quem pagou, quando a própria lei (artº 306º, nº1) refere que o prazo de prescrição começa a correr quando o direito possa ser exercido e ele pode, indiscutivelmente, ser exercido em casos como o dos autos a partir do momento em que ocorre o primeiro pagamento.

(…) No caso dos autos estamos perante um acidente que ocorreu a 17.3.2001, o qual causou lesões físicas a M…, tendo isso determinado que à mesma fosse concedida baixa médica entre 17.3.2001 e 15.3.2004, em consequência do que o ISS-IP- CDC, lhe pagou 7,43€ por cada dia.

Após, em virtude das sequelas de que ficou portadora, em 23.8.2004, a mesma M… requereu ao ISS-IP-CNP em 23.08.2004, pensão de invalidez, a qual lhe foi deferida, tendo a partir dessa data sido paga a pensão correspondente.

O ISS-IP-CDC e o ISS-IP-CNP deduziram os seus pedidos de reembolso nestes autos a 28.6.2010 e 5.7.2010, respectivamente, tendo a R. que como tal permanece deles sido notificada por carta registada expedida a 14.7.2010 e a 18.10.2011, respectivamente.

(…) à R. incumbia no caso concreto a alegação e prova de ter decorrido o prazo de prescrição que invocou em seu benefício, incumbindo, por seu turno, aos requerentes do reembolso alegar e provar que tal prazo não decorreu, mormente, por não terem tido conhecimento do direito que lhes assistia em momento anterior ou que, sobre ele recaíram vicissitudes interruptivas ou suspensivas.

Ora, analisando o que a este respeito se considerou provado e já referido, temos por evidente que à data em que foram deduzidos os pedidos de reembolso e considerando a data do primeiro pagamento tinham decorrido até mais do que 3 anos, mesmo se os contabilizarmos, em ambos os casos, do ano de 2004, pois a própria acção deu entrada já no ano de 2008.

(…) resumindo tudo o que acima se disse, que o prazo prescricional é de 3 anos pelo que mesmo contando-se do ano de 2004 já tinha ele decorrido por inteiro sequer à data de instauração da acção, sendo irrelevante juridicamente o facto de a citação dos requerentes para os termos do DL 59/89 ter ocorrido posteriormente, pois essa não lhes concede quaisquer direitos perante a R., que invocou a excepção que se aprecia em seu benefício e que assim, logrou provar a sua pretensão.

Porém, ainda que se entendesse que o prazo de que os requerente dispunham era precisamente o mesmo de que a própria originária A. dispunha, no que se não concede, sempre ele teria que se considerar como decorrido por inteiro pelo menos no ano de 2009, já com todos os alargamentos e entendimentos jurídicos possíveis (5 anos decorridos sobre pelo menos 2004), sendo que só no ano de 2010, em sede de transacção, a R. que como tal permanece, assumiu qualquer responsabilidade adveniente do sinistro ajuizado e, jamais se poderia considerar que a citação para a acção poderia ter vicissitudes interruptivas do prazo prescricional, relativamente a pretensões, nessa altura ainda nem sequer judicialmente manifestadas.».

Este entendimento, com que, no essencial, concordamos, compagina-se, aliás, “mutatis mutandis” com aquele que, embora versando pedidos de reembolso formulados em acção para efectivação de direitos emergentes de acidente de trabalho, foi expendido no Acórdão do STJ, de 18/05/2011 (Revista nº 739/05.4TTSTR.C1.S1, da 4ª Secção).

Efectivamente, escreveu-se nesse Acórdão do STJ, entre o mais:

«(…) dispõem os nºs 1 e 2 do artigo 1º do DL 59/89 de 22/02 que em todas as acções em que seja formulado pedido de indemnização de perdas e danos por acidente de trabalho ou acto de terceiro, que tenha determinado incapacidade temporária ou definitiva para o exercício da actividade profissional, ou a morte da vítima, serão as instituições de segurança social competentes para concessão das prestações, citadas para, no prazo da contestação, deduzirem pedido de reembolso de montantes que tenham pago em consequência dos referidos eventos.

Efectivamente, uma das funções da Segurança Social, dentro dos objectivos que prossegue, é a de substituir-se à entidade pagadora de rendimentos do trabalho quando os seus beneficiários se vejam privados deles por ocorrência duma eventualidade que integre o direito ao esquema de prestações correspondentes à protecção do regime geral.

Por isso, quando ocorre um evento gerador de perda de remunerações pelas quais haja terceiros responsáveis e cabendo-lhe assegurar, provisoriamente, a protecção do beneficiário, ficará a Segurança Social com o direito de exigir o pagamento dos subsídios ou pensões que tenha pago.

Daí a razão de ser da sua citação ao abrigo daquele diploma legal.

Assim, tendo-se citado o ISS em 14/11/08, veio este em 27/11/08, deduzir contra as rés, pedido de reembolso das quantias que pagou à beneficiária, a título de subsídio por morte e a título de pensões de sobrevivência, que esta havia requerido em 3 de Novembro de 2005 e com proposta de reconhecimento do direito às mesmas em 21/11/05.

(…) cabendo à Segurança Social assegurar, provisoriamente, a protecção do beneficiário, ficará esta com o direito de exigir o pagamento dos subsídios ou pensões que tenha pago, pois estas prestações de natureza social não são cumuláveis com a indemnização a cargo de terceiro responsável pelo acidente.

Efectivamente, nos termos artigo 16º da Lei n.º 28/84 de 14 de Agosto (anteriormente em vigor) e a que corresponde o regime do actual artigo 71º da Lei n.º 32/2002 de 30 de Dezembro, designada Lei de Base da Segurança Social, no caso de concorrência, pelo mesmo facto, do direito a prestações pecuniárias dos regimes de segurança social com o de indemnização a suportar por terceiros, as instituições de segurança social ficam sub-rogadas nos direitos do lesado até ao limite do valor das prestações que lhes cabe conceder.

Por isso o DL nº 59/89 obriga a que a Segurança Social seja citada em todas as acções em que seja formulado pedido de indemnização por perdas e danos por acidente de trabalho que tenha determinado morte, para deduzir pedido de reembolso dos montantes que tenham pago em consequência de tal evento.

Assim, o contemplado direito de sub-rogação do ISS e com ele a não definitividade do encargo com o pagamento das pensões de sobrevivência e do subsídio por morte[4], que só existe no caso de concorrência do direito a prestações pecuniárias dos regimes se segurança social com o de indemnização a suportar por terceiro, apesar do pagamento daquelas prestações sociais poder implicar um encargo definitivo para o ISS, como, por exemplo, no caso da morte do beneficiário resultar de uma morte natural.

No fundo as instituições de segurança social assumem um papel subsidiário e provisório, face à obrigação de indemnização de que é sujeito passivo o responsável civil.

(…) dado este regime especial de sub-rogação legal, entendemos que o prazo de prescrição da entidade subrogada será o mesmo do credor originário (5 anos conforme resulta do artigo 32º nº 2 da LAT)

(…) resultando da matéria de facto assente que, com data de 27.11.2008, o Instituto de Segurança Social, veio deduzir contra as Rés o pedido de reembolso das prestações que pagou à beneficiária, temos de concluir que se não consumou o prazo de prescrição.

Na verdade, a Autora, requerera a atribuição do subsídio por morte e da pensão de sobrevivência em 03 de Novembro de 2005, tendo havido proposta de reconhecimento do direito às mesmas em 21.11.2005.».

No essencial, o que diverge entre o entendimento seguido neste Acórdão do STJ e aquele que foi expendido na sentença, é que nesta não foi atendido, naturalmente, o prazo de 5 anos previsto na LAT, mas antes, como se impunha, o prazo prescricional de 3 anos estabelecido no artº 498º do CC, contado a partir do ano de 2004.

Defendem as Apelantes que o n° 2 do artigo 498° do Código Civil não é aplicável ao presente caso, já que se aplica o prazo especial previsto no artigo 13º do DL nº 133/88, de 20 de Abril, segundo o qual "o direito à restituição do valor das prestações indevidamente pagas prescreve no prazo de dez anos a contar da data da interpelação para restituir".

Salvo o devido respeito as Apelantes carecem de razão.

Vejamos:

Em nosso entender o que o citado artº 13º regula é o direito restituição das prestações indevidamente pagas, direito esse a exercer perante o beneficiário que indevidamente recebeu tais prestações, não disciplinando, assim, o prazo de prescrição do direito ao reembolso sobre terceiro que se apure ser responsável pelo acto que tenha determinado incapacidade temporária ou definitiva do beneficiário, dos montantes correspondentes a prestações pagas a este último e que o mesmo tinha direito a receber.

Não está em causa no presente recurso, como não podia estar na acção, a restituição, pela Autora, de prestações que lhe hajam sido pagas indevidamente, sendo que de acordo com o disposto no art.° 2° do citado DL nº 133/88 consideram-se prestações indevidas as que sejam concedidas sem observância das disposições legais em vigor (nº 1), designadamente as que forem concedidas sem a observância das condições determinantes da sua atribuição (nº 2, a)), em valor superior ao que resulta das regras de cálculo legalmente estabelecidas e na medida do excesso (nº 2, b)), ou após terem cessado as respectivas condições de atribuição (nº 2, c)).

Conclui-se, assim, que a sentença recorrida, enunciando devidamente as questões a resolver, designadamente as suscitadas pela invocada prescrição, solucionou-as correctamente, fundamentando acertada e exaustivamente o decidido, pelo que merece a nossa plena concordância a procedência dessa excepção peremptória e a consequente absolvição da ora Apelada.
III - Decisão:
Em face de tudo o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em, julgando a Apelação improcedente, confirmar a sentença recorrida.
Custas pelos Apelantes.

Coimbra, 27/05/2014


(Luís José Falcão de Magalhães - Relator)

(Sílvia Maria Pereira Pires)

(Henrique Ataíde Rosa Antunes)



[1] Código este que é o aplicável no que concerne ao regime de recurso, dado que foi já na sua vigência que foi proferida a decisão ora impugnada.
[2] Consultáveis na Internet, através do endereço “http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabase”, tal como todos os Acórdãos do STJ que adiante se citarem sem referência de publicação.